Já era Domingo, Miguel não pregara os olhos, só sabia repassar em sua cabeça a expressão chorosa de Dênis. Queria tê-lo agarrado e não deixar que ele fosse embora, mas sabia que não surtiria efeito. Talvez fosse melhor assim. Seu passado não era fácil de aceitar, e não queria colocar essa carga em cima do mais novo.

Era duro acabar com o que estava acontecendo entre eles, ainda mais que a noite anterior só aumentou seu desejo pelo garoto.

Você:

Bom dia meu anjo… me desculpe por ontem, como você está?✓✓

Bolinho:

Bom dia. Tudo bem.

Você:

Que bom! A gente pode se ver hoje? ✓✓

Depois dessa mensagem não recebeu mais nenhuma, o que deixou Miguel com um humor terrível, e Brownie foi o único que sofreu com a situação. Por fim era de tarde, e o homem já tinha fumado um maço inteiro de cigarros sem conseguir se ocupar com outra coisa. Acabou por sair de casa pra caminhar, mas parou a poucos metros de lá.

Olhou o celular novamente e não tinha nenhuma notificação de mensagem. Ligou para o garoto que morava na casa à sua frente.

“Alô…” uma voz rouca de sono o atendeu.

“Oi Dênis. Está em casa?” perguntou Miguel, feliz por ouvir aquela vozinha.

“Miguel? Hm… Estou.” seu tom era indecifrável, ambos ficaram em silêncio por um momento.

“Quer sair pra tomar um sorvete?” apostou Miguel.

“Ok… Já desço”

O olhar de Miguel foi atraído pelo som de uma cortina e olhou para uma janela no segundo andar da casa, onde conseguiu ver de relance o loiro a fechando. Em 5 minutos ele apareceu do lado de fora e trancou a porta atrás de si.

“Oizinho” ele disse, mas não parecia animado.

“Ei! Vamos lá, não gosto de me desentender com você”  Miguel estendeu a mão e Dênis a pegou.

“Nem eu” disse, mas era perceptível que seus olhos estavam inchados e a voz rouca.

Andaram em silêncio até uma sorveteria que tinha no bairro, e Miguel disse para o garoto pegar o que quisesse enquanto escolheu um picolé de limão, devido sua intolerância à lactose.

Quando se sentaram, Dênis suspirou.

“Eu queria falar de ontem. Sei que não é legal uma bêbada interromper nosso… Ahn, encontro e começar a dar em cima de mim mas-”

Dênis o interrompeu “Imagina, super bacana” revirou os olhos, mau humorado.

Miguel franziu os olhos. “Posso terminar? Isso tudo é muito podre e eu não queria te envolver com essa parte da minha vida. Mas vou te contar… Bom, ela foi minha namorada, e eu não sabia, mas ela tinha um noivo ao mesmo tempo que ficava comigo. Quando terminamos ela não saiu do meu pé por um bom tempo, mas caralho, se eu pudesse, nunca mais veria aquele demônio na minha vida!”

Dênis ouviu calado enquanto seu sorvete derretia aos poucos. Estava tentando ficar de mau humor, mas sem muito sucesso. Um sorriso malicioso brincou em seu rosto e ele lambeu o sorvete demoradamente onde estava pingando.  “ Um sábio me disse uma vez que um homem sem chifres é um homem indefeso” assim que o disse, riram juntos da piada de mau gosto. O ambiente pareceu menos pesado.

“Com certeza você nunca teve chifres, esse seu rostinho fofo é de alguém completamente indefeso” comentou Miguel dando uma mordida no picolé.

O sorriso permaneceu no rosto de Dênis “é óbvio que não tenho, nunca namorei!”

“Sério? Eu nunca imaginaria isso pra um moleque de 12 anos” Miguel começou a rir antes de ganhar um chute na canela. “Ai!” resmungou.

“Eu já te disse que tenho 17!” soltou uma espécie de rosnado, genuinamente irritado.

A esse ponto, ambos já haviam esquecido qualquer chateação e se divertiam na companhia do outro. Algum tempo depois, voltaram para casa de mãos dadas enquanto conversavam.

Dênis mal percebeu os olhares das pessoas na rua dirigido à eles, porém Miguel estava completamente ciente. Sua mão suava, contudo não pretendia esconder que estava saindo com o garoto ao seu lado… Afinal, não tinha vergonha disso.

“Bom, acho que podemos terminar o filme outro dia” Dênis deu um sorrisinho sem graça ao chegar na porta do condomínio onde Miguel morava.

“Tudo bem, eu tenho algumas provas pra corrigir” Miguel apertou a mão que segurava. “Nos vemos outro dia”

Dênis lhe abraçou, enterrando-se nele e o apertando. Por um segundo o mais velho ficou surpreso, mas logo após retribuiu o abraço, conseguindo pensar apenas que o outro parecia uma criança enquanto acariciava os fios loiros e o abraçava.

xXx

O início da semana passou rápido, e tudo estava bem para Miguel, às vezes se via andando pelos corredores da Editora ou da Faculdade com um sorriso bobo brincando em seus lábios. A sensação ficara, mas fazia algum tempo que não via o tampinha que frequentemente roubava sua atenção e seus pensamentos.

Enquanto caminhava até a sala dos professores, percebeu alguém parado ao lado da porta, encostado na parede e com os braços cruzados, olhando fixamente na direção de si.

Era o marombado amigo do Dênis. Suspirou, enquanto andava até ele.

“Está precisando de alguma coisa?” Disse, pois era evidente que tinha algum assunto com Miguel para lhe esperar ali e olhá-lo daquela maneira.

“Na verdade eu vim te pedir uma coisa mesmo” Fred manteve seu olhar de desprezo em cima do homem e lhe entregou um papel que estava em sua mão. Graças à luz da sacada, a foto era clara. Havia nela um professor prensando na porta um aluno da mesma faculdade, prestes a beijá-lo. “Não quero que você chegue perto dele outra vez, se quiser continuar trabalhando aqui.”

A mandíbula de Miguel estava travada e a parte da foto que segurava havia se amassado pela pressão excessiva de seus dedos. Seus olhos ferviam de ódio quando os dirigiu para Fred, e antes que pudesse lhe desferir um soco no meio da cara, saiu sem dizer nada.

Fred sorriu, triunfante.