Dolores escrita por Marília Bordonaba


Capítulo 47
Dolores




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O luto foi generalizado. A diretora disse mais algumas poucas palavras, suspendendo aquela semana de provas e deixando o pessoal livre pra chorar junto ou de ir embora caso preferisse. Comunicou onde e que horas aconteceria o velório, prestou condolências a quem ela considerava uma de suas alunas mais brilhantes e finalizou sua fala mais rápido do que eu esperava. 

As reações a minha volta eram diversas. Os amigos mais próximos de Virgínia estavam reunidos, chorando juntos, abraçados aos pais. A Jéssica passou mal, sendo carregada pelo pai de alguém até a enfermaria. Os professores, que aparentemente já estavam sabendo e conseguiam manter o controle das próprias emoções, ajudavam a consolar os alunos mais sensíveis. Tive um relance do Lucca, que estava abraçado a outro amigo de Virgínia, chorando discretamente um com o outro.

Todos choravam. Todos reagiam. Somente eu que estava parada, ouvindo e assistindo tudo como que se eu não pertencesse àquele cenário. Minhas vistas estavam embaçadas e os sons abafados, distantes. Senti um formigamento atrás de minha cabeça e sei que só não iria cair porque eu sentia meu corpo pesado como pedra.

— … Lores… Dolores!… – ouvi a voz do meu pai finalmente e depois de alguns segundos, olhei pra ele – Filha, você tá bem?

Eu teria respondido um “sim” se eu conseguisse mexer a minha boca.

— Você tá suando muito! – ele falou assustado – Vem comigo. - e segurando minha mão, ele me levou pra algum lugar onde eu pudesse sentar.

Eu não estava conseguindo assimilar muito bem a notícia.

Como assim a Virgínia morreu? Não parecia possível. Não fazia sentido. A Virgínia? Aquela Virgínia? A Virgínia que eu odeio? Não, nossos arqui-inimigos não morrem. Quando desejamos que eles morram, isso não acontece de verdade… Acontece? E aquele ditado “vaso ruim não quebra”?

Meu pai acariciava a minha mão, murmurando que ela estava fria e dava beijinhos, em uma tentativa mal sucedida de aquecer meus dedos. Eu continuava olhando pra frente, vendo todos chorarem. Alguns soluçavam com os olhos inchados, vermelhos. Eu não conseguia chorar. Não bateu a menor vontade de chorar por nenhum instante; eu não me sentia no direito, porque, afinal de contas, na última vez que nos falamos, eu quebrei o seu nariz e… Eu... Não. Não, não, não. Meu Deus!

— Pai, será que…

— O que? – ele perguntou assustado, porque meus olhos estavam arregalados e minha respiração acelerada.

— Será que… Que a Virgínia morreu porque… Porque… - eu não consegui completar meu raciocínio, a minha respiração entrecortada era um obstáculo pras minhas palavras.

— Não, meu amor. Tira isso da cabeça. Ninguém morre porque o nariz quebrou. - ele me abraçou, preocupado com o meu sentimento de culpa.

Não importava o que ele dissesse, eu só sabia de uma coisa:

— Pai, eu matei a Virgínia!


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