Heart on Fire in Her Hands (Hiatus Indeterminado) escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 13
Capítulo 12: Visões da realidade


Notas iniciais do capítulo

Boa madrugada!
Como vocês estão?

Quanto tempo, né? Eu sei que demorei, novamente... Mas, quem me acompanha no Twitter sabe que eu passei por vários bloqueios criativos e, também, que Heart é uma fanfic que me deixa muito insegura, tanto pela minha disposição quanto pelas exigências que eu faço a mim. É uma história que eu gosto muito, que tem uma Rachel que eu amo e que exige muito de mim ao ser escrita. Juntando tudo isso, eu simplesmente fico meses elaborando os capítulos. Tenho consciência disso e peço desculpas a vocês.

Falando sobre a Rachel dessa fanfic, eu sei que muitos já devem estar entediados com todo esse mistério sobre o passado dela, mas, eu prometo que está próximo do "fim". E isso é apenas uma parte de tudo que ainda tem para ser abordado por aqui. Por isso, por mais que o que eu peço sempre seja difícil, não me abandonem!

No mais, indico três músicas para esse capítulo: "Fell For You", Green Day; "Just Feel Better", Santana feat. Steven Tyler e "Letting The Cables Sleep", Bush.

Espero que gostem, boa leitura!



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As férias haviam chegado ao seu décimo dia e Rachel ainda não conseguia acreditar em tudo que acontecera. Dez dias foram necessários para que ela conseguisse remover parte do peso carregado por quase sete anos, ainda não era o ideal, ela sabia... Mas, já era um avanço. E era impressionante como uma pessoa que, até então, não estava presente em sua vida tivesse grande influência nisso, rivalizando com outra pessoa que não mais estava presente e, mesmo assim, definia grande parte do que era.

Rachel sentia-se mais leve, o sorriso vinha mais fácil e apesar daquele dia ser preguiçoso e modorrento, ela não estava descontente. Afinal, o que possuía não era pouco... Ainda não sabia se tratava de um coração, mas, já era algo, ainda mais para quem não possuía muito quando chegara a Santa Monica.

Na verdade, Rachel gostava de pensar que não possuía Quinn e que era a loira quem a encontrara.

— Rach, você vai querer mais um hambúrguer? - A pergunta de Finn soou distante em meio aos pensamentos apaixonados da morena, ele sorriu quando percebeu que a amiga não o escutara e continuou a olhá-la quando ela se tocou e, enfim, acenou positivamente com a cabeça mesmo não sabendo do que se tratava. Sam, que segurava os pratos enquanto o gigante virava os hambúrgueres, as lingüiças e vegetais na churrasqueira, deu um empurrão de leve nele e riu baixinho. - Eu acho que não fará sentido perguntar para Marley também.

— Não, podemos comer toda essa carne que elas sequer perceberão o que aconteceu. - Sam completou com um sorriso animado que lhe chegava aos olhos, os dois continuaram a observar ambas as garotas que continuavam perdidas em seus pensamentos. Uma esperando as horas passarem enquanto a outra esperava alguém chegar ao quintal dos fundos da casa de Puck.

Rachel conseguia apreender os aromas deliciosos do churrasco, mas, os seus pensamentos estavam distantes assim como suas sensações. O seu olfato lembrava-se do perfume adocicado e delicado de Quinn enquanto o seu tato lembrava-se do beijo inseguro e dos toques nervosos... Nenhum cheiro ou gosto seria capaz de superar aquela sinestesia sentida na noite anterior, era uma explosão que parecia uma supernova.

A morena perguntava-se o que Quinn faria agora, a última mensagem dizia que ela estava indo almoçar com os amigos em um lugar diferente - aparentemente, Santana quisera dar uma trégua no “Jewelry of The Coast” - e mesmo tratando-se de minutos de silêncio, Rachel já sentia falta dela.

Um prato foi colocado a sua frente, composto de carne, batata frita e legumes. Rachel sorriu para Sam e, também, para a sonora manifestação de seu estômago. Algumas sensações poderiam ser ignoradas, mas, certas necessidades não. Ela aprumou-se junto à mesa enquanto Marley vinha de prato em mãos para sentar ao seu lado. A loira tinha uma expressão preocupada que Rachel sabia bem a quem se referia, a morena não sabia se elas estavam efetivamente resolvidas, mas, mesmo assim, assegurou:

— O restaurante deve estar muito movimentado, fique tranqüila que Ruby logo estará com a gente.

— Eu só fico preocupada de não ter comida quando ela chegar. Nós duas sabemos que os meninos comem feito esfomeados, seja qual for o prato do dia. - Marley respondeu com uma careta enquanto apanhava os talheres, não existia resquício de insatisfação ou impaciência na voz dela, tudo parecia bem, por ora. Por isso, Rachel não resistiu e riu das palavras da amiga, levando um pedaço de carne vermelha à boca e deliciando-se com o molho de maçã especial de Finn. A morena olhou para o grandão e fez um sinal de positivo para ele que bateu continência, satisfeito por agradar. Depois, ela voltou-se para Marley e tranquilizou:

— Puck ainda não chegou e os meninos fizeram bastante coisa, garanto que sobrará comida. Se quiser, podemos fazer um prato para ela, mas, acho que não será necessário.

— Você está certa... Eu preciso relaxar quanto a isso. - Marley comentou decidida a acreditar naquilo que dizia, um tipo de comportamento que era bastante tradicional nela de forma que Rachel já estava acostumada. Também, era o tipo de atitude que fortalecia a ideia de que elas tinham superado o comportamento autodestrutivo da morena e a ingenuidade bondosa de Marley. A loira ajeitou os óculos de grau e empunhou o garfo e a faca, parecendo decidida a comer mesmo que a sua expressão não indicasse que estava com tanta forme assim. - Ruby já é grandinha e vivia bem antes de eu vir para cá.

— Olha, eu a conheço por tempo o bastante para saber que ela não tem muito juízo e que ela não estava muito bem antes de você... - As palavras brincalhonas, que soavam sérias devido ao imenso talento de Rachel em atuar, fizeram com que Marley erguesse os olhos do prato com a boca cheia de carne por mastigar. A morena gargalhou abertamente para o choque nos olhos azuis de sua amiga e tomou um gole satisfeito de cerveja antes de voltar-se à própria refeição. - Porém, uma refeição atrasada não vá matá-la... E também a conheço bem para saber que ela estaria aqui, com você, se pudesse.

A sinceridade dessas palavras aliada ao significado delas fez o rubor subir pelo pescoço de Marley levemente bronzeado por aqueles dias de sol na California. Rachel sorriu para o que provocou - um sorriso mais brilhante do que o que sorria no começo das férias -, satisfeita com a expressão sonhadora e apaixonada que surgiu no rosto de Marley e segurando a risada quando viu a amiga sorrir boba para o prato antes de resolver alimentar-se com mais ânimo.

A atração era uma coisa engraçada... Na verdade, aquilo que Marley sentia por Ruby e que Rachel sabia ser semelhante ao que ela mesma sentia por Quinn era engraçado. A comicidade contida daquele sentimento vinha da dualidade do que ele proporcionava, Rachel sabia muito bem disso porque queria se afastar de Quinn, no começo de tudo enquanto, agora, tudo que queria era estar perto da loira mesmo sabendo que elas não estavam nem metade de um dia longe uma da outra. Também quisera fugir do que começava a reavivar seu interior quando, agora, queria manter aquele calor dentro de si por mais que ele já estivesse aquecido partes das quais se esquecera depois de tanto tempo sozinha.

Era tudo ao extremo e tudo intenso, sensações que a morena não mais lembrava e das quais, agora sabia, sentia muita falta.

Há muito tempo, Rachel pedira para nunca mais depender de alguém para ser feliz, porém, esse sentimento - isso que fazia Marley sorrir bobamente para o próprio prato de comida e que fizera Rachel dançar na areia da praia com a garota mais bonita que já conhecera - vivido e retribuído mostrava a ela que viver sozinha era um erro. Talvez, tudo isso resultasse em dor depois... Mas, do que valia uma vida sem riscos? Uma vida resumida a relacionamentos relâmpagos? Hoje, tudo que Rachel queria era uma tempestade inteira... E a bonança que poderia vir depois dela.

A morena se esquecera das estrelas porque o seu céu estivera nublado pela passividade, até então. A noite anterior expulsara as nuvens e agora, tudo que ela buscava era o brilho das estrelas que não mais estavam longe de seus olhos e sim, próximas a eles, dentro do verde do olhar mais intenso que já recebera.

Rachel parou, novamente, de comer para dar o próprio sorriso bobo para o prato. Mesmo imersa em seus pensamentos, ela sentiu que era a vez de Marley observá-la e não sentiu vergonha quando viu que a amiga ria.

Naquele momento, com tudo aquilo dentro do peito e todo aquele brilho iluminando o caminho à frente, ela sentia-se invencível.

Foi o som desordenado de várias buzinadas que fizeram Rachel despencar das estrelas douradas, a morena virou a cabeça bruscamente, procurando o som e encontrando-o no jipe de Puck. O bad boy estava no volante, de óculos escuros e sorrindo de forma maníaca. Uma carretinha estava acoplada à traseira do veículo e, enquanto observava o amigo manobrar e estacionar, Rachel discerniu os contornos de vários instrumentos musicais.

A morena franziu a testa para essa constatação, os seus olhos castanhos procuraram Marley que engolia em seco, as mãos sobre o colo e o prato abandonado, definitivamente. Aquela ideia de inscrever-se em um concurso de bandas já estava no hall das piores que Puck tivera. E esse hall incluía a vez que ele convencera a todos de embebedarem-se e dormirem na praia, numa noite que indicava que choveria em Santa Monica.

Rachel respirou fundo ao voltar os olhos para Puck, ele descia do jipe animado, assoviando uma melodia qualquer. Finn e Sam já estavam em pé, olhando analíticos para os instrumentos. A morena também se levantou e, preocupada, comentou para Marley:

— O concurso de bandas do píer continua em pé.

— Infelizmente. - Marley respondeu em um tom tão miserável que provocou uma pena genuína em Rachel. A morena realmente desejou que fosse capaz de cantar, como antes, para salvar a amiga daquela roubada... Contudo, algo também lhe dizia que, caso aquele temor dos palcos fosse superado, Marley seria muito mais realizada na música do que era atualmente.

E, talvez, aquelas férias fossem o que ela precisava para superar isso, visto que nem os mais exigentes professores de Julliard conseguiram levá-la para apresentar-se nos concertos que tinham em New York. Rachel sabia do talento que a amiga tinha, assim como sabia das dificuldades dela - a timidez e a insegurança, por exemplo - e, acima de tudo, acreditava nela. O bastante, pelas duas.

— Então, não desistimos daquela ideia absurda de fundarmos uma banda? - Sam perguntou sarcástico, apanhando uma das caixas de som que Puck trouxera e entregando-a a Finn que logo a carregou para a garagem nos fundos. O churrasco era no gramado que separava a casa dos fundos, havia espaço ali, mas, era melhor deixar aqueles equipamentos protegidos. Ele apanhou a outra caixa de som. - Ao menos, o meu dinheiro não foi gastado à toa.

— A ideia nunca foi absurda e nem mesmo esteve fora de cogitação, pequeno Sammy! - Puck exclamou eufórico, apanhando duas das três cases e acenando com a cabeça para que Rachel apanhasse a última. A morena o olhou com certo desagrado, mas, não lhe cortou o barato. Marley ainda não se manifestara e, enquanto o amigo passava aos saltos por ela, Rachel perguntou:

— Está tudo bem para você? Não precisamos fazer se não quiser.

— Eu estou nessa se você estiver... Só preciso me acostumar com a ideia. - Marley confessou insegura, mas, apanhando a case e levando-a consigo, determinada. Era mais um dos comportamentos confusos de Marley Rose e isso lembrou a forma como ela reagiu quando foram colocadas para trabalharem juntas. Marley sentia-se intimidada por ela, Rachel sabia e, na primeira reunião delas para decidir o projeto, revezava-se em ser autossuficiente propondo ideias e totalmente dependente quando não concordava e ficava calada, coisa que quase enlouqueceu a morena e que, depois, conquistou o seu carinho. Marley poderia ser - levemente - desastrada para se expressar, mas, sabia como superar certas situações.

Não seria diferente de uma pessoa que, atualmente, estava com Ruby Clearwood sem jamais ter dado a entender que se interessava por mulheres antes. E que estava bem por isso, sem passar por qualquer crise.

Rachel sorriu para a amiga e apanhou uma bolsa cheia de fios antes de correr atrás da amiga. Marley depositou a case no espaço que tinha sido aberto para instalar os equipamentos e os instrumentos, a morena não deixou de rir para o fato de que, agora, eles eram uma legítima banda de garagem. Os seus professores de Julliard não achariam isso ideal para as suas carreiras, ainda mais se tratando de alunas que eram destaques em seus respectivos cursos.

Esses pensamentos fizeram a morena navegar para outros, mais obscuros. A morena engoliu em seco só que, diferente dos dias anteriores, sorriu ao se lembrar de quem esforçava para não recordar, mesmo que a memória permanecesse intocada em sua mente.

Receosa, Rachel esticou a mão e tocou o pulso de Marley, a loira virou-se distraída para ela e logo se recompondo ao notar o brilho nos olhos castanhos. Rachel colocou mais força naquele sorriso, afinal, já tinha um pouco dela ainda que a dor fosse a mesma. Marley segurou a pequena e talentosa mão morena junto de si, Rachel apertou os dedos pálidas e, cúmplice, confessou nostálgica:

— Eu prometo para você que fica muito mais fácil quando tem alguém que gostamos na platéia. E você tem essa pessoa, ela só não chegou aqui, ainda.

A loira sorriu agradecida para as palavras da pequena morena e, inesperadamente, abraçou-a. Um abraço apertado e sufocante, um dos legítimos abraços descompensados e cheios de carinho de Marley Rose. Rachel riu de encontro aos cabelos loiros e aos braços que a apertavam e já lutava para se separar dela quando Marley a manteve firme e sussurrou junto dela:

— Você também tem alguém.

— O que tá rolando aqui? Ruby e a loirinha fotógrafa devem ficar preocupadas? - A voz jocosa de Puck chegou aos ouvidos de ambas e elas se separaram, ligeiramente assustadas. Marley rolou os olhos para o bad boy, desviando-se dele enquanto Rachel se aproximava e dava um soco no abdômen dele, fazendo-o grunhir de dor:

— Qual o seu problema, Berry?!

Rachel o ignorou, passando por ele e com as risadas de Finn e Sam ao fundo, ela apanhou o celular e digitou a mensagem, sem temer enviá-la daquela vez.       

 

— Não que o “Jewelry of The Coast” seja ruim, mas, uma mudança de ares não faz mal a ninguém... - Santana comentou satisfeita à frente de Quinn e Brittany que deixavam o restaurante de comida japonesa, a loira de olhos azuis deu dois passos mais largos e alcançou a namorada latina, abraçando-se a ela e sorrindo grande.

Santana retribuiu aquele sorriso com um tão iluminado quanto, essa era mais uma das coisas que a latina guardava especialmente para a namorada, coisas que Quinn não entendia muito bem - mas, admirava - até então. Porém, agora, a futura designer sabia que não podia desdenhar daquilo porque sentia o mesmo em relação a Rachel... Tanto que sabia que o sorriso que surpreendeu os seus lábios, naquele instante, era diferente do que o que estava acostumada a dar rotineiramente.

O trio continuou a caminhar sempre em frente, sem olhar para trás, macerando os cascalhos do estacionamento que atravessavam. Kurt havia ficado para trás, determinado a ser cavalheiro o bastante para fechar a conta para elas. Santana lutou contra a brisa oceânica que tirou alguns fios escuros do lugar antes de colocar os óculos de sol, Brittany ajeitou o boné com a aba para trás nos cabelos loiros e Quinn estava com a câmera em mãos, determinada a tirar uma foto dos contornos das duas sob a iluminação do estacionamento quando o seu celular vibrou no bolso traseiro de sua bermuda jeans.

O vibrar do celular já fora algo trivial, algo que significava a vida real a apanhando no meio de um Verão de sonhos, longe dos julgamentos e necessidades dos pais... Contudo, recentemente, assumira um significado quase que especial. Por mais que existisse a decepção quando as mãos afoitas de Quinn desbloqueavam o aparelho e visualizavam uma mensagem ou uma ligação perdida dos pais, também existia a expectativa de sempre ser surpreendida por uma mensagem de Rachel Berry.

E depois da noite anterior, aquilo que vinha de Rachel adquirira uma intensidade ainda maior... Porque o beijo tirara os pés de Quinn do chão e as palavras, aparentemente, podiam mantê-la flutuando nas nuvens.

Quinn largou a câmera com uma rapidez jamais vista, essa permaneceu repousando junto ao seu peito, sustentada pela alça envolvendo seu pescoço. As mãos trêmulas tatearam o bolso até fecharem-se em torno do aparelho e a loira quase o derrubou na ânsia de desbloqueá-lo. Essa sua pressa chamou a atenção de Santana que, antes de entrar no Old Beetle, arqueou a sobrancelha para tudo que acontecia. Brittany sorria enquanto observava Quinn e essa loira, consciente de que a observavam, suspirou irritadiça pela demora do pobre aparelho em ser desbloqueado.

Bom dia! Como você está? Eu juro que não quero parecer psicopata ou necessitada, mas... O que acha de nos vermos hoje? Os meninos estão aprontando e eu gostaria de companhia para agüentá-los, o que me diz?

Os olhos verdes brilharam para as palavras na tela, Quinn piscou lentamente, de forma que pode imaginar Rachel dizendo aquelas palavras, com aquele tom despreocupado e debochado que não escondiam todo o carinho que ela tinha pelos amigos com os quais tanto implicava. Tão rápido ela imaginara, a saudade já fez um pequeno buraquinho no peito de Quinn, mostrando-a que o sentimento entre elas era intenso tanto na presença quanto na ausência da outra. A loira estava decidida e disposta a ir onde quer que Rachel quisesse e estava prestes a perguntar para onde deveria pedir para que Santana a levasse quando o aparelho voltou a vibrar e se acender em suas mãos.

Estamos na casa de Puck e eu mandarei a localização assim que você me disser que sim (não aceito outra resposta, de forma que eu até tolero caso traga a demônia que você chama de melhor amiga).

A primeira mensagem trouxe brilho a Quinn e essa segunda, alegria. Ela riu abertamente para as palavras que, mesmo tão más, eram brincalhonas e ergueu os olhos para quem elas se referiam, Santana tinha uma careta no rosto e abaixara os óculos escuros, julgando-a com os olhos escuros. Quinn abrira a boca para responder, mas, foi interrompida por Brittany que, empolgada, disse:

— Eu aposto que essa mensagem veio de certa morena linda de pernas longas e sorriso cativante, acertei?

— “Morena linda de pernas longas e sorriso cativante”?! Eu achei que fosse a única morena que importava para o seu coração, Britt-Britt! - Santana disparou indignada e Quinn soube, de imediato, que era tanto por Rachel reaparecer quanto pela namorada ter reparado em outra morena que não fosse ela mesma. Quinn também sabia que a implicância de Santana com Rachel era uma forma de mostrar que se importava e, por isso, não levou a sério, revirando os olhos para o comportamento infantil da melhor amiga. Brittany riu antes de corar e parar, com dificuldade, diante do olhar ofendido de Santana. Era evidente que ela estava divertindo-se com toda aquela situação. - E eu não sei o que pode ser tão engraçado nisso tudo!

— Você não precisa achar nada engraçado até porque, eu acho fofo quando você fica assim, cheia de ciúmes, Sant... - Brittany respondeu com a voz apaixonada, deixando um beijo delicado na bochecha da latina que não conseguiu sustentar a expressão dura, derretendo-se naquele carinho. Quinn observou as duas, disposta a alfinetar e implicar, mas, falou miseravelmente.

Durante tanto tempo, em meio a implicâncias e tirações de sarro, Quinn desejou ter algo como o que as amigas possuíam. E agora, que tinha algo começando e se desenvolvendo dentro do seu peito, ela via que era incapaz desdenhar de algo que podia mudar - e salvar - uma vida.

Não que uma vida pudesse girar em torno de um amor, mas, ela era muito mais mágica quando vivida através dele.

Quinn sabia disso agora. Significados mudaram desde que Rachel se aproximara dela e novos horizontes foram enxergados desde que beijarem-se na praia. A vida era muito mais do que vivia, amar despertava aspectos adormecidos de si e agora, ela nutria-se desse sentimento para desejar e sonhar.

Era bom flutuar acima do chão, porém, era ainda melhor quando podia voar em meio aos sonhos.

— Hey, Quinn! - A voz de Santana, elevada e mandatória, estalou o cérebro de Quinn de volta para a realidade. A loira sobressaltou-se, amparando-se à lataria do Old Beetle enquanto sorria de maneira desconcertada para o casal de amigas. Ela imaginava como estava sendo complicado e esquisito para as duas, tão acostumadas em vê-la presa às aparentes certezas inquestionáveis da vida, tê-la assim, tão distraída por sentimentos e sensações. Quinn ergueu os olhos, ainda segurando o aparelho nas mãos, abraçando-o como se ele fosse Rachel. - O que a anã queria contigo?

— Você não precisa chamá-la dessa forma, é de bom tom e de excelente educação. - Quinn bronqueou entediada provocando apenas um revirar de olhos em Santana, seguido de algumas palavras de baixo calão em espanhol. Brittany olhou de uma para outra, segurando o riso e beliscando a latina, de forma carinhosa, na barriga. Santana riu e Quinn também, a irritação desaparecendo. - Ela e os amigos estão fazendo alguma coisa, perguntaram se gostaríamos de ir... Se vocês não quiserem, podem me deixar lá e eu arrumo um jeito de vol...!

— Até parece que eu vou deixar aquelas mãos de homem tocarem na sua pureza longe dos meus olhos, Fabgay! - Santana exclamou determinada, ficando em pé nos bancos do Old Beetle e provocando risos na namorada e na amiga, a latina olhou para as duas, aparentemente surpresa com essas reações, mas, mantendo a sua pose de protetora firme e forte. Quinn balançou a cabeça, perguntando-se quando deixaria de se surpreender com a melhor amiga e respondeu desafiadora:

— Você não estava comigo na noite de ontem...

— Espera aí! O que foi que aconteceu ontem?! - Santana perguntou alarmada, despencando do alto do seu drama protetor e com os olhos escuros arregalados para Quinn. Brittany apenas observava a interação das duas, essa loira sabia que esse jogo de provocações era a forma de ambas demonstrarem que gostavam muito uma da outra. Quinn podia ver a curiosidade revirando-se dentro da melhor amiga, mas, manteve a sua pose determinada e respondeu cheia de mistério:

— Se eu não contei ontem, quando cheguei ao restaurante e você me interrogou, o que a faz pensar que eu direi agora?

Cuna blanca azeda! - Santana xingou furiosa, batendo a testa no volante do Old Beetle, buzinando sem querer, sobressaltando-as. O som atraiu a atenção dos poucos passantes do estacionamento para elas que, só gargalharam, quando os olhos julgadores passaram. Quinn ainda se recuperava do momento quando o seu olhar encontrou o de Santana.

Longe da brincadeira e das risadas, os olhos escuros entregavam orgulho e apoio. Sentimentos que Quinn sabia que não encontraria dentro da sua família de sangue e que estavam presentes em sua família por escolha. As conseqüências do que sentia por Rachel assustavam cada vez que pensava nelas - por isso que, de certa forma, evitava pensar e preocupava-se em viver -, mas, a proteção que Santana estava determinada a lhe dedicar dava forças para rir do que era mesmo que assustasse mostrar isso ao mundo.

— Será que eu não posso deixar as três mocinhas sozinhas por um minuto sem que vocês chamem a atenção do mundo todo? - A voz de Kurt, sarcástica e brincalhona, chamou a atenção das três que se viraram para encontrar a voz. O rapaz vinha caminhando até o carro enquanto guardava a carteira no bolso da bermuda, antes de chegar ao carro, ele colocou os óculos escuros e tirou o celular do bolso. Ele e Quinn pularam para o banco de trás enquanto Santana ligava o carro, Kurt remexeu-se no banco. - Então... Sam acabou de me chamar para fazer algo com ele e os demais, ele também me pediu para chamar vocês. Estão a fim?

— Você está atrasado como sempre, pequeno Hummel! Nós já estávamos indo para lá! - Santana anunciou enquanto manobrava o carro de forma brusca, fazendo com que todos grunhissem incomodados dentro dele. Kurt abriu a boca, mas, não se manifestou enquanto olhava para as amigas, corando furiosamente. - E depois disso, você terá que me explicar por que esse cover do Justin Bieber desenvolveu o hábito de chamar você para fazer coisas!

Foi com as piadas de Santana, as risadas de Brittany e os resmungos de Kurt que Quinn, com um sorriso nos lábios, respondeu para a Rachel que estavam a caminho.

As palavras digitadas acalentaram o coração de Quinn o aceleraram sem que ela percebesse, duas respostas de seu corpo para aquilo que ela não imaginava sentir quando começara o Verão. A loira sorriu para a tela do smartphone antes de bloqueá-lo, depois, ajeitou os óculos escuros junto ao rosto e inclinou a cabeça para o sol, enquanto repousava um dos braços no encosto do banco traseiro do Old Beetle.

Kurt, ao seu lado, digitava freneticamente e Quinn tinha um humor tão leve que estava determinada a enchê-lo por ele parecer tão concentrada, assim o teria feito se o seu próprio aparelho não voltasse a vibrar. Pela duração, a loira deduziu que se tratava de uma ligação. Ela sorriu antes mesmo de levar o aparelho ao ouvido e mal olhara quem ligara ao atender, animada:

— Estamos a caminho...!

Pelo visto, você tem tempo o bastante para sair e não o suficiente para atender os seus pais, não é, Lucy? — A voz naturalmente impositiva de Russel Fabray enviou, através das milhas que separavam a California de Ohio, um iceberg que, instantaneamente, congelou Quinn. A boca permaneceu aberta sem pronunciar qualquer palavra, o sorriso se perdeu em meio à expressão chocada, o calor foi congelado pela frieza de uma realidade que ela esquecera naqueles dez dias de Verão... Os olhos verdes perderam os seus focos dourados, tornando-se frios, como esmeraldas. Quinn se metamorfoseava quando estava junto aos pais e ela podia sentir que os seus amigos também, três pares de olhos preocupados a observavam, sabendo o que estava acontecendo. - Eu achei que tivéssemos criado você bem o bastante para não ser irresponsável dessa forma... Porém, eu não deveria esperar menos de uma viagem com esses seus amigos...!

— Não os culpe, eu avisei Frannie sobre a rotina maluca dessas férias, ela sabia e eu não tenho culpa se ela não explicou a vocês! - Quinn interrompeu o pai com a voz controlada, ainda que estivesse com vontade de esbravejar sobre tudo o que acontecera e acontecia naquele Verão. Ela sentia a ânsia de revelar quem, de fato, era. Aquela vontade parecia arranhar as paredes do controle que, por tanto tempo, seguraram-na. Diferentemente de todos aqueles anos, ela agora tinha um motivo... Não que Rachel fosse a razão, mas, a morena fazia parte do que a motivava a falar sobre quem era, de fato. Agora que se conhecera, que provara que o que sentia não era errado, Quinn não queria voltar atrás.

Os resmungos de Russel atraíram Quinn de volta à superfície furiosa do seu oceano pessoal. Santana a observava pelo retrovisor enquanto tentava se manter atenta ao trânsito, Brittany tinha o corpo totalmente voltado para o banco de trás, mordendo o lábio e Kurt estava mais próximo, afagando-lhe a mão livre e olhando-a com um daqueles olhares de apoio e, também, de orientação. Os olhos claros do amigo estavam calmos, exigindo que ela também ficasse daquela forma, Quinn obrigou-se a respirar profundamente e fechar os olhos, em seu ouvido, o seu pai era afastado do telefone e a voz de sua mãe, Judy, substituiu-o:

O que seu pai quer dizer é que gostaríamos de ter ouvido sobre os seus primeiros dias de férias diretamente de você, querida... É a sua primeira viagem sozinha, estamos em nosso direito de nos preocuparmos.

— De não confiarem em mim, isso que a senhora quis dizer. - Quinn rebateu com ironia, até mesmo sorrindo para a audácia de revidar daquela forma. Claro que, se fosse pessoalmente, ela jamais seria capaz de responder daquela forma. O sentimento de alívio por poder agir assim, mesmo tão distante, a deixou mais corajosa. Porém, Kurt apertou-lhe o pulso em tom de aviso, deixando claro que não era momento para aquilo. Quinn entendia, mas, estava cada vez mais difícil manter-se ponderada diante dos pais e seus preconceitos. - O que eu quero dizer é que está tudo bem, eu só não tive tempo de ligar nesses primeiros dias... E, também, eu queria descansar. Não atendê-los faz parte disso. Eu tentarei mantê-los informados de agora em diante.

É tudo o que precisamos... E lembre que queremos o melhor para você, nada além, Lucy. — Judy respondeu tranquilamente, de uma forma tão natural que Quinn poderia ter acreditado nela se não tivesse se decepcionado o bastante com a mãe antes. As poucas palavras sussurradas depois disso foram despedidas apressadas, a mão trêmula de Quinn imediatamente encerrou a ligação.

O smartphone que fora uma espécie de âncora de felicidade nos momentos imediatos à mensagem de Rachel, tornou-se um fardo. Quinn colocou-o de lado, no banco, entre ela e Kurt. O aparelho voltou a vibrar e ela não fez menção de verificar o que era, ocupou-se em olhar fixamente para frente, onde Brittany a observava sem saber o que dizer.

A voz de Kurt soou distante quando ele, nervoso, disse que Rachel enviara a localização. Santana pediu que encaminhasse para o seu próprio aparelho e logo, o endereço, que até então significara felicidade para Quinn, se tornou real e visível no GPS do Old Beetle.

Diferentemente dos minutos antes da ligação, foi o silêncio que reinou no carro enquanto eles percorriam a avenida junto ao Pacífico. Quinn sentia o sol que, dessa vez, parecia castigar a sua pele e o cheiro da maresia que começava a enjoá-la... Os seus pais haviam corrompido a magia de Santa Monica.

E tudo que Quinn queria, naquele momento, era reencontrar-se naquele mar que aprendera a amar e naquele calor que a ninava até então. Ela queria o seu refúgio de volta... Ela precisava de Rachel.        

# # # # #

A banda na garagem soava, exatamente, como uma banda de garagem deveria ser: desordenada e mais uma perturbação aos vizinhos do que uma genialidade musical.

Os erros nas notas e no arranjo estavam evidentes, mas, misturavam-se às risadas de Rachel e aos xingamentos de Puck que não parava de se enrolar nos metros de fios que se acumularam no chão aos seus pés e dos outros. Ainda assim, Marley - que estava sentada em uma das cadeiras em frente aos quatro que tocavam - achava que eles estavam bem no que se propunham... Quer dizer, eles estavam se divertindo.

A própria Marley deixava-se levar pelas gargalhadas de Rachel, Puck acabara de levar um tombo quando tentou se desenrolar e a morena não conseguira continuar a tocar a sua parte na introdução de Fell For You da banda Green Day que eles estavam se propondo a ensaiar. Sam balançava a cabeça de um lado para o outro, tentando não rir de Puck enquanto Finn abandonara a música e tocava uma série de sons que Marley acostumara-se a escutar em problemas de humor, sobretudo, nos vídeos em que alguém caía de forma escandalosa.

Marley realmente não conseguia ver uma banda surgir a partir do que assistia.

— Ok, ok! Isso aqui foi só para aquecer, nós realmente precisamos ensaiar se quisermos algo naquele festival! - Puck exclamou irritado, o orgulho ferido enquanto empurrava Sam que começara a rir justamente quando Rachel conseguira parar. A morena apoiava-se no suporte de microfone, voltando a rir. Puck olhou de Sam para Rachel e também não agüentou.

Logo, todos estavam rindo de novo.

E, provavelmente, foi por causa do som mais baixo das risadas de todos que eles conseguiram escutar a campainha tocando.

Marley teve a reação mais rápida e levantou-se bruscamente, tropeçando nas próprias pernas antes de conseguir se equilibrar. O seu coração batia rápido e parecia que ele estava dentro de sua própria cabeça, tamanha era a força com que as suas batidas martelavam os seus ouvidos. Ela também estava ofegante e, pelo calor que sentia subir pelo pescoço, sabia que estava vermelha.

Quando os olhos azuis localizaram os outros, todos tinham sorrisos que Marley só poderia descrever como “cretinos”. Ela tentou ignorá-los para sair dali e abrir a porta o quanto antes, - a nova-iorquina estava ansiosa e era patético que fosse, justamente, por causa de uma pessoa -  porém, um chiado nas caixas de som a fez parar. Marley escutou a risada rouca de Puck amplificada pelo microfone cantarolar:

Break a leg and you crush my heart, I’m a mess and you’re a work of heart...

O calor aumentou e Marley sentiu que explodiria se ficasse ali mais tempo. Quando atravessou os fundos e entrou na casa, a banda, supostamente, achou o ritmo e conseguiu tocar as primeiras notas da música que não tinham sido tocadas por minutos. Dentro da casa, ela parou para respirar fundo e quando achou que estava apresentável o bastante, grunhiu:

— Bem engraçadinho da parte de Puck começar justamente por essa parte...!

— E essa parte teria alguma relação com você? - A voz naturalmente sedutora de Ruby sobressaltou Marley, contudo, ela foi rapidamente apaziguada quando os braços bronzeados da californiana envolveram a sua cintura. A nova-iorquina sentiu um beijo quente e úmido em seu pescoço que arrepiou a sua pele, ainda assim, ela encolheu-se àquele corpo procurando receptividade e familiaridade. Ruby a recebeu, apertando-se as suas costas. - Eu acho que a bagunça aqui sou eu e não você, sem contar que eu não tenho intenção alguma de quebrar o seu coração.

Os olhos azuis límpidos desapareceram por trás das pálpebras fechadas e do sorriso satisfeito que se desenhou nos lábios de Marley. Mesmo depois daqueles primeiros dez dias de Verão, ela ainda se sentia trêmula diante de todo calor convidativo que Ruby exalava. O que a californiana lhe provocava ainda tinha a mesma intensidade do início, acentuada pela relação ainda mais íntima entre elas... Marley sabia, agora, que nada daquilo mudaria. Ela estaria, para sempre, marcada por aquela mulher. A nova-iorquina suspirou realizada em meio aos braços cálidos e virou-se, levando os próprios ao pescoço de Ruby e sendo recepcionada por um beijo nos lábios, Marley sorriu para o carinho e, olhando nos azuis escuros da californiana, respondeu timidamente:

— Você não poderia ser melhor.

— Dessa forma, eu fico feliz por agradar! - Ruby suspirou apaixonada, roubando mais um beijo de Marley que, novamente, sorriu. Era impossível não sorrir diante daquela californiana e também era impossível não deixar-se levar por aquela onda morna e sedutora, deixando-se ir para um oceano desconhecido... Marley sabia que iria para qualquer lugar se estivesse acompanhada por Ruby.

E mesmo que elas tivessem num mundo paralelo que parecia muito distante dos sons dissonantes e desorganizados que vinham da garagem, elas precisavam encontrar o caminho de volta. Ruby separou-se, provocando uma saudade imediata em Marley que fez um beicinho descontente. Ruby apertou a cintura de Marley, beijou demoradamente a sua bochecha e sussurrou em seu ouvido:

— Precisamos ir.

— Para onde? - Marley perguntou descontente, olhando ao seu redor apenas para constatar que continuavam sozinhas e que os demais pareciam respeitá-las naquele raro momento juntas e sozinhas. Ruby riu baixinho e separou-se da mais nova, alcançando as chaves do Mustang no bolso do short desfiado que usava, olhou de lado para a nova-iorquina antes de responder:

— Para o carro, os meninos me pediram para trazer algumas coisas e eu preciso de ajuda para descarregar... Não quero abusar de você, mas, parece ser a oportunidade perfeita para continuarmos sozinhas, ao menos, por agora.

Marley pesou os pós e contras daquela proposta, porém, ela estava em um ponto em que qualquer coisa, quando colocada em oposição a Ruby Clearwood, perdia a importância. A verdade era que daria qualquer coisa para ficar mais um tempo se aproveitando única e exclusivamente da companhia da californiana. Por isso, a nova-iorquina aceitou a mão que lhe estendida e surpreendeu-se ao perceber que, tão naturalmente, os dedos de ambas se procuraram e se encontraram, entrelaçando-se. Ela riu sozinha quando percebeu que não fora puxada por Ruby, simplesmente gravitou até o bronzeado corpo californiano como se estivesse caminhando unicamente pelos próprios pés e mente.

Sensações como aquela não poderiam ser ligadas, somente, a uma mera atração... Marley tinha certeza que havia mais ali e isso, de forma alguma, a assustava.

As mãos só se desconectaram quando Ruby tomou a frente, caminhando até o porta-malas do Mustang e o abrindo depois de girar a chave. Naquele compartimento, Marley enxergou caixas de bebidas e pacotes de gelo. Ela revirou os olhos diante das “coisas” que os garotos solicitaram à californiana, já era de se esperar, se não fosse por ela e Rachel, eles provavelmente estariam vivendo de álcool, sol e mar nessa altura das férias.

Ruby antecipou-se e apanhou um pacote de gelo de cinco quilos com ambos os braços, Marley arqueou a sobrancelha para aquela atitude e apanhou dois dos oito engradados de cerveja Budweiser que foram solicitados. A californiana a contornou, o frescor permanecendo enquanto ela retomava o caminho da casa de Puck, ela arfava, mas, não vacilava na sua tarefa. Entretanto, a nova-iorquina apressou-se em acompanhá-la e perguntar preocupada:

— Não acha melhor chamar os garotos para ajudarem?

— Eu estou acostumada com isso, nos dias mais movimentados do restaurante, eu carrego pelo menos cinco desses em uma noite... - Ruby respondeu sorrindo, inclinando a cabeça para trás, o bastante para que pudesse olhar Marley enquanto respondia. A nova-iorquina observava o trabalho dos músculos dos braços e das costas bronzeadas da californiana, corando enquanto pensamentos impróprios para aquele começo de tarde começavam a povoar a sua mente. Ruby percebeu o seu sorriso e Marley suspirou desconcertada, voltando os olhos para o chão durante o resto do percurso.

As duas chegaram à cozinha e o saco de gelo foi depositado em cima do balcão com um grunhido de esforço vindo da californiana, Marley colocou os engradados que carregava ao lado enquanto Ruby arrastava uma caixa térmica para perto. A caixa vermelha foi aberta e Ruby jogou o saco de gelo no chão algumas vezes antes de tirar um canivete do bolso traseiro do short e o empunhá-lo, cortando o saco e despejando o seu conteúdo no interior da caixa térmica.

Marley sabia que não era educado, mas, não conseguia parar de olhar. Seria absurdo achar algo tão rotineiro imensamente sexy?

Ela não ficou para a resposta, enquanto Ruby jogava o saco no lixo, Marley já estava na rua, em frente ao porta-malas prestes a apanhar mais alguns engradados ou, talvez, algumas das garrafas de vodka e tequila que também foram trazidos. E ela se inclinara para alcançar o que restava quando sentiu as mãos geladas enlaçarem a sua cintura, tocando justamente na porção de pele de seu abdômen que aparecera quando a sua blusa subira. Marley sabia quem estava com as mãos geladas, porém, a sua primeira reação foi sobressaltar-se pela segunda vez naquele dia.

As risadas roucas de Ruby próximas ao seu ouvido a tranqüilizaram e a expiração quente dela, em seu pescoço, acentuou ainda mais a sensação fria diretamente na pele de sua cintura. Marley inclinou-se de encontrou ao corpo da californiana, totalmente invadida pelo perfume de maresia. Ruby a aconchegou em seus braços e através dela, alcançou uma garrafa de vodka e outra de tequila, enquanto sussurrava:

— Um pouco de frio para aliviar esse calor todo da California.

— Honestamente? Eu não sei qual dos dois eu prefiro mais, no momento. - Marley respondeu em um daqueles momentos em que ela falava o que vinha à cabeça, o silêncio de Ruby foi a evidência que ela precisava para constatar que falara demais e que, talvez, tivesse dado a entender mais do que queria. Entretanto, tudo que a nova-iorquina conseguia apreender era aquela mistura de temperaturas junto ao seu corpo. Ela virou-se no abraço de Ruby e encontrou os olhos azuis mais escuros do que ela se lembrava, querendo engoli-la, como se ela estivesse se afogando nas profundezas de um oceano.

As garrafas fizeram barulho dentro do porta-malas quando se tocaram no momento em que Ruby as largou no compartimento. Agora, a californiana se apoiava na lataria do carro, ligeiramente distante do corpo da mais nova que continuava presa entre os seus braços e hipnotizada pelos seus olhos. Ruby ajeitou o corpo e deu um passo à frente, invadindo o espaço pessoal de Marley, as duas respiraram o mesmo ar e sentiram o que exalava uma da outra. A boca de Ruby não procurou a de Marley e sim, a pele do pescoço mais claro. Marley sentiu os beijos, chupões e mordidas subirem, assim como sentiu a mão calejada da californiana invadir os seus cabelos, apanhando um bom punhado deles e os puxando, de forma prazerosa. Ela não queria, mas, gemeu em alto e bom som enquanto sentia Ruby sorrir maldosa de encontro aos seus lábios, quando a californiana falou, a boca dela tocava a sua tão levemente que provocava uma onda de arrepios angustiantes:

— Eu posso ajudar você a escolher... Ou, ficar com os dois. Porém, saiba que o calor sempre vence no final, ainda mais diante do que eu tenho em mente para nós duas.

Ruby dizia aquelas coisas e sequer vacilava enquanto Marley estava, praticamente, derretendo em meio aos braços dela. A proprietária do “Jewelry of The Coast” não fez a menor menção de aproximar-se e deixou que a outra tomasse a atitude e Marley, sem conseguir pensar em nada fora o desejo que tremia as suas pernas e nublava a sua razão, teria feito algo se não tivesse escutado passos apressados a se aproximarem.

Sons mundanos que a fizeram descer da sua nuvem de luxúria.

Quase que ao mesmo tempo, um som de motor também se aproximou e o Old Beetle conversível preto foi estacionado logo atrás do Ford Mustang 1968. Ruby, como se nada tivesse acontecido, virou-se em direção ao carro recém-chegado, deixando o seu corpo ceder de encontro ao de Marley. Essa engoliu em seco diante da proximidade e tremeu quando o seu par guiou os seus membros superiores, entrelaçando-os à própria cintura.

Aquela era uma posição nova que, diante das circunstâncias, poderia ser usada em benefício de Marley. Ela podia se esconder, afinal. E evitar as perguntas desnecessárias a respeito da razão de sua respiração errática e de suas pupilas dilatadas.

Os olhos azuis claros, dilatados e famintos, desviaram-se do pescoço perolado de Ruby que se mostrava tentador diante de si e procuraram os donos dos passos, encontrando Rachel e Sam caminhando apressados até os recém-chegados que já saíam do carro.

Mesmo tendo os seus sentimentos tão fora do controle, Marley não pode deixar de apreciar a falta de jeito e a timidez delicada de Rachel ao seu aproximar e cumprimentar Quinn com um beijo no rosto. Também não pode deixar de sorrir ao ver que a loira inclinara-se em direção a sua amiga, ansiosa por mais tempo e mais contato.

Não se lembrava de ver Rachel tão ansiosa e insegura diante de uma pessoa.

Sam também estava inquieto, sorrindo imensamente enquanto ajudava Kurt com potes de plástico que pareciam sorvete. Ele tinha um em cada mão e tentava convencer o outro a entregar-lhe mais um quando Kurt lhe disse que ele podia congelar as mãos se fizesse isso. Sam corou com essas palavras.

— E aí? Por que nos chamaram aqui mesmo? - Santana perguntou sarcástica enquanto ajeitava os óculos de sol e jogava as chaves para Brittany que, cuidadosamente, guardava-as na bolsa. Essa loira sorriu e acenou feliz para Marley e Ruby que retribuíram, quer dizer, Ruby retribuiu porque a nova-iorquina ainda respirava profundamente, tentando recuperar a calma com o corpo bronzeado tão junto ao seu. Rachel, que já conduzia Quinn e Kurt para dentro da casa, respondeu:

— Eu chamei você por educação, Lopez.

— Ah, por favor, não comecem! - Kurt exclamou dramático, empurrando Rachel para dentro da casa e virando-se para fuzilar Santana com os olhos. A latina sorriu demoníaca antes de se inclinar para o interior do Old Beetle, voltando a aparecer com mais um engradado de cerveja. Brittany, no lado do carona, fazia o mesmo e balançou a cabeça de forma negativa diante da troca de gentilezas entre a namorada e uma das anfitriãs. Esse casal passou por Ruby e Marley enquanto Santana respondia atrevida, gritando na direção de Rachel:

— Eu começo sim e termino com essa cosplay de Frodo se ela fizer algo de ruim a minha melhor amiga!

Por Deus, Santana! Eu sei muito bem o que estou fazendo! — A voz de Quinn soou irritada de dentro da casa, provocando risos no casal que ficara junto ao Mustang. Kurt e Sam já tinham entrado também e o silêncio voltou a permear entre as duas.

Ruby, então, virou-se nos braços de Marley e sorriu de forma inocente como se não tivesse provocado uma infinidade de sensações na nova-iorquina anteriormente. A mais nova suspirou pesado e encostou a testa de encontro à da outra e grunhiu:

— Eu realmente não sei o que faço com você.

As mãos bronzeadas voltaram a escorregar pelo corpo de Marley e depois, desapareceram. As garrafas voltaram a tintilintar e Ruby as apanhou, ela se virou para retomar o seu caminho para a casa, mas, antes de dar o primeiro passo, olhou para Marley que parecia uma bagunça feita de ofegares e rubor e disse sedutora:

— Você pode se aproveitar de mim, garota de Nova York!

Marley sempre fora uma boa garota - até então - mas, observando os quadris de Ruby rebolarem diante de seus olhos a cada passo que era dado, só conseguiu pensar em como eles ficariam entre as suas mãos. Precisamente, em seu colo.

Aquele pensamento provocou mais uma onda de tremores em seu corpo e quando ela apanhou uma das garrafas, ela escapou de sua mão, voltando preguiçosamente para o interior do porta-malas.

Deus, como ela tinha caído. Na verdade, como ela desabou diante dos encantos de Ruby Clearwood. Mal se reconhecia e, tampouco, queria voltar a ser quem era sem aquela californiana junto de si...

 

Rachel não conseguia tirar os olhos de Quinn.

Aparentemente, tudo que acontecera entre elas na noite anterior a deixara mais sensível a tudo que fazia parte de Quinn Fabray. Os olhos da loira pareciam ainda mais sedutores naquele dia, os flocos dourados continuavam a brilhar dentro deles, por mais que a imensidão verde estivesse estranhamente obscura, Quinn também parecia nervosa, as mãos dela não paravam enquanto ela terminava uma tarefa e, imediatamente, partia para a outra. Sem contar na postura, Rachel não se lembrava de tê-la visto tão tensa como naqueles poucos minutos desde que ela e os amigos chegaram à casa de Puck.

Não era egocentrismo de Rachel pensar que, talvez, aquela mudança brusca de amor tivesse relação com o que ambas fizeram na noite passada. A única circunstância que contrariava essa teoria era que Quinn parecia extremamente animada quando conversaram por mensagem antes de se encontrarem. Se algo acontecera, fora naquele curto intervalo de tempo... E fora algo intenso porque Quinn estava diferente de tudo que imaginara para ela naquele dia.

Com cuidado, Rachel se aproximou aos poucos. Enquanto os outros apanhavam as bebidas e iam para os fundos, a morena ficou e esperou um momento certo que ela sequer sabia se poderia existir. Quando, finalmente, Kurt e Sam foram os últimos a saírem, rindo satisfeitos para as cervejas que carregavam, Rachel tomou ar e encheu-se de coragem para, enfim, perguntar:

— Está tudo bem?

— Ah, oi, Rachel! - Quinn respondeu nervosa, mal erguendo os olhos para a morena enquanto arrumava o que fazer com as mãos trêmulas. Rachel continuou a diminuir a distância entre elas até que parou lado a lado, com os olhos na pia onde Quinn tentava ocupar as mãos lavando um copo que estava limpo há tempos. As mãos pálidas tremiam e a morena, em um ato de coragem, segurou a que estava mais próxima de si e tornou a perguntar:

— O que está acontecendo?

— Não é nada, é só que... - As poucas palavras ditas antes de uma nova interrupção não convenceram Rachel, ela permaneceu firme, olhando para a loira, extremamente atenta a qualquer ato que pudesse ao menos dar uma ideia do que Quinn sentia. Elas se conheciam há pouco tempo e mal sabiam o que tinham, mas, Rachel sabia que precisava fazer aquela garota a sua frente feliz. Era uma espécie de promessa silenciosa tanto para si quanto para a outra. Por isso, os olhos castanhos permaneceram firmes e encorajadores, Quinn os olhou e pareceu ter encontrado algo dentro deles. Rachel sorriu. - São meus pais... Na verdade, é bom que se acostume com eles tentando mandar em minha vida...

— Você disse bem. Eles vão tentar mandar na sua vida, mas, eu acho que você não vai deixar... Certo? - Rachel sentenciou sem nem ao menos saber se aquilo era possível de ser alcançado. Apenas sabia que era isso que Quinn precisava ouvir naquele momento, eram essas palavras que a encorajariam a ser quem sempre quisera ser e não o que os pais dela queriam que ela fosse. O sorriso humilde da loira fez o interior de Rachel explodir-se em ternura e carinho, as mãos morenas afagaram as mais pálidas e Quinn, ligeiramente ruborizada, sussurrou:

— Você não tem ideia de como eles são. Eles acabariam com você se soubessem o que andamos fazendo.

— E o que andamos fazendo, hein? - Rachel pergunta de forma brincalhona, aproximando-se enquanto deslizava as mãos pelos braços de Quinn antes de alcançar a cintura delgada. As palmas morenas se aconchegaram ali, na curva da lombar e ela ficou na ponta dos pés para beijar a linha da mandíbula de Quinn. Sorriu de encontro à pele que parecia sensível aos seus lábios. O ato em si era carnal, mas, o significado dele não. Existia muito mais ali, algo que Rachel ouvira falar e jamais vivenciara, até agora. - Não vejo mal algum no que fizemos.

Quinn não respondeu de imediato, ela arfou quando os lábios carnudos deslizaram pela sua mandíbula até o seu pescoço. A morena sentiu as mãos claras subirem e arranharem o seu couro cabeludo, arrepiando-a. Quinn massageava os cabelos escuros enquanto respirava com dificuldade diante dos carinhos recebidos, por fim, as mãos dela voltaram a se mover e encaixaram-se no pescoço de Rachel, forçando a morena a olhá-la. Os olhos esverdeados não possuíam o dourado dentro deles, naquele instante, pelo contrário, estavam intensos e escuros. Quinn os fechou e respirou profundamente, por fim, ela suspirou e, ainda de olhos fechados, disse sôfrega:

— Eu fui criada acreditando que isso era pecado, que os meus amigos iriam para o inferno apenas por amarem de forma diferente do resto do mundo...

— E você acha que isso aqui é pecado? - Rachel perguntou carinhosamente, segurando os pulsos que ancoravam o seu rosto e sorrindo para a expressão fechada e amedrontada de Quinn. A loira engoliu em seco, em seus olhos não existia dúvida, era mais um conflito... Como se Quinn estivesse prestes a abandonar, de vez, uma das poucas coisas que ainda conectavam-na com os seus pais. Em seguida, Rachel apanhou a mão direita dela, guiando-a até o centro de seu peito que guardava o seu coração acelerado. De cabeça baixa, com os olhos castanhos observando aquela mão de tez tão mais clara do que a sua junto a si, Rachel suspirou. Não era católica, mas, não tinha como algo assim ser pecado. - Você acha que isso aqui vai levar alguma de nós duas para o inferno?

O silêncio voltou a ocupar o pouco espaço entre elas, a respiração ofegante de Quinn tocava a pele de Rachel, tornando a situação e a posição que estavam mais íntimas do que pareciam ser. A morena sentia o seu coração acelerar a cada segundo, como se quisesse arrebentar todas as barreiras que o afastavam da mão que, física e metaforicamente, o segurava.

Rachel jamais se entregara daquela forma e, mesmo sabendo de todas as preocupações de Quinn e temendo por um afastamento caso aquele Verão se revelasse ainda mais extraordinário, sabia que seria de uma injustiça consigo se não se propusesse a vivenciar aquilo.

Tudo que Rachel queria que Quinn soubesse era que ela existia, que ambas existiam e que não havia problema em serem a primeira opção uma da outra. Se o inferno desabasse sobre elas por causa daquele sentimento - daquele sentimento que arrebentava o seu peito ao mesmo tempo em que a mantinha forte por Quinn, daquele sentimento que a fizera se recordar do que valia a pena em vida, daquele sentimento que sua mãe lhe ensinara a teoria e grande parte da prática, esvaziando-a quando foi embora -, Rachel abraçaria as chamas e as deixariam devorar a sua pele.

Respondendo à pergunta feita a Quinn por ela mesma: não havia como aquilo que sentiam ser errado. Existiam coisas piores no mundo.

As palavras pareciam ter perdido o caminho para a boca de Quinn, tudo que Rachel recebia era um olhar brilhante, enigmático, que escondia os significados ou, simplesmente, que os mascarava para não mais se questionar. Ainda assim, a morena esperou pacientemente até o momento que a mão pálida afastou-se de seu peito, foi como se uma onda gélida tivesse abraçado o seu coração e Rachel teria chorado se Quinn tivesse ido embora.

Mas, a loira não foi. Pelo contrário, ela permaneceu.

As mãos refizeram o caminho até ancorarem o rosto moreno que, no desespero, abaixara. Quinn ergueu o rosto de Rachel e sorriu, os olhos verdes voltaram a brilhar com aqueles infinitos pontos dourados neles, a morena contou as suas estrelas douradas pessoais enquanto a loira sorria e respondia trêmula:

— Eles me fizeram passar o inferno julgando quem eu sou e pontuando o que eu deveria fazer. Você me deixou escolher e eu escolhi, pelo menos, nesse Verão, eu irei com você até o inferno, se for preciso.

Rachel sorriu realizada para a força contida nas palavras de Quinn, a loira tinha uma forma de ver o mundo que não era evidente somente em suas fotos como, também, na forma como ela estava vivendo aquele Verão. A morena sentiu-se responsável por aquela alma que, durante tanto tempo, esteve aprisionada. Não sabia se estavam tomando o caminho da danação, mas, estavam dispostas a enfrentá-lo.

E, agora, ambas sabiam que talvez, o inferno que dividiam fosse capaz de queimar a realidade delas e, das cinzas que restariam, elas poderiam erguer um novo mundo, talvez. Ou algo que, simplesmente, fosse capaz de aceitá-las.

Sem julgamentos, sem preconceitos, sem pais, se fosse preciso... Só as duas e quem importava para elas.

# # # # #

— Ô gente, confirma aí! São quantas pizzas mesmo? Oito? - Puck elevou a voz acima do volume das conversas espalhadas pelo gramado e a garagem de sua casa. Os grupos tinham se formado, mas, não estavam tão separados assim. O tempo passara rápido demais e a tarde se converteu em algumas horas rápidas antes do anoitecer, nada restara do churrasco e do sorvete e muitos já haviam reclamado de fome. Puck ficou em pé e caminhou entre os grupos, sendo ignorado completamente.

Marley olhou instintivamente para Ruby, ela estava acostumada com essas coisas e, geralmente, assumia a liderança quando Rachel não o fazia antes. E a sua melhor amiga estava bastante distraída pela loira de olhos verdes que não parava de sorrir para ela. A californiana suspirou e deixou a cabeça cair na curva do pescoço de Marley antes de grunhir:

— Qual a serventia de Puck e dos garotos se eles mal conseguem comprar comida sem a ajuda de alguém?

— Eu acho que você e Rach os mimaram demais... - Marley respondeu sorrindo para o arrepio gostoso em sua pele provocado pela respiração de Ruby junto de si, a californiana riu roucamente antes de morder a pele do pescoço da loira e dizer entediada:

— Eu já acho que eles são folgados.

— Mas, são os seus amigos. - A nova-iorquina retrucou teimosa enquanto ria baixinho, já que as mãos de Ruby alcançaram a sua cintura e a apertavam, a californiana ainda beijava cada porção do seu rosto que conseguia alcançar, tornando difícil manter aquela insistência infantil e brincalhona. Marley retribuía os beijos sem saber em que momento a sua guarda abaixara e se entregara, completa e novamente, à californiana.

As duas teriam continuado dessa forma se não fosse por algumas gotas de água gelada espirradas em suas peles aquecidas pelo sentimento que dividiam, Ruby grunhiu irritada - de uma forma levemente animalesca que tornava praticamente impossível não agarrar-se de novo a ela - antes de se levantar e procurar com os olhos azuis faiscantes pelo responsável. Assim que encontrou Puck, sorrindo de forma sacana, a californiana colocou as mãos na cintura e vociferou:

— Eu não tenho culpa se você não sabe contar, Puckerman!

— Para a sua informação, eu sei contar sim, Clearwood! - Puck exclamou ofendido enquanto colocava o pacote de gelo dentro de uma das caixas térmicas e jogava mais uma pedra de gelo em Ruby, a californiana desviou e arqueou a sobrancelha para ele, visivelmente irritada. Marley contentava-se em observar o embate da posição privilegiada em que se encontrava: atrás de Ruby, sentada e em um nível que não ultrapassava a cintura da outra. A nova-iorquina corou ao imaginar como tinha uma boa visão da discussão. Ao seu redor, os demais riam baixinho. - Porém, quem tem um restaurante aqui é você e quem conhece o dono da melhor pizzaria da cidade, disposto a nos dar um desconto se você pedir, também é você!

As palavras sugestivas de Puck pareceram despertar Marley, ela se levantou devagar e circundou Ruby, parando ao lado dela. Os olhos azuis escuros não procuraram os seus e a mais nova arqueou a sobrancelha para esse fato, observou que Ruby engolira em seco enquanto escutava Santana sussurrar satisfeita:

— Quem diria que o Robin do Batman anão seria tão possessiva assim...

Ignorando-a, Marley perguntou interessada:

— E da onde você conhece o dono dessa pizzaria, Ruby?

Finalmente, a californiana virou-se para Marley. A nova-iorquina percebeu o rubor discreto nas bochechas peroladas e bronzeadas, também viu os olhos escuros assumirem um ar defensivo enquanto a dona deles gaguejava algumas respostas que jamais foram realmente ditas. A existência de um passado com aquele cara que Marley não conhecia - mas, já não tolerava - era evidente. E por mais que isso incomodasse, foi algo mais que chamou a atenção de Marley em Ruby e que começou quando a californiana procurou e encontrou a sua mão, afagando-a enquanto a olhava nos olhos.

As defesas haviam sido derrubadas, Ruby entregava que não existia mais nada ali, pelo menos, não em relação aquele cara. Marley suspirou aliviada e sorriu, o sorriso abrandando a sua expressão dura que não combinava com o seu rosto naturalmente gentil.

— Escuta o que a Titia Santana lhe dirá, jovem padawan... Quando dizem que nossas namoradas conhecem bem certos homens ou certas mulheres, não vale a pena perguntar o que isso significa. - A voz debochada de Santana chegou as duas, removendo-as daquele cenário tranqüilo em que elas se instalavam quando estavam juntas. E por mais que as palavras da latina tivessem a intenção de irritá-las, o que as pegou foi a forma como Santana dirigiu-se a elas.

Namoradas? Marley gostou da forma como isso soava para elas. E Ruby também parecia ter gostado porque sorria e roubara-lhe um beijo.

Jovem padawan? Eu acho que alguém prestou muita atenção a nossa maratona de Star Wars, Quinn! - Dessa vez, foi Kurt quem debochou com um sorriso malvado nos lábios, recebendo um olhar enfurecido de Santana que só não levantou para enfrentá-lo porque Brittany a abraçou apertado, forçando-a a ficar sentada. As risadas de Rachel e Quinn vieram logo depois, acompanhadas por Sam e Finn. Com tanto riso, era impossível não se deixar levar.

Marley sentiu-se ser abraçada pela cintura por Ruby, a californiana tinha o rosto parcialmente encoberto pelos fios loiros da outra enquanto conduzia ambas para longe dos risos, seguindo Puck. Elas pararam em frente à porta de entrada, Ruby tinha as chaves do Mustang em mãos enquanto vestia uma camisa jeans, abotoando-a rapidamente por cima da regata que usava, ela olhou rapidamente para Marley que a observava e disse:

— Você pode vir, se quiser.

— Não acho que eu preciso... - Marley respondeu tranquilamente, aproximando-se e tomando a tarefa de abotoar a camisa para si, ela fez tudo devagar, aproveitando, assim que terminou, a nova-iorquina alisou os ombros, depois, enlaçou os seus braços ali e sorriu satisfeita quando as mãos da californiana seguraram a sua cintura, magnéticas como a maré com a lua. - Quem sabe, comigo aqui, você volta logo e não dá muita moral para o tal dono da pizzaria...

— Como se eu tivesse olhos para outra pessoa que não seja você. - Ruby respondeu de forma desleixada, como se aquilo não significasse muita coisa. Mas, ambas sabiam que significava, de tal forma que Marley deixou-se esconder entre os fios loiros da outra e a beijou demoradamente no pescoço antes que o chamado de Puck, do lado de forma, as separasse.

Ruby sorriu para ela quando se separaram e beijou-lhe a mão antes de ir. Marley suspirou enquanto observava o Mustang desaparecer através da janela da cozinha.

O seu coração acelerado parecia alto demais no silêncio da cozinha e o seu sentimento parecia não caber mais em seu peito. As palavras de Ruby jamais lhe foram ditas e o que sentia em relação a elas jamais fora sentido... Marley não tinha muitas certezas do que viria pela frente, nem de quão intensas seriam as próximas experiências.

Contudo, era viciante sentir daquela forma... Era viciante ter alguém como Ruby por perto. Parecia um sonho... Só que era a mais pura realidade.

Rachel chegou a tempo de escutar o que Ruby dissera a Marley e as suas feições, sem qualquer resquício da mágoa silenciosa com a qual chegara a Santa Monica, desenharam um sorriso que misturava a sua satisfação e também, o seu orgulho pelo que aquelas duas garotas - duas das mais importantes em sua vida - conquistavam em cada minuto que dividiam. A morena não sabia se acreditava em destino, porém, o que presenciara parecia mágico o bastante para desafiar a ordem das coisas.

A movimentação de Marley chamou Rachel de volta para a realidade, no momento, a mais nova tomava um gole de água enquanto ainda olhava para a janela da cozinha. A morena aproximou-se sorrateira e perguntou irritante:

— No que está pensando?

— Pelo amor de Deus, Berry! Você quer me matar?! - Marley exclamou assustada, logo após fazer um malabarismo desajeitado com o copo de vidro, conseguindo apanhá-lo antes que se espatifasse no chão. Rachel gargalhou satisfeita para a reação da amiga, uma risada cheia de vida que parecia diferente de todas que dividira até então e, talvez, essa natureza também tenha atingido Marley que, mesmo indignada com toda a situação, deixou-se levar pelas risadas da melhor amiga.

As duas riram por segundos inteiros e, talvez, poucos minutos quando, enfim, pararam ofegantes, olhando uma para a outra com resquícios do riso dividido nas lágrimas em seus olhos e nas bocas entreabertas. Marley deixou o copo de vidro sobre a pia e, mesmo que os seus olhos límpidos parecessem amenos, a sua voz era bastante importunadora ao perguntar:

— Você não deveria estar distraída por certo par de olhos verdes?

— Eu deveria, mas, sou boa o bastante para dividi-la com aquele demônio latino que ela chama de melhor amiga. - Rachel respondeu entediada, arrancando mais alguns risos de Marley e deliciando-se com isso, era bom poder dividir mais do que mágoa com a melhor amiga que, mesmo sem saber, a mantivera sã durante aqueles anos em New York.

Rachel não sabia se, algum dia, conseguiria demonstrar tudo que sentia por Marley, até porque, não era conhecida por ser boa em conduzir as relações que cultivava. Porém, a mais nova despertava em si a necessidade de continuar o que fazia porque parecia ser o certo. Afinal, Rachel apoiava aquele relacionamento com Ruby e sabia que a confusão dos seus sentimentos fora motivada única e exclusivamente pelos seus próprios assuntos não-resolvidos. A morena sabia que tinha muita bagagem e precisava, acima de tudo, manter em sua vida aqueles que também quisessem carregá-las.

E Marley parecia ser uma daquelas pessoas. Anteriormente, ela fora uma fonte de luz na escuridão na qual enfrentava os seus demônios e, agora, elas caminhavam juntas por um caminho não tão escuro assim. Marley não era quem a guiava mais e sim, quem a segurava. Agora, as duas estavam quase que em igualdade e não existia sentimento mais agradável em uma amizade do que esse.

Essa era uma mudança, mas, certos aspectos não se alteravam tanto em uma amizade e Rachel ainda tinha uma necessidade absurda de fazer Marley sentir tudo aquilo que ela mesma não sentira - e que, silenciosamente, se arrependera - e era por isso que, agora, a morena insistiria em um assunto. O talento da mais nova era enorme e não deveria, de forma alguma, ficar confinado a uma sala de aula. Por isso, Rachel pigarreou para quebrar o confortável silêncio que dividiram até então, Marley ergueu os olhos do copo que enxaguava e os olhos azuis, curiosos, perguntaram silenciosamente o que acontecia. A morena suspirou e encostou-se a pia, ao lado da amiga, antes de perguntar:

— Você pensou na proposta dos meninos?

— Cantar no festival? - Marley completou com um sorriso que Rachel conhecia bem, era o sorriso nervoso oferecido às pessoas que a deixavam desconfortável. A morena detestava ser esse tipo de gente para a amiga, mas, tudo que queria era que a outra tivesse consciência do que tinha dentro de si. A sua mãe lhe dissera, mais de uma vez, que certas vozes não podem ser caladas porque, se não, elas simplesmente deixam de existir depois de um tempo. E Rachel achava que sabia sobre isso, de certa forma. Mesmo rodeada dos sons vindos dos instrumentos de corda, existia um silêncio sempre mais alto dentro de si. Uma voz que se calara há alguns anos... - Pensar é uma coisa, propor-se a fazer, é outra totalmente diferente.

Rachel não permitiria que Marley calasse a sua voz por insegurança, uma voz daquelas nascera para os palcos e para ser ouvida por mais do que um punhado de pessoas. Vozes como a de Marley poderiam mudar a vida de certas pessoas porque eram especiais e, principalmente, cheias de sentimentos. Por isso, a morena virou-se abruptamente para a amiga e, intensa, continuou:

— Sim, eu sei... Mas, você se lembra de quando nos conhecemos naquele projeto conjunto na faculdade?

— Claro que eu me lembro. Nós fizemos uma versão de “New York State of Mind” e você cantou... E, se bem me lembro, cantou melhor do que qualquer um na minha turma! - Marley respondeu com saudade e sorrindo, enfatizando o quanto que Rachel fizera sucesso naquela apresentação.

A morena sorriu triste para a resposta da amiga, sentindo o peito apertar diante daquelas palavras. Claro que estava agradecida pelo elogio, contudo, sabia que poderia fazer mais. E até conseguiria fazer se o sentimento que a fizera cantar anteriormente ainda estivesse dentro de si. A alegria que possuía ao cantar se fora há algum tempo, maculada por uma doença, enterrada junto à morte. Era doloroso demais fazer aquilo para os outros quando perdera quem ensinara tudo aquilo. A voz silenciada de Rachel não era pela covardia e sim, pela dor. Cantar fazia sangrar aquela ferida aberta, derramando-se em tristeza, solidão e arrependimento.

Os olhos castanhos se fecharam para impedirem que as lágrimas escorressem através deles, por mais que estivesse melhor, o buraco no peito de Rachel parecia ser incapaz de ser fechado ou preenchido, era um buraco negro engolindo tudo ao redor e tudo que a morena parecia ser capaz de fazer resumia-se a criar estrelas para serem engolidas por ele. Ela só esperava que uma estrela fosse forte o bastante para não deixar-se ir... A morena retomou o controle de suas emoções após respirar profundamente, sorriu para amenizar a dor e tornou a perguntar:

— Sim, eu também me lembro disso. Mas, você se lembra do que me disse quando procuramos e escolhemos essa música?

Marley parecia dividida entre o que encontrara nos olhos de Rachel e no que lhe fora perguntado. A morena fez o melhor que pode para dissimular a tempestade de emoções dentro de si, procurou reencontrar o caminho que se acostumara a trilhar em todos aqueles anos... Porém, ela reconhecia que estava cada vez mais difícil não sentir. Naquele Verão, o sol parecia ter esquentado porções congeladas de si, derretendo-as e tornando-as visíveis a quem quisesse. Rachel sentia que saíra do torpor e o que sentia, agora, era ainda mais atribulado e avassalador.

Quase impossível de controlar.

— N-nós duas conversamos e descobrimos que amávamos essa música. - Marley respondeu depois do que pareceu uma eternidade. Ela gaguejava de preocupação e, também, por causa da epifania que sentia. Rachel sorriu para o que encontrou nos olhos desorientados de Marley, era exatamente aquilo que queria que a amiga encontrasse dentro de si para não deixar a sua voz morrer.

O amor.

Sempre fora, pelo menos, para Rachel. Antes, era o amor que também a fazia cantar e, agora, era o amor que a impedia de seguir em frente com a sua voz. Aquele sentimento poderia ser uma faca com dois gumes e, mesmo tão perigoso, parecia fascinante quando colocado junto ao ato de cantar. Essa era uma das valiosas lições que Rachel aprendera com quem a ensinara a cantar: o amor sempre vinha antes da técnica e quem amava o que cantava seria capaz de superar até o maior dos cantores técnicos.

Claro que a técnica ajudava, mas, o amor fazia mágica com a voz de quem o possuía.

Marley parecia totalmente desnorteada pelo que encontrara em sua epifania e, por isso, Rachel aproveitou-se para tirá-la daquela cozinha e conduzi-la, contornando a casa. Elas passaram pelos risos e chegaram à garagem, ali, enquanto Rachel conectava a guitarra na caixa de som, Marley finalmente pareceu ter despertado e perguntou alarmada:

— O que você está fazendo?

— Nós vamos fazer aquilo que amamos. Você vai cantar algo que ama. - Rachel respondeu animada, sorrindo enquanto alcançava o microfone e o entregava a Marley. As mãos pálidas seguraram o objeto, trêmulas e a morena sentou-se em cima de uma das caixas enquanto a mais nova sentava no chão, de pernas cruzadas. Elas se olharam, Rachel esperando uma deixa e Marley, uma orientação.

Por fim, as mãos morenas seguraram a guitarra como se segurassem uma amante e, delicadamente, elas dedilharam os primeiros acordes de um solo que ambas conheciam bem. Rachel fechou os olhos e esperou pela voz de Marley no microfone, no limite da deixa da vocalista, ela finalmente se manifestou baixinho:

She said I feel stranded

And I can’t tell anymore

If I’m coming or I’m going

It’s not how I planned it

I’ve got a key to the door

But it just won’t open

Rachel não escolhera aquela música à toa, era uma que apresentava um solo de Carlos Santana junto à poderosa voz de Steven Tyler. Tanto ela quanto Marley amavam os dois e, na versão original, parecia que a voz de um casava perfeitamente com os acordes do outro.

Era a demonstração de que duas coisas poderosas podiam ser ainda mais fortes quando juntas. Não existia disputa sobre quem se sobressairia, era tudo sobre controle e, principalmente, generosidade. Aquela música permitia que Rachel desse a força que Marley precisava para cantar, assim como fazia com que a morena também encontrasse parte do que deixara para trás.

E era isso que Rachel queria que Marley entendesse: ela não cantaria sozinha, existiria uma banda com ela... Existiriam amigos com ela, em cima do palco.

And I know, I know, I know

Part of me says let it go

That life happens for a reason

I don’t, I don’t, I don’t

Because it never worked before

But this time, this time

 

I’m gonna try anything to just feel better

Tell me what to do

You know I can’t see through the haze around me

And I do anything to just feel better

 

And I can’t find my way

Girl I need a change

And I do anything to just feel better

Any little thing to just feel better

A voz de Marley parecia outra no refrão, estava cheia de felicidade, deliciando-se nos versos e acertando todas as notas. Rachel sorriu quando os seus dedos se esforçaram para desenhar os acordes necessários para acompanhar a voz poderosa de sua amiga. O vocal dela rasgava a música enquanto a guitarra parecia aveludada, ao fundo, sustentando confortavelmente aquela agressividade incomum numa voz acostumada a ser baixa.

Elas estavam se revelando naquela música, mostrando a quem quisesse ouvir quem eram de verdade. Ambas despiam-se do que fora construído nelas e entregavam o que nascera com elas.

Dessa forma, não era surpresa que, enquanto Marley extravasava, Rachel, quase que imperceptivelmente, pedia por mais. Contudo, a morena não tinha consciência do que desejava já que aqueles últimos dias a fizeram sentir falta daquilo que achava ter esquecido.

Eram dias estranhos, dias que mesclavam uma alegria eufórica e uma melancolia profunda. Ainda assim, eram melhores do que aqueles que vividos nos últimos tempos, eram dias estranhos... Mas, dias sentidos.

She said I need you to hold me

I’m little far from the shore

And I’m afraid of sinking

You’re the only one who knows me

And who doesn’t ignore

That my soul is weeping

A guitarra parecia corresponder ao que a letra contava, ela se derramava, chorosa, pedindo por algo que encontrava nos vocais de Marley que eram mais intensos, que gritavam os versos.

Ambas queriam ficar bem, ambas entendiam o que a música queria dizer. Elas não estavam alheias ao que cantavam e talvez, isso deixasse aquele “dueto” ainda mais especial. Os olhares se encontravam entre o som, o castanho brilhava diante do azul límpido, era como se as ondas do mar encontrassem a areia e ali repousassem depois de uma busca incessante e desesperada através do oceano... E o mais irônico era que a areia não era calmaria e sim, tão intensa quanto em seu próprio repouso.

Assim como as ondas usavam a areia como contraponto para a própria força, era exatamente o mesmo que Marley fazia com Rachel. A morena sentia que Marley a usava para ter noção de onde poderia ir, a mais nova queria caminhar junto dela e, para isso, precisava ser guiada.

Rachel não pode deixar de sorrir diante dessa constatação e realmente se emocionou quando Marley fechou os olhos e continuou a cantar. Aquele era um exercício de confiança e aquele último ato, simples, não enxergar por própria escolha evidenciava o quanto a mais nova colocava na morena.

E depois de tudo que elas passaram nos últimos dias, aquilo era muito, era o essencial e o que precisavam.

I know, I know, I know

Part of me says let it go

Everything must have a season

Round and round it goes

And every day’s the one before

But this time, this time

 

I’m gonna try anything to just feel better

Tell me what to do

You know I can’t see through the haze around me

And I do anything to just feel better

 

And I can’t find my way

Girl I need a change

And I do anything to just feel better

Any little thing to just feel better

Elas se olharam e riram entre os versos, caso ainda existisse algo entre elas, isso já não era mais importante. As duas tinham se resolvido na ausência de conversas específicas e exatamente da mesma forma pela qual haviam se conhecido: através da música. Era essa paixão que as unia, era isso que inflamava os seus sentimentos pelo mundo e pela outra.

Rachel sentiu-se bem enquanto dedilhava as notas, era como se tivesse voltando para casa depois de dias loucos do lado de fora. Era estranho que pensasse em Marley dessa forma, mas, ela era família. E a morena precisava de toda a família que pudesse ter diante das perdas que já tivera.

Marley balançava a cabeça diante das notas de Rachel que, por sua vez, a acompanhava com o olhar satisfeito. Mesmo que a loira não tivesse a coragem para subir no palco para cantar, Rachel estava satisfeita por mostrar a ela que estava ali... Que voltara e não pretendia deixá-la na mão outra vez.

Aquela música selava uma promessa entre elas, uma promessa sem palavras, mas, feita de harmonias e de ritmo e que parecia mais forte do que outras tantas seladas por diálogo.

I’m tired of holding on

To all the things I ought to leave behind

It’s really getting old, and

I think I need a little help this time

O solo final pedia pelo talento de Rachel e assim ela o fez, ela deixou a paixão tomar conta de seus músculos e explodir na ponta de seus dedos. Cada um percorreu o braço da guitarra, produzindo notas repletas de paixão. Notas que dialogavam com o que a música dizia e, também, com aquilo sentido por quem a produzia.

E Rachel, mais do que nunca, era feita de uma mistura de tudo. Da sua tristeza pelas suas perdas à felicidade pelo que tinha em mãos. Do medo se entregar e se permitir sentir a ânsia pela presença de Quinn e de tudo que ela passara a representar para si naquele Verão. Eram sentimentos adversos, quase que enlouquecedores e que, mesmo assim, faziam com que ela ficasse sã comparada aos outros anos vivendo sem preocupações e, também, sem profundidade.

As notas de Rachel afundavam-se nas cordas conforme ela afogava em si mesma, em seus sentimentos que estavam anormalmente profundos, deixando-se embalar pela maré que eles produziam e, também, pelo que traziam ao seu litoral. A morena recebeu, de braços abertos, a natureza avassaladora do que sentia por Quinn, sentindo-se inundar por aquela onda cálida e sedutora que inflamou as últimas notas choradas pela sua guitarra.

A música foi terminada, Marley tinha um sorriso que chegava aos olhos límpidos e corava, como se tivesse feito alguma estripulia enquanto Rachel ofegava, olhando para a amiga com o castanho brilhando intensamente, pontos escuros que não representavam a solidão e sim, o reencontro.

Elas não conseguiram falar com o fim da música, a satisfação as impedia, assim como o medo de quebrar aquela conjuntura especial criada. Talvez, aquilo fora mais intenso do que o que viveram quando foram pareadas pela primeira vez. Agora, elas se conheciam e, principalmente, se reconectaram. Isso fora um dueto que sacramentara o perdão entre elas.

A confiança voltara e a amizade renascera, mais forte do que antes.

Rachel viu Marley abrir a boca mais de uma vez para fechá-la logo em seguida, as palavras estavam perdidas e não eram necessárias. Somente um som, vindo além da esfera em que elas se aprisionaram, as despertou. Alguém tropeçara e agarrara-se a um dos suportes de microfone, derrubando-o no chão. Elas se viraram em direção ao barulho e Rachel sorriu para Quinn que afastava a câmera dos olhos, corando furiosamente. Marley conteve o sorriso, olhou de uma para outra e sussurrou:

— Eu vou ver se Ruby chegou, não se incomode de me acompanhar.

A morena acenou agradecida com a cabeça e viu a amiga levantar-se, deixar o microfone no próprio suporte e passar por Quinn com um sorriso simpático nos lábios. Os olhos castanhos, enfim, procuraram os verdes que estavam presos ao chão, envergonhados. Uma risada curta e baixa chegou à garganta de Rachel e ela se ajeitou em cima da pequena caixa de som.

Quinn continuava envergonhada, de cabeça baixa e mãos apertando a câmera enquanto Rachel ponderava qual era o tamanho do seu sentimento por aquela aspirante a fotógrafa ligeiramente desastrada e imensamente linda...

Era impossível mensurar. E essa foi a resposta que bastou à guitarrista.

 

— Você não acha que está muito longe de mim? - A voz charmosa de Rachel chegou aos ouvidos de Quinn, minutos depois do estrépio provocado por sua falta de jeito ter interrompido aquilo que a morena dividia com a melhor amiga. A loira não sabia muito bem como responder, portanto, contentou-se em aceitar o que a outra dizia, aproximando-se com passos inseguros e incertos, demorando mais do que o normal para chegar até Rachel.

Quinn alcançou uma das cadeiras que haviam na garagem, posicionando-a em frente a Rachel que trabalhava em desplugar a guitarra e ajeitá-la no suporte ao lado da caixa de som em que estava sentada. As duas voltaram a se olhar quando essa tarefa foi finalizada e Quinn, completamente envergonhada, sussurrou:

— Eu não queria interrompê-las, me desculpe.

— Não tem problema, nós já tínhamos terminado... - Rachel respondeu tranqüila, com um sorriso que reforçava as suas palavras. Entretanto, existia algo nos olhos castanhos que atraíram Quinn e, principalmente, despertaram a sua curiosidade. Os olhos estavam mais escuros do que ela se lembrava, misteriosos, ainda que parecessem entregar mais do que gostariam. O que Quinn recebeu era feito de gratidão, felicidade e leveza. Sensações que a morena sempre despertara em outros e que, raramente, a loira encontrara por baixo da névoa melancólica que parecia impedi-la de interpretá-los melhor. - Há quanto tempo estava ali?

— Mais do que seria considerado normal... Eu posso ser muito intrometida quando fotografo, especialmente se eu acho que estou presenciando algo único. - Quinn respondeu de forma sincera, pesando as palavras como sempre fizera em sua vida. Nos demais casos, aquilo era feito para não decepcionar os seus pais, mas, nesse caso específico, ela não queria que Rachel enxergasse mais falhas na sua já fragmentada personalidade.

Quinn, depois do último momento entre elas, realmente tinha medo de que Rachel desistisse dela e a inesperada proximidade de seus pais acentuava esse medo de, novamente, ficar sozinha consigo mesma.

— Eu gosto da sua forma de enxergar as pessoas e os momentos, Quinn Fabray. É especial. - A voz musical de Rachel atraiu Quinn para terra, mostrando que o mundo dos pensamentos inseguros não era lá grande coisa.

Os olhos verdes cativaram os castanhos, os lábios róseos entreabertos ofegaram uma resposta que jamais teve voz. Rachel se aproximou e roubou um beijo deles, demorando-se neles e suspirando de encontro à pele branca antes de afastar-se com um sorriso iluminado. Quinn estava dividida entre apaixonar-se pelas palavras da morena ou amar o corpo que começava a aproximar-se do seu, Rachel segurou-lhe o queixo, mantendo os olhos verdes cativos na escuridão dos seus, elas se olharam em silêncio até que Quinn conseguiu pensar e tocou o interior do pulso que segurava o seu rosto e sussurrou com um sorriso pequeno:   

— E eu gostei de vê-la tocar com Marley, foi diferente da primeira vez. Parecia que vocês realmente sabiam o que a música significava... Era como se ambas realmente pedissem por aquilo que cantavam.

Rachel afastou-se rapidamente e Quinn temeu ter dito algo errado. Essa sensação passou quando viu as belas feições morenas entregarem uma expressão surpresa, em seguida, um novo sorriso iluminou o pouco espaço entre elas. A morena inclinou-se em direção a Quinn e alcançou a câmera fotográfica presa ao pescoço, ergueu os olhos como quem pedia permissão e a loira não pode dizer não.

Na verdade, não queria. Porque aquela morena parecia ser uma das poucas pessoas que entendia - ou se esforçava para entender - o que tinha dentro de si e tentava exteriorizar por meio daquelas fotos.

Antes de executar os comandos para visualizar as fotos anteriores, Rachel segurou a câmera com uma mão enquanto a outra alcançava a base da mandíbula de Quinn. Novamente, a morena sustentou o belo rosto e aproximou-o de seus lábios, beijando cada uma das pálpebras fechadas antes de beijar a mão pela qual deslizara. Beijos que evidenciavam a admiração de Rachel pelo que Quinn fazia, beijos que acentuavam a importância daqueles olhos e daquelas mãos para um mundo em que pouco se via e se compreendia... Os olhos castanhos voltaram a inundar os verdes naquela escuridão estranhamente segura e a dona deles ofegou:

— Isso é muito estranho, mas, você me lê como ninguém e não é como se eu tivesse me aberto completamente, ainda.

Quinn gostou da temporalidade passageira presente na última palavra da frase, por isso, sorriu deliciada para as palavras e então, foi a sua vez de roubar um beijo dos lábios carnudos. Contudo, Rachel era mais experiente do que ela nesse aspecto e conseguiu segurá-la por mais tempo, abocanhando os lábios róseos e afastando-se deles com leves mordidinhas. Quinn sorriu de encontro à boca da outra e respirou fundo, sentindo o aroma cítrico presente nos fios escuros antes de responder com a sinceridade latente em suas palavras:

— E eu quero, mesmo, saber o máximo que puder e o que você quiser me entregar.

— Você pode não gostar do que eu tenho escondido. - Rachel respondeu de imediato, com o tom de voz soando ferido. Ela parecia mais frágil agora, exposta. Talvez, a música dividida com Marley fosse somente para elas duas e Quinn era uma intrusa ali. A morena se afastou e segurou a câmera entre as mãos, evitando os olhos de Quinn e concentrando-os nas fotos que passavam pelos próprios. O afastamento fora tão abrupto que a loira demorou a entender o que tinha acontecido.

Aquele era mais um dos momentos em que Rachel se fechava e parecia dragar tudo com ela, era uma situação que lembrara o que haviam dividido no banheiro da sorveteria. Quinn gostaria de saber o que a machucara daquela forma, o que a fizera construir aquela personalidade efusiva que, ainda assim, despedaçava-se diante de qualquer lembrança dolorosa. A loira queria saber o que ou quem tirara o brilho daqueles olhos castanhos, ela queria entender o que as afastara no começo para, reaproximá-las no depois...

Quinn queria todas as partes de Rachel e não somente aquelas que ela era capaz de ler e interpretar. Afinal, sentia que ainda não tinha o necessário da morena para que pudesse fazê-la feliz.

Por fim, Quinn suspirou e pousou as suas mãos em cima das morenas. Os olhos castanhos levantaram-se bruscamente e ainda existia um vestígio defensivo neles até que a guarda voltou a ser abaixada. A loira sorriu compreensiva porque, afinal, doeria mais se afastar do pouco que alcançara do que continuar batendo naquela muralha que ainda as separava, elas teriam tempo para derrubarem tudo que haviam construído antes de se conhecerem? Existiria um tempo para elas ou seria, afinal, somente uma estação?

Quinn tinha medo de dar voz a essas perguntas, mas, Rachel exigia uma explicação para aquele súbito contato físico. Diante desse impasse e daquela intensidade absurda contida nos olhos castanhos, a loira aproximou-se e, beijando a bochecha morena, sussurrou próxima:

— Por que você não se aproxima mais um pouco?

Foi a vez dela se afastar, deixando o ar carregado com uma pergunta que tinha a ambígua natureza de se referir à proximidade física e à emocional. Rachel respondeu imediatamente ao seu chamado, quer dizer, à porção física nele. A morena levantou-se e virou-se de costas, antes de sentar no colo de uma Quinn surpresa. Ainda assim, os braços pálidos, naturalmente, entrelaçaram a cintura morena enquanto a dona deles ajeitava-se na curva do pescoço da menor para olhar as próximas fotos. Rachel riu baixinho para a posição, ajeitou-se confortavelmente, em silêncio.

As fotos continuaram a passar por elas até que uma, em especial, atraiu a atenção da morena.

Era um close da própria Rachel tirado durante o que parecia ser o último solo da música. Ela estava de cabeça baixa, com os cabelos escuros quase que escondendo o seu rosto, representado apenas por um perfil que se revelava sério, de olhos fechados e imerso na música. Os lábios estavam entreabertos e tão expressivos que parecia ser possível escutar a expiração que fluía através deles. O corpo de Rachel estava todo inclinado sobre a guitarra, como se agarrasse a ela para conseguir manter-se tocando. Os dedos eram meros borrões sobre o braço do instrumento enquanto aqueles que dedilhavam os acordes permaneciam visíveis. E mesmo com o corpo tão encolhido à guitarra, o rosto permanecera estranhamente paralelo em relação a ele. Escondido, mas, orgulhoso. Era uma combinação que remetia a mistério e, também, a talento.  

Pela expressão de Rachel, ela jamais se vira assim numa foto e Quinn temeu pela opinião dela.

Não que opiniões a tivessem parado, alguma vez - os seus pais detestavam as suas fotos e, nem por isso, ela deixara de fotografar. Pensava muito neles naquele dia. -, mas, uma reprovação vinda de Rachel poderia acabar com o que achava que tinha. E aquela foto realmente tinha algo diferente nela, algo que conseguira capturar a essência daquele corpo quente preso entre os braços de Quinn.

— O que você viu aqui? - Rachel perguntou curiosa, a voz ligeiramente trêmula enquanto virava-se para encarar Quinn, a loira não sabia se gostaria de ter aqueles olhos avaliando-a enquanto tentava explicar tudo que vinha em sua cabeça ao olhar aquela foto. Por isso, ela apertou a cintura entre seus braços e manteve a morena quieta enquanto respondia com o que achava ser o melhor diante da bagunça instalada em sua cabeça:

— E-eu... Eu não sei bem, Rae...! Eu acho que vi os seus segredos na sua postura, você se debruçava sobre a sua guitarra que, naquele momento, falava o que você escondia ainda que não pudesse ser entendido, você ainda queria se proteger daquilo ao mesmo tempo em que o seu perfil, a única parte sua que estava ereta, queria mostrar que você estava orgulhosa. Da música que tocava ou de tudo que passara? Ainda não sei. As suas mãos são a expressão final da sua paixão pelo que faz e estavam afoitas, como se quisessem explodir tudo isso... Eu não sou boa, mas, eu tentei enxergar voc...!

— Você me viu. - Rachel confessou frágil, contrastando com a força feita por todo o seu corpo ao romper o aperto de Quinn e virar-se no colo dela. A loira ainda colocava as ideias interrompidas no lugar quando foi atingida por aquele olhar castanho que, agora, estava cálido e agradecido. As mãos morenas deixaram a câmera em cima da caixa de som mais próxima e envolveram o rosto de Quinn, aproximando-o e respirando junto dele. - Você me viu, de novo.

Quinn não soube responder, os olhos escuros brilhavam diante dos seus, cheios de algo que logo se converteria em lágrimas. Por isso, ela agiu rapidamente e envolveu aquele corpo menor do que o seu entre os seus braços, apertando-o como se pudesse fundi-lo no seu, torná-las uma só para que pudesse dividir o que quer que tanto amargurava Rachel. As mãos pálidas infiltraram-se nos fios escuros, afagando-os enquanto a boca de lábios rosados beijava a pele morena, tentando sorver um pouco daquela dor através dos poros daquela pele bronzeada. Rachel não chorou, mas, suspirou pesado e Quinn, sentindo-se imensamente protetora e forte, ainda que tivesse tantas fraquezas quanto, sussurrou:

— Eu amo tudo que vi de você até agora, pequena... Não se preocupe em esconder-se de mim.

E se o que visse em Rachel fosse o equivalente ao Inferno para os seus pais, Quinn estava disposta a abraçá-la como se fosse o Paraíso.

Porque não havia natureza errada quando tudo se resumia a amor. Existiriam segredos, bagagens emocionais, passados dolorosos e presentes amargos... Mas, sempre existiria a possibilidade um futuro melhor. Sempre existiria a possibilidade de um futuro juntas, pelo tempo que fosse.

Por uma estação ou por vários delas.


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Notas finais do capítulo

Como puderam perceber, Marley e Ruby estão um pouco mais "adiantadas" no relacionamento do que Rachel e Quinn HAHAHAHA E para Faberry, ainda temos esse agravante dos Pais Fabray aparecendo... Você acham que eles conseguirão fazer algo, mesmo tão longe? Fica a pergunta!

E bem, eu sei que estou focando mais nos casais nos últimos capítulos, mas, eles precisavam ser resolvidos. E esse capítulo foi mais um de preenchimento do que um realmente ativo, prometo que o próximo traz mais emoções e surpresas!

E antes que eu me esqueça, eu realmente gosto muito desse momento Faberry em que Quinn explica a foto para a Rachel. Acham que a nossa aspirante a fotógrafa acertou na interpretação?

Eu espero que estejam gostando, mesmo com todas as minhas demoras. Tentarei não demorar tanto, mas, não posso prometer muita coisa :(

Obrigada por não desistirem de mim, um beijo e até a próxima!
(@redfieldfer)



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