Unknown escrita por DreamingAboutLife


Capítulo 1
Prólogo – She knew him




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A noite já atingira o seu auge de escuridão e silêncio quando o carro entrou na pequena estrada de terra batida. Os faróis a única fonte de luz enquanto passava por altos pinheiros que, vigilantes, ladeavam o caminho havia mais de um século. Passaram-se cinco minutos até que uma clareira se abrisse, revelando uma casa antiga de dois andares.

Encostou o carro junto à varanda exterior e desligou-o. A escuridão envolveu-a, mas os seus olhos depressa se adaptaram. Retirou o saco de viagem do banco traseiro e colocou-o ao ombro antes de sair do veículo. Deteve-se então no pequeno lanço de escadas que levava à varanda, deixando a sua cabeça tombar para trás e os seus olhos observarem os contornos escurecidos pela noite da casa onde passara a sua infância e parte da sua adolescência. Não esperara vê-la tão cedo.

Retirou as chaves da carteira enquanto subia as escadas. O tilintar de metal e o ranger de madeira enchendo o ar. Preparava-se para colocar a chave na fechadura quando se apercebeu que a porta se encontrava apenas encostada. As suas sobrancelhas uniram-se em confusão. Um olhar mais atento levou-a a perceber que a madeira em volta da fechadura se encontrava lascada. A porta fora arrombada, percebeu, e muito recentemente.

O som dos seus batimentos cardíacos ecoou nos seus ouvidos. A sua respiração ficou mais pesada enquanto o peso do medo e do nervosismo se instalava no seu estômago. Empurrou a porta com cuidado, esperando que a antiga madeira não range-se. A precária luz provida pela lua cheia iluminou a entrada.

Um passo. Outro passo. Deixou cair levemente o saco no chão e levou a mão direita em direção à pequena mesa de apoio encostada na parede, mesmo ao lado da porta. Os seus dedos tatearam levemente por baixo do tampo, até sentirem a superfície fria de metal. A sua mão fechou-se em torno do objeto, puxando-o silenciosamente para si. Sentiu-lhe o peso enquanto os seus olhos percorriam a área. Olhando para as suas mãos abriu a câmara, verificando que esta estava preenchida e voltou a fechá-la. Destravou o pin de segurança e ergueu o revólver com as duas mãos, agradecida que o seu pai tivesse insistido que ela frequentasse aulas de tiro quando fizera dezoito anos.

Mantendo a arma ao nível dos seus olhos caminhou o mais levemente que era capaz sobre as antigas tábuas escuras de madeira, cujo brilho há muito começara a desaparecer devido à quantidade de passos que haviam testemunhado. Apenas a luz da lua iluminava o interior, mas os seus olhos depressa se habituaram à iluminação precária. Empurrou com a ponta dos dedos a porta imediatamente à sua direita. Varrendo a divisão – o antigo escritório do seu avô – com o olhar verificou que esta se encontrava vazia. Dirigiu-se então para a esquerda. Olhou para a escadaria, percorrendo com os olhos o caminho que levava ao andar de cima ao mesmo tempo que a arma. O seu olhar desviou-se então para o arco de madeira que abria caminho para a sala.

A luz prateada da lua dava um ar fantasmagórico ao local, envolvendo o seu conteúdo numa aura pálida e brilhante. Os móveis, que ela se recordava de serem de madeira polida de carvalho, com o seu ar austero e antiquado, encontravam-se envoltos em lençóis brancos, bem como os sofás azuis com padrão floral que a sua avó tanto adorara.

Mas, em meio à calma translúcida e clara da divisão, havia algo escuro e inquietante. Um vulto que ali não pertencia. No sofá mais comprido, encostado à grande janela que iluminava e aquecia a sala nos calmos finais de tarde de Verão, um homem dormia numa posição quase fetal. O seu volumoso corpo tremia de alguns em alguns segundos. Não de frio, ela sabia. Medo. Frio, penetrante e dilacerante medo.

E em contraste com a escuridão que era aquele vulto, algo brilhava sob o cálido luar. Metal. Metal prateado e reluzente, com uma estrela vermelho sangue, no lugar do que fora em tempos um quente e, provavelmente, amável braço.

Ela sabia quem ele era. Como poderia não saber?

As suas mãos tremiam e passos hesitantes levaram-na em direção ao sofá, enquanto a sua respiração saíade forma ríspida e descompassada. Os seus olhos escortinaram cuidadosamente a face do homem que havia arrombado a sua porta e adormecido no seu sofá. Exaustão era o elemento mais marcante, e a razão porque ele, certamente, não acordara ainda. E foi quando fez uma análise mais atenta, quando olhou por detrás da máscara de cansaço que, mesmo em meio aos traços e emoções que o escondiam, que ela o reconheceu.

Ela conhecia-o.

A sua mente entrou em frenesim, procurando sentido na situação, mas não o encontrando.

Baixou a arma e voltou a travar o pin de segurança. Pousou cuidadosamente o revólver no chão enquanto ainda o observava atentamente, os seus olhos nunca deixando a face tensa do homem. Abriu cuidadosamente a cesta de madeira que se encontrava ao lado do sofá e retirou uma manta. A mesma manta onde se embrulhara nas frias noites de inverno que ali passara sempre que os seus pais não a podiam ir buscar. Cuidadosamente, agradecendo mentalmente pelo estado de exaustão que parecia o ter arrastado para o mais profundo abismo da inconsciência, cobriu-o com o quente tecido, observando a sua face relaxar lentamente.

Ainda o observou durante mais alguns segundos, antes de pegar de novo na arma e recuar em direção à porta da entrada. Devolveu o revólver ao seu local de origem e fechou cuidadosamente a porta. Pegou então na sua mala e subiu as escadas, rezando a qualquer que fosse a entidade que reina-se no céu para que a madeira não estala-se sob os seus pés.

Percorreu o longo corredor e abriu a última porta à esquerda. A divisão cheirava a pó, mas o cheiro que mais sobressaía era o de agulhas de pinheiros verdes, o mesmo cheiro que sempre a embalara para dormir. Retirou todos os lençóis que cobriam a mobília de quarto branca antiga, revelando o quarto da adolescente que um dia fora, dominado pela cor azul céu que sempre gostara.

Abriu o saco e retirou um fino pijama, o qual vestiu assim que se livrou das suas roupas. Exaustão física e mental apoderaram-se de si. Não tinha força para pensar no quão infantil o quarto lhe parecia naquele momento – haveria mais do que tempo para mudar a decoração – ou no quanto provavelmente precisava de um banho quente. As almofadas decorativas da cama atingiram o chão e a roupa foi puxada para trás. Deitou-se, envolveu-se nas cobertas e, fechando a sua mente a qualquer pensamento antigo ou recente, deixou que a escuridão a tomasse.


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