A Redenção do Tordo escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 53
Algo mais


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal!

Estou muito feliz e grata pela recomendação feita pela Elo!

Agradeço também quem conferiu a one-shot e deu o feedback que pedi... Já estou preparando a continuação de Blind Date!

O capítulo abordou algumas sugestões da Annie... Obrigada pelo carinho com a fic!

Boa leitura...



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Por Peeta

Mesmo estando dentro do Palácio da Justiça, cercados de gente, eu giro Katniss no ar mais uma vez, como se estivéssemos completamente sozinhos. Em seguida, eu a deposito no chão com cuidado.

— Então, você concorda mesmo que o que temos é perfeito? Ou eu preciso lançar mão dos argumentos que usei mais cedo?

— É sempre bom ouvir seus argumentos — Katniss me beija rapidamente.

— E eu ainda preciso esclarecer alguns pontos... — Eu me afasto o suficiente para divisar sua face e lançar a ela um olhar malicioso. Katniss esconde seu rosto em meu pescoço, provocando-me cócegas. — Sra. Mellark! Vamos deixar pra fazer esses esclarecimentos em casa! Nós estamos em público...

— E agora você está preocupado com isso?

Dou meia volta e as pessoas tentam disfarçar suas espiadelas em nossa direção, mas não conseguem evitar os sorrisos contidos.
A única que nos observa diretamente é a atendente. Agradeço a atenção da simpática senhora com uma reverência e estendo a mão à minha linda esposa para seguirmos novamente até a padaria.

— Sr. e Sra. Mellark! — A funcionária nos chama antes de sairmos. Abraço Katniss por trás e sigo com ela até o balcão. — A Certidão de Casamento e sua nova documentação ficam prontas em uma semana.

— Nunca pensei que esperar por um documento seria tão emocionante! O que será que vai estar escrito? Peeta Mellark, o homem mais feliz do mundo... — digo e Katniss me acotovela discretamente.

— As certidões, como o próprio nome diz, servem mesmo para que se certifique um fato. Vou sugerir ao chefe a inclusão do estado de espírito dos noivos na Certidão, pois a felicidade de vocês é algo notório... E verdadeiro — Ela pisca para nós.

— Obrigada mais uma vez — Katniss agradece e acena em despedida, enquanto eu repito a mesura anterior.

No alto da escadaria, do lado de fora do prédio, vemos a cidade pintada de branco pela neve, refletindo a luz do sol. A claridade faz Katniss semicerrar os olhos e ela muda o foco do seu olhar para dois pontos distantes, que se movem vagarosamente no sentido da cidade.

O cenho franzido dela se transforma em um leve sorriso.

— Haymitch e Effie estão vindo para a cidade! — Katniss os reconhece. — Vamos até lá!

Eu me adianto para descer primeiro, estendendo a mão para ela com um sorriso. Ela desce cautelosamente e agarra minha mão, tentando não deslizar nos degraus cobertos de neve.

Em poucos minutos, interceptamos Haymitch e Effie no meio do caminho.

— Eu vos apresento a Sra. Katniss Everdeen Mellark! — anuncio tão logo nos aproximamos.

— Até que enfim! — Effie exclama, soltando-se do braço de Haymitch para bater palmas.

Haymitch apoia sobre os pés o embrulho que está levando e aplaude junto com ela.

Percebo que o pacote que está com Haymitch é o quadro emoldurado que pintei na Capital para Delly.

— Onde estão indo com isso? — indago.

— Planejei de última hora uma despedida de solteiros para Delly e Thom na casa nova deles. Vamos até lá depois de organizarmos o salão da padaria para o casamento — Effie põe as mãos sobre sua barriga proeminente, expressando desconforto enquanto fala. — Imaginei que sua tela seria um ótimo presente para o casal!

— Sim, é perfeito. Mas, Effie, em seu estado, você deveria estar descansando! E não arrumando mais trabalho — Eu a censuro.

— Que nada! Ainda terei tempo de resolver muitas coisas. Meus bebês ainda vão esperar a mamãe voltar para a Capital...

— Você deve, pelo menos, delegar suas funções. Eu me prontifico a ajudar — Katniss oferece, colocando-se ao lado de Effie para caminharem juntas, enquanto recebe instruções detalhadas a respeito do que ela tem em mente sobre o cerimonial e a decoração.

— Estou com o pressentimento de que os gêmeos não estão tão pacientes como a Effie pensa — Haymitch sussurra pra mim, depois que as duas se afastam um pouco.

— Eu tenho certeza. É melhor se preparar, Haymitch. Essa dupla já está pronta para chegar.

Ele engole em seco e eu pego o embrulho que ainda está sobre seus pés.

— Peeta, eu preciso conversar com o Timothy no Palácio da Justiça e, depois, vou até o hospital falar com a equipe médica.

— É um bom plano.

— Effie não precisa saber dessa segunda parte — Haymitch afirma em voz baixa e se justifica em seguida. — Não quero que ela fique preocupada.

— Eu sei. Ela nem considera a possibilidade de ter os bebês aqui, porém é preciso se precaver.

— A Srta. Trinket sai da Capital, mas a Capital não sai da Srta. Trinket... — Ele balbucia.

— Quem sabe isso não muda quando ela vier a ser a Sra. Abernathy?— sugiro.

Haymitch suspira, chamando-a em seguida:

— Effie! Vou até o Palácio da Justiça. Mais tarde, levo o almoço de vocês.

— Oh! — Ela se sobressalta, pousando a mão sobre a barriga novamente. — Um chute! E mais um! Elliot e Maysilee estão dizendo até logo e pedindo pra você trazer algo delicioso para comermos, papai!

Haymitch vai até Effie para afagar e beijar o local onde estava a mão dela.

— Aguentem firmes aí, crianças — Ele se expressa com carinho e segue em direção à praça.

Effie acena sorridente e rumamos nós três para a padaria. Lá chegando, eu me ocupo com a preparação do bolo de casamento, enquanto Effie e Katniss vão arrumar o local da festa.

Como prometido, Haymitch nos traz comida na hora do almoço e nos acomodamos os quatro numa mesa no andar superior. A decoração já começou a tomar forma, mas Katniss e Effie ainda têm muito trabalho pela frente.

Haymitch murmura discretamente para mim, informando que o contato com os médicos foi bastante satisfatório.

Eu me apresso para comer, a fim de dar conta de todas as tarefas seguintes. Por isso, termino a refeição rapidamente e volto para o meu posto de confeiteiro no andar de baixo. Antes de retornar a seus afazeres, Katniss vai até onde estou e põe a mão sobre a minha testa.

— Você não está mais febril. Não está sentindo mais nada?

— Só uma vontade imensa de ganhar um beijo — provoco.

— Essa doença é contagiosa?

— Espero que sim...

Katniss une seus lábios aos meus e alguém bate à porta. Através do vidro, vejo que é Violet, acompanhada de Casper.

— Podem vir. Está aberta — autorizo e eles logo entram.

— Peeta, nós gostaríamos de saber se podemos ir à despedida de solteiros na casa de Delly e Thom... — Violet pede.

— Sem problemas! Todos podem ser dispensados mais cedo para irmos juntos.

— Chefe, é melhor que seja depois da última fornada. Para não decepcionar os clientes — Casper opina.

— Bem lembrado... Assim podemos levar alguns pães frescos para a reunião.

Os dois aquiescem e saem, mas antes que a porta se feche por completo, é possível ouvir Casper perguntar à Violet se Amelie também vai. Um sorriso se forma em seu rosto quando Violet confirma.

Katniss olha pra mim de modo sugestivo, mas disfarça depressa.

— O bolo está ficando lindo — Ela elogia.

— Acho que Delly vai gostar — concordo humildemente.

— Ela vai amar, até porque eu aposto que o recheio é de doce de leite.

— Acertou! Eu não poderia fazer diferente — Pego um pouco do creme que sobrou com uma colher para que ela experimente e, com um último beijo com sabor de doce de leite, Katniss vai terminar seus afazeres com Effie.

No fim de tarde, faço questão de também preparar pessoalmente o pão para o ritual que sela os casamentos em nosso distrito.

Com a saída do último cliente da padaria, libero todos antes da hora como combinado, para irmos para a reunião com os noivos. Effie e Haymitch já foram há cerca de meia hora.

No caminho, percebo que Casper tenta a todo custo chamar a atenção de Amelie, mas, talvez por insegurança, usa de artifícios que a deixam incomodada, como quando implica com seu jeito tímido ou imita sua voz quase infantil.

Katniss atrasa o passo para ficarmos lado a lado com ele e sussurra:

— Apenas seja gentil com ela.

O rapaz olha espantado para Katniss, não esperando um conselho dela.

— Vai por mim — Ela insiste.

— Katniss está certa — Lionel avisa, dando tapas no ombro do amigo.

E as advertências são suficientes para que ele mude um pouco sua postura.

Ao chegarmos, somos recebidos por Haymitch e Effie, e já estão reunidos também Gale, Cressida e Rory, bem como os familiares de Thom e outros amigos. Blaine e Timothy aparecem em pouco tempo.

Depois de cumprimentarmos a todos, Katniss entrega o cesto com os pães à Delly, que vai guardá-los na cozinha e convida as garotas a conhecerem a casa.

Effie é a única que não vai com elas e fica sentada no sofá, enquanto Haymitch alisa sua barriga. Quando Delly retorna com as meninas, Effie anuncia que eu preparei um presente para ela e Thom.

Delly segura o grande pacote com dificuldade e todos a seguimos até o sofá, onde eu a instruo para se sentar e abrir o embrulho. As bochechas de Delly ficam coradas enquanto cuidadosamente retira o papel para revelar a tela que criei na Capital. Ela reconhece imediatamente no desenho seus familiares ao lado da família de Thom.

Quando as pessoas processam o que há na pintura, fazem murmúrios de admiração. Eu e Delly nos entreolhamos e nos conectamos de um modo tão fácil, que minha mente logo é povoada com todas as coisas que vivemos juntos para termos tanta afinidade.

Blaine aproveita o momento para também estender para Delly uma caixa envolta numa embalagem colorida e brilhante.

— Como forma de agradecer por ser uma irmã amorosa, diligente e muito chata — Blaine declara. Sua voz, que é sempre brincalhona, torna-se formal, por fim. — É algo que o Thom encontrou nos escombros da sapataria.

Ao ouvir isso, Delly rasga logo o papel para ter acesso ao conteúdo.

— As agulhas que mamãe usava para tricotar os sapatinhos de bebê! — Delly retira do embrulho uma coleção de hastes de metal. As mais finas estão retorcidas, porém as mais grossas sofreram poucos danos e praticamente mantiveram o formato original. Ela pega os objetos com lágrimas nos olhos. — Deviam estar naquele armário de ferro do papai que nós dizíamos que era indestrutível.

— Está aí a prova — Blaine não resiste muito tempo em ir abraçar a irmã.

Por alguns instantes, eles se lembram de histórias de infância, detalhando algumas situações que envolviam estripulias de criança em cima do tal armário. Vejo a sombra da dor por trás de suas risadas sinceras e saudosas. Fico feliz por Delly e Blaine terem um ao outro. E por eu ter os dois por perto.

Katniss sorri pra mim, quando apoio minhas mãos em concha em torno da boca e grito:

— Discurso! Discurso!

Gale e Rory acompanham a convocação, fazendo coro comigo.

— Vocês vão pedir discurso à Delly? Vai atrasar o casamento... Apesar de ser só amanhã — Haymitch implica, mas Delly nem se incomoda.

Com o nariz ainda avermelhado pelo choro recente, ela fica de pé e faz um agradecimento a todos por terem vindo, dizendo-lhes o quanto apreciou os presentes, seguindo com um lembrete de que nos veria em breve na festa de casamento.

As palavras de encerramento são interrompidas pelo tímido pigarreio do noivo, para a surpresa de todos, por Thom ser sempre tão avesso a falar em público.

— Delly, já que estamos entre família e amigos, vou treinar para fazer os votos de amanhã... — Ele fica de pé diante de sua noiva, envolvendo as mãos dela nas dele. — Antes de qualquer coisa, eu queria agradecer a você por ser essa pessoa linda e apaixonante. — Depois, ele se volta para nós. — E a todos vocês, por serem tão bons com ela.

Todos aplaudem e assobiam. A sala está absolutamente silenciosa e o que se vê é puro encantamento refletido no rosto de cada um, enquanto Thom prossegue.

— É sempre bom voltar para casa depois de um dia de muito trabalho, mas sempre falta alguma coisa — Ele assume, habilmente pausando. — Melhor dizendo, falta alguém. E é você, Dell... Eu me sinto muito feliz por saber que, a partir de amanhã, serei seu marido e que não vai faltar mais ninguém quando eu voltar pra casa todos os dias.

— Vai faltar, sim! — berra o pai de Thom, para o desespero de Delly, que arregala os olhos, empalidecendo.

— Pai... O que significa isso? — Thom o repreende, desconcertado.

— Eu explico. Vai faltar, ao menos nos primeiros meses... Porque eu quero netos! — O pai de Thom ergue os braços e arranca risadas de todos.

— O senhor tem razão — Delly sorri e a cor volta às suas bochechas.

— Delly, minha futura nora, não gostaria de falar sobre um assunto doloroso nesse momento, mas eu preciso dizer uma coisa... Você perdeu seus pais e nada pode reparar isso, mas eu ganhei uma filha maravilhosa que, em outras circunstâncias, eu sequer teria a oportunidade de conhecer melhor — O sogro de Delly expressa sua estima por ela com a voz embargada.

— Vocês conseguiram a proeza de me deixar sem palavras... — Delly funga antes de sorrir.

E esse sorriso não se esvai do rosto dela em nenhum momento e se espelha no semblante de Thom. O olhar embevecido da minha amiga para ele é a prova de que aquele amor de criança amadurece a cada dia e se fortalece, mais ainda, quando ele acaba de se declarar apaixonado pela ideia de ser seu marido.

— Estou muito feliz por você, Dell! — Eu a abraço fortemente e Katniss imita meu gesto.

— Nossos pais também estariam muito felizes — Blaine externa, emocionado.

Thom desaparece na cozinha e depois volta com uma garrafa de champanhe e um copo de suco de morango para Effie. Delly distribui as taças e Thom derrama nelas o conteúdo. Casper se prontifica a pegar um pouco de suco para Amelie, quando ela revela que não pode tomar nada alcoólico. Depois que todos são servidos, erguemos nossas bebidas juntos.

— Pelo casamento de Thom e Delly! — Gale entoa.

Nós todos brindamos e bebemos um gole e, então, observo como Lionel, Gale e Cressida riem e debatem sobre como a nossa realidade se transformou e como é incrível que esta seja a vida que levaremos de agora em diante.

Noto que Katniss também presta atenção na troca de ideias, porém não se anima a se enturmar na conversa.

— Está tudo bem? — pergunto baixinho em seu ouvido.

— Sim. Eu apenas não consigo evitar uma confusão de sentimentos em ocasiões como essas — Ela sussura de volta. — Então, estou fazendo aquele nosso jogo de pensar nas coisas boas que as pessoas fizeram.

— Essa é minha brava garota! — Beijo sua têmpora demoradamente.

Katniss apoia a cabeça em meu ombro de um jeito preguiçoso, fechando os olhos, e essa é a deixa para que eu tome a iniciativa de me despedir de todos para irmos para casa. Haymitch chama Effie para nos acompanhar. Antes de sairmos, porém, ela expulsa todo mundo com seu jeito nada sutil:

— Vamos, vamos! Está na hora de arrumar tudo e, depois, cada um vai pra sua casa! Amanhã é um grande, grande, grande dia e Delly deve estar plenamente descansada.

Ninguém se atreve a contrariar Effie e, num mutirão, em poucos minutos, tudo está limpo e em seus devidos lugares.

Delly vai passar a noite na casa de Timothy, na companhia de Violet, pois a residência dele é a mais próxima da padaria e é de lá que ela sairá pronta para a cerimônia.

Então, eu e Katniss seguimos para a Aldeia dos Vitoriosos acompanhados apenas de Effie e Haymitch. Blaine também não vai conosco, pois está indo deixar Violet em casa.

Depois de vencermos alguns metros sob o intenso frio, a voz de Delly sobressai na algazarra que seus convidados continuam fazendo a caminho de suas casas e do hotel, que é para onde estão indo Gale, Cressida e Rory.

— Katniss! Antes de vocês irem, gostaria de pedir um favor! — Delly se acerca a nós, ajustando seu casaco em seu corpo para se proteger da friagem. — Fique à vontade para recusar, se não quiser... Não vou ficar chateada.

— Pode pedir, Delly — Ela a encoraja.

Delly olha pra trás em busca de Thom, mas ele ainda está trancando a porta da casa.

— É que... Eu e Thom... Nós gostaríamos de saber se você poderia cantar durante a festa.

Katniss me olha, parecendo surpresa, sem saber o que responder.

— Cantar? — Ela titubeia e minha vontade ao ver sua expressão de criança desamparada é de abraçá-la para que sinta conforto e proteção. — Qual música devo cantar?

— A que você preferir, mas... — Delly é interrompida por Thom, que também vem ao nosso encontro, carregando um gorro e um cachecol para sua noiva.

— Mas nós ficaríamos muito honrados, se você cantasse "A árvore-forca" — Ele completa, vestindo em Delly de modo afetuoso as peças que trouxe.

— A árvore-forca? Não sei se é uma boa ideia. Essa é uma canção tão triste para um casamento — Katniss hesita em ceder.

— Essa música se tornou um hino de liberdade. Por isso, mesmo que ela seja triste, ganhou outro significado para nós — Thom argumenta.

Ela já parece convencida com esse comentário. No entanto, ainda não está segura em aceitar.

— Durante meu tratamento no Distrito 13, Delly vivia cantarolando do meu lado — acrescento, puxando para baixo a touca de lã da minha amiga até cobrir todo o seu rosto.

— Era tão ruim assim? — Delly indaga sorridente, depois de destapar sua face.

— Digamos que, se dependesse do seu talento como cantora para conquistar o Thom, você não estaria se casando amanhã — ironizo.

— Ai! Que desaforo! — Ela empurra meu ombro com o punho fechado. — Eu canto com você, Katniss, pra desmentir seu marido implicante.

Katniss já sorri com a novidade.

— Mas é claro que vocês duas vão cantar! Já estou até vendo... — Effie se intromete, esboçando um ar sonhador. — Desde que você cantou em seu casório, Katniss, isso virou a última moda em casamentos!

— A Effie já decretou, docinho — Haymitch brinca.

— Combinado, então — Ela finalmente acata.

Delly une as mãos sob o queixo, empolgada, e Thom beija o topo da cabeça dela.

— Vou ensaiar! Você me ajuda, Thommy? — Ela implora e ele estreita os olhos em minha direção.

— Olha o que você me arrumou, Peeta — Thom resmunga de brincadeira, envolvendo Delly pela cintura para levá-la à casa de Timothy.

Enquanto eles vão se afastando, a voz modulada de Delly se espalha pela rua agora silenciosa, conforme ela entoa as primeiras estrofes da música.

— Ela é afinada, Peeta! — Katniss me repreende.

— Delly sabe que eu estava brincando. Era eu quem pedia a ela para cantar pra mim.

— Quem vai precisar ensaiar pra não fazer feio sou eu — Ela puxa meu casaco e eu me desequilibro um pouco no chão escorregadio.

Katniss tenta impedir que eu caia, mas, em poucos segundos, estamos os dois estatelados num monte de neve, com ela por cima de mim.

— Já vi essa cena — Haymitch recorda a nossa queda em frente às câmeras no início da Turnê da Vitória.

— Será que dessa vez eu mereço um beijo de verdade? — questiono com a voz abafada pelas risadas de Katniss.

Mal termino de falar, ela volta a ficar séria e sinto seus lábios sobre os meus.

— Você merece beijos de verdade dessa vez... E todas as vezes.

Katniss me ajuda a ficar de pé e retiramos os flocos de neve um do outro. Ela encaixa sua mão na dobra do meu braço e seguimos nosso caminho.

Haymitch redobra os cuidados com Effie, amparando-a por todo o percurso com passos lentos. Os dois estão absortos em seus próprios assuntos, que gravitam em torno da feliz ansiedade pela espera dos bebês, ansiedade esta que só não está maior que o ventre protuberante de Effie.

— Você gostou da escolha da música? — Katniss pergunta, ainda preocupada com o tema.

— Quando você foi filmada à beira do lago, cantando "A árvore-forca", eu ainda estava em poder da Capital. Então, não acompanhei o que aconteceu com os rebeldes nessa época. A primeira vez que vi o vídeo foi no Distrito 13. Eu me lembrei de algumas coisas e também do seu pai. Não mencionei seu nome naquele dia, mas algo diferente aconteceu comigo. O fato de ouvir você cantar me trouxe uma sensação de paz tão grande. Foi a primeira vez que me senti assim depois de tudo o que aconteceu na Capital.

Os braços de Katniss me apertam ainda mais contra seu corpo, e não é só por causa da baixa temperatura.

— Essa música me lembra muito do meu pai também. Sinto tanto a falta dele que chega a doer.

Agora é a minha vez de trazê-la mais para perto de mim.

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Quando já estamos prontos para dormir, Katniss se deita ao meu lado em nossa cama, recostando-se em meu peito. Ela está visivelmente esgotada.

— Cansada?

— Muito! — Katniss boceja. — Eu fiz praticamente tudo. Effie só ficou me dando ordens... Mas foi melhor assim. Ela não pode fazer esforço.

— Não mesmo. Os bebês não devem demorar a nascer.

— Também acho que não.

Katniss ajeita o corpo para ficar mais confortável e eu puxo as cobertas sobre nós. Ela dorme pouco depois.

Na manhã seguinte, desperto com Katniss tentando checar minha temperatura. Ela já está arrumada, com um belo vestido verde de mangas compridas.

— Bom dia. Como está se sentindo?— Ela inquire.

— Novo em folha — Ergo meu tronco para me espreguiçar.

— E sem febre! — Ela revela ao ler a medição do termômetro.

— Estou bem... Eu só preciso de um favor seu.

— O que eu posso fazer por você? — Ela se põe de pé, mostrando sua disposição para ajudar.

— Além de ser linda e cuidar tão bem de mim? — Fico de frente para ela.

— Além disso — Katniss esboça um sorriso.

— Você poderia ensaiar para cantar na festa hoje. Eu amo ouvir a sua voz.

— Ai! Minha garganta! — Katniss põe a mão no pescoço, fingindo estar rouca.

— É uma pena essa rouquidão repentina — Faço graça, segurando sua cintura e ela torce o nariz.

— Eu não vou conseguir cantar com você me olhando desse jeito.

— Como não? Você cantou lindamente e na frente de todo mundo em nosso casamento.

Sem mais argumentos, Katniss revira os olhos.

— Pare de enrolar e vá logo se arrumar para a festa — Ela foge do assunto.

— Você está mudando o foco...

— Está bem. Eu ensaio, enquanto você toma banho — Ela se desvencilha dos meus braços e me circunda, pondo a mão sobre meus ombros para me conduzir ao banheiro.

Seguro seus dedos e coloco-os em torno do meu tronco para que ela me abrace por trás.

— Agora não estou olhando para você. Pode cantar.

Então, o timbre suave de Katniss me embala nos minutos seguintes. Fecho os olhos e respiro profundamente.

— Meu amor, você sabe que eu ficaria assim pra sempre, não sabe? — afirmo depois que ela se cala.

— Você ficaria cansado e nós perderíamos o casamento da Delly e do Thom — Katniss beija o meu pescoço.

— Mas você pode cantar pra mim mais vezes? Juro que não vou ficar encarando minha cantora preferida.

Sempre.

Somos interrompidos pelo miado de Buttercup, que desce da cama para arranhar minha perna.

— Ele quer ouvir você cantar mais também.

Katniss se abaixa e pega o gato no colo.

— Vem aqui. Deixa o Peeta se aprontar. Só não pode puxar fio do meu vestido com suas garrinhas afiadas — Ela alerta ao cruzar a porta do quarto.

Após eu terminar de me arrumar, deixamos nossa casa, cobertos por grossos sobretudos, e partimos para a cerimônia de casamento.

A princípio, andamos com dificuldade pela neve espessa até alcançarmos o meio da rua, que já havia sido raspada antes.

Agora temos infraestrutura para lidar com as dificuldades trazidas pelas nevascas. Tratores circulam pelo distrito assim que a camada de neve atinge alguns centímetros. Isso é muito útil, porém o gelo fica acumulado na beira das calçadas. Então, até a padaria, caminhamos por um corredor ladeado por pequenas paredes de neve, em toda a extensão da estrada.

Na padaria, eu e Katniss nos desfazemos de nossos casacos logo na entrada. Greasy Sae vem nos abraçar.

— Tudo está na mais perfeita ordem e muito bem encaminhado — Ela nos tranquiliza. — Com todos ajudando um pouquinho, tudo se ajeitou. Thom e Delly merecem.

— E como você está, Sae? — indago.

— Muito bem. Estava apenas com saudades de vocês, mas vejo que o tempo na Capital fez bem aos dois — Ela afaga nossos rostos. — Agora já vou indo, pois o almoço é por minha conta.

Depois que ela se afasta, faço questão de verificar se está tudo bem. A decoração está incrível: o espaço foi enfeitado com flores, velas e emaranhados de luzes ao redor das colunas.

O bolo resistiu ao traslado até o andar de cima e agora se destaca no centro de uma grande mesa. Os músicos terminam de afinar seus instrumentos e iniciam uma pequena demonstração do que prepararam para animar a festa.

A maioria dos convidados já está presente. Effie dá conta dos últimos detalhes com a colaboração de Violet e Amelie. O noivo conversa com Gale e Haymitch longe das janelas, como Effie determinou, para que não veja Delly chegar. Cressida faz algumas tomadas com sua filmadora, registrando pequenos detalhes da decoração e momentos descontraídos das pessoas presentes.

Quando eu e Katniss descemos as escadas, Cressida nos acompanha. Delly já está no andar de baixo ao lado de Blaine. Ela nos vê e acena, como uma criança vendo seus familiares do palco em uma apresentação da escola.

— Isso mesmo, Delly! Quero muitos sorrisos como esse hoje — Cressida a incentiva, com a câmera ligada.

Eu abraço minha amiga, sem precisar dizer uma palavra, compartilhando um instante só nosso antes do grande momento. Estou muito feliz pelo fato de que, como eu, ela esteja se casando com alguém que ela sempre amou e que também a ama de verdade.

Delly está surpreendentemente calma. Seu irmão está muito mais agitado, talvez por estar vivenciando uma responsabilidade que, a princípio, não seria dele. Suas palavras demonstram isso.

— Se nosso pai estivesse aqui, ele diria: 'Esse é um passo importaaante' — Blaine estica a sílaba, imitando com perfeição o jeito de falar de seu pai. — 'Você saaabe o que está fazendo, minha garotinha?'

— E eu, como sempre, responderia: 'Agora que você perguntou, não tenho certeza' — Delly graceja e une sua mão à de Blaine.

— Em compensação, a mamãe diria: 'Eu confio nas suas escolhas, filha' — Ele está visivelmente emotivo.

— Ai, Blaine, não me faça chorar — Delly sacode a mão livre diante dos olhos lacrimejantes.

Katniss pega o lenço que está em meu bolso e tenta acalmá-la, secando algumas poucas lágrimas.

— Não se preocupe. Você está magnífica! — Katniss dá o último retoque no penteado de Delly, acomodando algumas mechas de cabelo no arco de metal e brilhantes que faz as vezes de grinalda.

— Borrou a maquiagem? — Violet indaga ao se acercar a nós, trazendo o buquê para Delly.

Antes que Katniss esclareça que não aconteceu nada de errado, Blaine se adianta:

— Calma, Dell! Não há nada tão ruim que não possa piorar. Você ainda pode tropeçar e rolar do alto da escada.

— Blaine! — Violet reclama com ele, enquanto espalha a longa cauda do vestido de noiva.

Katniss e eu ainda estamos rindo quando subimos para o salão. Alcançamos nossas cadeiras e passamos a observar Thom, que já espera Delly na extremidade oposta à entrada, com seu terno escuro, tomando longas respirações. Nós sorrimos para ele de forma compreensiva ao vê-lo arregalar os olhos no instante em que os dois violinistas começam a tocar a música escolhida para a entrada de sua noiva.

Daisy e Camellia, que são as damas de honra, e Darrel, o pajem, aparecem no alto da escada, seguidos por Blaine e Delly.

Quando Thom a vê, seu semblante é um misto de felicidade absoluta e ansiedade. Delly respira fundo no último degrau e abre seu sorriso característico. A música continua e a reação à sua chegada se faz ouvir. Thom assiste à sua entrada, como se fosse a primeira vez que a visse. Delly controla a velocidade dos passos até o altar especialmente montado para a ocasião.

Ao lado de Timothy, Thom parece bastante nervoso. Ele pisca um olho para Blaine, que faz de conta que não vai entregar a mão de sua irmã ao cunhado, fazendo todos rirem. Por fim, Blaine beija a testa de Delly e a libera para que se posicione em frente ao noivo.

A cerimônia corre tranquila e, no momento dos votos, Thom limpa a garganta antes de dizer:

— Delly, meu amor, nosso reencontro mudou todas as minhas perspectivas e me fez sentir algo que eu nunca imaginei que seria capaz. Você me surpreende por sua personalidade forte, mas também por sua leveza de alma. Você trouxe fôlego, motivo, sentido. E, desde então, não há um dia em que eu não seja preenchido por uma vontade imensa de ser melhor. Por você. Por nós. Prometo tentar ser melhor a cada dia ao seu lado e o que eu peço em troca é algo simples, nem sempre fácil, mas que só pode vir de você. Eu quero apenas que o encanto do seu sorriso seja uma constante em nosso "felizes para sempre" — Thom declama e a reação de Delly é mais do que esperada, um enorme sorriso na direção dele. — Para terminar, perdoem-me pelo clichê, mas... Como se diz por aí, o amor constrói. E é maravilhoso o privilégio de construir uma vida com você — Ele finaliza, fazendo uma clara alusão à profissão que os dois abraçaram.

— Thom, eu prometo que, mesmo nos momentos de dificuldade, você terá o meu sorriso... — Delly suspira e seus olhos estão brilhando, com as lágrimas a ponto de caírem.— Eu planejei o que falar umas centenas de vezes. Eu me esforcei para colocar em palavras o que significa estar aqui, recebendo você como meu marido, com as bênçãos dos nossos familiares e amigos. Mas sei que não vou conseguir. Não agora, porque não dá. Tenho certeza de que, para isso, vou precisar levar o restante da minha vida. Da nossa vida. E não é porque me faltem palavras, pois todos sabem que eu não sou de economizá-las! — Ela reconhece e as risadas de todos confirmam sua fama de tagarela. — Por isso, vou apenas tentar... Tanta coisa mudou em tão pouco tempo nas vidas de todos aqui e, por mais singelo que pareça, para mim, a mudança mais significativa foi o fato de você finalmente ter entrado em minha vida. E ter se tornado a maior razão dela. Uma das poucas coisas que não mudou desde que eu me apaixonei por você anos atrás, quando ainda era uma menina, é o fato de que apenas com você eu imagino construir o meu "felizes para sempre".

Em seguida, entre sorrisos cúmplices, acontece a troca de alianças e de promessas. Logo depois, o beijo, muitos aplausos e, então, Delly e Thom estão casados.

Ao fim da celebração, todos jogam punhados de pétalas de flores nos noivos, que estão radiantes. Delly é uma pessoa sorridente por natureza, mas o brilho em seu olhar transcende todos os momentos felizes que vivenciei com minha amiga anteriormente.

Eu e Katniss somos praticamente os últimos da fila para cumprimentar os noivos. Espero Katniss parabenizar a ambos para me aproximar deles. Antes de se afastar, ela aponta para os músicos e se encaminha até lá.

— Graças ao seu incentivo, Peeta, estou aqui. Eu não tenho como agradecer — Thom declara.

— A melhor maneira de me agradecer é fazendo a Delly muito feliz.

— Essa é minha missão — Ele garante e eu o abraço fraternalmente.

Delly já espera minhas felicitações de braços abertos.

— Não posso mais chamá-la de Cartwright, Sra. Walstone — digo.

— Eu fiz como a Katniss. Meu nome de casada é Delly Cartwright Walstone. Então, tecnicamente, não deixei de ser Cartwright.

— Ok, Cartwright, acho que você está sendo aguardada junto à banda.

Delly segue meu olhar e vê que Katniss segura dois microfones e ergue um deles em sua direção. Os violinistas tocam as primeiras notas da música "A árvore-forca", enquanto Delly assume sua posição ao lado de Katniss.

Elas se viram uma para a outra e trocam sorrisos de solidariedade antes de começarem a cantar. É uma surpresa para todos, mas logo os rostos espantados se tornam admirados e entusiasmados em participar. O coro de vozes vai aumentando aos poucos.

Os olhos de Katniss ficam marejados. Ela abaixa o microfone, mas Delly continua cantando, enquanto todos já estão entoando a canção em uníssono e se levantando. Timothy e Haymitch brindam entre si. Gale se une numa corrente a Thom e a Rory, os três com os braços sobre os ombros uns dos outros e outras pessoas se juntam a eles. Vou até Katniss e seguro sua mão, animando-a a voltar a cantar.

Os casamentos de antes não eram celebrações no sentido pleno da palavra. A união de um casal era, sim, a promessa de algo bom, porém com a eterna sombra de uma possível tragédia familiar, quando os filhos atingiam a idade para enfrentar a colheita.

A nossa geração não precisa ser comedida nos festejos. Apesar de não ser fácil esquecer o passado, a festa de hoje foi planejada e acalentada por muitos dos que tiveram suas vidas transformadas depois da rebelião e é um símbolo do quão absolutamente extraordinários os casamentos podem e devem ser.

Então, o sentimento que prevalece e que fica gravado em nossos corações e nas imagens captadas por Cressida é o de que este não é apenas um dos melhores momentos da vida de Delly e Thom. É um dos melhores momentos da vida de todos aqui. E o que já está perfeito fica ainda mais com o que acontece a seguir.

Depois da primeira dança dos noivos e do lançamento do buquê, depois dos brindes e da comilança, depois de fotos e discursos, depois da despedida dos recém-casados... Depois de tudo isso, eu e Katniss damos algumas voltas ao som da música, deslizando pela pista de dança.

Ela inclina a cabeça em meu ombro, mas sequer tem tempo de relaxar. Um gemido de dor alto desperta a nós dois e, quando olhamos para o lado, vemos Effie com expressão assustada e Haymitch tentando tranquilizá-la. O chão todo molhado em volta deles é a prova de que a bolsa estourou.

— Chame uma ambulância, por favor! — Ele balbucia para mim.

— Haymitch, não quero uma ambulância. Providencie um aerodeslizador imediatamente! — Effie retruca.

— Effie, não há mais tempo! Não podemos arriscar. Os bebês vão nascer no Distrito 12 mesmo — Haymitch sentencia.

Através das janelas, vejo que a neve deu uma trégua. Engulo em seco e corro para o telefone. Explico a situação ao atendente do hospital e a ambulância chega em pouco tempo, mesmo com as condições adversas da estrada.

— Obrigado, garoto — Haymitch me dá um tapa nas costas, visivelmente aliviado, quando aviso que o veículo já está aguardando do lado de fora.

— Katniss, eu preciso que você fique comigo — Effie implora.

— Efiie, eu sou a pessoa menos indicada para isso — Katniss protesta, não por insensibilidade, mas por estar aterrorizada.

— Lindinha, eu sei que é difícil pra você, mas, se você está assustada, imagine o estado da Effie — Haymitch afirma com toda a franqueza que só ele pode ter. — Vem com a gente — Ele solicita e Katniss aceita.

— Encontro vocês lá daqui a pouco. Vai dar tudo certo — Eu auxilio Haymitch a levar Effie até a ambulância.

Pego o agasalho de Katniss e ela segue com eles, segurando a mão de Effie e acariciando sua testa.

Aguardo todos deixarem a padaria, com o pensamento longe daqui, e visto o meu casaco. Saio no exato momento em que recomeça a nevar. Por sorte, houve tempo de a ambulância chegar ao hospital bem antes disso. Durante minha caminhada, o vento fica cada vez mais forte e eu tenho que abaixar a cabeça para avançar.

Ando tão rápido quanto minhas pernas me permitem. Uma vez sob a marquise que protege a entrada do hospital, sacudo como posso a maior parte da neve pesada que está sobre meus ombros e braços, até que vejo Katniss com os olhos vermelhos surgir no saguão de entrada. Sem me importar por ainda estar coberto de flocos brancos, eu entro e ela me vê.

Ficamos apenas olhando um para o outro enquanto outras pessoas andam ao nosso redor, nenhum de nós fazendo um movimento. Algo aconteceu. Algo se passou com alguém. Ou com ela mesma.

— Peeta, os bebês nasceram... Eles são.... São lindos e saudáveis. E presenciar o nascimento deles foi a experiência mais... mais...

— Eu sei que não há palavras para definir.

Ela balança a cabeça de um lado a outro e, alguns segundos depois, corre para me abraçar. Não sei quem chora mais, se sou eu ou Katniss. Ela me leva até o berçário, mas as crianças ainda não estão lá.

Espero impaciente até Haymitch aparecer com dois pacotinhos em seus braços, com um sorriso imenso e irreconhecível no rosto. Quando eu vejo as suas carinhas rosadas, por entre mantas e toucas, eu entendo perfeitamente o porquê.

Como Haymitch me prometeu, sou o primeiro a dar banho nas crianças. Katniss, por sua vez, não perde a oportunidade de segredar para eles que ela será a primeira a levá-los à floresta, quando tiverem idade para isso.

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Desde que Elliot e Maysilee nasceram, vê-los pela manhã e seguirmos com as tarefas de cada dia passou a ser a nossa deliciosa rotina.

Nas últimas semanas, porém, foi difícil nos acostumarmos à falta que fazem nossos pequenos vizinhos, que foram passar uma temporada na Capital com os pais. No entanto, para a nossa completa felicidade, os gêmeos não aguentam ficar muito tempo longe do Distrito 12.

Estou agora colocando no livro de memórias as últimas fotos que Effie e Haymitch nos enviaram da Capital, do dia em que as crianças completaram seis meses.

Os quatro voltaram para casa ontem, porém apenas conversamos com Effie e Haymitch. Não vimos os bebês, pois já estavam dormindo quando chegaram.

— Já terminou?— Katniss me pergunta pela terceira vez.

— Quase. Você está morrendo de saudades, não é? — questiono e ela confirma com a cabeça.

Deixo o livro aberto sobre a mesa para selar as páginas com sal marinho mais tarde, pois também estou sentindo muita falta daquela dupla adorável.

Quando chegamos a casa deles, Haymitch está sentado na poltrona, com a cabeça para trás e os braços e pernas jogados para os lados.

— Haymitch! Bêbado a essa hora da manhã? — Katniss brinca. — Você é pai de duas crianças!

— E eu não dou conta de vocês dois?— Ele desperta de mau humor. — Estou bêbado, sim, queridinha! De sono... Estão nascendo os dentes dos bebês e está difícil descansar. Preferi poupar a Effie essa noite.

— Pelo menos, a ressaca não é tão desagradável — comento de modo divertido e ele dá um sorriso torto.

— Você tem razão. É diferente agora. Eu era um bêbado miserável, viciado, hoje eu sou um bêbado de sono. Mas um bêbado feliz, muito feliz. Viciado também, mas apenas na minha família...

Nesse instante, Effie surge no andar de cima, com os gêmeos nos braços. Suas roupinhas são idênticas, apenas de cores diferentes.

Os dois se parecem bastante entre si e, em minha opinião, suas feições lembram muito a Effie. Os olhos azuis e os cabelos claros são definitivamente iguais aos da mãe. No entanto, distingo também alguns traços do Haymitch.

Ao avistar Effie no alto da escada, Haymitch levanta rapidamente para ajudá-la a descer os degraus, pegando Maysilee nos braços.

— Obrigada por ter me deixado dormir um pouco mais, Haymitch. Foi um sono restaurador! — Effie afirma, mas boceja ao final da frase.

Elliot olha para a mãe atentamente e repete o gesto dela, abrindo a boquinha e enrugando os olhos.

— Mas, se tivesse oportunidade, você dormiria mais um pouco, Effie? — pergunto, já esticando os braços para pegar o menino do colo dela.

— Com certeza! — Ela e Haymitch falam em coro.

— Então, aproveitem! Eu e Katniss ficamos com as crianças enquanto vocês descansam.

Effie parece não acreditar e olha espantada para mim e para Katniss.

— Eles já estão comendo alimentos sólidos. Se sentirem fome, vocês podem dar algumas das frutinhas que estão ali — Effie aponta para a cozinha.

— Não se preocupe! — Katniss fala.

Effie estende a mão para Haymitch e os dois sobem a escada depressa.

Eu e Katniss nos sentamos com os gêmeos nos tapetes multicoloridos e acolchoados que agora dominam a sala de estar. Nós nos arrastamos e rolamos no chão, acompanhando as travessuras dos pequenos.

Os dois estão crescendo muito rápido. Parece que foi ontem que segurei pela primeira vez seus corpinhos miúdos e frágeis, que já estão gorduchos e firmes, a ponto de ensaiarem as primeiras engatinhadas.

Agora estamos eu e Katniss deitados com os bebês acomodados em nossas barrigas. Meu queixo parece ser o mordedor ideal para coçar as gengivas de Elliot. Já o mordedor preferido de Maysilee é o cotovelo do irmão. Elliot nem se incomoda.

Eu ergo o menino no ar inúmeras vezes, enquanto sua risada se espalha pela sala e contagia a irmã, que ergue seus bracinhos para que eu faça a mesma coisa com ela. Antes disso, consigo captar o olhar apaixonado de Katniss para essas duas criaturinhas tão pequenas, mas que promoveram mudanças tão grandes.

Effie continua sendo um arco-íris de disparates, mas está aprendendo a ser mais tolerante com atrasos e com deslizes no visual. Sua prioridade é o que é bom para seus filhos. E, como eles, ela aprendeu a amar o Distrito 12 como a sua casa.

Haymitch ainda é rabugento e implicante, porém seu sorriso, e não só a sua risada sarcástica, brota mais facilmente.

A maternidade transformou Effie. A paternidade transformou Haymitch. Elliott e Maysilee me transformaram.

E Katniss? Ela já se transformou em tantas facetas. Foi a menina da costura, a caçadora, a tributo voluntária, a garota em chamas, o Tordo.

Katniss ainda é todas elas. Será possível que ainda caibam mais transformações? Ela diz que vai deixar as coisas como estão. Ao menos, por enquanto.

No entanto, não perco as esperanças de um dia ela querer se transformar em algo mais.

 

 


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Notas finais do capítulo

Oi de novo!

Dia dos namorados é o dia de todos os que amam e se amam...

Então, feliz dia dos namorados para todos!

Love is all we need!

Beijos!

Isabela