Após Tempestades e Guerra, É Hora de Voltar Para C escrita por Bella P


Capítulo 2
Capítulo 2




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Você não precisa me dizer uma, duas vezes, se perguntar o porquê de estarmos aqui,

Apenas precisamos parar a inundação antes que percamos tudo e nos afoguemos por causa do medo.

(Journey – Natasha Blume)

 

ANTES

 

Nova Iorque estava um caos.

Era a primeira semana dela na cidade e a mesma estava sob intenso ataque alienígena. Prisma não era de Nova Iorque, ela era nascida em Cambridge, Massachusetts, viveu alguns poucos anos em Nova Iorque e então mudou-se para a ensolarada Califórnia. Porque para onde Joana ia, como empregada das Indústrias Stark, Prisma ia. Joana era amiga e funcionária de Tony, uma das principais designers de armas da empresa, o seu conhecimento em mecânica e computação era sem igual e um dos gansos dos ovos de ouro da companhia, depois de Tony é claro.

Dos oito aos dezoito anos ela viveu em Nova Jersey, mas fora um breve momento, aos dezesseis anos, em que voltou a Nova Iorque para defender o Olímpo, Prisma nunca mais esteve na cidade. Isto até que a Doherty, Lawson e Associados resolveram a contratar direto de Havard. Agora ela estava de volta a Nova Iorque, ainda sem um lugar fixo para morar, sem a sua mudança nem mesmo ter chegado na cidade e esta estava sendo destruída.

Prisma deslizou sobre o asfalto trincado até parar sob a mesa de ferro, ainda em pé, na varanda de um café. A explosão havia feito escombros voarem por toda a parte. Explosão não, o Hulk na verdade, que rugia metros acima da cabeça dela e arremessava corpos de alienígenas no chão como se esperasse que esses quicassem como uma bola de borracha. Quando Cronos atacou, ao menos ele teve a decência de colocar todos os mortais para dormir e concentrar as suas forças somente no Empire State. Loki estava atirando para todos os lados, esperando acertar alguma coisa.

Prisma sabia de uma coisa: ali não podia ficar. O subterrâneo, no momento, era o local mais seguro, pois a batalha não tinha um lugar de concentração, não havia um perímetro, porque os alienígenas pouco se importavam com casualidades. Algo passou zunindo pela rua, deixando um rastro vermelho e azul em seu caminho, acertou três alienígenas que estavam com as armas erguidas e avançando por entre carros revirados, os derrubando imediatamente, antes de voltar com a mesma velocidade que veio. Prisma arriscou dar uma olhada além do seu esconderijo para ver a bandeira americana avançar em direção aos alienigenas.

Não, sério, era a bandeira americana vestindo um homem, porque aquele uniforme era a coisa mais ridícula que ela já vira na vida. E ela conhecia Tony Stark, um homem que achava que vermelho e dourado era sinônimo de discrição.

Capitão América passou por ela, sem nem ao menos vasculhar o perímetro. Haviam becos e prédios vazios ao seu redor, locais onde inimigos ou vítimas poderiam estar escondidos, e ele simplesmente seguiu em frente sem nem ao menos dar um relance além das janelas quebradas e portas entreabertas. Era um idiota.

Mas pensar na idiotice dele não era a preocupação de Prisma, que saiu de sob a mesa e fez o que o capitão não fez, observou o seu redor. Havia uma entrada de metrô a duzentos metros e um caminho aparentemente desempedido. Prisma inspirou profundamente e disparou em uma corrida, passou por cima de pedras, deslizou sobre o capô de carros e saltou por sobre uma perigosa rachadura no asfalto e, quando estava chegando a entrada, um alienígena surgiu como uma aparição na sua frente. Prisma somente reagiu, as espadas gêmeas de bronze celestial e aço, a mistura mais perigosa a sair das forjas de Hefesto, pois tinha efeito tanto em semideuses quanto mortais, surgiram em suas mãos com a mesma velocidade que aquele alienígena, e desapareceram assim que cumpriram o seu trabalho de eliminar a ameaça e abrir caminho para o metrô.

Prisma desceu as escadas e ousou um relance por cima do ombro, apenas para ver o Homem de Ferro guiar um míssel na direção do portal e desaparecer além deste. Ela considerou ficar ali, ver o desfecho daquilo tudo, esperar Tony retornar, mas alienígenas estavam surgindo das esquinas a dois quarteirões de onde ela estava e logo a veriam. Prisma deu as costas para a cena e desceu as escadas, desaparecendo no subterrâneo.

 

AGORA

 

— Pensei que estava se escondendo de mim. – Prisma sorriu quando Rhodes a envolveu em um abraço apertado, que ela devolveu com igual força. Tony era o tio excêntrico, mas Jim sempre foi o tio legal, o tio favorito que toda criança queria ter. E se Prisma vez o outra tentou incentivar um relacionamento entre sua mãe e Rhodes, por favor perdoeem as fantasias de uma criança procurando por uma família de conto de fadas.

— Jamais. – Prisma respondeu enquanto acompanhava Jim para a sala de visitas, sentando-se no sofá oposto a ele.

Jim queria estar na Torre Stark, ao lado de Tony, mas sabia que precisava manter as aparências. Pepper estava, a muito custo, mantendo os abutres longe, conseguindo esconder a real razão do sumiço de Tony. A mídia dividia-se entre pena pelo pobre bilionário abandonado pelos companheiros a gloriosos momentos em que destrinchava e expunha Tony, e todo o seu passado caótico, cada erro e acerto dele, como uma fratura exposta. A permanência de Jim na base dos Vingadores, junto com Visão, era uma maneira de despistar o público, e felizmente nada de grandes proporções havia acontecido nos últimos meses, nada que incitasse a ajuda dos Vingadores, mas nada tirava da cabeça de Prisma que esta era a calmaria antes da tempestade.

— Por mais que eu esteja adorando ver esse sorriso lindo, qual a razão de você estar aqui? – Jim a conhecia tão bem quanto Tony. Ambos os homens estiveram ao seu lado, de maneira direta ou indireta, por toda a sua vida, sabiam de todos os seus segredos e apoiaram Joana nos momentos mais difíceis de sua doença. Eles eram a sua família.

— O Tratado está me matando. – Prisma disse com um suspiro sofrido. Tony queria que ela alterasse o Tratado de modo que este fosse viável para ambas as partes que o abrangia: o povo e os heróis que dispuseram-se a proteger este povo. Até aí tudo bem, alterar o Tratado não foi tão difícil assim. Convencer os heróis da lista de Tony a ajudá-la foi um pouco mais complicado, mas não impossível, o que estava dando noites insones a ela era que agora eram 135 países assinantes. 135 países que ela precisava convencer a aprovar as alterações. – A ONU está com o pé tão atrás sobre as alterações, que eu não acredito que conseguirei nem mesmo fazê-la me ouvir. Capitão América e a sua estúpida teimosia somente piorou as coisas. E obviamente que o fato de eu estar sugerindo perdão pela ONU aos Vingadores foragidos não está ajudando o meu caso. Eles sabem que precisaremos desses heróis mais cedo ou mais tarde, mas têm medo de ceder e serem provados errados.

James suspirou e recostou no sofá.

Prisma era muito nova. Por mais habilidosa que fosse, ainda sim era muito nova. James ainda lembrava-se daquele bebê de bochechas rosadas e brilhantes olhos castanhos que ele segurou em seus braços horas depois do nascimento. Do sorriso sem dentes, das fraldas que ajudou a trocar, de como, por um momento, ele teve a esperança de que Prisma seguisse os seus passos no Exército e como ficou aliviado quando ela não o fez. Porque ao mesmo tempo em que sabia que ela seria um grande soldado, ficava apavorado que ela entrasse na frente de combate. Prisma já tinha lutado demais para uma vida inteira e Joana fez Tony e James prometerem que garantiriam que a filha teria uma vida normal, mesmo que ela não fosse normal.

O Exército levaria Prisma para longe dos EUA, a manteria segura dos monstros que gostavam de caçar a sua raça, mas também a colocaria em outros tipos de perigo. E ao mesmo tempo que Prisma era jovem, ela era velha demais. A idade era um fator que a ajudou neste caso. Semideuses não costumavam sobreviver a adolescência porque se este milagre acontecia, eles pouco a pouco tornavam-se amadurecidos o suficiente para o seu cheiro ficar enfraquecido ao olfato dos monstros. Ao que parecia, os hormônios da puberdade eram um agravante para que um monstro conseguisse farejar um semideus, esses deixavam o cheiro deles mais forte. A idade adulta e o fim da puberdade trazia segurança, tornava o cheiro tão enfraquecido que não fazia mais desses semideuses um alvo, embora incidentes pudessem ocorrer vez ou outra.

Mas, por mais amadurecida que estivesse, por mais mulher feita que fosse, Prisma, aos olhos de James, ainda seria aquela garota de joelhos ralados, sorriso banguela e olhar traquinas. A garota que, para o desagrado de James, foi mandada muito cedo para o Acampamento Meio-Sangue. James discutiu por dias com Joana sobre isto, Tony também. Prisma só tinha oito anos, ainda estava segura. Ela estudava em casa, com tutores que passaram pelo crivo extenso de Tony e James, o condomínio que morava era vigiado vinte e quatro horas do dia por JARVIS. Ela tinha tempo. Mas um único momento em que toda essa precaução falhou e Joana pirou.

Prisma não estava preparada para o ataque, pois ela ainda vivia na ilusão de que era uma menina normal, filha de um pai que abdicou de sua responsabilidade e deixou todo o peso de criá-la nas costas da mãe. Ela não sabia que em suas veias havia sangue divino. Ela não sabia quem era, até que um tutor conseguiu driblar o crivo de Tony e atacou. Prisma somente sobreviveu por sorte. Instintos enraizados em seu DNA lhe garantiu a vitória sobre a estranha criatura, mas foi o suficiente para fazer Joana decidir que era hora de parar de guardar a filha dentro de uma redoma de vidro e prepará-la para o pior.

Depois desse dia, Prisma foi despachada para o Acampamento para tornar-se moradora permanente do local, retornando para visitar a família somente durante as férias de verão. E nem mesmo as visitas eram durante as férias inteiras. O afastamento fez James perder anos da vida daquela garota que ele viu nascer. Em um piscar de olhos, ele viu uma menina partir para Nova Jersey, em outro piscar, ele viu uma mulher voltar. E até hoje ele não conseguia assimilar direito uma com a outra.

— Você precisa de aliados. – James declarou ao ver um ar cansado começar a rodear Prisma. Fazia uns seis meses que ela estava nesta luta incessante e sem pausas para respirar, e o excesso de trabalho estava começando a aparecer no rosto dela. As marcas do cansaço que nem mesmo a maquiagem conseguia esconder. – Já falou com T'Challa? – Prisma mirou James como se ele fosse um imbecil.

— Está falando do rei que está abrigando um certo grupo de foragidos que são a causa da maioria das minhas dores de cabeça? – ela falou com deboche e James riu.

— O falecido rei T'Chaka foi o precursor do Tratado. T'Challa pode não estar participando ativamente do assunto no momento, a abertura comercial e política de Wakanda para o mundo deve estar ocupando todo o tempo dele, mas não acredito que ele tenha renunciado ao Tratado. Wakanda ainda é um dos países assinantes.

— Sim. Mas um dos países que permaneceu isolado por tanto tempo que não terá nenhuma voz no conselho da ONU.

— Melhor ainda. Se Wakanda esteve isolada, significa que é um território neutro. Wakanda não teria razão para participar do Tratado já que o isolamento dela a fez parecer que o que acontecia com o resto do mundo não era de seu interesse. A participação no Tratado é uma forma de dizer que ela esta pronta para socializar e que ela se importa com as preocupações que o mundo está sofrendo no momento. A ONU irá ouvir Wakanda. – Prisma esfregou as têmporas com as pontas dos dedos e soltou um longo e sofrido suspiro.

— FRIDAY? – ela chamou.

— Sim, chefe?

— Por favor me diga que Tony tinha T'Challa na discagem rápida.

— Fazendo a ligação. – James sorriu, um sorriso que Prisma retribuiu. T'Challa era um jovem rei de um país rico e orgulhoso. Prisma somente esperava que ele não fosse uma versão mais jovem e muito mais teimosa de Tony Stark.

 

ANTES

 

— Eu sei porque você está aqui e por isso peço educadamente que vá embora. – Prisma piscou repetidamente para o homem atrás do balcão. Luke Cage era extremamente bonito, uma visão, com expressão serena e olhar tranquilo, mas ela sabia exatamente o que aqueles músculos podiam fazer e o que ele podia fazer se ficasse irritado.

— Se soubesse, então já teria servido o Bloody Mary que eu estou doida para beber. – o rosto de Luke torceu-se levemente em desagrado, mas ele não moveu um centímetro de onde estava. Porém, o seu olhar deixou de ser tranquilo e tornou-se desafiador.

— Eu te conheço, a vi pela TV, e sei exatamente que você não veio parar neste buraco, vinda de Manhattan, por causa de uma bebida. – Prisma sorriu largamente para ele, um sorriso de dentes brancos, perfeitos e completamente inocente. Um sorriso que apenas tornou a expressão de Luke mais fechada.

— Deixe-me ver se eu adivinho: você considera o Tratado opressor e somente uma forma do governo de controlar os que eles estão chamando de Inumanos e outros heróis, certo? – Luke não disse nada, não precisava, a cara dele dizia tudo. Prisma soltou um “hum” do fundo da garganta. – Você leu o Tratado? Não, com certeza não, porque o documento encontra-se em revisão no momento e aquilo que foi disponibilizado para o público é uma versão antiga e não mais válida. Mas vamos ser sinceros aqui... Estamos falando de 135 países, não governos, países. Ou seja, governantes e governados que são a favor do Tratado. É muita gente com segundas intenções querendo controlar os Inumanos e outros heróis, não acha?

Prisma podia ver nos olhos de Luke que ele ainda não estava feliz por ela estar ali, mas que ele começava a compreender o cenário geral da situação.

— Eu entendo a sua aversão sobre o assunto, entendo mais ainda que não é exatamente por você que você está com medo.

— Os Vingadores foram presos simplesmente porque foram contra o Tratado. – Luke a interrompeu e Prisma trincou os dentes em um sorriso falso enquanto contava até trinta mentalmente.

— Querido, você já deveria ter aprendido que a mídia não é confiável. Os Vingadores foram presos porque violaram leis. Por exemplo, se eu quebrar uma garrafa na cabeça do cara atrás de mim e que desde que eu cheguei aqui não para de olhar para a minha bunda, com certeza uma confusão começaria, você chamaria a polícia, eu seria presa preventivamente, seria solta com o pagamento de uma fiança, seria julgada e talvez condenada. Você sabe como é o procedimento. – ela continuou sorrindo, mesmo diante da expressão cada vez mais azeda de Luke.

— Pelo que sei. – ele se afastou do balcão e cruzou os braços sobre o peito largo. Jessica Jones, mulher de sorte. – A prisão dos Vingadores foi ilegal. – Prisma deu de ombros e recolheu um punhado de guardanapos de dentro de um copo, começando a dobrá-los em formas assimétricas.

— Nenhuma lei, em seus estágios iniciais, é perfeita. Mas a prisão ilegal foi resolvida, a pessoa que os prendeu ilegalmente foi devidamente punida e agora o Tratado está sendo revisado para garantir que isto não aconteça de novo.

— Perfeito. Eu entendo tudo o que você está dizendo. O que eu não entendo é o que você faz aqui. Esse Tratado não tem nada a ver comigo... ou Jessica. – Prisma riu brevemente e largou os seus origamis mal feitos de lado.

— Luke Cage, Jessica Jones, vocês não são heróis, mas também não conseguem fechar os olhos para o que acontece ao seu redor. Uma hora ou outra vocês vão querer ajudar, vocês já ajudaram, e quando isto acontecer, a vontade de vocês de querer exercer um bem maior vai bater de frente com a vontade do Tratado. E aí, como ficamos? Espero que você esteja disposto a passar outra temporada na cadeia, se pretende ser tão teimoso.

— Você ainda não explicou o que quer aqui. – Luke disse, inclinando-se sobre o balcão, apoiando os cotovelos neste e colocando o seu rosto bem próximo do de Prisma, que sorriu. Era uma posição de abertura, uma posição que mostrava que agora ele estava disposto a ouvir a proposta dela.

— O documento original do Tratado é falho e foi promulgado com muita rapidez. Após o fiasco em tentar fazer todos os Vingadores assinarem, e o fiasco que foi Thaddeus Ross, a ONU percebeu que precisaria rever algumas coisas. O Tratado em si era uma ideia crescente, mas que só foi posto em prática depois do incidente de Sokovia, por isso do nome. Uma lei deste porte, de abrangência mundial, não tem como ser redigida as pressas, antes que outro ataque aconteça. E eles nem ao menos consultaram todas as pessoas que ela afeta. Apenas escreveram e esperaram que ambas as partes concordassem com o assunto, quando uma das partes nem fazia ideia de que o Tratado estava sendo redigido.

Prisma abriu a bolsa e tirou de dentro dela dois cartões de visitas, deslizando-os por sobre o balcão, na direção de Luke.

— Um dos cartões é o endereço de um servidor onde o documento encontra-se. O login e a senha no cartão é de uso privado, pertencem somente a você. Espero que você consiga convencer a srta. Jones a dar a sua opinião sobre o assunto. Outros heróis também estão dando as suas sugestões de melhoria e quando eles terminaram, eu vou revisar tudo, acolher o que é viável legalmente, entrar em contato para informá-los do novo texto para uma nova revisão da parte de vocês e quando todos entrarem em comum acordo, quando todos estiverem satisfeitos, eu encaminharei o novo Tratado para a ONU. Peço que não demore muito para fazer as alterações, a ONU me deu apenas um mês para apresentar as novas propostas. O outro cartão é para caso você precise entrar em contato comigo. Se aceitar assinar o Tratado, após as melhorias, você será automaticamente representado pela Doherty, Lawson e Associados.

— Se eu aceitar assinar o Tratado serei considerado um Vingador?

— Não exatamente. Juridicamente sim, você será incluído na iniciativa Vingadores como parte não ativa. Foi a única maneira que encontramos de colocá-los como clientes da Doherty, Lawson e Associados. Mas isto não quer dizer que você será um Vingador, a não ser que a coisa esteja realmente feia e precisarmos muito da sua ajuda, mas você ainda terá a opção de negar o pedido. – Luke recuou, levando com ele os cartões.

— O mesmo vale para Jessica.

— Sim.

— Um mês, você disse.

— Um mês eu tenho para apresentar a proposta final. Você tem 72 horas.

— A questão é: se a coisa realmente ficar feia e vocês precisarem da minha ajuda, de que ela valerá se vocês não têm os outros Vingadores? – Prisma recolheu a sua bolsa e levantou do banco, ajeitando o seu terninho calmamente.

— Eu ainda estou trabalhando nisto. – declarou, antes de despedir-se de Luke e deixar o bar.

Da lista de heróis que Tony lhe deixou, Luke Cage e Jessica Jones eram uns dos últimos a serem contatados. Porque conforme as próprias anotações de Tony, eles seriam os mais difíceis de serem convencidos. Mas Prisma puxou os históricos deles e percebeu que para convencer Jessica, bastava convencer Cage.

Agora ela iria para o último e mais difícil da lista, porque ele era um advogado como ela, e tão bom quanto ela, quando não estava fantasiado de pseudo-demônio, pulando de telhado em telhado enquanto dava umas boas porradas nos criminosos de Hell's Kitchen.

Hell's Kitchen? Talvez a fantasia de demônio fosse apropriada.

 

AGORA

 

T'Challa estava fascinado. A jovem contratada pela iniciativa Vingadores para representá-los perante a ONU não era de fácil intimidação, mesmo diante das perguntas que o Conselho jogava sobre ela, para questionar as alterações que ela propunha para o Tratado, Grey os respondia com calma e apoiando-se em estatísticas e expressões legais como se ela tivesse conhecimento de cada lei existente no mundo. Ou soubesse exatamente o que a ONU pensaria e como destruir com antecedência as muralhas que eles estavam tentando construir, para impedir essas mudanças, antes mesmo que o primeiro tijolo fosse colocado.

Quando ele recebeu a ligação, três dias atrás, ficou surpreso.

Fazia meses que ele não ouvia falar de Tony Stark, por isso esperou ao menos ver o rosto do outro empresário na tela de seu telefone. O que surgiu foi uma jovem que possuía uma suave semelhança com Stark, pois ambos tinham os mesmos cabelos escuros, os mesmos grandes olhos castanhos, o mesmo ar arrogante e seguro de si. Prisma Grey, foi como ela se apresentou, advogada da Doherty, Lawson e Associados, firma que representava legalmente a iniciativa Vingadores.

— Não farei rodeios com o senhor, majestade. Pretendo alterar o Tratado, pretendo trazer os Vingadores de volta para casa, pois eles são um mal necessário. Mas a ONU, depois de Viena e Alemanha, está mais relutante do que nunca. Mais países entraram na lista de proponentes e a sua maioria quer cláusulas ainda mais rígidas. Acho válido a ONU querer se precaver, mas ela está esquecendo algo: os Vingadores são cidadãos deste planeta. O Tratado está os excluindo legalmente de vários direitos que eles possuem no momento em que nasceram em qualquer país desta Terra. A ONU está vendo apenas os superpoderes, os heróis, mas não as pessoas por detrás desses heróis. É isto que eu estou tentando mudar, mas eu preciso de muito mais que argumentos legais e palavras bonitas e estatísticas e fatos. Eu preciso de um país me apoiando. E que, de preferência, este país traga outros.

— Por que a senhorita não começou com os EUA? – T'Challa perguntou. Era lógico, pois mais da metade dos Vingadores eram cidadãos americanos. Prisma sorriu debochada.

— Está falando do país que está sofrendo severas represálias porque metade dos Vingadores são cidadãos americanos e portanto era função dos EUA, em primeiro lugar, ter controle sobre eles? O país cujo Secretário de Defesa acabou de ser demitido e cujo presidente está sendo investigado porque Ross não pode ser agido sozinho, já que o que ele faz precisa de autorização do chefe do executivo?

— Secretário de Defesa que você ajudou a demitir e mandar para a cadeia. Posso estar um pouco ocupado com outras questões governamentais, mas não estou tão desatualizado do mundo. – o sorriso de Prisma ficou ainda mais largo.

— Foi necessário. Ross era uma pedra no caminho que precisava ser tirada.

— Concordo. Então, – T'Challa recostou em sua cadeira. – os EUA não são uma opção de apoio, mas Wakanda sim. Não somos um país grande e a nossa imersão neste novo mundo globalizado é recente.

— Isso mesmo. Vocês não são um país grande, mas temos que admirar o fato de que Wakanda desenvolveu-se de forma espetacular, tanto financeiramente quanto culturalmente, sem influências externas. E agora a abertura política e economica do país está fazendo outras nações salivarem por acordos comerciais. Nações com as quais vossa majestade pode barganhar. Contratos em troca de apoio para o Tratado.

— A senhorita possui uma boa lábia, acho surpreendente que precise de ajuda.

— Lábia não basta se não tenho poder nenhum em minhas mãos exceto um vasto conhecimento legal. O senhor, no entanto, tem um país inteiro.

— Verdade.

— Então?

— Quando será o seu encontro com o conselho da ONU?

— Será em três dias, em Genebra. Encaminharei para o senhor o horário e o local.

— Então nos encontraremos lá.

Como prometido, três dias depois T'Challa estava em Genebra, esperando por Prisma, com representantes do Marrocos, Egito e Turquia. Os primeiros países a entrarem em contato com Wakanda após a abertura econômica e que releram o Tratado e consideraram a proposta muito interessante. O próprio T'Challa estava surpreso com o tanto de alterações que o acordo sofreu.

Agora estavam todos dentro do enorme auditório, com Prisma parada atrás do púlpito, discorrendo sobre todas as vantagens que o novo Tratado viria a trazer para todas as partes interessadas.

— Ainda sim... Perdoar os Vingadores dos crimes cometidos no último ano. – o representante da França ainda parecia duvidoso, assim como muitos outros.

— Não há crime sem lei prévia que o defina. – Prisma declarou. – Muitas das ditas violações cometidas pelos Vingadores não se enquadram em nenhuma lei internacional e ao mesmo tempo em várias. Os Vingadores são uma força especial a parte, que apesar de sediados nos EUA, não respondem a nenhum governo em específico. Até agora. Se os Vingadores desejam servir ao povo, garantindo a sua segurança, então precisam ouvir o povo e atender as suas vontades. E a maior representação existente do povo são os senhores, são as Nações Unidas. O Tratado é uma garantia legal de que a partir de agora as ações que causem dano ao bem estar mundial sejam devidamente punidas, respeitando os direitos de todos os envolvidos, inclusive dos Vingadores. Mas antes disto, por não ter lei válida para punir estas ações de caráter especial, o perdão dos crimes é um caminho viável.

— Mas e quanto aos crimes cometidos na Alemanha? – o próprio representante da Alemanha declarou. – Capitão América causou estragos materiais e emocionais enormes. Violou as nossas leis e você quer que nós simplesmente esqueçamos isto?

— Óbvio que não. Capitão América, se ele realmente é tudo isto o que dizem dele, além dos belos olhos azuis – alguns pessoas riram as costas de Prisma. – irá se responsabilizar pelos seus atos. Mas isto não poderá ser feito enquanto ele estiver foragido e enquanto não houver garantias que a sua equipe estará legalmente respaldada quando retornarem para solo americano.

— Capitão América não deveria nem ter sido escolhido líder dos Vingadores. Ele tem pouca experiência de combate, ou maturidade para isto. Fora que ele é um homem de valores de décadas passadas, não acompanhou a evolução mundial, simplesmente foi atochado com essas informações e esperaram que ele absorvesse tudo e se tornasse um homem do século vinte e um. Quem permitiu tamanho absurdo? – Espanha protestou.

— Concordo. – Prisma declarou, para a surpresa do representante. – E garanto que Capitão América receberá a punição administrativa procedente aos seus atos. A iniciativa Vingadores é uma organização independente, mas toda e qualquer organização possui regras passíveis de punição se violadas. Os Vingadores não são diferentes.

— E quanto ao Homem de Ferro? – Itália. Prisma detestava a Itália, ela era sempre tão questionadora.

— O que tem o Homem de Ferro?

— O que foi feito dele?

— O Vingador Tony Stark, conhecido como Homem de Ferro, encontra-se em hiatus.

— Disso sabemos, todo mundo sabe. Isto é que as Indústrias Stark vêm nos dizendo no último ano. Mas a senhorita há de convir que o desaparecimento de Stark é suspeito e no mínimo preocupante.

— Por que disto, senhor representante?

— Stark é uma bomba relógio, como todos os seus amigos, portanto o seu sumiço é alarmante. – Prisma inspirou profundamente. Ela sabia que chegaria a este ponto, pois em todas as reuniões que teve com a ONU no último ano, esta pergunta sempre pipocava: onde estava Tony Stark?

Ela correu o dedo sobre a tela do tablet na sua frente e acionou alguns links. Prontamente, a imagem no tablet foi reproduzida pelo telão usado para demonstrativos, naquela reunião.

— O que é isto? – Inglaterra perguntou ao ver um laudo na tela.

— Isto, senhores, é o relatório médico do sr. Stark, obtido na última batalha quando ele tentou apreender os seus companheiros em Leipzig e na Sibéria.

Porque Zemo agora estava mais calado do que nunca. E apesar de ter revelado que houve um confronto entre Capitão América e Homem de Ferro na Sibéria, ele não disse a verdadeira razão deste confronto, porque agora a mesma não servia de nada. Com Ross fora da jogada, Zemo não tinha mais moeda de barganha. E com a reputação dos Vingadores arruinada, ele conseguiu o que queria, que era destruir a equipe. Então, para ele, não fazia diferença revelar esta informação. E o silêncio dele gerou interpretações. A maior delas é que Tony foi tentar apreender Capitão América de novo, encontrou resistência, acabou perdendo a batalha e Rogers e Barnes conseguiram fugir. T'Challa, que havia seguido Tony porque ainda estava movido pelo desejo de vingança, chegou já no final de tudo e apenas no momento certo para capturar Zemo. E história termina aí. Ao menos para o público, a história termina aí.

— Como podem ver, os danos sofridos por Tony não foram poucos. Foram materiais – nisto Prisma olhou diretamente nos olhos do representante da Alemanha. – e emocionais. E conforme coletiva de imprensa prestada por Virgínia Potts, o afastamento de Tony consiste em tratar-se de todos esses ferimentos. E creio que isto é um ponto positivo. O conselho referiu-se a Tony como uma bomba relógio, o fato dele estar procurando ajuda profissional é uma garantia de que ele está disposto a desativar esta bomba. E conforme o pedido que eu entrei junto aos senhores, a minha requisição pelo perdão dos Vingadores esta sendo feita sob consideração legal e emocional. O perdão valerá após assinatura do Tratado. Caso negado, os Vingadores irão entregar-se de boa vontade a Justiça onde serão processados de forma justa e idônea. Retornando ao serviço como Vingadores, todos irão passar por avaliações psicológicas periódicas, além de tratamento obrigatório para aqueles considerados temporariamente inaptos ao serviço, e os relatórios serão encaminhados diretamente para a ONU que irá permitir ou vetar a atuação deles conforme as informações obtidas.

Os representantes começaram a conversar entre si em sussurros até que Portugal, que era o presidente da mesa naquela reunião, anunciou:

— Faremos um intervalo de duas horas para que os representantes possam discutir a portas fechadas a sua decisão final. – declarou e todos levantaram-se da mesa e saíram do auditório por uma porta lateral. A imprensa e outros países não integrantes da ONU e observadores saíram pela porta principal, deixando apenas T'Challa e Prisma para trás, fora alguns seguranças e pessoal da limpeza que começaram a arrumar as coisas enquanto ocorria este intervalo.

Prisma recolheu o seu material e foi sentar-se ao lado de T'Challa, na primeira fileira do auditório.

— Acha que a ONU irá aceitar a minha proposta? – perguntou. T'Challa havia pronunciado-se logo no início da reunião, sendo o porta-voz não apenas de Wakanda, mas dos outros países que o apoiava, dizendo que estava de acordo com o novo Tratado e que o apoiava. Depois disto, Prisma tomou o palco e começou a tecer as suas considerações do porquê era o melhor para todos o novo documento ser aprovado.

— Há grandes possibilidades da ONU aceitar as suas requisições. Você argumentou bem. O problema...

— São os Vingadores. – Prisma suspirou. A ONU era o de menos no momento. O pior seria os Vingadores, aquele bando de idiotas cabeças duras. Mas ela precisava que eles fossem perdoados, porque isto significaria que ela conseguiu amolecer a ONU o suficiente para assim que os Vingadores estivessem de volta aos EUA e provando para o mundo que estavam dispostos a brincar com este como crianças bem comportadas, ela iria por em prática a última parte do pedido de Tony:

Anistiar James Buchanan Barnes.

T'Challa e Prisma ficaram em silêncio por alguns minutos, enquanto Prisma retirava os saltos e massageava as solas dos pés. Ficar em pé por horas em um salto quinze não era para qualquer um.

— Onde está Stark, srta. Grey? – Prisma não estava surpresa com a pergunta do rei, porque ele não era imbecil em acreditar que Tony estava em um spa tratando de suas feridas e simplesmente ter deixado o trabalho difícil na mão de terceiros. Qualquer pessoa que conhecia minimamente Tony Stark sabia que ele não era homem de admitir que estava magoado. Não, ele engolia a dor, dava um sorriso fingindo que estava tudo bem e continuava em frente como se nada disso o estivesse destruindo pouco a pouco por dentro.

Prisma suspirou, cansada.

— Bem. – respondeu. – Eu espero.

 

ANTES

 

— Quando que você iria me dizer que Stark é um semideus? – Prisma piscou repetidamente. Fazia tantas horas que estava olhando para a tela daquele laptop que já estava vendo tudo em dobro. Na porta do elevador estava Will, que não sabia se dirigia-se a ela ou olhava embasbacado para o oficina a sua volta. No final das contas, Prisma abdicou do escritório pela oficina. Trocar ideias com FRIDAY e DUM-E a ajudava a planejar melhor os seus passos.

— O quê?

— Stark. – Will saiu de seu estupor e foi na direção de Prisma. – Semideus. Quando você iria me dizer?

— Como você descobriu?

— Alguns testes... – Prisma ergueu a mão em um gesto de pare.

— Deuses não têm DNA, então não venha tentar me convencer que um simples exame de sangue lhe deu essa resposta.

— Deuses não têm DNA, mas algo na “genética” deles não permite que nós sejamos completamente humanos. São coisas mínimas que se você não souber que estão lá, não encontra. Eu passei anos sendo médico no Acampamento Meio-Sangue e sempre achei fascinante como a nossa fisiologia é diferente dos mortais. Somos mais resistentes, mais fortes, se sobrevivermos a adolescência, nossa expectativa de vida é bem maior que a normal, alguns de nós possuem poderes extraordinários. Habilidades além da compreensão mortal. Mas, ao mesmo tempo, somos igualmente frágeis.

— Você me perdeu no “somos mais resistentes”.

— Capitão América. – Will disse com um sorriso e Prisma franziu as sobrancelhas. Capitão América não era o seu assunto favorito no momento. – Os EUA fizeram uns experimentos loucos para conseguirem criar o Capitão América. Os semideuses são a versão natural do cara. Quero dizer, tipo, alguns semideuses equivalem a meio Capitão América. Outros a um Capitão América inteiro. Outros a 1/3 do cara, é uma questão de porcentagem. Acho você é um Capitão América inteiro. O que significa que, se vocês batalharem, vão estar em pé de igualdade.

— Bom, porque eu estou querendo socá-lo desde que comecei neste trabalho. – Will riu.

— Os filhos dos três grandes talvez sejam dois Capitãs? 1/2 quem sabe? Porque temos também os poderes extraordinários associados a eles.

— E notou que você mudou de assunto? O que o Tony ser um semideus importa?

— Sim. Eu vi que ele tem traços semelhantes a semideuses, mas ao mesmo tempo não. Importa de explicar?

— Tony é descendente. Howard era neto de Hefesto. Maria era filha de Atena. – por isso que Tony não ficou nada surpreso quando Joana lhe contou que o pai do bebê que esperava era o deus Ares.

Will arregalou os olhos.

— Putz! O melhor dos dois mundos. Por isso que ele é O Tony Stark. Mas o fato dele ser um semideus muda tudo, todas as fórmulas que Bruce, Helen e eu estamos trabalhando terão que ser refeitas.

— O que significa que vai levar mais tempo para conseguirmos ajudá-lo. O que significa que as coisas estão piorando para o lado dele.

— Não necessariamente. A descendência dele explica como Tony conseguiu sobreviver a tudo que viveu até agora, e também nos dá chances e esperanças de que ele possa melhorar, talvez até mesmo sem o Extremis.

— Como assim?

— Eu vou começar um tratamento com ambrosia. Continuaremos trabalhando com o Extremis, mas talvez a ambrosia sozinha surta efeito.

— E se não surtir? – Will deu de ombros.

— Que os deuses nos ajude.

Isto não era confortador.

 

AGORA

 

Os Vingadores entraram na sala um por um, cumprimentando T'Challa de forma polida, devida a alta posição que ele ocupava, e sentando nas cadeiras vazias ao redor da mesa. Steve Rogers foi o último a entrar e fechar a porta as suas costas, sentando na cadeira oposta de onde T'Challa e Prisma estavam, na cabeceira daquela mesa ovalada.

Nos olhos de Wanda e Scott havia um pouco de medo, Prisma notou. Provavelmente porque eles estavam surpresos em vê-la ali, surpresos por ela saber onde eles estavam, imaginando que se ela sabia onde eles estavam este tempo todo, por que não Tony Stark? Prisma sorriu discretamente para eles, o que aumentou o medo em seus olhos quando eles tiveram as suas suspeitas confirmadas. Afinal, a informação de que os foragidos estavam em Wakanda vieram realmente de Tony. E era bom mesmo eles terem medo. Medo era algo que Prisma poderia usar em sua vantagem.

Sam Wilson possuía apenas uma pequena curiosidade estampada em seu rosto e Prisma não o detestava tanto quanto os outros. Wilson tinha um histórico militar exemplar e o seu trabalho no centro de veteranos mostrava que ele era a criatura que tinha mais bom senso entre todos ali. O sorriso que Prisma deu para ele foi em um tom mais amigável, pois era bom ter Wilson ao seu lado. Ele não sorriu de volta, mas a curiosidade permaneceu em seu rosto.

Clint Barton emanava pura raiva. Prisma viu as gravações do RAFT e as palavras duras que o agente proferiu para Tony, e na opinião dela, Clint Barton era um idiota. Que tipo de homem se diz aposentado e na primeira ordem do Capitão América larga mulher e filhos para trás para seguir um homem que não fazia ideia do que estava fazendo? E depois ousava culpar terceiros por sua burrice? Para ele, Prisma não sorriu, apenas arqueou as sobrancelhas em desafio e Clint bufou, desviando o olhar.

Prisma sabia que ficou famosa, a sua batalha no último ano lhe deu o apelido de “Tubarão Branco”, porque as pessoas no começo, principalmente a imprensa, acharam que ela seria comida viva pela politicagem por detrás do Tratado, por detrás de toda essa confusão que foi nomeada de “Vingadores: Guerra Civil”, quando o que aconteceu foi o contrário. Provavelmente, quando eles a viram pela primeira vez, a associaram ao esteriótipo da mulher bonita e burra, esteriótipo que ela destruiu rapidamente e fez todos perceberem que ela se encaixava mais na categoria “bonita e letal”. Clint não aceitar o desafio dela era prova que ela criou fama o suficiente até para intimidar, um pouco que fosse, um agente renomado da SHIELD.

Agora Steve Rogers... Rogers era uma mistura de tudo: medo, raiva e curiosidade. Os olhos azuis iam de T'Challa para Prisma e voltavam para T'Challa, em um gesto nervoso. Rogers não parecia ter mudado nada neste último ano, nenhum deles parecia ter mudado nada e Prisma fechou os punhos com força sob a mesa, ferindo as palmas das mãos com as suas unhas manicuradas, ao ver que os Vingadores foragidos pareciam muito bem. Com um leve ar de cansaço, mas saudáveis, enquanto Tony estava definhando em uma cama de hospital, nas profundezas da Torre Stark, esperando por um milagre.

— Senhores, creio que vocês conhecem a srta. Prisma Grey. – T'Challa iniciou aquela reunião, que prometia ser tensa, com as tradicionais introduções.

— A mulher que nos chamou de malucos em rede mundial. – Clint alfinetou com um sorriso debochado e Prisma apenas sorriu serenamente, religou o seu tablet e clicou em um dos ícones na tela, o abrindo.

— Não agente Barton, eu não os chamei de malucos, eu apenas atestei os fatos. Os Vingadores são mentalmente instáveis. – isto foi o suficiente para começar vários protestos ao redor da mesa, Clint principalmente era o mais exaltado, Steve tentava convencê-la do contrário, Sam estava curiosiamente quieto enquanto Wanda e Scott diziam coisas que, sinceramente, não tinham a menor relevância para Prisma. – Dra. Annalise Queen. – o nome foi o suficiente para fazer Barton e Rogers calarem a boca. A reação dos dois homens foi o suficiente para calarem Scott e Wanda também. Prisma sorriu tranquilamente. – Segundo a dra. Queen, e eu cito, “o agente Barton está impossibilitado de retornar a campo sem o devido tratamento. Os traumas obtidos devido a “possessão” do indivíduo conhecido como Loki são a principal fonte dos transtornos psicológicos que o agente Barton apresenta no momento. Entre eles: paranoia, insônia, terrores noturnos e propensos acessos de raiva”. Devo continuar?

— Esses arquivos são confidenciais. – Clint rosnou entre dentes.

— São? Para o público. Como advogada dos Vingadores, nada é confidencial para mim. – Prisma clicou em outro ícone no tablet. – A dra. Queen também foi quem avaliou o capitão Rogers após o seu descongelamento. “Capitão Rogers sofre de estresse pós-traumático, desassociação emocional, afunilamento psicoemocional, insegurança, uma profunda vontade de se provar e tendências suicidas”. – Steve parecia querer sumir sobre a cadeira, ainda mais quando todos os olhares foram parar sobre ele. – Não senhores. – Prisma explicou, chamando a atenção dos Vingadores para si. – O capitão Rogers não irá cortar os pulsos, tomar uma quantidade absurda de remédios ou pular do alto de um prédio sem paraquedas. As tendências suicidas estão atreladas a desassociação emocional. Tudo o que Rogers conhecia e amava ficou em 1944 e, aparentemente, ele possui uma certa dificuldade de conectar-se com novas pessoas porque a insegurança não o permite. O medo de perder tudo de novo o faz ser um pouco travado e desapegado quando o assunto é a sua própria segurança. Porque se ele morrer em combate, ao menos ele não correrá o risco de ver os amigos morrendo de novo.

— Afunilamento psicoemocional? – Wanda perguntou com uma voz miúda e Prisma viu que Rogers parecia bem menor do que realmente era.

— Rogers tem a tendência a apegar-se a uma ideia e não soltar dela, ignorando tudo e todos a sua volta, ignorando sugestões e ofertas de ajuda. Creio que vocês já testemunharam este afunilamento. Quantas vezes Rogers perdeu a noção da realidade quando o nome “Bucky” foi mencionado? – mais uma vez todos os olhares foram para Steve. – A dra. Queen definiu Rogers como “não aprovado para o serviço”, exceto se, como Barton, ele passasse por tratamento e avaliações periódicas para ser medida a evolução dele. Mas Fury ignorou isto tudo em favor de um “bem maior” e veja só no que deu.

— E quanto a Stark? – Prisma desviou a atenção de Steve, que queria desaparecer na cadeira, mas não conseguia, para Clint que ainda tinha a expressão azeda de quem estava querendo arrumar briga, o que era realmente uma graça, porque arrumar brigas sempre foi uma constante na vida de Prisma. Ela cresceu no Chalé 5, onde a definição de entretenimento de seus irmãos era acordar uns aos outros, no meio da madrugada, com ataques surpresas. Sempre Alerta, era o lema deles, e Prisma tinha as cicatrizes para provar que na maioria das vezes ela saiu vencedora desses embates.

— Os problemas do sr. Stark têm problemas e isto não é segredo para ninguém. Psicólogos fizeram teses em cima de Tony Stark e a maioria deles chegaram bem perto da realidade. Mas Tony Stark é um civil não treinado que optou colocar-se em risco por um bem maior, o que significa que ele não teve a preparação mental requerida para este tipo de profissão. O senhor pode dizer o mesmo, agente Barton? – isto calou a boca de Clint em um segundo. – Alguém mais quer alfinetar o bilionário que não está aqui para se defender, ou podemos ir ao ponto principal desta reunião?

— Sabemos porque você está aqui. – Steve desistiu de virar uma cadeira e finalmente ergueu os ombros e readiquiriu a postura arrogante que fazia os outros o chamarem de líder, mas para Prisma ela só via um moleque que não tinha ideia do que estava fazendo. – Sabemos, também, que você consultou outros heróis para elaborar o novo Tratado, mas não nos consultou.

— Foragidos não têm direito a voz, Rogers. Deveria ter pensado nisto antes de violar várias leis internacionais. Além do mais, a sua chance veio e se foi há um ano, quando você simplesmente disse não ao Tratado de Sokovia sem nem ao menos ler uma linha deste.

— Eu tinha assuntos mais importantes para serem resolvidos! – Steve protestou.

— Quando você diz “assuntos”, eu devo interpretar como “Bucky”. – Prisma alfinetou e Steve franziu a testa em desagrado.

— Entendemos que algumas de nossas atitudes foram precipitadas. – Sam manifestou-se em um tom calmo e diplomático. – Mas tínhamos informações de que a polícia tinha ordens de atirar para matar e estávamos tentando evitar o pior, como a morte de um homem inocente que nada mais é do que uma vítima de guerra, não esse monstro que todos pintam. – Prisma soltou um “hum” do fundo da garganta, recolheu o tablet de sobre a mesa e recostou na cadeira, acionando alguns ícones no aparelho. As costas dela, a televisão da sala ligou e números de um relatório surgiram na tela.

— Cinco policiais hospitalizados, dois mortos. Este foi o seu “evitar o pior”? Além do mais, como militar, me esclareça quais são as regras em caso de perseguição a um terrorista conhecido? Um terrorista que aos olhos do povo era responsável por um bombardeio que feriu e matou autoridades mundiais, além de uma longa lista de crimes no decorrer dos últimos 70 anos.

Sam suspirou em um gesto cansado, mas mesmo assim respondeu:

— Atirar em caso de ameaça confirmada.

— Atirar para ferir, ou para matar. A regra não foi criada única e exclusivamente para Barnes, ou por causa dele. – Prisma praticamente fuzilou Steve com olhar, pois o homem tinha aberto mais uma vez a boca para falar, quando naquele momento o melhor que ele poderia fazer era ficar quieto. – Devo também mencionar os feridos e as baixas do engavetamento e desmoronamento do túnel em Berlin? Ou dos milhões de dólares em danos a propriedade no aeroporto de Leipzig? E vocês se perguntam por que da necessidade do Tratado. Por isto. Porque se vocês forem acessar o Twitter, o Facebook, o que for, verão grupos, hashtags, pessoas pedindo a cabeça de cada um de vocês em uma bandeja de prata. Linchamento público, enforcamento. No caso da bruxa, queimar na fogueira em praça pública. A imagem de vocês está além do lixo, sr. Wilson, está tão queimada que talvez seja impossível resgatar alguma coisa das cinzas. Assinar o Tratado é o humilde pedido de desculpas de vocês. Então não, vocês não têm mais direito a opinar sobre o mesmo.

— O Tratado é uma prisão legal! – Steve protestou e Clint concordou com ele. Scott e Wanda tinham a expressão de incerteza daqueles que estavam considerando a proposta e Sam mostrava que a compreendia só pelo olhar. Mas Tico e Teco insistiam em querer contrariar tudo. Prisma evitou rolar os olhos e soltar um bufo.

— Sei que o rei T'Challa – que mantinha-se quieto durante toda aquela reunião. – já havia os informado da premissa desta reunião e lhes passado cópias do Tratado. Vai me dizer que, mais uma vez, vocês estão se negando a assinar o documento sem nem ao menos lê-lo?

— Você precisa compreender que se algum país estiver sob ataque e necessite da ajuda dos Vingadores, não há como ficarmos sentados esperando a aprovação da ONU enquanto pessoas morrem por causa de politicagem! – Steve só faltou socar a mesa diante de sua frustração. Então esta era a verdadeira face do Capitão América quando alguém lhe dizia não? Era realmente um menino mimado.

— Rogers, eu entendo de onde você vem. Você sempre foi o garoto franzino que sofreu bullying, que precisou aprender a se defender. E então um dia lhe foi dada as ferramentas para conseguir não apenas se defender, mas também defender outros garotos franzinos que estavam sofrendo bullying. Na sua visão, o mundo, o povo é o garoto franzino ao qual você foi incumbido de proteger. O curioso é que quando o garoto franzino diz não, diz que não quer a sua ajuda, diz que quer aprender a se defender sozinho, você diz que não, que não é da responsabilidade dele esta decisão, porque, ao seu ver, você sabe o que é melhor para o povo e só você é capaz de protegê-lo. O que isto te torna, Rogers? Um ditator. E corrija-me se eu estiver errada, mas não foi para lutar contra criaturas assim que Capitão América foi criado?— a frustração sumiu do corpo de Steve instantaneamente, sendo substituída pela vergonha. – Pois é.

— E a ONU? Sabe? – Barton precisava de sério tratamento psicológico quando voltasse, porque a raiva que ele emanava não era normal.

— O novo Tratado está sendo atualmente apoiado por 149 países. Você está querendo me dizer que 149 países, com população de milhares de habitantes, que também apoiam o Tratado, sabem menos que cinco pessoas o que é melhor ou não para eles?

Silêncio. Puro e absoluto silêncio. Prisma podia ver nos rostos de cada um, até mesmo no teimoso Steve Rogers, a compreensão os abatendo. Pena, ela queria argumentar mais, poderia ficar horas fazendo isto. Ela fez com a ONU, por que não os Vingadores? Mas apesar da raiva e teimosia, frustração e problemas que precisavam seriamente de ajuda profissional, dava para ver que eles estavam cansados. Que eles apenas queriam voltar para casa. Principalmente Rogers e Maximoff. Porque eles eram os mais novos ali, eram crianças que só queriam que tudo acabasse ou voltasse a ser como era antes.

Como era antes, nada voltaria a ser, mas ao menos a aceitação deles era um começo.

— Leiam o Tratado. Vocês têm vinte e quatro horas para assiná-lo.

— E se não o assinarmos? – Scott ainda ousou perguntar.

— Então vocês terão que arrumar outro advogado, porque eu não estou disposta a tirar gente burra da prisão.


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