Draco sabia bem para onde estavam indo, foi o que não o deixou se surpreender quando chegaram a casa de dois andares e Belinda abriu o pequeno portão branco, passando rapidamente para a porta alta de ébano. Tudo estava como Draco recordava de sua infância e quando entrou percebeu que mesmo o interior da casa estava igual, até as fotos, sendo que a primeira que lhe chamou atenção foi uma tirada no aniversário de 7 anos de Belinda, na Califórnia. Os dois correndo e pulando nos braços estendidos de Mary, que ria animadamente enquanto os carregava e beijava a bochecha de Draco e depois de Bell, os girando no ar. Os três estavam em êxtase naquela manhã de piquenique na praia, rindo e se divertindo loucamente, a foto mostrava uma felicidade a qual Draco não conseguia recordar de ter sentido um dia.

 -Você lembra? –Bell questionou, a mão segurando o porta-retratos e o analisando com carinho.

 -Sim. –Ele sorriu e se aproximou da amiga, apoiando o queixo em seu ombro, também olhando a foto com nostalgia e rememorando aquela manhã. –Estávamos tão felizes.

 -É estranho dizer que eu não consigo alcançar toda essa felicidade dentro de mim?

 -Não, na verdade eu me sinto assim também. –Ele foi franco. –Até olhar pra essa foto eu nem lembrava que eu tinha sido assim, Bell.

 -Eu também não. –Ela sussurrou. –Dorian me disse que tenho medo de encarar minhas lembranças felizes, no fim das contas ele tava certo.

                Draco não disse nada, ficaram por longos minutos contemplando a foto em completo silêncio, cada um tentando recordar aquele sentimento de felicidade a qual Mary os presenteou, mas nenhum conseguindo alcançar verdadeiramente.

                Belinda sentiu o peso da cabeça de Malfoy em seu ombro. Ele havia apoiado a testa nela.

 -Você vai se tornar um deles em breve, não é mesmo? –Malfoy ficou em completo silêncio. –Eu soube assim que Dorian me disse sobre a prisão de Lucius e sobre o maldito jantar. Queria não saber, queria ser ingênua o suficiente para não saber. –Ela suspirou e colocou o porta-retratos de volta no lugar. –Mas eu não sou mais ingênua como antes. Contudo o que quero saber é, desde quando você sabe?

                Draco sentiu o corpo tremer, o que o fez fechar as mãos em punho nas laterais do corpo, tentando evitar que Belinda notasse.

 -Eu não tenho escolha. –Ele sussurrou.

 -Não imaginei que tivesse. –Ela fechou os olhos e ficou quieta por um momento.

 -Eu queria ter falado desde o começo, mas...

 -Mas eu não estava falando com você.

 -Não. –Ele falava em sussurros. –Eu descobri antes. –Ele tinha medo de falar, mas precisava. –Só que você não estava bem e eu achei que colocar mais uma desgraça na sua vida seria pior, então esperei, só que... Eu... –Draco não sabia como falar.

 -Está tudo bem. –Ela assegurou. –Desde quando você sabe?

 -Desde a noite em que encontramos o Mark na Mansão Lestrange.

                Belinda sentiu o mundo tremer a baixo de seus pés e se segurou para não permitir que lágrimas fossem derramadas.

 -E quando foi confirmado? –Ela questionou entredentes, tentando manter a calma.

 -No dia seguinte em que você saiu para treinar com Rabastan.

                Belinda notou, pela voz rouca do rapaz, que ele chorava. Bell se virou e passou os braços na cintura do melhor amigo, que devolveu o abraço.

 -Sinto muito. –Ela disse. –Eu deveria ter estado com você. –As lágrimas finalmente ganharam passagem, mesmo contra sua vontade. –Me desculpa.

 -Não é sua culpa. –Ele assegurou.

 -Mas...

 -Shiii. –Acalantou, mesmo ele não estando bem. –Pelo menos você sabe agora.

                Belinda sentiu o ódio por cada Comensal da Morte ser ampliado em mil. A única pessoa que ela gostaria de proteger do mundo, era exatamente quem não poderia. Draco, em breve, ganharia a maldita Marca Negra e toda a dor e sacrifício que vinha com ela.

                Belinda usou um Feitiço para fazer Malfoy adormecer, obviamente contra a sua vontade, contudo ela não o deixaria acordado com tanta culpa nos olhos, até porque ela própria precisava de quietude para absorver tudo o que fora conversado. Tudo sobre a prisão de Lucius, a volta de Voldemort, os detalhes sórdidos do que Draco ouvira entre os Comensais, mas acima de tudo isso, precisa de tempo para assimilar o que sabia que ocorreria com Draco dentro de alguns dias. Em poucos dias ela veria a maldita Marca Negra incorporada a pele pálida do braço do melhor amigo. Entretanto a Marca era o menor problema, o real motivo de dor era saber o que ela significava e traria para a vida dele.

                Lestrange se dirigiu de volta a sala, estava exausta, sentia seu corpo pesar como se estivesse revestido de chumbo, contudo ela sabia que isso se devia somente a todos os problemas que vinha enfrentando desde a chegada de Bellatrix Lestrange em sua vida. E apesar de todos os pensamentos enevoados, logo a manhã chegou radiante, o sol entrava pela pequena fresta que a cortina havia deixado na janela de vidro e inundava a sala. Mas a manhã trouxe mais que um esplendoroso dia de sol, com ela veio Rabastan, que assim que olhou para Belinda soube que ela não havia dormido nada, ainda usava a roupa da noite anterior e se mantinha sentada no sofá da sala, olhando para a parede.

 -Draco está dormindo. –Ela esclareceu, sem nem mesmo lhe dar tempo de questionar.

 -Ele contou? –Rabastan quis saber, sentando ao lado da menina.

                Belinda se manteve encarando o vazio a frente, eram tantas coisas a organizar em sua mente que não conseguia nem mesmo sentir vontade de se virar para olhar Rabastan. Ela entrelaçou uma mão na outra e assentiu uma vez.

 -Sim, nós conversamos noite passada.

                Rabastan viu que ela parecia distante e desanimada, contudo praticamente conseguia ouvir as engrenagens de sua mente perspicaz girando e maquinando sobre tudo o que vinha acontecendo.

 -Você sabe que ele, assim como você, não tem alternativa na vida, não é?

 -Eu tenho uma ainda. –Ela disse sem vontade e mal se mexendo.

 -Que seria? –Belinda sentia os olhos de Rabastan analisando-a atentamente, mas não se importou.

 -Nada que você precise se preocupar. Principalmente, nada antes de matar Bellatrix.

                A voz saiu vazia, mas Rabastan soube que não era blefe ou brincadeira e isso, por mais inesperado que fosse, o preocupou.

 -Você não é jovem demais para pensar em suicídio?

 -Quem falou sobre suicídio? –Ela parecia apática, contudo ele sabia que não era esse o sentimento que predominava. –Entretanto milhares de jovens cometem suicídio, infelizmente, mas devo admitir que sou jovem, essencialmente, para o homicídio, não acha? –Contra-atacou.

 -Ferinha...

 -Eu estou bem por hora. –Assegurou e finalmente o olhou. Os olhos negros traziam uma névoa que ele ainda não havia visto ali, era mais densa e fria do que ele poderia prever. –Leve Draco para casa, eu tenho outras coisas a fazer.

                Rabastan a viu se erguer de modo imponente. Ela parecia bem mais velha do que era.

 -Lembre-se que é jovem e precisa se divertir, Ferinha.

                Belinda sorriu minimamente de canto, sem um único traço de divertimento, e pegou o sobretudo, jogando-o por sob os ombros.

 -Talvez, Rabastan.

                Belinda começou a se dirigir a porta.

 -Não irá se despedir do Draco?

 -Hoje não.

                Rabastan a viu sair pela porta sem olhar pra trás, assim como viu uma nuvem obscura seguir seus passos. Belinda havia deixado de ser uma adolescente a muito tempo, ele sabia que parte disso se devia a presença dele, do irmão e principalmente de Bella, contudo havia mais. Belinda, quando a conheceu, ainda tinha vivacidade queimando em seus olhos, contudo naquele dia não havia nada e Rabastan só sabia de uma coisa, uma coisa alarmante e perigosa. Belinda Lestrange quebrara de vez e ele não imaginava haver concerto.