Todo dia era rotina, nada mudava naquele pequeno pedaço de terra perdido no meio do mar. O Ninho era um lugar monótono, nunca tinha nada de novo, os profetas apenas passavam o tempo que lhes restava ali, isolados sem fazer nada, só usavam seus poderes para pressentir tudo que acontece ou que vai acontecer ao redor do mundo e avisar todos que deveriam saber.

O tempo era sempre fechado, era como se a própria ilha atraísse as nuvens, chuvas, trovões, incluindo o frio, que sempre obrigava os velhos profetas a usarem túnicas com várias peças de roupa embaixo.

A área que antes era verde, com plantas, toda verde, flores, agora era marrom, toda a vida se esvaiu daquele lugar, até o próprio templo já estava rachado, com marcas da idade. Os profetas, estruturas e… A vida daquele local, já estavam perto do seu fim.

E eles sabiam disso.

Ao longe, no mar, um dos profetas viu uma embarcação se aproximando, ela era pequena, sua vista já desgastada dos seus centenas de anos não deixava aquela imagem nítida. Só que duas coisas estavam estranhas, por que eles não tinham previsto isso? E como o ser que devia estar na embarcação achou aquele lugar?

—Então, aquele é o Ninho. -No pequeno barco navegava um homem, que estava sentado esperando chegar no seu destino, ele estava vestindo a roupa de um oficial diplomata, completamente negra, que ia do seu pescoço, coberto pela gola alta da peça até seus calcanhares, correntes douradas finas juntavam a peça na altura do tórax. Ele pegou do chão um quepe também negro com detalhes dourados e colocou na sua cabeça. Seus cabelos eram curtos, lisos e totalmente brancos, assim como seu rosto, pálido. -Espero que esses velhos não resistam muito. -O barco parou, nem a correnteza forte como estava conseguia movê-lo, com um movimento de mãos, aquele homem abriu uma fenda no espaço e entrou nela, saindo imediatamente no Ninho.

Nem sinal dos profetas, nem mesmo sua energia era possível sentir. O invasor que havia acabado de quebrar o espaço tempo começou a caminhar em direção ao templo, sem hesitar, não demonstrava preocupação nenhuma. Ele entrou naquela estrutura gigantesca e várias tochas se acenderam naquela enorme sala, os cinco profetas estavam um do lado do outro no centro do salão, protegendo o que havia no final do mesmo… A Relíquia do Renascimento.

—Como fugiu, Crow? O que quer aqui? -Perguntou o que estava no meio, o mais alto de todos.

—Creio que nenhuma dessas perguntas sejam da sua conta. -Crow estendeu a mão e a sala inteira perdeu a cor, tudo ficou preto e branco, era como se o tempo tivesse parado. Com exceção dele. -Eu controlo o terreno, eu moldo o espaço como eu quero. -Ele andava e seus passos não produziam som algum, continuou até passar os profetas e ficar próximo do seu objetivo: A Relíquia.

—Não pense que nos derrotará com esse truque! -Com um estalar dos dedos, um dos profetas fez as cores voltarem.

—Profeta Kalyun, mestre da individualidade. -Crow sorria, ainda de costas para seus oponentes, que voltaram ao normal. -Seu poder é incrível, pode sobreviver a qualquer adversidade com o Individualismo e tem como ir além, pode criar um Coletivismo, como o que fez agora, fazer com que todo meu terreno adquira seus poderes, se livrando da minha dimensão.

—Conhece bem meus poderes. -Era velho como os outros, mas era o único sem barba ou bigode. -Então sabe que não tem chance de me vencer. Vamos devolvê-lo para o local que escapou.

—Mísseis arcanos! —O profeta com cabelo longo estendeu seus dois braços e ficou de mãos abertas, delas, surgiu um círculo roxo com vários símbolos nele. O encantamento professado gerou uma rajada de disparos de magia também roxos. Todos os disparos atingiram Crow nas costas. Quando a fumaça baixou… Ele não estava mais lá. -O que? -O profeta se assustou.

—Profeta Yoropac, mestre supremo da magia. -Ele reapareceu atrás dos cinco, fazendo-os ficarem assustados. -Odeio magia, você será o primeiro a morrer. -Crow abriu sua mão e Yoropac reagiu na hora, preocupado com o que seu inimigo faria a seguir.

—Teia mágica! —De cada um de seus dedos surgiam cordas mágicas nas pontas, que ao fazer movimentos com as mãos formava uma teia que ocupava grande parte do salão. As cordas se ligavam nas paredes, teto, umas nas outras, até mesmo em Crow. -Não somos profetas por acaso, garoto, não nos subestime! -Yoropac foi dar o comando para a liberação da energia e explosão das cordas mas nesse momento Crow contra-atacou.

—Quando eu luto, Yoropac, eu crio as regras, eu faço o meu campo de batalha e minhas próprias leis da física. Troca! —Os reflexos dos profetas eram incríveis, apesar da idade bem avançada, centenas de anos, eles respondiam extremamente rápido. Com aquele golpe, Crow trocou de lugar com Yoropac, sendo assim, o profeta que ficou embaraçado nos fios. A liberação de energia aconteceu, a explosão foi gigantesca, causando a criação de mais rachaduras e estragos no templo que era altamente resistente.

—Você não vai matar meus companheiros. -Disse Kalyun. No segundo antes da explosão, ele usou seu poder para tornar seu parceiro profeta imune, desfazendo os fios presos a ele. -Enquanto eu viver, você não causará um arranhão a nenhum deles! -Os outros começaram a agir, pulando pelos pedaços de pedra que foram resultado da explosão.

—Crescer! —A tunica do profeta mais alto rasgou, seus músculos cresceram de uma forma inimaginável, as veias palpitavam, como se quisessem partir sua pele. -Dogma, Garo! -O velho mais forte fisicamente se movia tão rapidamente que parecia que ele tinha a habilidade de teletransporte. Correu para as costas de Crow.

—O que? -O invasor se assustou. -Hale, o devastador, sua força deve ser… -Antes que terminasse de falar, levou um soco no seu rosto, sendo mandado na direção do profeta que parecia ser ainda mais velho que os outros.

—Inversão! —Quando se aproximou de Garo, Crow foi jogado noventa graus a direita na mesma intensidade. Garo manipulava os vetores, ele gerou o mesmo impacto do golpe de Hale mas em outro sentido e direção, como se Crow tivesse levado dois golpes em lugares diferentes.

Ele colidiu com a parede, fazendo destroços caírem em cima dele. O poder dos profetas era insano, eram considerados os homens mais fortes do mundo, ou quase. Eram adversários que qualquer um evitaria um confronto, lutar com eles era praticamente se suicidar, então por que Crow estava fazendo isso?  Dogma usou sua telecinese para tirar os escombros e ver se seu oponente estava morto, mas para surpresa deles, ele não estava lá.

—Com certeza vocês não são tão sábios como dizem. -Crow estava do lado da relíquia, aproximando sua mão. -Com certeza não entendem como funciona o multiverso e as dimensões.

—Não toque, ela está estabilizada! -Kalyun tentou gritar, mas sua voz rouca não permitia. -Se encostar ou tirá-la daí, ela vai ter sua energia liberada! -Crow riu. Ele colocou suas mãos na relíquia e a tirou do lugar, mas nada aconteceu. -O que está acontecendo? O que você fez? -Com uma mão ele segurava o objeto que os profetas davam suas vidas para proteger, com a outra, fez algo como se parecesse sugar toda energia daquilo, uma aura azul em direção a sua mão.

—Estou armazenando a energia dela em outra dimensão, em uma dimensão onde essa energia não é volátil. -Dogma foi o primeiro a agir, com seu poder tentou jogar Crow para longe, mas nada aconteceu.

—Meus poderes… Por que não funcionam?

—Seus poderes psíquicos não atravessam dimensões. -Uma cópia perfeita do invasor estava atrás de Dogma, deixando todos sem reação. Havia dois Crow, um com a relíquia e outro atrás de Dogma. -Aquele ali é o Crow da sétima dimensão, eu sou o dessa. -Ele, com seu braço direito, encostou no peito do velho profeta. -Nunca mais volte, seu inútil, não serve nem para cumprir a missão que lhe foi dada. -De repente o corpo do profeta pareceu preso dentro de um espelho e sumiu. -Vocês logo irão com ele para outra dimensão! -A cópia sumiu.

Os profetas ao ver um de seus companheiros ser derrotado se assustaram, não acreditavam que Crow poderia ser tão forte. Se não pensassem em algo para fazer e derrotá-lo naquele momento, sabiam que iam ser mandados para outro universo.

—Não vamos perder a calma. -Disse Garo.

—Esse maldito! Barreira energética! —Yoropac criou uma cúpula de energia que juntava Hale e Crow no mesmo lugar. -Ela vai inibir seus poderes, aproveite Hale, mate ele! Ele matou nosso companheiro. -Yoropac era o mais volátil, mais emotivo de todos. Nenhum deles tinha muita compaixão pelos outros, com o tempo, não só a aparência mas o emocional deles também se deterioravam.

—Isso é um problema… -Disse Crow, com a cara fechada, pela primeira vez estava nervoso.

Hale partiu para cima de Crow, acertou uma cotovelada no seu queixo jogando-o para cima, mas antes de sair pela parte de cima da barreira, ele pulou, agarrou sua perna e o lançou no chão, a força foi tanta que uma cratera foi criada. O profeta então caiu em cima do invasor e acertou uma série de socos fortes e rápidos, que jogavam fumaça e pedaços do chão para o alto. Kalyun usou seu poder para transferir parte de sua reserva de energia para Hale, e Garo usou sua habilidade para dobrar a força dos socos.

Hale parou os golpes, ele ficou em pé, a cratera era aberta o suficiente para todos verem o que tinha acontecido lá dentro. Crow estava todo machucado, sangrando, com suas roupas rasgadas e… Sem respiração. O profeta havia matado ele?

—Conseguimos. -Disse Garo. -Ele era poderoso demais, por um momento achei que não o derrotaríamos.

—Foi uma derrota. -Respondeu Kalyun. -Com ele morto, o poder da relíquia continua armazenado em outra dimensão… É impossível saber o que acontecerá agora, se o Crow daquela dimensão colocar as mãos naquilo, acredito que teremos o mesmo destino que iríamos ter se ele não tivesse morrido.

—Vou desfazer a barreira… -Disse Yoropac.

—Espere… Não! -Hale gritou mas o seu parceiro acabava de desfazer a barreira.  Uma outra cópia do invasor apareceu bem na frente de Hale.

—Bu! -Como se ele possuísse intangibilidade, Crow enfiou sua mão no peito do profeta, que parou de se mexer, não conseguia respirar, estava congelado. -Esse seu coração é grande como você… Mas continua tão frágil. -Ele apertou o coração de Hale dentro de seu peito com força, espremendo-o e matando um profeta. O invasor retirou sua mão e Hale, após voltar ao tamanho normal, caiu no chão, morto. -Foi realmente por pouco, se tivesse pego o meu eu dessa dimensão dentro da sua barreira, eu certamente teria morrido… Mas como sempre, eu previ seu movimento.

Eram três de cinco agora, de alguma forma os profetas continuavam certos de que iriam matar Crow, o ego deles era enorme demais. Não tinham tempo de se preocupar com os companheiros derrotados, precisavam vencer seu oponente e achar um jeito de reaver a energia da Relíquia do Renascimento. Garo tirou a parte de cima de suas vestes revelando seu corpo, forte, para um velho, definido inclusive.

—Reforço Ultima! —Setas negras surgiram em seu corpo, como grandes vetores, apontando para direções diferentes, com sentidos e intensidades também diferentes. -Nunca achei que precisaria usar isso novamente. -Ao esticar seus braços, grandes vetores negros “descolaram” dos mesmos e ficaram no ar, levitando. -Atirar!

As setas se esticavam infinitamente. Garo não precisava se movimentar, com sua mente ele as controlava, elas se esticavam numa velocidade muito alta e a força de impacto e perfuração eram insanas, Crow desviava com dificuldade, os vetores perfuravam o chão e as paredes como se fossem folhas de papéis.

—Duplex! —Com essa magia, Yoropac criava uma duplicata para cada vetor de Garo, fazendo com que o dobro de vetores fossem atacar Crow. Kalyun usava seu poder para deixar os golpes de seus companheiros mais fortes. O invasor conseguia se esquivar da maioria, mas alguns pegavam de raspão até que um dos vetores perfurou seu estômago. Ele caiu no chão, as setas continuavam vindo.

—Barreira dimensional! —Algo como uma barreira transparente, com uma textura parecida com vidro apareceu em cima de Crow, protegendo-o dos outros golpes. -Usar minha troca de dimensões não vai funcionar, forças existem em todos os universos, por isso você poderia quebrar a passagem entre elas e me matar não importa como, precisava me proteger com algo físico. - A barreira começou a trincar.

—Não consegue nos impedir com isso.

—Acha mesmo que eu não sabia disso? -Três cópias de Crow surgiram e todas foram atacar Garo, de uma vez. Yoropac se virou para as cópias e usou mísseis arcanos para atingí-las, Kalyun também foi ajudar, fortalecendo os mísseis de Yoropac. Com essas distrações, Crow conseguiu que sua barreira empurrasse os vetores para trás, ele levantou e suas cópias sumiram. -Quebra de realidade! —

Aos olhos de Garo, Yoropac e Kalyun, o mundo começou a se despedaçar, tudo mudou de lugar, objetos de ponta cabeça, os profetas ficaram de um modo como se fossem reflexos de um espelho, invertidos. Eles não conseguiam se mover, seus corpos estavam pesados demais e acabaram caindo no chão. Perceberam ali que não tinham mais chances.

—Eu vou embora, já consegui o queria. -Crow se aproximou dos três. -Eu pensei melhor sobre matar vocês, mas acho que seria mais interessante se avisassem todos os reinos sobre o que está prestes a acontecer. Ele sorriu, respirou fundo, levantou sua mão direita e a imagem do poder da relíquia armazenado em outra dimensão apareceu ali. -Esse planeta apodrece cada vez mais, tudo isso por causa do ser humano, essa raça imunda que espalha pobreza e fome… A única solução é acabar com esses idiotas, e quem pode fazer isso é ele… Waryoku.