— Hey, você está bem?... - uma voz que começava longe e baixa, ecoava em sua cabeça - Por favor fala alguma coisa, acorda, por favor... - a voz estava mais alta e leves chacoalhões faziam a garota voltar a si.

Lydia estava sentada no chão, nos braços de Beetlejuice, que a abraçava e a chacoalhava de leve. Seus olhos se abriam lentamente.

— Beej...? - ela esfregou os olhos com as costas da mão para desembaçar sua visão.

— Ainda bem, achei que a queda tivesse te afetado. - disse, segurando ela em seu abraço e levantando com ela.

— Queda? Mas que queda? - com a visão desembaçada ela olhava para a expressão de alivio do fantasma.

— Não lembra de nada? - Ele perguntou, soltando ela de seu abraço e ajeitando seu terno listrado.

Antes que pudesse responder, ela focou sua visão no ambiente. Eles estavam em um beco escuro, iluminado apenas por um lampião. Havia alguns cartazes de procurados, com fotos de homens e mulheres, a maioria usava chapéus longos. Ela se aproximou de um desses cartaz sem falar nada, e leu em voz baixa.

— Pirata procurado, vivo ou morto. - ela fez uma pausa e seus olhos arregalaram. - PIRATA?! - ela se virou para Beetlejuice que apenas a observava.

— Então, não foi um sonho, estamos MESMO dentro do filme?!

Em silêncio, ele apenas balançou a cabeça em confirmação.

— Essa não! - ela colocou a mão em seu rosto, tentando pensar em algo enquanto andava em circulos. - Espera! - ela olhou para o amigo e rapidamente o puxou pelo colarinho da camisa magenta. - Seu Juice, seu juice pode nos tirar daqui!

— É uma possibilidade. - disse o poltergeist um pouco cabisbaixo, arregaçando as mangas. - Pronta? - estendendo a mão pra ela, com um sorriso triste e inseguro.

— Sempre! - ela sorriu um pouco nervosa e segurou em sua mão. Ele não costumava ser cabisbaixo, havia algo estranho e ela podia sentir em seu tom de voz.

Ele estalou os dedos, Lydia fechou os olhos e os dois esperaram... Com um sorriso ela abriu os olhos, mas nada havia acontecido. Em desespero seus olhos procuraram os dele, que estavam encarando o chão.

— Não me diga que... - ela mordeu os lábios, segurando mais forte sua mão.

— Aparentemente, estou sem juice. - ele suspirou, olhando para ela de canto de olho. - Eu tentei tirar a gente daqui assim que caimos nesse beco... Mas nada aconteceu...

— Ah não... - ela suspirou, olhando pros lados rapidamente, procurando alguma resposta ou talvez alguma ideia.
Alguns minutos de silêncio entre eles, até que Beetlejuice ergueu sua cabeça e estava com um sorriso.

— Hey, não tentamos com você me chamando três vezes. Se isso funciona no mundo dos vivos, talvez podemos ir pra Neitherworld assim. - ele disse, encarando ela como se essa fosse a última e mais forte esperança que eles tivessem nessa situação.

— É verdade, talvez eu consiga ativar seu juice com o seu nome! - ela sorriu, ainda segurando a mão dele. Ela sugou o ar enchendo bem os pulmões e começou - Embora saiba que deveria ter cautela, ainda me atrevo em lugares assustadores. Assombração fantasmagórica eu te liberto, Beetlejuice, Beetlejuice, BEETLEJUICE! - mais uma vez ela fechou os olhos esperando pelo melhor, mas quando abriu, nada.

— Não deu certo, estamos presos aqui, por minha culpa! - ele soltou a mão dela, começando a ficar estressado - eu e minha boca grande! - disse chutando uma garrafa que estava no chão.

Era noite e tudo estava silêncioso. Ao chutar a garrafa o barulho ecoou pelo beco, três vezes mais do que o normal.

Passos podiam ser ouvidos em direção ao beco, como se estivessem correndo.

— Rápido, e fique quieto! - ela puxou o fantasma pela mão, em direção a uma pequena e escura fresta entre duas construções no beco. Era pequena o bastante para caber a jovem, e o amigo que encolhia a barriga para passar de lado.

— Você escutou isso? - disse uma voz masculina entrando no beco. Pelos passos, haviam apenas duas pessoas.

— Sim, mas deve ter sido algum gato. - disse a outra voz masculina um pouco mais distante.

O dono da primeira voz passou ao lado da fresta em que Lydia e Beetlejuice se escondiam. Ambos puderam ver que o rapaz usava vestimentas elegantes para época, ele carregava uma arma em seus braços andando até o fundo do beco.

— Pare de ser tão encucado, vamos embora, Comodoro. - disse a voz mais distante. Em questão de segundos o Comodoro, voltou e lentamente foi andando para fora do beco.

— Ainda sim, acho que não foi um gato. - confessou.

— Eu aposto que foi um gato, ou algum cachorro, sabe como são, ficam revirando tudo o que encontram. - as vozes foram sumindo, juntamente com os passos.

Beetlejuice colocou a cabeça para fora da fresta para ter certeza, e ambos os homens já sairam. O beco se encontrava vazio novamente. Com dificuldade ele saiu da fresta, ajudando Lydia logo em seguida.

— Que situação. - disse quase que em cochicho o poltergeist.

— Hey, calma, vamos sair dessa... - disse ajeitando o terno do Beetlejuice - Precisamos de respostas e ajuda. Mas primeiro, temos que nos adequar a época... Nossas roupas são 'modernas' demais para essa época. Além de estarem super sujas graças ao nosso esconderijo. - disse puxando seu vestido que agora haviam manchas por ele. - Não quero nem descobrir o que é isso... - encarava uma mancha na borda do seu vestido, a mancha brilhava e parecia gosmenta.

— Eu prefiro assim. - ele disse sorrindo e olhando seu terno todo manchado. Lydia nada disse, apenas encarava as roupas de ambos com nojo. - Mas então como vamos arranjar outra roupa?

— Podemos comprar. - ela disse procurando aos lados do seu corpo a sua bolsa - Ah, ótimo, ficou no nosso mundo.

— Boa ideia, mesmo que eu ou você tivessemos dinheiro, o que não temos. - disse puxando os bolsos da calça e deixando eles para fora - Acredito que nessa época a nossa moeda nem existia, muito menos cartões de crédito, gata.

— Tem razão, que ideia boba. - colocou a mão na testa, tentando pensar em outra alternativa.

— Podemos saquear um banco, ou alguma loja, como verdadeiros Piratas, o que acha? Aproveitando que estamos no clima. - ele sorriu, esfregando uma mão na outra.

— Não, não quero fazer algo tão grande como... - ela ficou quieta por ouvir vozes, diferente das outras duas. Eles caminharam até o fim do beco que dava na rua e espionaram.

Dois homens, um velho e um rapaz novo estavam saindo de uma loja. Provavelmente pai e filho.

— Acho que sua ideia de saquear não é tão ruim afinal, Beej... - ela disse, sorrindo pela situação. - Eu vou me arrepender, mas melhor que nada.

— É hora do show, Babes! - respondeu com um sorriso sapeca.

Ambos pegaram uma garrafa cada um e foram em direção aos dois homens.

Eles estavam trancando a loja, quando Lydia e Beetlejuice quebraram as garrafas na cabeça de cada um, fazendo ambos desmaiarem e os segurando para não cairem no chão.

— Esse velhote é pesado, hein? - disse o fantasma enquanto Lydia abria a porta da loja novamente. Prosseguiram arrastando os homens para dentro da loja.

— Ele é do seu tamanho, beej, não é atoa que é pesado. - ela riu soltando o rapaz delicadamente no chão.

— Hey, você também, é tão magra quanto esse mané. - soltou o senhor no chão, próximo ao jovem, provavelmente eram pai e filho.

— Você... Acabou de me dar uma ideia. - sorriu encarando ele e os dois caidos no chão.

Algum tempo depois, pai e filho ainda estavam desacordados no chão, mas dessa vez, apenas com as suas roupas intimas.
Beetlejuice se olhava no espelho, ajeitando o sobretudo em seu corpo.

— Nada mal, e essas botas até que são confortáveis. - pisou no chão, testando as botas e pegando um dos chapéus da loja. Ele estava com um sobretudo com listras pretas e cinzas, uma camisa branca, calças cinzas e botas pretas.

Aparentemente a loja vendia chapéus e cintos com coldres para armas e espadas.

— O que acha? Achei essa blusa e espartilho ali nos fundos. - a voz de Lydia ecoou na loja.

— Está ótima, Lyds. - disse ainda se arrumando no espelho.

— Ah qual é, você nem olhou. - ela resmungou, cruzando os braços.

— Claro que olhei, e você está... - ele travou quase que boquiaberto quando esticou o pescoço para olhar a jovem.

Ela estava com um sobretudo preto sem mangas, sua blusa era decotada, com mangas levemente bufantes na cor vermelho vinho e um espartilho underbust preto. A sua calça era cinza escuro e suas botas eram pretas. Ela tinha colocado no topo da cabeça um pano vermelho e estava usando luvas rasgada nos dedos na cor preta.

Ela sorriu, rindo e caminhando até ele. Colocou o dedo no queixo dele, fechando sua boca.

— Obrigada. Levarei isso como um elogio. - passou por ele, pegando um chapéu grande e redondo, também na cor preta e colocando na cabeça. - Pronto, agora vamos procurar ajuda.

Eles sairam da loja sem demora, com a antiga roupa deles embaixo dos sobretudos. Foram até o porto, que não foi tão dificil de achar, afinal saindo da loja, eles já conseguiam ver o porto no horizonte. Precisaram apenas seguir a rua.

Andando na rua, Beetlejuice não pode ignorar, um olhar apreensivo de Lydia. Ela estava inquieta e tensa, dando passos longos e rápidos.

— Vai ficar tudo bem. - ele disse baixo.

Os olhos de Lydia correram em direção a ele, com um olhar surpreso. Ela não estava esperando por isso.

— Você vai ver, vai ficar tudo bem. É só mais uma aventura que vamos enfrentar juntos. - ele sorriu pra ela. Queria deixa-la o mais confortavel possível. - Já passamos por situações piores, lembra em Brinkadoom? Também estava sem meu juice, e saímos de lá. Aqui não vai ser diferente. - ele sorriu.

— Você sempre sabe o que dizer pra me deixar menos tensa, BJ. - ela sorriu de volta e foi desacelerando o passo, andando mais próxima a ele.

— Amigos são pra isso, não? Além do mais, nós somos...

— Um time. - ambos disseram juntos, e riram.

— Sim, somos um time, obrigada por me fazer rir mesmo nas piores situações. - ela abraçou ele de leve se aconchegando em seus braços.

Por alguns segundos ele não sabia o que fazer, então, quase que em piloto automático, ele a abraçou de volta, com um sorriso extremamente bobo. Um sorriso, que durante muitos anos ele sempre escondeu dela, e sempre sorria quando ela não via.

Apesar de ser um cara morto, ela sempre mexia com ele de um jeito diferente. Ele sempre prezava pela sua reputação de cara frio, que não liga pra ninguém e que atormenta os outros, mas com ela, era diferente. Quando estava com ela, nada mais daquilo importava pra ele. Mesmo assim escondia, por medo da reação dela, por medo de perder sua amizade. Difícil admitir, mas ele tinha medo.

Ele percebeu que já estavam nesse abraço por alguns minutos e rapidamente ele deu alguns tapinhas nas costas dela, quebrando o clima e pigarreando para consertar a voz.

— Então, alguma ideia de como começar a procurar respostas? - Beetlejuice disse.

Ela ergueu a sobrancelha pela reação inusitada dele, mas o respondeu calmamente.

— Precisamos procurar algum lugar que possamos saber sobre magia. - disse, passando por algumas embarcações.

— Procurando sobre assuntos místicos? - uma voz grave ecoou na escuridão entre as embarcações.

— Sim, eles estão, estão procurando coisas místicas. - outra voz respondeu. Era uma voz fina e falha. - Conte pra eles, conte, conte pra eles.

— Quem está aí? - Beetlejuice colocou Lydia para trás dele, protegendo-a.

— Meu nome é Frank. - um rapaz jovem saiu dentre as sombras. Seu cabelo era castanho claro e curto, e sua barba era rala. Havia um papagaio em seu ombro, com o bico trincado, e com poucas penas vermelhas e azuis. - E este é Pete.

— Conte pra eles, o que? - Lydia saiu de trás de Beetlejuice curiosa pelo que o papagaio havia dito.

— Sobre Tortuga. - ele sorriu, se curvando diante da jovem e pegando sua mão. Dando um beijo nas costas de sua mão. - É um imenso prazer conhecer tal formosa dama. Qual seria seu nome?

— Oras, er, obrigada. - ela respondeu, desconsertada e rindo. - Meu nome é Lydia, e ele é... Conhecido como BJ. - mesmo que o juice não estivesse funcionando, Lydia estava acostumada em dizer que BJ era o apelido de Beetlejuice, por segurança.

— Belíssimo nome, senhoria Lydia, tão bonito quanto... - Frank disse, com um sorriso no canto dos lábios.

— TÁ, TÁ, Tortuga, onde fica e o que é esse lugar? - Beetlejuice o interrompeu, quase se colocando no meio dos dois.

Frank pigarreou e arrumou suas vestes.

— Fica em uma ilha, não muito longe daqui. - ele colocou a mão dentro do sobretudo tirando um mapa. - É conhecida como o ponto de encontro de piratas. Fica bem aqui. - disse colocando o mapa em cima de um barril e apontando para a localização. - Vocês devem ser novos por aqui, para não conhecerem Tortuga.

— Sim, pode se dizer que sim. - O fantasma disse com a voz ríspida.

— Lá vamos encontrar respostas para os assuntos místicos? - Lydia também estava observando o mapa, colocando o dedo em cima de onde achava que estavam.

— Sim, vai ser lá que vocês vão encontrar o que procuram. - ele foi aproximando sua mão da mão de Lydia para corrigir o local que ela apontava, mas num piscar de olhos a mão que Frank estava segurando era de Beetlejuice que o olhava com tédio.

—Er, vocês estão aqui. - Frank continuou, largando a mão de BJ e apontando direto no mapa.

— Okay, precisamos de um barco. - Lydia disse encarando Beetlejuice.

— Diga a ela, diga! Diga do navio abandonado. - Pete quase gritava desesperado.

— Navio abandonado? - a jovem ergueu a sobrancelha.

— Sim, aqui nesse porto, há um navio que ninguém sabe de quem é. É um milagre ainda ninguém ter pego ele.

O jovem pirata começou a andar e Lydia foi atrás. BJ por sua vez, pegou o mapa com rapidez e escondeu em seu sobretudo.

— Aqui está. - apontou para um navio com madeira escura, ele não era tão grande quanto os outros, mas com certeza era grande o suficiente para apenas dois. - Esse é conhecido como Víbora do Mar. Creio que não ligariam se alguém o pegasse emprestado. Como disse, já faz um tempo que está ancorado aqui no porto...

— Está bom pra nós. Tem certeza que ninguém sairia procurando por ele? - perguntou a jovem, dando a volta no porto para olhar melhor o barco.

— Tenho certeza absoluta. Ele deve ajudar vocês a chegar em Tortuga. Vão levar quase um dia para chegar lá. O barco é grande o suficiente para alguma cama para descansarem. - explicou Frank.
Beetlejuice já puxava a escadaria do navio para que pudessem subir.

— Bem, obrigada pela sua ajuda, Frank, foi um prazer. - ela agradeceu, e ele mais uma vez se curvou beijando sua mão.

— O prazer foi meu. - ele sorriu para ela.

— Vamos. - um Beetlejuice impaciente apareceu ao lado deles. - Temos uma longa viagem pela frente.
Lydia apenas concordou, e o acompanhou. Ele parou na escadaria, para ajuda-la a subir e ficou encarando Frank com os olhos cerrados.

Depois que subiram, puxaram e guardaram a escada.

Não demorou muito até que as velas estivessem abertas, e a ancora devidamente guardada. O navio começava a sair do lugar.

— Arg, eles conseguirão? Conseguirão o que quer? Conseguirão? - disse Pete com sua voz fina e aguda.

— Não sei, amigo, mas iremos descobrir... - Frank tinha um sorriso malicioso em seu rosto.