Após Tempestades e Guerra, É Hora de Voltar Para C escrita por Bella P


Capítulo 3
Capítulo 3




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Recolha-me no deserto, dê-me água, me guie pelas montanhas,

Espere até que o sol brilhe sobre nós, enquanto atravessamos morros assombrados.

(Journey – Natasha Blume)

 

 

AGORA

 

— Srta. Grey, é isto mesmo o que ouço? Creio que a senhorita já está abusando da boa vontade deste conselho. – Egito resmungou e Prisma permaneceu com o sorriso amigável no rosto. – Há dois meses a senhorita solicitou que a ONU perdoasse os Vingadores e a sua solicitação foi concedida. Agora pede anistia a um assassino conhecido?

— Caro representante, como o meu pai sempre diz: “não culpe a arma, a arma em si nada faz, culpe quem a manuseia, este sim é perigoso.”

— James Buchanan Barnes, popularmente conhecido como Soldado Invernal, teve as acusações sobre o bombardeio de Viena, que resultou na morte do rei T'Chaka, retiradas. Mas no “currículo” dele constam setenta anos de mortes e crimes contra a humanidade. – a representante da Suíça falou e o sorriso de Prisma permaneceu intacto, embora o seu coração batesse de forma acelerada em seu peito.

— Tenho ciência disto, senhora.

— Querer que o anistiemos é suicídio. Haverá um enorme descrédito sobre a ONU por parte das nações que não a integram e da população que ainda está avessa conosco por termos perdoado os Vingadores. Agora a senhorita vem a nós com mais este pedido. Me faz entender que os esforços do último ano foram em vão, o que é extremamente curioso, já que a senhorita participou ativamente de todas as melhorias e discussões sobre o Tratado.

— Também tenho ciência disto, mas o que peço não é anistia imediata. Peço que ao menos a ONU permita que o rei T'Challa de Wakanda, que caridosamente ofereceu-se para carregar este fardo sob o risco de grandes represálias, conceda asilo político ao Sargento Barnes para que o mesmo receba a ajuda necessária para desfazer qualquer dano que a HIDRA tenha causado a ele.

— E depois a senhorita quer que a ONU lhe dê anistia. – Suíça insistiu em um tom de desagrado.

— Repito, senhora representante, a anistia não é imediata. O Sargento Barnes precisará de um grande trabalho não apenas para ajudá-lo com o seu emocional, como também ajudar em sua imagem, fazer o público disassociá-lo do Soldado Invernal para quando o nome dele for mencionado, ser lembrado apenas o homem que deu a vida pelo seu país durante a Segunda Grande Guerra.

— E como a senhorita pretende fazer isto? – Brasil perguntou.

— Senhores, o material que irei lhes apresentar agora é o mesmo material, em uma versão editada, que a nova Assessoria de Imprensa dos Vingadores irá usar para melhorar a imagem do Sargento Barnes. Aviso que é um conteúdo nada agradável, com cenas explícitas de tortura, mas acredito que a única forma de mostrar aos senhores que o Sargento Barnes deve ser considerado um prisioneiro de guerra, que sofreu grandes torturas e traumas, ao invés do assassino cruel que todos o imaginam ser. – todos os representantes possuíam expressões de completo horror e estavam pálidos antes mesmo dela começar a rodar os vídeos. – Posso começar? – perguntou, enquanto apontava o controle para a televisão. Em uníssono, eles assentiram com a cabeça e Prisma deu play nas próximas horas que iriam mostrar o show de horrores e o nível de crueldade que era a HIDRA.

 

ANTES

 

— Você? Me pedindo favores? O que eu te ensinei sobre isto? – Prisma ignorou a cutucada em favor de bebericar o seu chocolate quente. Havia escolhido um banco isolado, praticamente no interior do Central Park, justamente por causa disto. Os filhos de Ares eram imunes a raiva que o pai deles naturalmente incitava nos mortais ou outros semideuses, mas isto não significava que a presença do deus não os irritava.

— Nada. Porque é isto que você faz: não nos ensina nada. – Prisma cutucou de volta. Não tinha medo de Ares, essa coisa de temer deuses era tão ridícula e ultrapassada que chegava a ser cômica. Porque os deuses precisavam deles, sempre precisariam, por isso que continuavam a procriar feito coelhos com mortais. E era isto que ela usaria em sua vantagem.

Ares sorriu aquele sorriso cheio de dentes, um sorriso maldoso e que por alguma razão a sua mãe sempre considerou charmoso. Prisma até hoje tentava entender o que Joana viu no deus. Joana era um gênio, como Tony, entrou no MIT aos dezesseis anos, graduou-se aos dezenove, permaneceu no instituto para fazer a sua pós-graduação, e foi neste período que ela conheceu Ares.

Joana não vinha de uma família de militares, não tinha um passado nas forças armadas, ou qualquer relação que fosse com combate ou guerra, porque essas sempre eram as mulheres mortais que Ares procurava para emprenhar. Joana era apenas uma garota bonita e inteligente do interior do Texas, que cresceu em um lar normal, como muito poucos neste mundo, e que foi cedo para a faculdade. Mas alguma coisa nela chamou a atenção do Deus da Guerra e desta breve e estranha relação nasceu Prisma.

Prisma, em um primeiro momento, não parecia uma filha de Ares.

Ela não tinha a mesma brutalidade que as suas irmãs, não era alta, troculenta e de expressão sempre amarrada. Prisma tinha uma beleza que era uma mistura de guerreira Amazona com uma ninfa. Corpo de curvas suaves, rosto de traços delicados, longos e sedosos cabelos castanhos ondulados, cílios negros grandes emoldurando belos olhos castanhos, pele clara, mãos pequenas e delicadas. Prisma parecia uma boneca perto de seus irmãos e por anos ela sofreu por isto. No começo ela não quis aceitar que tinha qualquer relação sanguínea com aqueles animais. Os filhos de Ares eram combatentes habilidosos, eram guerreiros extraordinários, grandes estrategistas, mas preferiam ceder a ferocidade e a brutalidade de uma batalha do que agirem de forma mais sensata. Não gostavam de pensar primeiro e atacar depois.

Foi neste momento que Prisma percebeu que era igual e diferente de seus irmãos.

Uma batalha não era vencida somente no braço, era preciso analisar o inimigo, por todos os lados, descobrir cada ponto fraco e forte dele e impedir que ele conhecesse os seus. Os ataques, se precisos e bem calculados, não necessitariam nem de muita força. A investida surpresa sempre seriam a melhor técnica de combate e o fato dela ser menor que seus irmãos foi uma vantagem que ela descobriu cedo. Ela era forte e ágil e isto a tornava tão ou mais perigosa que os outros filhos de Ares que, depois que Prisma finalmente aprendeu a se defender, levaram todas as surras merecidas como revanche das surras que deram nela.

Por isso que, quando foi embora do Acampamento, eles acharam que como Clarisse, Prisma seguiria a carreira militar. Ir para Havard não era bem o que estava nas apostas de todos. Mas Direito era uma forma de combate. Conhecer o seu oponente, conhecer todos os pontos fracos e fortes dele, investir em ataques silenciosos, ataques surpresas, estraçalhar o adversário usando todas as armas legais possíveis, era uma forma prazerosa de combate. Mais do que cair no braço com alguém.

— Você é petulante como a sua mãe. – isto pegou Prisma de surpresa. Nas poucas vezes em que esteve na presença de Ares, este jamais falava de sua mãe. Os outros semideuses tinham a errônea ideia de que os deuses não tinham consideração pelos seus amantes mortais, mas depois de muito avaliar, por todos os ângulos, como foi ensinada a fazer na faculdade, ela percebeu que não era bem este o caso.

Os deuses eram imortais, estavam aqui desde o início dos tempos e aqui permaneceriam até o fim dos tempos. Para eles, o tempo em si não era nada. Um dia era um segundo, um ano era um dia. Eles viram sociedades nascerem, crescerem e morrerem, assim como filhos, e eles lembravam de tudo. De cada momento de evolução da humanidade, de cada filho e cada amante. Lembravam com dor, com nostalgia, com carinho, porque tinha que ter algum nível de gostar no meio disto tudo. Prisma tinha a certeza disto pois, pelo que conheceu de sua mãe, poderia dizer com certeza que Joana não se relacionaria com Ares apenas por se relacionar, não falaria sobre ele com aquele tom de nostalgia e saudades de um tempo bom sobre um sujeito que era a personificação da Guerra. Embora para Prisma era completamente bizarro imaginar Ares em qualquer outro lugar que não em um campo de batalha. Ela não conseguia ver o deus andando sob a luz das estrelas, de mãos dadas com alguém, de pés descalços na areia, ouvindo o bater das ondas do mar. Isso era medonho. Poseidon até que se encaixava neste cenário. Ares, não.

— Soube que é a minha melhor qualidade. – Prisma respondeu com divertimento, bebericando mais um pouco de seu chocolate quente.

— Eu sei porque me chamou aqui, e já digo não antes de você começar a falar.

— Uh-hum. – Prisma soltou entre um gole e outro, olhando com desinteresse o balançar das folhas das árvores metros a frente deles.

— Não posso, Prisma! É contra as regras!

— Eu já entendi. – repetiu calmamente.

— Se já entendeu, então vou-me embora.

— Ok. – ela colocou o copo quase vazio sobre o banco, ao lado de sua perna, e puxou a bolsa para o seu colo.

— Estou indo embora.

— Avisa antes para eu poder fechar os olhos.

— Estou falando sério.

— Eu sei. – silêncio, com Prisma remexendo em seu celular e, então, um longo e sofrido suspiro.

— Odeio quando você faz isto. – Ares disse derrotado e Prisma riu.

Os outros semideuses não sabiam, apenas os filhos do deus em si sabiam, mas Ares era um coração mole. Não, sério! Ninguém nunca percebeu que, dentre todos os semideuses do Acampamento Meio-Sangue, os do Chalé 5 eram os únicos que possuíam poucas queixas sobre o pai divino? Ares não era uma constante na vida de nenhum deles, mas quando era, sabia ser um pai chato. Daquele que fica palpitando na vida dos filhos, dando ordens, impondo regras e, se bobear, até colocar de castigo.

— O que você quer de mim?

— Você sabe o que eu quero.

— Os arquivos da HIDRA sobre o projeto Soldado Invernal. Por que acha que a HIDRA terá alguma coisa?

— Porque todo cientista é arrogante. Conseguir reproduzir o soro que criou o Capitão América, ou construir um braço mecânico que está conectado diretamente no sistema nervoso do hospedeiro, ou criar um sistema eficiente de lavagem cerebral sem danificar o cérebro em si, acha mesmo que Zola e seus sucessores não iriam querer documentar isto? E guardar a sete chaves? Faça-me o favor.

— Pensei que aquela ruiva, a assassina russa, já tinha vazado tudo o que há para se saber da HIDRA. – o tom de voz que Ares usava para se referir a Viúva Negra não era muito agradável. Não para Prisma. Era o tom de um homem considerando a próxima conquista. Pavoroso.

— Natasha Romanoff. Você sabe quem ela é, pare de se fazer de idiota. – Ares riu inocente, ou ao menos tentou. Nada do que o homem fazia era inocente.

— Você sabe que se eu fizer isto você vai estar me devendo. – Prisma riu.

— Não, você vai estar me pagando apenas um dos milhares de favores que me deve. – Ares franziu as sobrancelhas em desagrado.

— Eu não devo... – Prisma virou sobre o banco para encará-lo, o interrompendo bruscamente.

— Devo lembrá-lo que cada missão que um semideus é enviado é, em 100% dos casos, para consertar alguma cagada que um deus fez? Então pelas minhas contas vocês estão nos devendo, e muito. Só que os meus irmãos e os outros semideuses são bundões demais para cobrar. Eu não tenho esse problema e muito menos paciência para lidar com as suas atitudes de maiorais. Não gostou? Arremessem um raio na minha cabeça, eu não estou nem aí.

— Podemos não arremessar um raio na sua cabeça, mas você sabe muito bem que não precisamos atingi-la diretamente para feri-la. – Ares provocou com um sorriso sacana, que Prisma imitou.

— Para chegarem a Tony Stark terão que passar por Atena e Hefesto. Soube que Stark é o orgulho dos dois. E Rhodes? Me engana que eu gosto. Você adora o Rhodes. Ele é militar, ele é um coronel, ele é da sua turma. E então? – Ares gargalhou. Era por isso que Prisma era uma de suas favoritas, ela sabia onde alfinetar.

— Me dê algumas horas.

— Horas? Um estalar de dedos não resolve?

— Você está me dando muito crédito.

— Você é um deus! Você vive para ter todos esses créditos! – Ares riu de novo.

— Me dê algumas horas e eu te retorno a ligação. – e desapareceu tão rápido que Prisma quase não teve tempo de desviar o rosto.

— Odeio quando ele faz isto. – resmungou, recolhendo as suas coisas e retornando para a Torre.

 

AGORA

 

Voltar as instalações dos Vingadores não foi exatamente como Steve imaginou que seria. Não havia Fury ditando ordens, ou cientistas e outros funcionários percorrendo os corredores, monitorando as atividades ao redor do mundo. Não havia risadas a noite, na sala de estar, onde todos se reuniam para ver um bom filme, com pipocas afundadas na manteiga e refrigerante. Não havia o som de grunhidos e gemidos característicos de corpos lutando, treinando, preparando-se para o próximo combate.

Quando retornaram para a instalação o que eles encontraram foi a expressão azeda do coronel Rhodes, que assim que os viu disse que se precisassem dele que o procurasse na Torre Stark, e foi embora. Visão não o seguiu, mas Steve percebia que o andróide mantinha uma relativa distância deles, principalmente de Wanda, que estava desolada por causa disto. Clint retornou para a fazenda apenas para voltar uma semana depois e trancar-se em seu quarto por três dias. Quando finalmente saiu de lá, disse que Laura e ele não eram mais um casal e que ele voltou para casa apenas para ver as suas coisas atulhadas no celeiro e papéis do divórcio esperando para serem assinados.

Uma semana após o retorno deles os Vingadores conheceram a sua nova Assessoria de Imprensa, assim como a sua nova, ou não tão nova assim, terapeuta. Dra. Annalise Queen deu apenas uma única olhada para aquele grupo miserável, sacudiu a cabeça em negativa e soltou:

— Teremos um longo trabalho pela frente.

A presença de Prisma Grey nas instalações era uma constante. Como advogada e agora que eles estavam de volta aos EUA, ela vinha dia sim e dia não para, junto com a Assessoria de Imprensa, explicar tudo de novo e diferente que aconteceu neste último ano em que eles estiveram foragidos.

— Vocês não vão, nem sonhando, mencionar Wakanda. Para o público vocês estiveram correndo o mundo, mantendo-se fora do radar das autoridades. Wakanda não pode sair da boca de vocês. – ela enfatizou com um olhar severo, durante o briefing para um talk show que eles iriam participar naquela noite, o que irritou Steve. Ele sabia que mencionar Wakanda seria um tiro no pé, seria cuspir na boa vontade do rei T'Challa, além de desacreditá-lo se o público soubesse que por todo este tempo o país esteve abrigando foragidos da justiça altamente perigosos.

Um mês depois que eles retornaram as instalações, Natasha deu as caras. Ela simplesmente apareceu na sala de estar, com a sua bolsa de viagem a tira colo, deu a todos um olhar julgador e foi esconder-se em seu quarto pelas próximas horas. Assim que saiu, bem na hora do jantar, ela nada disse, não deu explicações, não disse onde esteve, o que aconteceu, e porque ela não esteve ao lado de Stark, de Grey, os ajudando com o novo Tratado, já que ela também o apoiava.

Mas pior do que todas as coletivas de imprensa, todas as visitas a programas de TV, rádio, entrevistas para jornais, ter o retorno deles avaliado e reavaliado pela mídia, pelo público, ver o saldo positivo e negativo que a Guerra Civil causou, pior do que tudo isto, era não saber de Tony.

Tony Stark não deu as caras em nenhum momento desde o retorno dos Vingadores.

Pior ainda foi saber que a carta que Steve mandou, o telefone, estavam acumulando poeira dentro de uma gaveta da mesa do escritório que foi usado para discutir assuntos mais particulares entre Fury e Steve.

— Onde está Tony? – Steve perguntou naquela manhã assim que Prisma encerrou a reunião e ambos foram os últimos a ficarem na sala.

Prisma havia os chamado para informar que a ONU acatou o pedido dela de autorizar o asilo político de Barnes por Wakanda e considerar a anistia do mesmo após avaliar a resposta do público diante do projeto de “melhoria de imagem” que a assessoria de imprensa deles estava montando.

— Mas Barnes já está em Wakanda. – Scott comentou e Prisma rolou os olhos. Uma coisa que Steve notou foi que a advogada não gostava deles. Ela tolerava Scott e nutria um certo respeito por Sam, mas as expressões de desagrado que ela adquiria ao ver Wanda e Clint eram perceptíveis. Mas o pior era que Prisma não apenas não gostava de Steve, ela o detestava. Ele podia ver nos olhos escuros dela, cada vez que ele abria a boca para dizer alguma coisa, a vontade contida de socá-lo bem no nariz.

— Barnes estava em Wakanda ilegalmente, agora ele está legalmente e agora os cientistas de Wakanda, se necessário, poderão procurar ajuda externa para auxiliar na recuperação dele sem correr o risco de serem presos por abrigarem um terrorista internacional.

— Bucky... – Steve abriu a boca para protestar, pois defender Bucky já era uma reação instintiva nele, mas um olhar de Prisma o calou.

— Juridicamente falando, James Barnes é categorizado como terrorista aos olhos das autoridades mundiais, não interessa o que o Capitão América diga. E como a sua popularidade no momento está na lama, literalmente não interessa o que o Capitão América diga. – a reunião prosseguiu após este “delicado fora” e quando terminou, Steve ficou para trás porque ele precisava conversar com Prisma. Precisava não somente saber de Tony, mas tentar compreendê-la.

— Tony está seguro. – foi a resposta dela para a pergunta de Steve, que abriu a boca para continuar, porque estar seguro não queria dizer nada. – E não, eu não vou elaborar. Basta saber que Tony está seguro, que está bem, e que ele irá aparecer quando ele quiser aparecer. – o tom de finalidade dela mostrava que realmente Steve não obteria mais do que isto. Então era hora de partir para a segunda opção.

— Você não gosta de mim. – declarou e Prisma, que estava recolhendo o seu material de sobre a mesa, preparando-se para ir embora, cessou os seus movimentos e nada disse, esperando que Steve elaborasse. – Você não gosta dos Vingadores, mas principalmente não gosta de mim.

— E daí?

— Por quê? – porque Steve precisava entender. Prisma não gostava deles mas moveu mundos e fundos para trazê-los de volta para casa, para inocentá-los.

Prisma largou o que fazia e sentou novamente na cadeira.

— Percebo... Você é a garota popular, Rogers. Mas não do tipo cruel, como Regina George. Não, você conquistou a popularidade devido ao seu carisma e sorriso de bom menino. E essa popularidade lhe garantiu uma legião de seguidores fiéis. Então, quando você encontra alguém que não gosta de você, sem aparente razão, você precisa saber o por quê. Porque você é tão legal, como pode alguém não gostar de você? – ela disse com deboche e Steve contou até vinte mentalmente para não perder a paciência.

— Eu só não entendo como você pode não gostar de alguém e defendê-lo ao mesmo tempo.

— Eu não preciso gostar de um assassino comprovado para defender a sua suposta inocência. Meu trabalho não envolve gostar dos meu clientes, envolve defender os seus direitos.

— Ainda sim...

— Rogers, se o meu aparente desprezo está lhe tirando o sono, então eu vou aliviar o seu sofrimento. – ela apoiou os cotovelos sobre a mesa, entrelaçou os dedos e apoiou o queixo sobre esses. – Eu não gosto de você porque você é um moleque imaturo que não aceita um não. Eu não gosto de você porque você recebeu regalias das quais não merecia. Promovido de soldado raso a capitão só porque teve a sorte de sobreviver a um experimento? Pior, depois de ter desobedecido ordens do seu oficial superior. Ordens que hojem o levariam a corte marcial, não a uma promoção. Você não merece o título de Capitão porque você não fez por merecer ter esta patente. Você apenas teve sorte. Eu não gosto de você porque você exige a verdade, nada mais que a verdade, de seus companheiros, mas mente para eles quando melhor lhe convém. Sim capitão, eu sei da Sibéria. Eu sei que você sabia quem matou Howard e Maria Stark, que na verdade eles foram mortos e não que sofreram um acidente. Eu sei que você mentiu por anos para Tony sobre isto, eu sei sobre a batalha na Sibéria, eu sei sobre a armadura que você desativou ao cravar um escudo que você não merece carregar no reator arc. Reator que não faz pouco tempo era o que mantinha Tony vivo.

Prisma se calou e esperou por uma reação do homem no extremo oposto da mesa, mas Rogers estava pálido como uma vela e com os olhos largos.

— E agora que você sabe que eu sei, espero que tenha isto em mente na próxima vez que pedirmos para você fazer algo que o desagrade, porque eu posso te arruinar com a mesma velocidade com que te tirei da ruína. – Prisma voltou a recolher o seu material, o guardou calmamente em sua pasta e ergueu-se da cadeira, dando suaves tapinhas no ombro de Rogers ao passar por ele.

— Então por quê? – a voz de Steve saiu engasgada e havia um leve tom choroso nela. Prisma não se virou, já na porta da sala, para encarar o homem. – Então por que nos ajudou? Por que me ajudou? – um minuto foi o tempo que ela levou para dizer:

— Porque Tony me pediu. – e foi embora.

 

ANTES

 

— Não está funcionando. – sinceramente? Prisma já estava cansada de ver aquele quarto absurdamente esterelizado, de somente poder ver Tony através de uma vidraça, como se ele fosse algum animal raro exposto no zoológico, ela estava cansada de ver o homem como apenas uma sombra do que foi, tão magro, tão pálido, desaparecendo sob as cobertas. Tão parado, quando ele sempre foi tão vivaz e inquieto e cuja presença somente era capaz de preencher um salão com mil pessoas.

Will suspirou ao seu lado.

— Se ele fosse um semideus puro, pudesse dar certo. Mas ele é apenas um descendente, as doses de ambrosia que precisam ser aplicadas são mínimas, se não quisermos dar um choque no sistema dele. A ambrosia o ajudou a mantê-lo estável, desacelerar o estado de deteriorização, a sustentar o organismo devido ao coma induzido. Eu já te falei que manter um paciente em coma, de forma artificial, por tanto tempo, é tão arriscado quanto mantê-lo acordado?

— Sim.

— Pois então. A ambrosia nos deu tempo, mas a nossa única salvação é o Extremis.

— Que vocês não sabem se vai ajudar ou não.

— Todo procedimento é arriscado. E convenhamos, de uma forma ou de outra, Tony está condenado.

— Eu preciso conversar com Jim e Pepper sobre isto. – porque Tony queria ferrar com eles, só podia ser. Não bastava estar os matando de preocupação no último ano, o desgraçado ainda tinha colocado nas mãos dele a responsabilidade de decidir o que era certo o errado para Tony caso este fosse considerado fisica ou mentalmente incapaz de fazer isto.

— Acho que o que você precisa no momento é de uma boa noite de sono. Quando foi a última vez que você teve uma noite tranquila de descanço?

— 1989? Bom ano. Tenho saudades daqueles tempos. – Will riu.

— Vá descansar, Prisma. Tony aguentou por todo este tempo, acho que ele aguenta mais um dia. – era bom mesmo ele aguentar mais um dia, ou Prisma iria descer ao submundo somente pelo prazer de esganar Tony Stark.

A viagem de elevador até a cobertura foi feita de forma silenciosa. Até FRIDAY ultimamente andava um pouco quieta, contemplando a saudade e preocupação que sentia pelo seu criador. A porta do quarto abriu sem Prisma dizer nada e ela somente teve tempo de retirar os sapatos antes de cair de cara sobre as cobertas. Em segundos, já dormia.

— Ou eu caí no sono mais uma vez na oficina, ou isto é um sonho.

— Se você caiu no sono na oficina, óbvio que está sonhando. Ou não. – Tony disse com divertimento quando Prisma afastou-se da porta do elevador e adentrou a oficina.

O homem estava saudável, corado, os olhos castanhos brilhavam, a barba estava bem feita e ele sorria largamente, sentado sobre o banco que Prisma costumava ocupar quando estava trabalhando.

Prisma aproximou-se de Tony, puxou outro banco de sob a mesa e sentou-se de frente para ele.

— Eu conheço este olhar, é o olhar de “eu quero muito te bater agora”. Você quer me bater?

— Você não faz ideia.

— Violenta você, não?

— Com o pai que eu tenho? Por que a surpresa?

— Achei que eu tinha desfeito esse mau exemplo.

— Repito: com o pai que eu tenho, por que a surpresa? – Tony riu.

A relação Tony x Prisma era complicada. Distante por algumas vezes, próxima em outras. Era uma mistura de amizade, cumplicidade, companheirismo, familiaridade. Prisma poderia dizer que cresceu com uma mãe e três pais. Ares era o seu pai biológico, Tony e Jim, os de criação. E boa parte do que ela era hoje era por causa dos dois últimos homens. Ares dizia que ela era petulante como Joana mas na verdade, ela era petulante como Tony. Geniosa como Jim. Teimosa como Tony. Leal como Jim. De Ares vieram os poderes, as habilidades para a guerra, a brutalidade e a raiva que ela sempre mantinha sob controle. Não porque ela desprezava este lado obscuro que ser um filho de Ares implicava. Não, ela o abraçava como parte de si e usava em sua vantagem quando o momento mostrava-se oportuno. Ela gostava de reprimir este lado porque ela gostava de se desafiar, saber o que ela podia ou não fazer. E o controle a ajudou a ser a advogada que era hoje.

Imagina se ela perdesse a paciência nos tribunais? Seria um banho de sangue na certa.

— Então, é isto? Depois de mais de um ano, você simplesmente resolve dar as caras. – Tony arqueou uma sobrancelha para ela e sorriu.

— Você acha que este sonho é uma visão?

— Nenhum sonho de um semideus é realmente sonho.

— E se for apenas um sonho?

— Tony... – Tony riu.

— Você fez bem.

— O quê?

— Sobre o Tratado, sobre os Vingadores, sobre Barnes. Estou orgulhoso.

— Agora eu sei que isto é um sonho, porque não lembro de ver o seu espírito me seguindo para cima e para baixo, servindo como conselheiro sobrenatural.

— Isto não é verdade. Eu sempre estive com você, em todos os momentos. – Tony ergueu o indicador a apontou para o lado esquerdo do peito dela. – Bem aqui.

— Agora isto está virando um pesadelo. Tony Stark falando sobre sentimentos, é o fim do mundo. – ele riu.

— Não seja dramática.

— Aprendi com você. – silêncio. Ambos ficaram sentados, frente a frente, olhando um para o outro, avaliando-se. Prisma queria tocar Tony, sentir a pele quente sob os seus dedos, confirmar que ele estava ali, vivo, mas era inútil, porque aquilo tudo era um sonho apenas, uma visão. Nada era real, nada era verdadeiro. E ao mesmo tempo era. Semideuses não tinham sonhos normais e sendo o espírito de Tony ou não estando ali, a aparição dele em seu subconsciente, depois de tanto tempo desde que ela entrou nesta empreitada, não era um bom sinal.

— Você sabe porque eu estou aqui. – Prisma sabia e não queria aceitar. Não queria aceitar que o fim estava próximo. Enquanto estava lutando pelo Tratado, pelos Vingadores, por Barnes, todas as horas do seu dia estavam tão ocupadas com trabalho que ela tinha pouco tempo para pensar em Tony hospitalizado. Will, Bruce e Helen mantinham Pepper, Jim e ela atualizados do progresso com o Extremis, Will a mantinha atualizada sobre a condição de Tony e enquanto este estivesse respirando, era o suficiente para Prisma continuar lutando.

Mas os três cientistas encerraram as suas pesquisas, todas as fórmulas foram vistas e revistas, todos os testes possíveis e impossíveis foram feitos, agora a única forma de saber se tudo daria certo ou iria por água abaixo era injetando o Extremis em Tony. Mas as chances disto tudo explodir na cara deles eram maiores do que a de eles obterem algum sucesso.

— Eu não quero ouvir. – ela respondeu de forma petulante. Negaria até o último minuto a verdade, negaria até não poder mais.

— Prisma...

— Não! – Prisma colocou as mãos sobre as orelhas, em um gesto infantil, e começou a cantarolar uma canção qualquer. Ela não queria ouvir, ela não precisava encarar a dura realidade, não agora. Talvez nunca.

— Prisma... – uma mão quente pousou em seu ombro.

— Não! – Prisma soluçou.

— Ah, Pris... – o velho apelido de infância foi o suficiente para Prisma desabar. O seu corpo inteiro amoleceu, a sua cabeça pendeu para frente, encontrando o ombro firme de Tony, e as lágrimas rolaram pelo seu rosto.

— Eu te odeio. – ela disse após minutos nesta posição, soluçando e sentindo o rosto ficar molhado pouco a pouco. Tony riu.

— Odeia não. Ódio é uma palavra muito forte, é um sentimento muito forte. Raiva talvez, você tenha de mim no momento. Mas não ódio. – Prisma se afastou e secou as lágrimas com as costas das mãos.

— Só em meus sonhos para você dizer coisas maduras.

— Eu sou o exemplo da maturidade! – Tony soltou com uma falsa expressão ofendida e Prisma arqueou uma sobrancelha para ele. – Mas não mude de assunto.

— Não! – ela repetiu, porque ela ainda não queria ouvir. Tony rolou os olhos.

— Não seja infantil, Prisma. – Prisma suspirou, secou mais as lágrimas e inspirou profundamente para recuperar o controle.

— Eu sei o que você está me pedindo, mas você tem que concordar que não é fácil. Não depois de tudo o que aconteceu. Você colocou um peso nas minhas costas que eu aceitei de bom grado porque eu sabia que era o certo a fazer, mesmo que eu queira muito partir cada um dos seus queridos Vingadores ao meio. Mas isto, isto eu não quero fazer.

— Mas precisará, caso seja necessário. Não me deixe viver sendo uma sombra do que eu fui, Prisma. Eu prefiro morrer a isto. Por favor...

— Tony... – ela disse chorosa, sentindo as lágrimas retornarem ao seus olhos. Tony a segurou em ambos os ombros e mirou olhos castanhos em castanhos.

— Por favor, Prisma. – Prisma suspirou derrotada.

— Okay. – concordou.

 

ANTES

 

Prisma não queria fazer isto e pela cara de Rhodes ao seu lado, ele também não. Jim estava vivendo na Torre Stark desde que os Vingadores voltaram para a base no interior de Nova Iorque. Visão vez ou outra aparecia para uma visita, pois ele também tinha conhecimento do estado de Tony. O andróide estava lá quando Tony infartou. Steve tentou, por várias vezes, contatar Tony na Torre Stark, quando o telefone não funcionou, ele resolveu aparecer pessoalmente para encontrar a muralha intransponível que era Virginia “Pepper” Potts. Pepper, ao que parecia, também não estava muito feliz com as atitudes do capitão Rogers, e demonstrou isto de maneira mais delicada e diplomática, porque a CEO era educada desta maneira. Prisma não, esta sabia guardar rancor como ninguém e por isto que não queria fazer isto.

William havia lhe informado que Bruce, Helen e ele iria iniciar o procedimento com o Extremis em poucas horas e Prisma sabia que era agora ou nunca. Tudo poderia dar certo, como tudo poderia dar errado. E se tudo desse errado, os Vingadores deveriam ser os primeiros a serem informados porque, quando isto vazasse para a imprensa, eles seriam os primeiros a serem alvejados com perguntas e a popularidade deles iria ao chão, desfazendo o bom trabalho da Assessoria de Imprensa nos últimos três meses, se o público ficasse sabendo que Homem de Ferro e os Vingadores não estavam socializando a ponto dos Vingadores não saberem das condições de saúde do Homem de Ferro.

— Srta. Grey? – Steve chamou em um tom hesitante. Steve sempre pisava em ovos toda vez que precisava falar com Prisma. Um simples bom dia era motivo para a mulher olhá-lo com desconfiança e isto corroía Steve por dentro. Porque os olhos dela eram os olhos de Tony. O mesmo tom castanho, como chocolate derretido, grandes e expressivos. Cada vez que ela o olhava o julgando, Steve via Tony o julgando. Via o desapontamento de Tony, a desconfiança de Tony, via que Tony não o considerava nada mais que um mentiroso traidor.

— Rogers. – até mesmo o tom de desdém dela lembrava Tony. E ao mesmo tempo que isto matava Steve por dentro aos poucos, o deixava curioso. Quem era Prisma Grey? E qual era a verdadeira relação dela com Tony Stark? Porque ela não era apenas uma advogada defendendo os direitos deles a pedido de Stark. Ela considerava o que Tony passou na Guerra Civil algo pessoal, como se ela mesma tivesse sofrido aquilo tudo. E este tipo de conexão não era criada tão rapidamente. Levava tempo, levava anos até.

Prisma suspirou e segurou a vontade de esfregar os olhos com as pontas dos dedos, em um gesto de cansaço. Os seus olhos rodaram pela mesa, por cada Vingador presente nesta, até encontrarem o olhar de Jim, que lhe deu um pequeno sorriso e um aceno discreto.

— No dia 15 de Agosto de 2016, às 16 horas e 47 minutos, Tony Stark foi encontrado por Visão, em sua oficina, desacordado. As 16 horas e 49 minutos ele foi encaminhado para o centro médico da Torre Stark, onde os profissionais que trabalharam com os Vingadores e encontravam-se de licença devido a Guerra Civil foram contatados para prestarem os primeiros atendimentos. Às 17 horas e 10 minutos, o médico chefe da equipe, Dr. Brian Grant, informou que Tony Stark havia sofrido um infarto. Às 17 horas e 26 minutos Tony Stark teve uma crise epilética, consequência de um AVC. Às 17 horas e 35 minutos, Tony Stark foi posto em coma preventivo e encontra-se neste estado desde então.

— Você... – Steve engasgou, tentando encontrar os olhos de Prisma que havia relatado isto tudo com a atenção voltada para a tela do tablet. – está querendo nos dizer que Tony, por todo este tempo, esteve em coma? – Prisma suspirou, desta vez sem esconder o quão cansada estava.

— Não. – disse em um tom baixo. – Estou querendo dizer que por todo este tempo, Tony Stark esteve morrendo.

Os Vingadores não disseram nada, chocados demais para proferirem uma palavra que fosse, mas Prisma podia ver em seus rostos várias emoções diferentes: raiva, culpa, pena, preocupação. Todas se misturando, nenhuma permanecendo por mais tempo que o necessário, era como se eles não soubessem o que sentir.

— Eu não estou dispondo desta informação para conseguir simpatia da parte de vocês em relação a Tony. Sei que muitos ainda não o “perdoaram” pelo que aconteceu. – o olhar de Prisma foi diretamente para Clint, que permaneceu calado. Desde que retornou a base e começou a terapia obrigatória, Barton havia melhorado muito o seu temperamento, mas a raiva ainda estava lá, menos intensa, mas estava lá. – Também não estou dizendo isto para fazê-los se sentir culpados. – porque Prisma não precisava olhar para Steve, ela podia sentir a culpa emanando dele em ondas. – Estou apenas atestando um fato. Tony Stark está morrendo e isto, mais cedo ou mais tarde, chegará ao público e por isso os Vingadores não podem ser pegos desprevenidos.

— Com licença. – Sam a interrompeu. – Se o caso de Stark foi um infarto, uma cirurgia não teria resolvido o problema? Ou ao menos aliviado a situação?

— Infelizmente não. O coração de Tony sofreu muitos danos no Afeganistão, mesmo sem os estilhaços ameaçando estraçalhar o órgão, este já estava extremamente enfraquecido. Exames de rotina, dois anos atrás, detectaram uma suave isquemia. Tony estava ciente que se continuasse com a sua vida atribulada, ele corria o risco de um infarto. – desta vez Prisma coçou os olhos para não apenas tentar espantar a dor de cabeça que começava a latejar em sua têmpora, como também as lágrimas que queriam porque queriam brotar neles. – O idiota deveria ter me chamado antes, quando toda essa confusão do Tratado começou. – Prisma murmurou e Jim pousou uma mão sobre a dela, em um gesto de força e conforto, lhe dando um breve sorriso.

— E por que ele não chamou? – Natasha, que em todas as visitas de Prisma a base sempre permaneceu quieta, apenas observando o ambiente ao seu redor, avaliando tudo e todos, finalmente se manifestou.

— Porque ele é um imbecil que acha que pode resolver todos os problemas do mundo sozinho. – Rhodes respondeu.

— De qualquer maneira. – Prisma continuou. – O caso de Tony não é mais de cirurgia, é de transplante. Ele está na lista, sob um pseudônimo, mas a espera é longa e existem outros com mais urgência do que ele.

— Então vocês vão fazer o quê? Simplesmente desistir? Esperar Stark desistir? Desligar as máquinas? – Clint desdenhou e Prisma sorriu brevemente, porque mesmo sob a raiva ela podia ver a preocupação ali, o medo que o arqueiro sentia de que pudesse perder mais uma pessoa que lhe era querida. Ele considerava Tony seu amigo, mesmo que no momento estivesse irritado com ele.

— Óbvio que não. No dia 17 de Agosto de 2016, Pepper Potts entrou em contato com a Doherty, Lawson e Associados e os contratou para ser a nova firma de advocacia representante dos direitos dos Vingadores perante o Tratado de Sokovia. Neste mesmo dia, eu fui posta a frente deste caso e nomeada a advogada oficial dos Vingadores. No dia 18 de Agosto de 2016, eu contatei o dr. William Solace, no Lenox Hill, e o trouxe para ser o chefe da equipe médica que iria cuidar de Tony.

— Pensei que já havia um médico chefe nesta equipe. – Sam novamente se manifestou.

— Todos que trabalhavam para os Vingadores, antes da Guerra Civil acontecer, ou pediram dispensa do cargo ou aceitaram o acordo de licença não remunerada, deixando-se a disposição para serem reconvocados para as suas antigas funções a qualquer momento, o que os obrigaria a abandonar o emprego em que estivessem atuando no instante do chamado. O dr. Brian Grant foi generoso o suficiente para ceder o seu tempo para atender esta emergência, mas ele já possuía uma nova proposta de emprego em vista e já tinha dado entrada nos papéis para pedir a sua dispensa como médico chefe dos Vingadores.

— E o que esse William Solace poderia oferecer que o dr. Grant não pode? – Steve lembrava claramente de Brian Grant e o homem era um médico brilhante. Tinha que ser, para lidar com soldados, superhumanos e Inumanos. Se Prisma realmente quisesse manter o homem como médico chefe, ela teria oferecido uma contra proposta que Brian não pudesse recusar.

Prisma sorriu, porque ela podia ver nos olhos de Steve o que ele estava pensando.

— Porque William poderia me oferecer um milagre. O que realmente aconteceu. No último ano, William, junto com a dra. Helen Cho e o dr. Bruce Banner – Natasha empertigou-se na cadeira ao ouvir o nome de Bruce. – tem trabalhado em uma nova fórmula do Extremis e planejam aplicá-lo em Tony em exatamente – Prisma girou o pulso para ver o relógio que estava neste. – quatro horas e cinco minutos.

— O que é Extremis? – Scott perguntou confuso e Prisma arqueou as sobrancelhas para ele.

— Onde você esteve nos últimos anos? Sob uma pedra? – Prisma perguntou. Não que todas as informações sobre o Extremis tenham chegado a público. Uma coisa ou outra foi explicada para assim justificar a morte de Aldrich Killian e o fato de que era o empresário por detrás do Mandarim. Para as pessoas não envolvidas diretamente no caso, Extremis era uma fórmula que poderia ser considerada a vacina das vacinas, capaz de combater várias doenças ao mesmo tempo, usando apenas um único composto, mas cuja instabilidade o tornava inviável para o comércio e que ainda era extremamente perigoso e provavelmente nunca seria realmente testado pois era complexo demais e a pessoa por detrás de sua criação estava morta e não deixou nenhuma anotação para ser estudada, porque a criatura era paranoica.

— Usar o Extremis em Tony... Não acha um pouco arriscado? – Natasha perguntou. – Tony não possui a mesma calma que Pepper.

— Eu sei, por isso que levamos um ano para conseguirmos uma versão provisória do Extremis. Uma versão que será injetada, fará o trabalho e então será expulsa do organismo de Tony.

— Se vocês vão salvá-lo, por que deste drama todo? Desta reunião? – Clint resmungou e Prisma gostaria muito de virar a mão na cara dele. Pelo modo como o arqueiro recuou com a cadeira, ao receber o olhar dela, o mesmo percebeu que Prisma queria virar a mão na cara dele.

— Porque o Extremis pode funcionar, como não funcionar. – Jim respondeu. – E a segunda chance é mais provável do que a primeira. E se o Extremis não funcionar... – ele trocou um olhar com Prisma.

— O quê? – Steve perguntou com o coração batendo tão acelerado no peito que tinha medo que este saísse pela sua boca. Os olhares que Prisma e Rhodes trocaram não foram nada confortadores.

— O Extremis pode curar ou matar Tony. Mas se não matá-lo... – Jim hesitou e Prisma deu o seu terceiro suspiro de cansaço naquela manhã, completando:

— Se não matá-lo, teremos que desligar as máquinas.

— Ou seja, se Extremis não matar Tony, vocês o farão. – Clint praticamente cuspiu a acusação.

— Eu vejo mais como uma libertação. – Prisma deu de ombros, ignorando o olhar raivoso de Clint. – Se o Extremis não matar Tony, ele finalmente será livre.

 

AGORA

 

Era aterrorizante ver Tony através daquele vidro, vê-lo praticamente desaparecer sob as cobertas, tão imóvel que poderia tornar-se um com a cama. Prisma havia permitido a vinda dos Vingadores para a Torre Stark para acompanharem o procedimento, porque Steve precisava estar ali, precisava estar ao lado do amigo que ele abandonou por causa de outro. Precisava dessa dose de realidade para perceber a burrice que cometeu, para ver que as coisas poderiam ser diferentes. Prisma conseguiu refazer o Tratado a pedido de Tony,e o novo documento era bom, não era 100% seguro, mas era um começo. Ainda irritava Steve que ele teria que esperar por autorização da ONU para poder entrar em combate mas, se ele fosse realmente avaliar tudo agora, com mais calma, não foi isto que ele sempre fez?

Quando trabalhava para a SHIELD ele não teria que aguardar ordens para assim entrar em combate e se Fury dissesse não, mesmo que não gostasse da ideia, não teria que recuar? E, se não recuasse, não seria punido de acordo por sua insubordinação? Mas Steve ficou arrogante, desde que a Iniciativa Vingadores deixou de responder a SHIELD e ao Conselho de Segurança Mundial. Quando o poder ficou somente nas mãos deles e durante todo este período eles tiveram mais sucessos do que fracassos, Steve começou a pensar, mesmo que incoscientemente, que as mãos deles eram mais seguras do que a dos outros. E o resultado disto o que foi?

Uma equipe destruída, propriedade particular destruída, pessoas mortas e feridas, pessoas que os temia, as mesmas pessoas que antes os idolatrava. E mais de cem países que diziam que eles não eram de confiança. Mais de cem países. Por Deus, o que Steve estava pensando? Como ele pôde ter sido tão cego em achar que centenas de países estavam armando contra os Vingadores? Descobrir que a HIDRA esteve infiltrada todos esses anos na SHIELD, a agência que ele participou no passado, sob outro nome verdade, a agência que criou o Capitão América, destruiu tanto assim a sua confiança nas autoridades? Mais... Ele realmente ficava tão cego assim quando o nome de Bucky era mencionado?

Sim, ficava.

As sessões com a dra. Queen realmente estavam sendo de grande ajuda, além de reveladoras.

Steve estava se apegando ao passado e qualquer coisa que tivesse conexão com ess. Ele havia dito a Tony que o Steve que entrou no mar com um avião em 1944 era diferente do Steve que saiu deste. Mas na verdade não havia diferença alguma. Ele continuava o mesmo Steve teimoso, que não aceitava ser derrubado pelo mundo, como este tentou tantas vezes fazer, leal aos extremos, mas muito cabeça dura.

— Ficar olhando não vai acelerar o processo. – Prisma surgiu ao seu lado e Steve deu um relance para ela. Era a primeira vez que via a advogada em roupas que não fossem suas saias lápis, camisas sociais, vestidos ou ternos e salto alto. Ela também estava sem maquiagem, o seu cabelo estava preso de forma desajeitada na nuca, e usava jeans, camisa e tênis. Vestida assim ela parecia menos ameaçadora, mais humana e mais alcançável.

Fazia cinco horas desde que o Extremis havia sido injetado em Tony e Bruce, Helen e William faziam rondas de uma em uma hora para acompanhar o progresso do “vírus” dentro do sistema do engenheiro. William os informara que o Extremis agiria por 72 horas no organismo de Tony e depois desse momento começaria a ser expelido pelo mesmo. Enquanto isto acontecia, Tony permanecia em coma induzido pois, segundo William, “este processo vai doer pra cacete”. Por enquanto, nada parecia fora do normal. Os batimentos cardíacos de Tony estavam estáveis, ele dormia tranquilamente, imóvel sobre a cama, e tudo parecia estar dando certo.

— Mas me ajuda a refletir. – Steve deu de ombros, cruzando os braços sobre o peito, com os olhos ainda em Tony. – Acha que ele vai me perdoar? – porque esta era a pergunta que não queria calar, que estava corroendo Steve desde que ele voltou para os EUA. Não, mentira, desde que ele abandonou Tony na Sibéria em favor de Bucky.

Prisma riu ao seu lado, e não foi uma risada agradável.

— Sabe o que mais me irrita? É que sim, ele vai te perdoar. Não hoje, não amanhã, mas ele vai te perdoar. Provavelmente já tinha começado a te perdoar antes do infarto acontecer, já que ele me pediu para ajudar a trazer os Vingadores para casa.

A confissão deveria agradar Steve, mas não agradou. Ele não queria que Tony o perdoasse assim tão fácil, ele queria fazer por merecer o perdão do outro homem, lutar por este, provar que Tony valia a pena, que merecia ter alguém que lutasse por ele. E então Steve percebeu. Ele tinha isto. Ao olhar para Prisma, via que Tony tinha este alguém que sempre lutaria por ele.

— Tony... – Steve engasgou, hesitou por um momento, mas continuou com a pergunta porque ele precisava saber isto, saber a extensão do relacionamento entre Prisma e Tony. – é o seu pai, não é? – Prisma riu, e era uma risada genuína que a deixava mais jovem e mais bonita.

— Tecnicamente. Assim como eu considero James Rhodes um pai. – Steve franziu as sobrancelhas diante da resposta dela, porque ela não havia esclarecido nada. – Tony é um momento de surto psicótico da minha mãe que achou que um rapaz de dezoito anos, com indícios de alcoolismo, emocionalmente instável, gênio, egocêntrico, com baixa autoestima e problemas paternos fosse o candidato perfeito para apadrinhar uma criança. E anos mais tarde, para se tornar o guardião legal desta criança. Então não, biologicamente falando Tony não é o meu pai. Emocionalmente falando... É, você pode dizer que ele é meu pai.

— Assim como emocionalmente falando, coronel Rhodes também é seu pai.

— Sim. Eu tive sorte em tê-los na minha vida. – Steve olhou longamente para Prisma, lhe dando um pequeno sorriso antes de desviar o olhar para Tony, além do vidro de observação.

— Não, eles têm sorte de ter você na vida deles.

 

AGORA

 

Tony não estava muito certo, exceto que ele deveria estar com dor. A sua cabeça estava confusa, os seus pensamentos se embolavam uns nos outros, sem nenhuma coerência ou coesão, mas entre eles um somente prevalecia: a certeza de que ele deveria estar sentindo dor. Em cada músculo de seu corpo, da raiz do cabelo até a ponta dos dedos dos pés.

— Ele parece mais jovem. Ele não parece mais jovem? – a voz que penetrou a névoa que eram os seus pensamentos lhe parecia familiar, mas Tony não estava conseguindo associar voz a pessoa.

— É um efeito colateral do processo. – esta outra voz era estranha.

— Efeito colateral? Se este é o efeito colateral, vou patentear esse negócio e vender para Hollywood. – alguém riu.

— Seria justo, se não fosse o fato de que a fórmula foi desenhada especificamente para o DNA de Tony.

— Ele também parece mais encorpado. – a voz familiar continuou.

— O Extremis curou tudo, até mesmo a perda muscular e calórica que Tony sofreu neste último ano. – último ano? Tony sabia que a confusão que sofria no momento, os olhos pesados, eram resultados de um momento em que ele entrou em estado de incosciência involuntária. Trocando em miúdos, ele desmaiou. Mas por quanto tempo ele ficou desmaiado?

— Então... – a voz familiar continuou com um tom de hesitação. – O Extremis curou tudo mesmo?

— Até o fígado que eu falei que estava baleado. – mais uma vez alguém riu.

— E quanto tempo vai levar para ele acordar?

— Por que a pressa? O pior já passou. Vamos comemorar.

— William. – a voz familiar repreendeu.

— Os remédios vão levar algumas horas para sairem do organismo dele e mesmo assim vai levar um tempo para ele ficar completamente lúcido. Então, paciência. Você esperou por um ano, o que são mais algumas horas?

Um ano? Tony estava dormindo por um ano? Então era hora de acordar, não é mesmo? Ele precisava acordar. Pena que os seus olhos não concordaram com ele e menos ainda a sua consciência, pois Tony a perdeu mais uma vez em minutos.

Quando voltou a si, desta vez os seus olhos resolveram colaborar e abriram vagarosamente. O quarto estava escuro, havia um bip bip soando a sua esquerda, um vento gelado batia em sua bochecha direita e um vulto estava debruçado sobre ele ao pé de sua cama. Tony piscou várias vezes para desembaçar a visão, mas de nada adiantou. Tentou falar alguma coisa, mas as palavras ficaram entaladas em sua garganta seca. Um tubo preso em seu nariz estava lhe dando vontade de espirrar e ele percorreu os olhos pelo teto, sem fixar em um ponto específico. Minutos depois, adormeceu mais uma vez.

Tony acordou de novo para um quarto mais claro, para flores na cômoda ao lado de sua cama, para um urso de pelúcia enorme sobre um sofá, para cartões e balões de melhoras, para Prisma sentada na beirada da cama, segurando a sua mão e sorrindo para ele.

— Ei... – Tony arriscou a dizer e sua garganta arranhou e ardeu. Ainda sorrindo, Prisma soltou a sua mão, recolheu um copo de sobre a cômoda e delicadamente deslizou um cubo de gelo por sobre lábios secos. Tony suspirou de alívio ao sentir as gotas d'água perpassaram os seus lábios e descerem por sua garganta, a umidecendo pouco a pouco. Logo depois o cubo foi colocado em sua boca e Tony o absorveu rapidamente, sentido-o derreter em sua língua e aliviando a irritação em sua garganta.

— Ei. – Prisma respondeu, com o sorriso jamais esmoirecendo de seu rosto, e devolveu o copo para a cômoda.

— O que... – Tony queria perguntar o que tinha acontecido, mas a sua garganta ainda não estava totalmente hidratada e por isso as palavras não saíram.

— É uma longa história que resume-se ao seguinte: você infartou e teve um AVC, Pepper me procurou com a sua mensagem e enquanto eu fazia o que você me pediu, consegui trazer um filho de Apolo, Banner e Cho para transformarem o Extremis em uma fórmula viável de uso para te curar. Isso já faz um pouco mais de um ano. Você ficou em coma induzido por todo este tempo, porque qualquer tipo de estresse poderia ser fatal. Então, conseguimos a fórmula do Extremis, usamos em você e voilá! Tony Stark 2.0, pronto para aterrorizar o mundo.

Tony riu, o que não foi uma boa ideia com a sua garganta irritada, porque rir lhe deu um acesso de tosse. Prisma lhe passou outro cubo de gelo que ele chupou avidamente até que a irritação melhorasse.

Um ano ele ficou desacordado e com certeza perdeu várias coisas. Muitas coisas. Mas isto ele recuperaria depois, porque agora que estava lúcido o suficiente para lembrar dos seus momentos pré-infarto, ele recordava que em caso de incapacitação de sua pessoa Pepper tinha ordens de procurar Prisma e pedir ajuda. Ajuda com o Tratado, com os Vingadores... Com Barnes.

— O Tratado? – murmurou e Prisma sorriu orgulhosa.

— Redigido e aprovado pela ONU, conforme as suas solicitações. – um peso saiu do peito de Tony.

— Os Vingadores?

— Todos de volta em casa. – outro peso saiu do peito dele.

— Barnes?

— Asilado político em Wakanda, com autorização da ONU, passando por tratamento para assim ter a sua anistia aprovada. Enquanto isto, a nova Assessoria de Impresa dos Vingadores está fazendo um lindo trabalho de redenção de James Barnes junto ao público. – vinte mil pesos saíram de sobre o peito de Tony e pela primeira vez, desde que toda aquela confusão começou, ele sentia que podia respirar normalmente como se não tivesse novamente um reator arc esmagando os seus pulmões.

— Prisma... – Tony queria chorar. Na verdade, ele sentia as lágrimas descendo pelas laterais de seu rosto. Ele sabia que no momento em que pediu ajuda a Prisma, esta procuraria todas as informações possíveis e inimagináveis sobre a situação, portanto ela saberia exatamente o que aconteceu na Guerra Civil, como se ela tivesse participado da mesma. E Prisma era superprotetora, extremamente superprotetora com aqueles a quem queria bem. Tony sabia que chamá-la seria um risco, que Prisma poderia querer buscar vingança em nome dele ao invés de ajudar, mas ele precisava tentar. Ele implorou em suas mensagens por ajuda e rezou, enquanto gravava as mesmas, que Prisma ouvisse o seu pedido ao invés de ceder a raiva.

— Você me chamou para lutar nesta guerra ao seu lado, e eu vim. Eu vim e lutei esta guerra enquanto esperava você voltar para casa. – Tony sentiu os dedos mornos dela envolverem os seus e fechou os olhos, sorrindo.

— Prisma... Obrigado. Você não precisava vir ao meu chamado, mas veio. – Prisma sorriu aquele sorriso que conquistou Tony desde o primeiro momento em que ela sorriu para ele, ainda bebê, em seus braços. Uma palma macia tocou o seu rosto e lábios úmidos e quentes beijaram-lhe a testa.

— Pelo contrário. Quando você chamar eu virei, sempre.

 

 

Deixe-me te dizer, eu estou pronto para voar,

Eu sobrevivi a chuva, a tempestade de areia, lutei uma guerra, agora é hora de ir para casa.

(Journey – Natasha Blume)


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