HELENA LACERDA

Observei a fina camada de chuva que pintava as janelas naquele pequeno espaço que eu me encontrava. As gotas caíam lentamente, arrastando-se pelo visto até que sumissem no fim. Pensei que seria ótimo ser uma pequena gota de água; Sumir não seria tão complicado.

 Levei meu olhar até o rádio que tinha uma transmissão ruim no meio de uma boa música, sendo o motivo para que desligassem o aparelho. Não gostava de silêncio e de como aquilo tornava minha mente bagunçada.

— 5 minutos.

Ouvi a voz de Georgia dizer ao telefone. Não sabia com quem ou porquê, mas entendi que havia relação com o nosso destino: Algum lugar ao norte da cidade, longe de casa e longe de tudo que eu conhecia. Me perguntei se teria cavalos ou flores do campo. Se haveria algo minimalista com que eu pudesse passar o tempo.

 Eu reconhecia qual seria meu fim. Reconhecia que terminaria muito diferente do que um dia fui. A visão que passei agora não era a mesma que enxergavam; Apenas um saco de pele e órgãos cancerígenos. Alguém que hoje não transbordava sorrisos ou olhos brilhantes.

— Arthur se tornou o primeiro nas olimpíadas de Matemática no sétimo ano. - Falei baixo, apenas para que eu escutasse. - No oitavo ano, ganhou o campeonato de Xadrez. No nono, voltou a ganhar as olimpíadas de Matemática. No segundo do colegial, Arthur Vilasboas era o principal concorrente de Havard da escola.

Engoli a pouca saliva que me restava, o rosto gelado e agora úmido pelo vidro do carro.

— No terceiro ano, se tornou pai de uma menina.

 Eu sorri. Sorri pela primeira vez em dias. Talvez em meses. Não sabia ao certo se estava contente ou apenas feliz por me lembrar. Não sabia se doía lascivo ou mortal.

— Lena... Sua avó cuidará de você. Ela será boa para nós.

 Ouvi da mulher no banco do carona. Mãe. Ouvi da minha mãe.

 - Ficará apenas algumas semanas, queridas. Até que se recupere.

 Aquilo quase me fez rir, porém me mantive quieta. Eu nunca me recuperaria.

 - Au revoir, Cherie.

 Brinquei com as palavras, soltando uma risada desajeitada. Eu não queria chorar alí. Não naquele momento.

 Faria isso quando me deitasse a noite.