Gênese: A Saga da Rosa - Temporada I escrita por FireboltVioleta


Capítulo 23
Focas e Fofocas




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“Às vezes os problemas são sinais de que chegou a hora de o guerreiro iniciar uma nova batalha.”

Roberto Shinyashiki

 

—-----------O-----------

 

ROSE

 

Meu queixo havia despencado consideravelmente.

Os gnomos, intimidados, haviam voltado correndo para suas tocas, ainda praguejando alto e gesticulando os punhos enfurecidos.

Deixando-nos ainda mais perplexos, a foca esgueirou-se para fora do charco, aproximando-se suavemente, com os olhos saltados de surpresa.

Como uma flor que desabrochava, a pele úmida escorreu como um cobertor, expondo a silhueta encolhida de uma mulher.

— É… uma selkie – ofegou Scorpius.

Pisquei, pega de surpresa. Lembrava bem daquele nome, de um dos antigos livros escolares da mamãe. Selkies viviam como focas, embora tivessem a capacidade de se tornarem humanos, quando retiravam suas peles.

Mas o que uma selkie fazia tão longe das águas do rio? E por que estava ali?

Olhei para baixo, encarando o apito branco. Guinchei, ao pensar na possibilidade daquele objeto ser o motivo do surgimento daquela criatura.

Hugo recuou, encolhendo-se atrás de mim. A selkie sorriu, erguendo a mão em nossa direção.

— Não vou machucá-los – a voz dela era límpida e delicada, como as marolas de um olho d'água – ouvi o chamado do apito.

— O quê? - ofeguei – esse apito…

A confusão que tingiu sua expressão não demorou para se dispersar.

— Ah – pareceu compreender alguma coisa -  ela lhe deu… mas não lhe disse o segredo – vi-a se debruçar acima da pequena amurada de pedras – sou Io. Selkie do Lago Profundo – inclinou a cabeça – é a filha de Hermione Granger?

— Hermione Weasley – pigarreei, ainda espantada, vendo meus primos, Hugo e Scorpius se entreolharem – sou Rose.

— Rose – Io repetiu, sorridente – parece muito com ela – acomodou-se em cima da amurada – sua mãe salvou a minha vida há alguns anos. Lhe dei este apito como agradecimento, para quando necessitasse de uma retribuição – Io sacudiu as mechas louras – bem… acho que agora ele pertence a você.

Ergui uma sobrancelha. Então Io era uma velha conhecida da mamãe? E o apito era para alguma emergência que surgisse?

Percebi o interesse da selkie em minha família, e decidi me ocupar com as apresentações.

— Ahn… Io… essa é minha família… meus primos Alvo e Tiago… - eles assentiram num cumprimento - meu irmão Hugo… - Hugo acenou timidamente atrás de mim – e meu amigo, Scorpius.

Scorpius titubeou quando Io o encarou fixamente.

— Filho de Draco Malfoy?

— Sim – meu amigo murmurou, hesitante.

O rosto de Io relaxou.

— Entendi – soltou um longo suspiro – bem… é evidente que não sabia a utilidade do apito. Não a culpo – ela deu uma risadinha baixa – mesmo no passado, Hermione sempre foi muito… reservada… em relação às suas intenções. Imagino que achou uma boa ideia arranjar nosso encontro de modo mais descontraído… que descobrisse por si mesma.

Refreei um resmungo. Ultimamente, mamãe estava sendo um pouco mais do que só reservada. Quase andava parecendo o Mestre dos Magos de Caverna do Dragão.

— É – limitei a concordar – acho que sim.

— Então… - Alvo cutucou o apito em minha mão – a Rose te chamou até aqui? - franziu o cenho – estranho… nossos pais nunca mencionaram nada sobre você.

Io não pareceu magoada. Pelo contrário – aparentava estar estranhamente aliviada.

— Ela deve ter tido suas razões – disse vagamente – bem… não atrapalharei ainda mais a diversão de vocês. Retornarei ao meu ninho agora.

Quis me desculpar por ter retirado Io de sua casa sem motivo, mas ela pareceu notar isso em minha expressão, e balançou a cabeça em negativa, banalizando meu pequeno deslize.

— Bem – dei de ombros – a gente se vê por aí, então.

A selkie assentiu amavelmente.

— Até mais, meninos.

Io puxou de volta a pele de foca sobre seu corpo, tomando outra vez sua forma animal. Estagnados, assistimos a foca dar um mortal, mergulhando de volta na água do charco, e desaparecendo de vista.

Scorpius foi o primeiro a quebrar o silêncio bizarro que se seguiu.

— Tudo bem – ele forçou uma risada – isso foi estranho. Muito estranho.

— Deixa eu ver se entendi – Tiago apontou para o apito – a tia Hermione te deu esse apito… pra pedir ajuda? É isso? - ele cruzou os braços – por que diabos ela achou que você precisaria de ajuda?

— Nunca pensei que faria isso… mas concordo com meu irmão – Alvo comentou – você não é o tipo de florzinha delicada, Rose – brincou – a titia está meio que exagerando com essa medida de segurança, não acha?

Sacudi os braços. Aquilo podia mesmo ser exagerado. Mas minha mãe me amava, afinal de contas. E se meus pais estavam mais seguros, sabendo que eu tinha um meio de pedir por ajuda, não seria imatura para discutir.

Mas afinal… que tipo de ameaça eles imaginavam que eu enfrentaria?

Hugo batucou o pé contra o chão.

— Vamos tirar isso a limpo quando o papai e a mamãe voltarem, Rosie – ele parecia determinado – melhor voltarmos à Toca e contarmos a vovó sobre a Io.




Vovó não pareceu tão surpresa quando terminamos.

— Não é a primeira vez que uma criatura mágica toma o caminho do charco para emergir na Toca  - seus olhos pareceram divagar, presos em outro cenário, enquanto ela servia os pratos na mesa para o jantar.- uma vez, uma ninfa veio visitar seus pais – ela sorriu com a lembrança – alguns rios e lagos são conectados diretamente com o pântano.

— Então qualquer animal ou criatura que more nos rios da vizinhança pode aparecer por aqui?

— Sim… e não – ela riu – há um feitiço que foi lançado ao redor do nosso terreno… nenhuma criatura com más intenções consegue entrar aqui sem enfraquecer consideravelmente… ou até morrer. Se a selkie chegou aqui viva, é por que não quer fazer mal a ninguém.

Tantas coisas que nunca haviam me contado… por que só agora elas estavam vindo à tona?

Alguém bateu à porta outra vez. Vovó foi atender, deixando nós cinco a sós na cozinha.

— Não queria dizer isso, Rosie – cochichou Scorpius, baixo o bastante para que meus primos e Hugo0 não escutassem – mas acho que o professor Longbottom está errado – ele me fitou seriamente – quando as aulas voltarem… acho melhor voltarmos a procurar por respostas.

— É arriscado, Scorpy – retruquei em voz baixa.

— Eu sei – ele sorriu para mim – mas acho que todos te devem algumas respostas.

Senti meu peito esquentar consideravelmente. Uma sensação boa, aconchegante, e estranhamente enternecedora.

— Você… realmente quer continuar me ajudando? - indaguei – mas Scorpius… por que se arriscar… por minha causa?

Scorpius segurou minha mão. Senti um formigamento estranho em meus dedos.

— Por que somos amigos, Rosie – Scorpius riu – e é isso que os amigos fazem, não é?

Senti-me sorrir. Scorpius era realmente o melhor amigo do mundo.

E eu não conseguia imaginar um dia em que poderia retribuir toda aquela preocupação e companheirismo.

Vovó voltou para a cozinha, acompanhada de uma moça que eu não reconheci. Pelo elegante uniforme negro, e os cabelos louros elegantemente assentados num coque, era óbvio que se tratava de uma funcionária do Ministério da Magia.

— Crianças… - minha avó apresentou-nos – esta é Aloy Brown, assistente júnior do quartel-general dos aurores. Aloy… acho que já conhece meus netos… e o jovem Scorpius.

A moça se aproximou, cumprimentando-nos individualmente.

— É um prazer conhecê-los – sacudiu minha mão. Tinha uma aura simpática, embora se mantivesse definitivamente formal.

— O prazer é nosso – retribuí o gesto.

— Aloy veio falar com vocês sobre um assunto em particular – vovó explicou – deixarei que conversem á vontade. Estarei nos fundos se precisarem de mim.

Assim que vovó saiu, Aloy acomodou-se do outro lado da mesa. Confusos, nos encaramos mutuamente, estranhando a presença repentina da assistente diante de nós.

— Bem… provavelmente devem estar se perguntando por que estou aqui – declarou – não se preocupem. Não é nada que envolva vocês – pousou os braços sobre a mesa, unindo as mãos – seus pais pediram que eu esclarecesse algumas coisas sobre a longa estadia deles no Ministério. Imaginaram que desejariam saber o que está havendo.

— Com certeza – Alvo bufou, cruzando os braços contra o corpo.

— Então está bem – Brown inspirou profundamente – a operação toda é confidencial. Então, obviamente, o que direi aqui não deverá ser repassado a mais ninguém. Entenderam?

Assentimos em conjunto. A tensão era evidente entre nós.

— Srta. Brown… - Scorpius se proferiu – a senhora é sobrinha de Lilá Brown?

— Sim – Aloy pareceu surpresa – conheceu minha tia?

— Mais ou menos – ele fez uma careta – papai me falou sobre ela uma vez. Disse que a irmã dela foi internada no Sá. Mungus devido á um surto psicótico.

— Calma lá – Hugo os interrompeu – Lilá Brown? A ex-namorada do papai?

— Querem calar a boca e deixar Aloy falar? - ralhou Alvo, fazendo com que os dois se aquietassem – pode continuar, Srta. Brown.

— Certo – ela continuou – eles estão auxiliando numa operação massiva de espionagem, interceptação e captura de um grupo disperso de Comensais da Morte no interior do país. Embora hajam poucos, há suspeitas de que estejam se comunicando ativamente. E há um boato de que tentariam se reunir efetivamente dentro de alguns meses. Naturalmente, como os principais chefes dos departamentos aurores, seus pais se responsabilizaram pelo andamento das investigações. Por isso tem estado tão ausentes durante as férias de vocês.

Então era isso. Mamãe, papai e tio Harry estavam gerindo a operação de perseguição aos Comensais da Morte.

Então não era surpresa que tivessem evitado comentar sobre aquilo. Uma palavra sobre aquilo com os ouvintes errados, e o caos se instalaria.

— Entendi – Tiago piscou – mas ainda assim… não podiam ter ao menos comentado sobre o motivo das reuniões?

— Provavelmente não quiseram preocupar vocês – sugeriu Aloy.

— Bem… não deu muito certo, não é? - Hugo desdenhou – só deixaram todo mundo ainda mais assustado. Eles nunca esconderam nenhum motivo de patrulha ou operação da gente!

Brown não se alterou.

— Eles apenas pediram que eu transmitisse a mensagem – concluiu, taxativa – quanto aos dados que já temos da operação… sei tanto quanto vocês - Aloy ergueu-se, levantando-se da cadeira e afastando-se da mesa – espero ter esclarecido um pouco do que está acontecendo.

— Eu não diria isso – funguei, desanimada.

Antes que tomasse seu rumo para fora da cozinha, Aloy volteou a olhar em minha direção.

— Uma última coisa, Rose… - disse em tom misterioso, fitando-me profundamente – se eu fosse a senhorita, me asseguraria de saber a hora de usar aquela chave.

E enfim, após me deixar com uma pulga atrás da orelha, Aloy Brown saiu da cozinha, desaparecendo de vista.




— Ah, é. Ajudou muito. Muito mesmo.

Me encolhi, desviando da almofada que Alvo disparou contra a cama de Tiago.

— Tem gente querendo dormir aqui! - bronqueou, irritado.

— Pode dormir quando morrer – Tiago se ergueu, apoiando o cotovelo no colchão – mas e então, Rosie? O que você e Scorpius estavam cochichando durante o jantar?

— Nada que te interesse, Tiago – foi minha vez de ralhar.

Infelizmente, Tiago interpretou meu silêncio de outra forma.

— O que foi? - troçou – acha ruim eu saber o que os namoradinhos estavam falando?

Um som abafado veio do canto do antigo quarto de papai. Pude jurar que Scorpius havia acabado de cair de cara no chão de madeira.

— Ele não é meu namorado – rosnei baixinho, ouvindo o pobre garoto se levantar, esgueirando-se de volta para seu colchão.

— Ah, tá – Tiago disse, zombeteiro – e eu sou a rainha da Inglaterra.

— Tiago! - Alvo voltou a bufar.

— Está bem, está bem – rendeu-se meu primo, finalmente se calando e voltando a deitar em sua cama provisória.

Em poucos minutos, o quarto finalmente ficou em silêncio, com todos os meninos adormecidos em suas camas.

Fiquei um longo tempo encarando o teto, admirando as estrelas brilhantes que piscavam magicamente acima de mim.

Aos poucos, o torpor da noite finalmente tomou conta de meu corpo, fazendo-o relaxar. Mesmo com tantos pensamentos rondando minha cabeça, por fim entreguei-me ao sono, mergulhando para um lugar onde aquelas ansiedades jamais poderiam me atingir.

Ou foi assim que pensei.



























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