A Filha do Coringa: a Origem escrita por Apenas mais alguém qualquer


Capítulo 3
Algumas respostas




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Minha vez está chegando...

Acordei abruptamente ao ouvir aquele sussurro. Demorou um tempo até me orientar e perceber que estava no carro, ainda viajando para Gotham. Meus pais estavam imergidos numa conversa tranqüila e nem perceberam que eu tinha acordado. Decidi então, ficar quieta com a cabeça encostada na janela, escutando as vozes tão tranqüilas deles.

Mas não conseguia prestar atenção neles, fiquei ponderando sobre o sussurro que ouvi antes de acordar. De vez em quando escutava meu alter ego falar comigo, mas fazia tanto tempo que não ouvia sua voz que achei que ela tinha perdido essa habilidade. Comecei a ficar preocupada, era para eu estar melhorando, não regredindo.

Talvez essa mudança para Gotham fosse mais intensa do que imaginava...

Ou talvez fosse apenas a necessidade de tomar meus remédios falando alto. Minha meta agora consistia em cada vez depender menos dos remédios que “controlavam” as minhas crises e o meu outro ego, e para isso precisava agüentar algum tempinho à mais sem tomá-los. Acho que conseguia resistir até chegar em Gotham.

Depois de um tempo vendo a paisagem pela janela, consegui clarear minha mente e focar na conversa dos meus pais. Eles estavam falando sobre o Asilo Arkham, nome o qual eu conhecia muito bem já que fazia parte da minha história. Encontrei-me subitamente interessada na conversa deles.

— ... é, faz muito tempo que trabalhamos lá. Fiquei feliz de terem nos convidado para trabalhar novamente e também por terem, finalmente, controlado o lugar e os maníacos. Já passava da hora do Asilo sofrer uma reforma radical– meu pai comentou.

— É, parece que a segurança foi reforçada e os criminosos mais psicopatas foram transferidos para prisões de segurança máxima. Só restaram os loucos de sempre – mamãe comentou, aliviada. – Ninguém agüentava aqueles psicopatas.

— Não era apenas os psicopatas, era o lugar em si. Tanta coisa já aconteceu dentro daquelas paredes. Lembra daquelas fugas e ataques? Sempre deixava alguns mortos e vários feridos, e os psiquiatras eram os que mais sofriam pois aqueles maníacos queriam se vingar dos doutores que os atormentavam todos os dias.

— Ah, nem me fale – mamãe suspirou profundamente. – Isso me lembra da Dra. Quinzel. Tão jovem para se tornar num monstro.

—  O que aconteceu com ela? – perguntei curiosa. Na verdade as palavras escaparam da minha boca, não pude contê-las.

— Ah meu Deus, Cecy! Você me assustou – mamãe deu uma risadinha. – Pensei que estava dormindo.

— Eu estava, até uns minutos atrás.

Vi o olhar do meu pai pelo espelho retrovisor do carro, seus olhos estavam franzidos e pude ver um pequeno sorriso em sua boca. Então ele voltou a atenção dele para a estrada enquanto me perguntava algo:

— Então você estava ouvindo nossa conversa, não é? Não é educado ouvir conversa alheia.

— Não quando a conversa é dos meus próprios pais e de um assunto que me interessa – rebati.

Um silêncio constrangedor tomou conta da atmosfera do carro. Eles sabiam que o Asilo Arkham era um assunto que me interessava, mas toda vez que perguntava algo relacionado à ele, eles mudavam de assunto. As únicas coisas que sabia era que eles trabalharam lá durante um tempo e que eu tinha nascido lá e os dois me adotaram. Parecia que eu não era a única à querer esconder meu passado dos outros.

— Por favor! Contem alguma coisa para mim, eu estou com 17 anos! Vocês não acham que eu mereço respostas? – respirei fundo e esperei alguns instantes. – Apenas respondam a pergunta: o que aconteceu com ela? Essa doutora. – perguntei em um tom mais baixo.

A julgar pelo silêncio constrangedor que se abateu dentro do carro, pensei que aquele assunto tinha encerrado ali, mas enfim, milagrosamente, meu pai suspirou em derrota e começou a contar a história da doutora. Não esperava realmente que eles fossem me contar alguma coisa, dizer que eu estava surpresa era um eufemismo.

— Uns três anos depois de você nascer, A Dra. Harleen Quinzel era a mais nova e jovem psiquiatra do Asilo Arkham. Ela era muito inteligente, mas retraída, não tinha muitos amigos.

— Vocês não eram amigos? – perguntei.

— Eu era mais próxima dela do que seu pai – mamãe respondeu. – Mas mesmo assim, era apenas um relacionamento profissional. Tentei diversas vezes convidá-la para sair com os outros psiquiatras, mas ela nunca aceitava.

— Ah, então ela mesmo se isolava – comentei pensativa. Eu entendo.

— Exatamente – papai continuou. – Um dia, um criminoso muito famoso entrou no sanatório. Já deve ter ouvido falar do Coringa.

Meu coração parou. Quem não conhecia o Coringa? Ele era um dos criminosos mais psicopatas e maléficos que já existiram na face da Terra. Em seus momentos de “auge”, ele era a principal notícia no mundo inteiro. Mas eu tinha um estranho pressentimento sobre ele, como se eu... o conhecesse. Era uma fixação meio estranha.

— Espere aí – estava assimilando os fatos. – Então quer dizer que vocês trabalharam no mesmo prédio em que o Coringa estava preso?

— Não apenas isso, fazíamos parte da equipe que tratava dele.

— Não acredito... então vocês conheceram um dos mais perigosos psicopatas de todos os tempos?

— Pode-se dizer que sim – papai respondeu, mas percebi que os dois estavam meio incomodados.

— Por favor, continue.

Seguiu-se uma breve pausa e então ele continuou.

— A princípio, era para eu examiná-lo, mas surgiu uma emergência que ocupou o tempo de todos os melhores psiquiatras do Asilo e então a Dra. Quinzel se tornou responsável pelos seus exames e terapias. Se ela conseguisse “domar” o Coringa, seria admiravelmente respeitada por todos os outros psiquiatras. Era um jeito dela provar que era capaz.

— Mas uma coisa muito improvável aconteceu, - mamãe continuou – ela foi criando empatia por ele durante as sessões de terapia. Pode-se dizer que ela... se apaixonou por ele.

Sacudi a cabeça em confusão.

— Como alguém pode se apaixonar por um vilão que matou milhares de pessoas? Alguém que já fez tanto mal ao mundo que deve ter um lugar reservado no inferno? – Eu estava perplexa, não conseguia entender. Às vezes o mundo não fazia sentido.

Ah, querida... ele nunca fez sentido.

Sacudi a cabeça rapidamente para expulsar aquela voz da minha consciência.

— Minha filha, se tem uma coisa que eu sei nesse mundo caótico, é que existe louco para tudo o que se possa imaginar – às vezes meu pai soltava algumas sábias palavras, mas queria saber logo o que aconteceu com a doutora.

— Ok, continue – falei meio impaciente.

Meu pai percebendo minha impaciência e entusiasmo, revirou os olhos – que notei pelo espelho retrovisor – e exibiu um pequeno sorriso torto.

— Entretanto, tenho quase certeza que o Coringa a manipulou. A Dra. Quinzel não era muito boa da cabeça também. Então, em um belo dia, ocorreu um ataque no Asilo, mas não um simples ataque, aquela era a fuga do Coringa. Quando o ataque começou, a Doutora estava na sala de terapia por eletro-choque com o Coringa amarrado na mesa. Acho que você pode imaginar o que aconteceu... pessoas feridas, mortes, os loucos fora dos quartos, um caos total. Acabou que, o Coringa, zangado com o tormento das terapias feitas pela Doutora, mesmo que “apaixonada” por ele, a dominou e conseguiu amarrá-la na mesa e a fez provar o seu próprio remédio, ou no caso, terapia de eletro-choque.

Meus olhos arregalaram. Não conseguia nem me imaginar no lugar dela.

— Deve ter sido horrível!

— Ah, sim. Então o Coringa brincou com ela o máximo que pôde e fugiu antes que as autoridades chegassem...

— E onde vocês dois estavam durante esse ataque? – interrompi.

— Deixe-me lembrar... Ah! Eu levei 3 tiros no ombro, o que foi suficiente para me deixar inconsciente, e também fez os capangas do Coringa pensarem que eu estava morto. Não me lembro de muita coisa, mas alguém chutou meu rosto, disso eu tenho certeza – papai tinha uma cicatriz no rosto, acho que acabei de descobrir a origem dela. A única coisa que ele falou sobre ela, era que aquilo era o resultado de um chute.

— Eu e alguns enfermeiros e psiquiatras conseguimos nos esconder dentro de uma solitária. Quase nos descobriram, mas graças à Deus eles foram embora pois a polícia já estava chegando – Mamãe falou com uma nota de apreensão em sua voz. – Definitivamente, aquele foi o pior dia de nossas vidas. Fiquei muito preocupada com seu pai, pensei que ele estava morto. Depois do ataque só nos encontramos no hospital e foi um alívio saber que ele estava vivo e que iria ficar bem. Também pensei em você em casa com a babá, não conseguia imaginar você crescendo sem seu pai e eu.

Pensei ter visto uma lágrima escorrer pelo seu rosto através do espelho retrovisor lateral, também escutei ela fungar. Não imagino o que ela deve ter sentido. Meu pai também deve ter percebido o sentimentalismo da mamãe, pois colocou sua mão afetuosamente sobre a coxa dela, e ela a segurou com força. Papai continuou a história, com os olhos fixos na estrada:

— A Dra. Quinzel depois de ter sido torturada, passou um tempo no hospital e depois foi para casa para terminar sua recuperação. Sabendo que esse tipo de tortura é bem traumatizante, os diretores do Asilo deram uma licença de afastamento para ela até que se recuperasse. Mas, acontece que aquilo mexeu com a cabeça dela e transformou a paixonite dela pelo Coringa, em obsessão. Ela começou a persegui-lo de alguma forma e insistiu para que pudesse ficar com ele. Acho que ela o irritou tanto que a aceitou, e surgia então a Arlequina.

— Espere aí! A Arlequina é a parceira mais fiel dele – já tinha ouvido falar dela algumas vezes no noticiário.

— E a mais apaixonada – papai completou. – E é essa paixão obsessiva que faz ser tão fiel à ele.

Revirei os olhos e continuei admirando a paisagem através da janela ao meu lado.

— É, ela é realmente louca.

Foi então que vi ao longe uma cidade que a princípio pensei ser Nova York, a paisagem tinha prédios altos e cinzentos, além de ter uma camada espessa de poluição sobrevoando a cidade. Mas olhando detalhadamente, não era, a posição dos prédios estava errada. Seria Gotham? Então mamãe respondeu minha pergunta silenciosa.

— Olhe ali, Cecy! – mamãe apontou na janela a paisagem da cidade. – Bem-vinda à Gotham!

Inesperadamente, um sorriso surgiu no canto de minha boca ao ficar encarando o horizonte da cidade por muito tempo. Milhares de sentimentos oscilavam dentro de mim naquele instante, como familiaridade e estranheza, pois a cidade se assemelhava com NY, a cidade que eu tanto amava, mas não era ela, será que isso seria um problema?

E tinha essa perspectiva de uma nova vida, estava tão entusiasmada pois podia finalmente fazer amigos, criar lembranças boas, ficar melhor. Mas será que eu seria tão sortuda assim? Ou eu teria medo de tomar atitude e acabaria me isolando do mesmo jeito que fiz esses anos todos? Eram tantas possibilidade possíveis e tantas possibilidades que pareciam impossíveis.

E tinha essa pergunta na minha cabeça, que me assombrava, perseguia e nunca me deixava, desde quando eu era criança:

Será que eu finalmente descobriria quem era o meu verdadeiro pai biológico?


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Notas finais do capítulo

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