Eu estou andando em um corredor escuro. Não me lembro de ter vindo aqui antes, e nem sequer sei como vim parar aqui, vejo uma porta e, com um pouco de receio, giro a maçaneta.

Quando abro a porta, tenho uma visão que me faz gelar. Um homem pequeno, de cabelos grisalhos e olhos de serpente. Presidente Snow.

— Senhorita Everdeen, achei que jamais a veria novamente. – Diz ele, ajeitando sua tradicional flor na lapela.

— Você está morto! – Exclamo. — Eu vi você morrer, eu vi!

— Digamos que sou um homem de muitos mistérios, os quais a senhorita não conseguiria nunca, entender e desvendar. – Diz ele, e eu vejo seus olhos cintilarem. — Eu sabia que você viria. Não iria aceitar que seu amado e desejado marido, morresse sem fazer nada por ele.

É aí que eu me viro e vejo uma parede de vidro do outro lado da sala. Do outro lado do vidro está Peeta deitado em uma cama aparentemente desacordado.

— Peeta! – Grito correndo para a parede de vidro. Eu esmurro o vidro sentindo uma angustia terrível apertar em meu peito. Peeta se levanta e caminha até o vidro.

— Pensando bem, é até bom você assistir a cena a seguir, para ver que sua rebeldia não resultou em nada, a não ser nas mortes daqueles que você mais ama. – Diz o presidente Snow.

Eu me virei para ele a ponto de ver ele apertando um botão, no mesmo instante ouço o barulho de animais correndo e me viro para a parede de vidro onde Peeta olhava diretamente para mim.

— Isso é tudo sua culpa! – Grita Peeta e o que eu vejo é assustador: Bestantes de lobos iguais aos que apareceram na primeira arena, foram soltos e começaram a atacar Peeta. Tudo que ele pode fazer é gritar, como já está sendo atacado.

O que eu sinto pode ser baseado apenas em uma palavra: Desespero. Me debato contra o vidro, chorando desesperadamente. Gritos agudos e apavorados escapam da minha garganta, mas não a nada que eu posso fazer, além de chorar compulsivamente enquanto vejo o corpo de Peeta ser mutilado até a morte. Ouço a gargalha fria de Snow.

“Katniss, acorde!”

De onde veio essa voz?

“Katniss, é só um pesadelo, acorde!”

Sinto alguém me sacudir e acordo em um pulo. O que vejo não é mais aquela sala horrível, e sim meu quarto. Estou sentada em minha cama e todo o meu corpo treme.

Apenas noto a presença de Peeta e Haymitch, quando Haymitch põe a mão sobre meu ombro me perguntando se estou bem. Olho para Peeta e sua expressão é séria, como se ele estivesse preocupado.

— Eu estou... O que fazem aqui? – Eu perguntei tentando parecer calma.

— Uma senhora muito agradável foi até a casa de Peeta, informar que sua esposa estava aos berros dentro de casa, e ninguém sabia o que estava acontecendo. Vem cá, será que ninguém ainda reparou que vocês nem se olham mais? – Diz Haymitch sorrindo debochado.

— Então os vizinhos ouviram? – Eu perguntei sem graça.

— Acho que toda Panem ouviu. – Haymitch exagera e eu o lanço um olhar irritada.

— Tem certeza           que está bem Katniss? – Peeta pergunta e eu assinto. — Então vou voltar para minha casa. Mais tarde venho ver se você está melhor. – Ele diz dando tapinhas camaradas no ombro de Haymitch e saindo pela porta.

— Diga docinho, as coisas ficaram amargas? – Diz Haymitch sorrindo fraco e logo sua expressão ficar séria.

— Foi horrível Haymitch, eles o pegavam. Peeta, eles... – Eu disse abraçando Haymitch e voltando a chorar.

— Shii, já está tudo bem, você viu. Ele está bem. – Diz Haymitch passando a mão pelo meu cabelo.

Depois da guerra algumas coisas mudaram, eu e Haymitch havíamos nos aproximado mais, ele é como um pai para mim e sinto que eu sou como sua filha. Já minha relação com Peeta não é das melhores, para dizer bem a verdade, nem nos falamos mais. “Ele não é mais o mesmo Katniss”, minha consciência me diz, porém eu me nego a aceitar a realidade, não posso acreditar que aquele menino doce e gentil havia ido embora. Pensar nisso dói e muito.

— Você viu Haymitch? Ele está tão longe de mim. – Eu disse já começando a soluçar.

— Não diga isso Katniss, ele só está com medo, assim como você. Mas ele chegou lá em casa muito preocupado com você, disse que queria ver o que você tinha, mas não queria vir sozinho. Ele estava com medo de você manda-lo embora. – Diz Haymitch enquanto eu tentava me acalmar.

— Tudo bem, eu estou mais calma agora, pode ir para casa. Eu vou tentar voltar a dormir. – Eu disse já calma enxugando meu rosto.

— Tudo bem, mais tarde eu venho ver como você está. – Ele disse se levantando e indo embora.

Assim que ouvi a porta se fechando me deitei novamente na cama tentando não pensar em Peeta ou no meu pesadelo. Porém, sei que é inevitável não pensar em Peeta novamente, é inevitável não desejar que ele estivesse aqui comigo, me envolvendo em seus braços, em seu calor. Sinto falta do antigo Peeta, aquele que me amava, e aquele que eu tanto evitava e desfazia. É incrível como só agora que eu sei que ele não me ama mais, eu posso ver o quanto ele é importante para mim.

Após alguns minutos que mais me pareceram horas tentando dormir sem nenhum êxito minhas pálpebras finalmente pesam, eu me enrolo no lençol e fecho os olhos.

*-*

Minha cabeça latejava sobre os lençóis de cetim da minha cama, inspirei profundamente como se por um milésimo de segundo minha cabeça fosse melhorar com isso. Suspirei em frustração quando a luz do sol bateu contra meus olhos desprevenidos da claridade. Me levantei da cama indo em direção ao banheiro, mal posso acreditar que passei o resto da noite sem ter nenhum outro pesadelo, após ter uma noite de sono parcialmente boa, o que para mim já é um luxo. Me sinto um pouco melhor e mais disposta.

Tomo um banho longo e relaxante fazendo minha tradicional trança e descendo para fazer meu café da manhã, aposto que um café bem forte vai ajudar muito a melhorar minha cabeça. Assim que chego na cozinha coloco a água no copo para ferver, enquanto corto algumas frutas frescas que Greasy Sae trouxe para mim e pego o leite na geladeira, ponho a mesa e me sento para tomar meu café, Greasy não trouxe pão hoje, então terei que me contentar com essas frutas e o café. Quando vou levar um pedaço de morango até minha boca a campainha toca. Estranho, pois ninguém nunca vem e visitar, a não ser Haymitch que vem quase todos os dias e Greasy Sae. “Dever ser Haymitch”, penso me levantando e indo atender, abro a porta e dou de cara com Peeta, em sua mão está uma cesta de pães fresquinhos. Ao vê-lo em minha frente é inevitável não lembrar de como ele me faz falta. Sinto uma súbita vontade de me jogar em seus braços e beijá-lo, mas me seguro. Com certeza isso o deixaria confuso, isso se não o provocasse um daqueles flashbacks.

— Bom dia. – Ele diz, dando um sorriso tímido e abaixando o olhar.

— Bom dia, Peeta. – Digo dando um risinho discreto e dando espaço na porta para ele entrar. — Entra.