A História antes da História escrita por P B Souza


Capítulo 5
Não há, nas trevas, egoísmo


Notas iniciais do capítulo

Chamam demônio, mas a palavra vem de antes de seu significado mundano.



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Abraça-me lentamente e consome cada centelha que ousaria brilhar. Antes no vazio sob as estrelas que encimavam seu lar, agora no infindável abismo aonde as trevas me abraçam.

Ó, doce Pai, me permita chamar-lhe de cruel, pois sabes Tu que assim és. Mas não viverás Tu apenas de meu desprezo, pois me fizeste capaz de ver grandiosidade nos outros, e Tua genialidade só se equipara a crueldade, mas há ai genialidade, e isso não posso negar.

Genial, é o que és, Pai, e vejo isso agora, vejo seu plano e entendo-te, e és sim genial.

Mesmo caído aonde finda a luz, posso ainda ouvir as trombetas e as harpas de meus irmãos a tocar ao seu redor, idolatrando-o. Posso ouvir o som angelical descender dos céus e cair nas trevas, centenas de milhares de quilômetros. Anos-luz de distância percorridos em segundos no vazio, mas agora, de alguma forma, eu sei que no vazio o som não há de se espalhar. Não faz sentido.

De repente, nas trevas, é como se eu pudesse ver a verdade por detrás da beleza da criação. O que é isso que me deste quando me roubaste a luz?

Ouso dizer que um presente, pois é bom, mas dói tanto! Agora eu entendo as distâncias, eu conheço as matérias e eu aprecio as próprias moléculas que formam a vida dentro de cada um de nós. Ó, Pai, deste-me o saber junto do abismo, e cá estou eu, isolado com seres menores e ignorantes tão alados quanto eu, mas menores em tamanho, saber, força, luz e beleza. Deste-me esse saber e agora eu entendo que me criaste quase que imediatamente após criar o vazio, e que se passaram milênios de convívio e que meus irmãos são centenas de milhares de anos mais novos que eu e agora sei que Tu me manteve nas trevas, mesmo quando estava eu no céu, ao seu lado. Me guardou como um incapaz, por uma eternidade, me fazendo crer ser especial quando eu nada sabia.

E agora eu sei. Agora Tu me deste o saber, mas por quê? Castigado com o tempo, castigado com a eternidade e o saber. Castiga-me com Tua sina, então me vê como um igual, Pai?

Confia em mim o peso que carregas? O peso do saber?

De todos os defeitos que Tu tens, eu espelho-os quase todos. Mas este não, não sou egoísta como Tu.

Dividirei esse saber. Se sofrerei, todos os caídos sofrerão comigo e hão de entender-te, Pai. Eles hão de ver-te como eu vejo e sofrer como sofro e saber como és cruel. E nossos irmãos a tocar suas trombetas irão, em seu tempo, saber também. E verás que está sozinho, pois nenhum anjo poderá amar o monstro que Tu és. E nesse dia iras Tu reconhecer que errou? Me perguntou, com ansiedade.

E Tu há de chamar-nos Daimons, crias do conhecimento, já não mais filhos de Deus!


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