You're burning up, I'm cooling down. escrita por Thai


Capítulo 26
We're all going to die, all of us.


Notas iniciais do capítulo

Vocês que escrevem já tiveram a sensação de que um capítulo se escrevia sozinho e você era apenas um receptáculo da ação? Esse capítulo foi bem assim pra mim! Comecei a escrever a história do jeitinho que eu tinha planejado no início, com os elementos que coloquei no meu resumo do que aconteceria em cada capítulo, mas me vi simplesmente apagando tudo e refazendo. Foi bem????? Por isso que demorei mais do que eu havia previsto pra postar.
Preciso muito da opinião de vocês aqui haha
Confesso que o resultado final me agradou, mas é meio estranho não ter controle sobre sua própria narrativa. Vocês já se sentiram assim? A história e seus personagens criando vida própria...
Enfim, espero de verdade que vocês gostem. Minha intenção inicial tinha sido narrar os dias da viagem de forma contínua, mas acabou que saindo dessa forma que vocês vão ler aqui. Enfim, já me estendi demais. Aproveitem!



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Já fazia tantos dias desde que haviam partido de Winterfell que Sansa já não era mais capaz de contar. A viagem até a Muralha se arrastava de maneira lenta, avançavam menos e menos a cada dia. Haviam montado acampamento próximo à Estrada do Rei, Jon dizia que enfrentariam apenas mais alguns dias de viagem. Os homens do Sul encontravam dificuldade em se adaptar ao inverno e mesmo os homens do Norte reclamavam da neve que se acumulava e caía sem cessar, das botas encharcadas e dos dedos enrugados. Quando não neve, a chuva despencava fria e dura. Sansa se encontrava de pé em frente a uma imensa fogueira que se movia em uma dança melancólica sempre que flocos de neve caíam sobre suas chamas. Encolhia-se sob o seu casaco de peles e tentava manter o calor dentro de seu corpo, mas sentia-se cada vez mais gelada e úmida, até os ossos pareciam estar molhados. Lembrava-se do dia em que partiram, o dia seguinte ao seu casamento. De Jon lhe pedindo para que ficasse em Winterfell e tentando convencê-la de que não seria uma boa ideia ir com ele. Convencia-se cada vez mais de que ele estava certo sempre que tinha que suportar o frio e a neve, as dormidas inquietas e a preocupação. A verdade era que ela iria aproveitar cada um dos momentos que pudesse ter com Jon. Gostaria de acreditar que Melisandre havia dito palavras vazias. Palavras são vento, pensou. Mas não conseguia conter a inquietação dentro de seu peito. Se irei morrer, morrerei ao lado dele... Entendia os motivos de Jon para querer que ela ficasse, havia tentado fazer o mesmo com Arya e Bran. Mas agora tudo o que havia restado da família Stark marchava para uma guerra e talvez nem todos sobrevivessem àquilo.

Incomodava-se também com os dragões voando no céu e os ruídos estrondosos como trovões que suas asas faziam ao cortar o vento. Daenerys havia incentivando Jon a tentar domar um dos seus, Rhaegal era como o chamara em homenagem ao seu irmão, pai de Jon. Era uma besta imensa com escamas de um profundo tom de verde. Sansa sentia o corpo inteiro tremer sempre que tinha que estar de frente para um deles. Jon não parecia partilhar de seu medo, no entanto. Pelo contrário, podia sentir o fascínio através do brilho de seus olhos. Já fazia uma semana que estavam na estrada quando Jon tentara tocá-lo pela primeira vez. Não havia recebido resistência do dragão negro que Dany montava, mas Rhaegal parecia mais rebelde. O dragão recusou o toque e bateu as asas para longe. Apenas alguns dias depois Jon teve coragem de repetir o ato. Sansa observou aflita quando o marido pôs a mão no espaço entre os dois olhos gigantes. Fantasma estava ao seu lado, mantendo uma distancia segura, porém levemente inquieto. Jon deslizou os dedos lentamente por toda a extensão até chegar ao focinho. Daenerys sorria animada ao seu lado e Tyrion encarava a cena intrigado. Arya parecia partilhar do fascínio, mas Sansa não conseguia encarar do mesmo modo. Ouvira histórias de homens que haviam tentado domar dragões e acabaram queimados. O mesmo não havia acontecido com Jon, no entanto. Mesmo assim, ele falhara em sua missão de montar no dragão e Rhaegal passava a maior parte do seu tempo sobrevoando o céu sobre eles.

Os seus dias eram tediosos. Passava boa parte da manhã e da tarde sobre o dorso de um cavalo. Suas pernas doíam e a parte interna de suas coxas começava a criar feridas. Quando paravam para descansar, a comida era escassa e o conforto menor ainda. Não havia todo o luxo da comitiva do Rei de quando ela havia marchado para Porto Real com seu pai no passado. A guerra é dura, Sansa, Jon havia lhe dito uma noite quando ela reclamou das dores e da fome. Apenas quando pararam em Bosque Profundo, sob o teto de Lorde Glover, foi que obteve alguma comodidade. Naquele dia comeram de maneira farta e dormiram sobre uma cama macia. Mas o melhor para ela havia sido as roupas secas e quentes. Estava farta de estar sempre com as vestes molhadas e o corpo úmido. Havia dormido com Jon mais uma vez como marido e mulher naquela noite e mais uma vez viu-se pedindo para que ele lhe desse um filho. Havia crescido dentro de si o desejo de ser mãe. Era algo que a mantinha esperançosa, que a fazia ter alguma perspectiva de um futuro. Haviam partido na manhã seguinte. Jon lhe dissera que não poderiam se demorar ali, deveriam fazer valer cada momento.

Sansa tentou viajar com Bran em sua carroça, mas o irmão estava quase sempre dormindo e Meera era uma companhia silenciosa. Tentou ir com Arya, mas a mais nova se afastava da estrada com frequência e se perdia na floresta com Nymeria e Sansa só a via quando a noite caía. Tentou Brienne, mas a mulher quase sempre estava na presença de Jaime Lannister e não gostava de encarar o homem que era quase como um retrato de Cersei. Quis recorrer a Jon, mas seu marido estava sempre falando sobre estratégias de guerra e ela de nada entendia do assunto. Viu-se sentindo falta de Willas e o pensamento automaticamente levou-a até Winterfell onde havia deixado o herdeiro da Campina e Davos. Restou-lhe Tyrion Lannister. O duende era uma companhia divertida. Estava levemente bêbado quase todo o tempo e tinha sempre um livro em mãos. Fora ele quem lhe contara sobre as histórias de dragões que a fizeram tremer.

— Foram soltos todos os três, Vhaghar, Meraxes e Balerion, na batalha que ficou conhecida como Campo de Fogo. Balerion era o maior deles, negro como os cabelos de Lorde Snow. Mais de quatro mil homens foram queimados até a morte naquele dia, inclusive o Rei da Campina, Mern. Foi assim que Aegon Targeryen conquistou Westeros, com fogo e sangue. — ele falou quase que de maneira displicente enquanto empurrava um gole de vinho para dentro. Nada daquilo era novo para Tyrion.

— Como eles morreram? — Sansa havia perguntado curiosa.

— Meraxes morreu em Dorne, uma seta de escorpião no olho, que é como uma grande lança com flechas de ferro imensas. Balerion morreu muito mais tarde com duzentos anos. Vhaghar é o dragão mais velho que se tem relato em Westeros, morreu de cansaço, imagino. — ele havia lhe sorrido naquele momento, repuxando seus lábios finos em uma imagem quase grotesca.

Algumas vezes, quando paravam, Arya e ela duelavam um pouco. Embora Sansa se incomodasse com a plateia que sempre se formava, havia adquirido uma técnica que pelo menos não a fazia sentir tanta vergonha. Usava Lamento da Viúva como arma, a espada que pertencera à Joffrey, mas que ela gostava de sempre se lembrar de que antes disso havia pertencido ao seu pai. Foi em um desses dias, quando Brienne e Jaime duelavam no mesmo espaço que ela e Arya, que Sansa testemunhou um embate que a divertiu, embora como a senhora educada que era jamais deixaria transparecer o seu contento. Tormund havia se aproximado deles e intimara Jaime para um duelo. Sansa pôde ver que o selvagem tinha certa afeição por Brienne, embora a mulher fosse completamente alheia à situação. Sansa notou, também, que sua protetora olhava Jaime Lannister com admiração notável. Jon havia se aproximado, sussurrando aos ouvidos de Tormund algo que pareceu uma reprimenda porque o selvagem fez uma expressão de completo descontentamento e voltou a encarar o leão.

— Vamos lá, senhor de Lannister, mostre-me do que é capaz. — Tormund provocara, cuspindo no chão em seguida, ignorando a repressão de Jon.

— Não acho que seria um embate justo, sor. — Jaime deu seu melhor sorriso e raspou sua espada no ar exibindo o aço.

— Está com medo? — o selvagem não se deixou intimidar e exibiu seu machado de guerra.

Foi assim que se iniciou o combate. Tormund trajava apenas couro fervido e peles, enquanto Jaime e toda sua pompa estavam cobertos por uma pesada armadura de ferro revestida por ouro. O leão empunhava a arma com a canhota, a mão que fora obrigado a usar por ter agora uma mão de ouro no lugar em que deveria estar sua destra. Sansa o conhecera em seu auge, quando era membro da Guarda Real e irmão da Rainha.  Quando exibia seu sorriso de soberba e seu ar galante. Não era mais o Jaime que conhecera tanto tempo antes. Os anos não foram bons com o Lannister também, pensou. O homem lutava de maneira muito mais dura e não era tão habilidoso. Por isso, quando Tormund avançou contra ele e fincou seu machado no peitoral dourado, o Lannister tombou e caiu. Foram ouvidas risadas de todos os cantos, de todos os expectadores, o próprio Tormund gargalhava satisfeito. Mas Sansa notou que Brienne tinha uma face severa e pouco divertida e talvez o que Tormund havia feito para ganhar o coração de sua donzela apenas a tinha afastado mais. Sansa conteve o sorriso, sentiu-se levemente vingada, mas ao mesmo tempo houve pena. Quando viu Brienne se aproximar de Jaime e ergue-lo do chão, ela pôde perceber os olhos verdes embaçados pela vergonha. Mais tarde naquele dia, quando sentou-se com Tyrion perto da fogueira, ele havia lhe contado sobre como Jaime havia matado Cersei.

— Quando chegamos a Porto Real, Daenerys e eu, estava pronto para implorar pela vida de meu irmão. Mas o que encontramos na Sala do Trono foi uma imagem que ainda atormenta meus sonhos. Deve ter ouvido a história de como Jaime matou Aerys, de como seu pai o encontrou sentado sobre o trono enquanto o rei jazia morto sob seus pés. Foi a mesma imagem que encontrei, mas Cersei tinha os olhos vermelhos como sangue e a garganta roxa. Meu irmão matou o rei pelas costas, como um covarde, mas quando matou a rainha a olhou nos olhos enquanto assistia sua vida se esvair. Enquanto a via lutar por um novo ar. É cruel, imagino. Mas quem o culparia?

Sansa não disse nada. Refletiu sobre aquilo durante as noites que se seguiram. Ela havia assistido Ramsay morrer, mas não acreditava que seria capaz de tê-lo matado com as próprias mãos. Cersei Lannister perturbava seus sonhos. Lembrava-se de como Joffrey havia morrido, roxo e inchado, e imaginou sua mãe do mesmo modo. Às vezes imaginava mãe e filho jazendo um ao lado do outro em uma cama de ouro e lençóis de seda carmesim. Quando parou de devanear, Sansa notou que uma aglomeração já se formava ao redor da fogueira em que estava. Todos tentavam seu máximo para manter-se aquecidos. Foi naquele momento que vidrou seus olhos nas chamas. Elas balançavam quase como se estivessem dançando à melodia do vento. Os ruídos que o fogo fazia quando a neve entrava em contato com suas labaredas eram quase como choro. Um choro de lamento.

As chamas não mentem — ouviu um sussurro próximo ao seu ouvido. Quando olhou, viu a sacerdotisa de R’hllor que Daenerys havia trazido consigo. Kinvara era seu nome. — Algumas pessoas de pouca fé não entendem suas mensagens, mas a verdade está lá. Procura algo nas chamas, Rainha de Gelo? — a mulher era quase tão inquietante quanto Melisandre. Ela tinha um sorriso sempre estampado no rosto, um sorriso que parecia dizer que ela sabia um segredo que ninguém mais sabia.

— Não — Sansa disse, nervosa.

— Não precisa mentir para mim. Eu vejo o que quer ver, vejo o que a atormenta. — a mulher tocou seus ombros, ficando colada em suas costas, sussurrando para que apenas ela ouvisse. — Olhe. O que procura está aí, dançando. Você apenas tem que abrir seu coração para o Senhor da Luz. Olhe.

Sansa olhou. Viu as chamas tremeluzirem em vermelho e laranja, tons tão vibrantes que seus olhos doeram. Viu vultos de fumaça se movendo fantasmagóricos. Viu as cinzas subindo até o céu e manchando o branco.

— Não há nada para ver além do que já está aí. — sentiu Kinvara lhe sorrir. Os pelos de sua nuca se eriçaram quando a mulher voltou a falar.

— Está cega de medo. Abra os olhos, Lady Sansa. — a mulher insistiu.

Sansa voltou a olhar para as chamas. Não havia nada ali como imagens claras, mas ela sentiu quando sua alma queimou. Parecia pegar fogo dentro de si. Sentiu as mãos de fumaça lhe agarrando o coração e as cinzas lhe taparem a garganta.

— Eu vejo... — a vontade de chorar foi súbita.

Em seus ouvidos, mesmo que ninguém mais pudesse ouvir, as chamas sussurraram como uivos de um lobo em um lamento tão profundo que Sansa quis gritar sua dor. Era tão angustiante...

— Faça-o parar... — pediu, as lágrimas nos olhos pedindo passagem. — Faça-o parar! — ouviu-se gritar.

— Sansa! — era a voz de Jon.

Quando ela olhou ao redor, quase como que saindo de um transe, viu Jon empurrar Kinvara para longe de maneira brusca. A mulher nunca deixou o sorriso morrer em sua face. Sansa nunca esqueceria aquele sorriso.

— As coisas ruins acontecem por um motivo — ela disse a encarando. E depois partiu.

— O que houve? O que essa mulher lhe disse? — Jon perguntou aflito. Sansa viu o desespero em seus olhos.

— Jon... — ela então abraçou seu marido com tanta força que a pressão de seus corpos doeu em si. — Nós todos vamos morrer, Jon.


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Notas finais do capítulo

É isso, espero de verdade que tenham gostado. Deixem-me saber o que acharam, beijos e até o próximo ♥