Os póneis bonzinhos vão para o Inferno escrita por Maurus adam


Capítulo 18
Livro 2 Capítulo 7 - A paternidade é tramada




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De todos os erros em que Arenito poderia ter incorrido, acabou por cometer o pior deles todos. Adquiriu um potro recém-nascido sem se ter preparado previamente, tanto material como psicologicamente. O seu 'eu' mais novo revelou-se estar à altura da sua faixa etária e passou cerca de uma hora a chorar a plenos pulmões até Arenito se ter lembrado de que o bebé poderia estar com fome. Infelizmente ele não fazia a mínima ideia do que os bebés comem. (Tinham-se passado literalmente vários milénios desde a ultima vez que lhe entraram lacticínios para o estômago.) Arenito tinha conseguido alimentá-lo com um sumo feito com bagas e cenouras que lhe enfiou pela goela abaixo com a ajuda de uma garrafa de gargalo estreito. Não era a alimentação mais indicada para um recém-nascido mas ia mantendo-o nutrido. Muito pior tinha sido a sua salubridade. Sem o mínimo de jeito e conhecimento para cuidar de crianças, pareceu uma boa ideia a Arenito improvisar um berço com um caixote e alguns panos a servirem de colchão. Inicialmente parecia não haver nenhum problema, pelo menos até o bebé começar a fazer as suas necessidades e a sujar a cama toda enquanto rebolava nela. Rapidamente quase todas as suas provisões de tecido gastaram-se a tentar manter o potro limpo.
Mas isso não era nada comparado com o barulho que ele era capaz de gerar. Faminto ou não, o Arenito mais novo passava a maior parte do tempo desperto a chorar compulsivamente. É claro que como a maior parte dos bebés, ele revelou-se um péssimo dormente, sobrando-lhe bastante tempo acordado para praticar a sua berraria. O facto de Arenito ter uma fronha capaz de deixar qualquer pónei com pesadelos, quanto mais a um bebé, só piorou as coisas. Nem sequer um dia ainda tinha passado e já ele estava farto do pequeno potro. O seu plano original tinha sido sempre encontrar um lar digno para a sua versão mais nova, mas com o cansaço extremo aliado ao stresse constante de interagir com outro ser começou a esgotar a pouca paciência que ainda restava a Arenito e só à custa de muito esforço é que conseguiu evitar cometer uma tragédia. Ele sentiu-se terrivelmente tentado em lançar, bastante literalmente, para fora da aldeia a pobre criança. Somente os séculos de trabalho e estudo que passou para chegar àquele momento o impeliram a aguentar toda aquela choradeira agonizante por mais um pouco. De qualquer das formas Arenito tinha que se livrar do pequeno potro o mais rapidamente possível, nem que fosse simplesmente para arranjar algum pónei que pudesse tomar conta dele melhor do que ele próprio.
No dia seguinte Arenito deixou a sua versão mais nova alimentada e embrulhada em lençóis lavados e partiu de Inferno em busca de algum sitio onde o pudesse deixar. À medida que aumentava a distância entre si e a sua casa, a pressão de tudo o que lhe tinha acontecido nas ultimas vinte e quatro horas começou a aliviar visivelmente. Voar sobre as intermináveis e silenciosas planícies de neve tinha-se revelado para Arenito ser um exercício extremamente relaxante. Infelizmente aquela viagem não foi mais do que isso. A paisagem nevada era literalmente interminável e silenciosa, em qualquer direcção, até onde a vista de Arenito conseguia alcançar. Toda aquela região estava completamente deserta. Mesmo explorando a localização de algumas das aldeias e cidades que Arenito ainda se lembrava de existirem só veio a revelar ruínas antigas.
Aparentemente, a infestação de windigos tinha provocado a esterilização de toda a vida em todo o mundo que Arenito conhecia. Chegou mesmo a pensar que ele e o seu outro 'ele' eram os únicos póneis ainda vivos no mundo. A sensação de desolação que sentiu era avassaladora. Ele nunca se tinha importado com os outros póneis, mas desde de que o deixassem em paz também não sentia grandes níveis de hostilidade para com eles. Naquele momento a solidão não saciada que sentia tomou conta dele, especialmente porque se encontrava tão próximo de conseguir que uma parte de si alcançasse um destino melhor.
Foi preciso Arenito lembrar-se de que o Sol e a Lua tinham continuado a mover-se pela abobada celeste até àquele dia para se aperceber de que pelo menos alguns unicórnios deveriam ter sobrevivido. Interrogando-se onde poderiam estar, lembrou-se de que quando patrulhava os céus à volta da vila de Inferno a espantar windigos, ocasionalmente avistava grupos de póneis a dirigirem-se para o sul. Voando o mais alto que conseguiu, perscrutou naquela direcção. No horizonte as Montanhas de Cristal reflectiam esplendidamente os raios do por-do-Sol pelo céu. Até lá, a única coisa que conseguia avistar era um espesso manto branco. Arenito tinha a certeza que não haveria nenhum sítio até às montanhas em que póneis poderiam habitar, mas para lá delas qualquer possibilidade poderia ser uma realidade. Tomando a direcção das Montanhas de Cristal, voou com intenções de explorar o que se encontrava por detrás delas, até que se lembrou que tinha deixado o bebé sozinho à mais de meio dia. Voltando imediatamente para a sua casa, Arenito começou a ouvir uma choradeira ensurdecedora. Apesar de estar bastante cansado por ter passado a maior parte do dia a voar, começou a sentir-se muito pior. O barulho fez-lo recordar de tudo o que já tinha passado por causa do pequeno potro e quase instantaneamente todo o stresse que tinha deixado para trás ao partir de Inferno voltou a acumular-se em cima dele. O seu lar, que durante milénios foi o seu santuário contra a caocidade do mundo, tinha-se tornado num pesadelo vivo.
Ao entrar na sua casa (Como se a poluição sonora não fosse suficiente.) foi assaltado por um horrível atentado às suas capacidades odoríferas. A pequena criatura não somente se tinha contentado em defecar e urinar, como também tinha vomitado pela cama toda. E a admirar pelo pestilento miasma que se tinha instalado naquela divisão, já o tinha feito à bastante tempo. Invocando a pouca paciência que ainda possuía, Arenito limpou e amamentou o bebé o melhor que pôde. Só então deitou-se, esperando que pequeno potro não o incomodasse tempo suficiente para passar uma boa noite de sono. Ele iria começar um dia muito cheio na manhã seguinte.
Se ele quisesse explorar para lá da cordilheira de montanhas, ele teria que o abandonar o bebé. Arenito não tinha nenhuma solução melhor ao seu dispor. Não poderia levar o potrinho consigo pela possibilidade de arriscar a sua vida caso encontrasse algum perigo e por o ir atrapalhá-lo se necessitasse de ser discreto. Só lhe restava deixá-lo sozinho em Inferno. Na realidade era a desculpa perfeita para se manter afastado do caos que era tomar conta dele. O problema era que teria de de voltar o mais rapidamente possível a intervalos regulares, o que não seria lá muito prático tendo em conta a enorme distância entre Inferno e as Montanhas de Cristal. Ainda por cima ele não saberia o que encontraria para além delas, ou a que distância poderia estar localizada uma cidade.
Deixando o pequeno Arenito bem alimentado e aconchegado, o Arenito mais velho partiu bem cedo no dia seguinte. Fazendo o máximo de esforço que conseguiu, chegou às Montanhas de Cristal em pouco mais de duas horas. Pousando no cume de uma delas para descansar um pouco, Arenito pôde finalmente ver o que se ocultava por detrás delas. A paisagem nevada estendia-se por alguns quilómetros, mas para além dela o horizonte preenchia-se com campos verdejantes e florestas massivas. Mesmo no limite da sua visão, Arenito conseguia enxergar algumas cidades. Os póneis tinham conseguido prosperar naquela nova terra. Arenito tinha muitos sítios por onde escolher que poderiam ser um óptimo lar para o seu alter-ego mais novo. Batendo vigorosamente as asas, levantou voo rumo àquele novo e verdejante pais desconhecido.
A primeira cidade que Arenito encontrou era um enorme aglomerado de edifícios gigantescos, cada um deles possuindo várias dezenas de andares. Fascinado pelo tamanho colossal daquelas construções de vidro e argamassa cinzenta, deu algumas voltas pelos céus daquela cidade antes de decidir aterrar no topo do edifício mais próximo. A partir do telhado de um daqueles enormes prédios rectangulares, Arenito possuía um olhar privilegiado das ruas que o circundavam. Aquela zona encontrava-se completamente desprovida de vida vegetal. Algumas das ruas maiores possuíam fileiras de pequenas árvores decorativas, mas exceptuando isso, ele não conseguia avistar qualquer tipo de planta. Ademais, parecendo-lhe como um enxame desordenado de formigas, os póneis daquela cidade entupiam as já de si pequenas ruas enquanto faziam uma algazarra enorme que se fazia ouvir mesmo até à altitude aonde se encontrava Arenito. A sua cabeça começou a doer com a zumbeira que vinha de lá de baixo e ele foi-se rapidamente embora daquele sitio, pensando que já estava demasiado lotado para mais algum pónei ir viver para lá.
Procurando por outra localidade, Arenito acabou por encontrá-la, mas não onde esperava. Voando com toda a sua atenção focada na superfície não se apercebeu da sua verdadeira natureza até ter quase chocado com ela. Uma grande e espessa nuvem que se estendia por um par de quilómetros acabou por revelar-se uma autêntica metrópole. Tanto as ruas como os edifícios eram inteiramente constituídos por nuvens comprimidas umas às outras até formarem uma forma suficientemente estável para não se desfazerem com o vento. Não foi surpresa nenhuma para Arenito que aquela cidade estivesse exclusivamente povoada por pégasos. Voando a uma distância segura para evitar ser visto pelos habitante locais, Arenito reflectia se valeria a pena mutagenar o seu outro 'eu' num pégaso, como tinha feito consigo há muito tempo atrás, para lhe permitir viver naquele lugar. Chegou à conclusão de que operar mudanças tão drásticas num ser tão jovem e com uma compleição ainda bastante fraca arriscaria demasiado a criar-lhe problemas permanentes de saúde, ou até mesmo a que morresse durante o processo.
Virando as costas àquela insólita cidade, Arenito prosseguiu em direcção ao sul, buscando outro sitio onde pudesse depositar o pequeno potro que tinha em casa. Foi então que reparou que já era quase meio da tarde e que teria de voltar rapidamente para cuidar do bebé. Uma tarefa cansativa, tendo em conta a distância do regresso e o tempo que tinha passado a voar desde que partira.
Ao chegar de regresso a casa, a situação que o esperava não era melhor do que a do dia anterior. Cuidando do pequeno potro o mais rapidamente que pôde, foi dormir ao relento, no lado oposto do Inferno, para evitar ser incomodado pelo choro constante do bebé. Acordou ao principio da noite, ainda cansado, mas suficientemente restabelecido para voltar à sua busca. Antes de deixar a sua cidade, alimentou-se a si e à sua versão mais nova (Não o limpou, só o deixou num canto do berço que não se encontrava muito sujo.) e então dirigiu-se de novo para as montanhas que separavam o novo país dos póneis do antigo.
Voando muito mais para sul do que as duas cidades que visitara nessa manhã, deparou-se com uma pequena vila no meio de nenhures. Era uma aldeia simples, formada apenas por algumas dezenas de casas e outras tantas hortas e rodeada por uma extensa região desértica. Arenito nem teria reparado nela se não fosse pela pelo contraste que os telhados de lajes de xisto faziam no terreno arenoso. A grande e brilhante Lua iluminava perfeitamente a areia clara e aqueles telhados negros faziam-se notar a uma valente distância.
Calculando que não devia haver nenhum pónei acordado a passear pela rua naquela hora, Arenito decidiu pousar no topo de uma das casas para observar melhor aquela vila. Infelizmente, não foi uma ideia muito sensata. Estava ele a pensar que aquele sitio era demasiado pequeno e desinteressante para o seu outro 'ele' ir para lá viver, quando um 'reck... cranque' se fez ouvir mesmo por baixo das suas patas. O telhado, preparado unicamente para abrigar o interior de ventos, tempestades de areia e muito raramente uma chuvada ou duas, não aguentou com o peso de Arenito e ruiu, precipitando-o para o interior do sótão.
Meio tonto com a queda, mais devido à surpresa do que ao choque, Arenito bateu fortemente as suas asas para se livrar dos destroços que o cobriam. Pôde então olhar à sua volta. Encontrava-se num quarto de crianças, tão pequeno que ele próprio mal cabia nele. A um canto, numa cama e coberta por um lençol, estava uma pequena potrinha, meio assustada e olhando muito fixamente para ele. Tendo a certeza que toda aquela confusão havia acordado todos os outros póneis daquela morada (E muito provavelmente uns quantos das moradas vizinhas.) Arenito saltou pelo buraco que tinha acabado de causar e voou para longe, antes que mais algum pónei o pudesse ver.
Continuando a deslocar-se para sul, Arenito acabou por chegar a terrenos mais campestres e temperados. O horizonte cobria-se de alegres campos e florestas verdejantes, ponteados ocasionalmente por uma ou duas quintas isoladas. Era uma região agradável mas não parecia haver nenhum sitio que despertasse o interesse de Arenito.
Olhando em volta, tentou decidir em que direcção haveria de explorar a seguir. Para o sul e para oeste o terreno continuava a ser ocupado por campos e florestas. Para este existia uma montanha. Nessa montanha havia uma grande cidade construida inteiramente num socalco artificial. Se bem que Arenito não conseguisse vê-la muito bem àquela distância, achou que se havia uma cidade construida no declive daquela montanha então deveria ser suficientemente interessante para ele dar-lhe uma vista de olhos.
Então Arenito alterando o seu rumo para este. Porém, a meio do caminho encontrou outra cidade. Parecia uma simples aldeia, por isso Arenito nem teria posto os olhos em cima dela na sua viagem para a extravagante cidade esculpida numa montanha se a aldeia não estivesse mesmo no seu caminho. Assim, felizmente acabou por ser difícil para ele evitá-la.
Aquela pequena cidade assemelhava-se demasiado com a antiga vila do Inferno, do longínquo tempo de quando Arenito ainda era um jovem potro. Era um sitio pitoresco, uma vila localizada no meio de uma planície verdejante e composta por pequenas casas dispostas à sorte e separadas por largas e solarengas ruas. A noroeste o terreno estava ocupado por áreas de cultivo, sendo a maior parte dele dedicado a pomares de macieiras. A sul existia uma enorme e espessa floresta. Basicamente, parecia mesmo a antiga Inferno e Arenito apercebeu-se disso. Deveria ter-lhe virado as costas e ido embora, afinal de contas não tinha tido todos aqueles milénios de trabalho árduo para repetir a sua vida atormentada, mas algo atraiu a sua atenção para aquela vila. O dia estava a começar e o Sol ascendente começara a banhar toda aquela cidade. Já havia póneis a passear pelas suas ruas, unicórnios, pégasos e póneis terrestres, e conviviam lado-a-lado com a maior das naturalidades.
Arenito estava espantado. Precisava de observar aquela cidade mais atentamente, mas as suas ruas eram tão largas que o poderiam avistar facilmente se ele se decidisse aproximar mais. Ademais, alguns pégasos andavam a esvoaçar pelos céus e de certeza que o encontrariam caso ele não se afastasse rapidamente. Contornando a cidade para o sul o mais ligeiramente possível, Arenito dirigiu-se para a floresta local e ocultou-se lá. A floresta encontrava-se um pouco afastada da periferia daquela cidade, mas mesmo assim ele conseguiu ter uma vista razoavelmente boa de algumas ruas próximas.
Durante um par de horas espiou de longe o que se passava naquela vila. O que ele presenciou confirmou as suas observações iniciais. Vivendo em completa harmonia, as três raças de póneis conversavam, trabalhavam e brincavam pacificamente. Aquele sitio era perfeito para para criar o seu outro 'ele'. Possuía um toque familiar mas ao mesmo tempo era diferente. Era como os desejos efémeros de um sonho esquecido, só que era bastante real e não uma boa de sabão que rebentaria quando Arenito acordasse. Felicíssimo por ter encontrado o lugar ideal para entregar o bebé, (Tanto por finalmente se ir livrar dele quanto por lhe dar uma oportunidade de ser feliz.) voou de volta ao Inferno.
Arenito cuidou uma ultima vez do pequeno potro antes de descansar para a viagem de regresso. Tinha pensado em esperar um dia ou dois. Queria poder repousar do caos que tinha sido aqueles últimos dias mas depois de ser acordado pela terceira vez seguida em menos de cinco horas sabia muito bem que não teria descanso enquanto tivesse que cuidar da sua versão recém-nascida.
Arenito voou então de volta à pequena cidade que tinha escolhido para a sua nova vida ter uma vida nova. Enrolado em cobertores no interior da sua mochila, o pequeno bebé chorava desalmadamente com o enorme desconforto que era para um pónei tão novo voar aos solavancos num sitio tão escuro e apertado. Porém, dado que do lado de fora daquele ninho improvisado estava um frio glaciar, o bebé encontrava-se no melhor sitio onde poderia estar.
Tinha regressado à pequena cidade quando o Sol se começava a pôr. Sabendo que precisaria de andar à vontade para encontrar um lar conveniente para o pequeno potro, Arenito procurou refugiu na floresta onde tinha estado a observar a aldeia nessa mesma manhã. Lá ocultou-se entre a folhagem duma árvore e esperou que fizesse noite cerrada. Deitando-se sobre um ramo, esperava poder dormir um bocado enquanto a Lua não atingisse o seu zénite. É claro que acabou por ter que desperdiçar esse tempo a cuidar uma ultima vez do seu 'eu' recém-nascido. Abafado nas profundezas da mochila, o coitado do potro estava assustado, faminto e bastante sujo. Arenito teve que deitar um dos cobertores fora, juntamente com o pano que o bebé usara como fralda. Mais problemático tinha sido a alimentação. Arenito estava com tanta pressa de se livrar daquele fardo que nem se lembrou de se abastecer com comida. Ele não se importava, a sua compleição aguentava algum tempo sem sustento. Por outro lado, sua versão mais nova estava esfomeada. Será inútil dizer o quanto lhe custou andar cansado, no meio do escuro, carregando um potro aos berro, à procura de algum tipo de fruta que pudesse ser suficientemente sumarenta para um bebé poder ingerir. Por fim encontrou um arbusto de mirtilos. Tão faminto o pequeno Arenito estava que o Arenito mais velho não teve dificuldades em o alimentar enfiando bagas inteiras pela sua garganta. Finalmente saciado, o cansaço tomou conta dele e adormeceu, permitindo a Arenito ter algum tempo de sossego.
Finalmente, encoberto pela escuridão, abandonou o seu esconderijo e sobrevoou os telhados daquela vila. Ao principio avançava prudentemente, receando que ainda pudesse haver algum pónei acordado, mas depressa se tornou óbvio que as ruas se encontravam completamente desertas. Não demorou muito a encontrar o sitio ideal para deixar a sua versão mais nova. Era uma grande casa branca no meio de um bonito jardim. Pelas suas janelas Arenito pôde ver que a maior parte das suas divisões estavam cheias de camas com potrinhos a dormir. Ele não saberia dizer que tipo de lugar era aquele, mas isso não era importante. De certeza que se tantas crianças lá habitavam, então os póneis encarregues daquele sitio poderiam facilmente cuidar convenientemente do seu outro 'ele'.
Arenito dirigiu-se à sua porta e retirando o bebé da sua mochila, deixou-o na soleira, bem embrulhado nos cobertores onde se encontrava a dormir. Porém, não o permitiu continuar a dormir, pois acordou e recomeçou a chorar. Antes que a choradeira atraísse atenções indesejadas, bateu violentamente à porta e voou para o telhado de uma casa próxima. De dentro daquele edifício saiu então uma berraria insuportável, que fez coro com a choradeira que se ouvia do lado de fora. Passado algum tempo parou, e apesar do pequeno bebé ainda continuar a chorar nenhum pónei parecia ter reparado nele. Arenito começou a ficar impaciente. Ele não acreditava que nenhum pónei ainda não tivesse reparado que havia uma criança na rua a fazer tanta barulheira. Estava quase a pensar em voltar a descer e a bater à porta quando esta se abriu.
De lá de dentro saiu uma égua. Ficou como que paralisada, com a boca aberta, quando se apercebeu que mesmo à beira das suas patas, envolvido em alguns cobertores, encontrava-se um potrinho que choramingava compulsivamente. Se seguida um garanhão surgiu de dentro daquela casa. Ambos olharam em volta, como se procurassem o pónei que tivesse abandonado aquele bebé. Depois de terem trocado algumas palavras, pegaram no Arenito mais novo e voltaram lá para dentro.
O Arenito original deixou-se ficar por ali durante mais algum tempo. Por fim, levantou voo e regressou à sua morada. Inferno tinha retornado ao lugar silencioso e acolhedor que sempre o caracterizara. Com o cansaço acumulado dos últimos dias, Arenito deitou-se e deixou o sono tomar conta dele. Tinha alcançado o objectivo de uma eternidade e a melancolia de tempos desocupados iria eventualmente atingi-lo, mas naquela altura estava simplesmente contente por haver um outro 'ele' noutro mundo, a viver uma outra vida.


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