A Inútil Capacidade de Ser Receoso escrita por Fabrício Fonseca


Capítulo 17
Dezesseis




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—Tudo que sua mãe fazia sempre era maravilhoso – Marcos fala sorrindo.

—E se a gente fosse à Galaxy’s hoje de noite? – Digo sorrindo. – É preciso uma festa para curar os efeitos de outra, não é o que dizem?

—Ninguém diz isso, Thomás. – Aline diz rindo.

—Bom, acho que eu digo a partir de agora.  

Depois que o caminhão nos deixa em frente á loja de esportes radicais andamos juntos até a praça e lá Aline e Marcos se despedem de nós.

—Você quer apostar uma corrida até lá em casa? – Digo sorrindo para João. – Valendo um pedaço enorme de bolo de cenoura com calda de chocolate.

—Claro que eu quero! – Ele diz rindo.

—Então no “já” nós vamos. – Digo ficando parado ao seu lado.

Um. Estico a perna direita para frente para dar a partida e ele faz o mesmo.

Dois. Olho para frente me focando no caminho.

Três. Começo á puxar o ar pelo nariz e soltar pela boca.

Já! Começamos á correr.  

Vamos indo por cima da calçada para não corrermos o risco de sermos atropelados por um carro no meio da rua, desviamos das pessoas que estão andando no caminho contrário e um cachorro de um garoto começa á correr atrás de nós e ao tentar segurá-lo ele acaba tomando uma queda.  

—A gente não vai ajudar? – João grita para mim ainda correndo.

—Se você quiser ser gentil. – Grito rindo.

—Ah não, ele já se levantou – ele grita e eu olho para trás e vejo o garoto limpando sua camiseta com uma mão e segurando a guia do cachorro com a outra.

Então eu percebo que ao olhar para trás acabo diminuindo meu ritmo. Olho para frente e vejo que João está a uma considerável distância de mim.

—Eu não acredito nisso! – Grito tentando correr mais depressa, mas quando consigo me aproximar dele chegamos ao portão de casa e ele ganha. – Vocês são iguais, essa corrida não valeu! – Digo ofegando ao me lembrar da corrida que tive com Laura, a garota que eu passei a última semana; ela me enganou e acabou ganhando a corrida, assim como João.

—Primeiro: no amor e na guerra, ou nas apostas, valem tudo – ele diz também ofegante. – Segundo: eu sou igual a quem? 

—Não interessa – digo abrindo o portão. – Vamos entrar, eu vou fazer seu bolo.

—Você é meio estranho ás vezes, sabia?

—É que eu não sou um garoto normal. – Repito o que ele disse no dia em que nos conhecemos e ele ri.

Vamos para a cozinha e eu pego os ingredientes para fazer o bolo, e enquanto misturo tudo João fala um pouco sobre Luma, sua namorada.

—Ela gosta dos mesmos livros que eu – ele diz por cima do barulho da batedeira. – Sempre que nós brigamos escrevemos uma carta do futuro um para o outro e no fim acabamos bem novamente; ás vezes nós somos muito melosos, mas que casal não é?

—O que é uma carta do futuro? – Pergunto ao desligar a batedeira e provar a massa.

—Eu aprendi com “Perdão, Leonard Peacock”, meu livro favorito – ele começa a explicar. – É uma carta que você escreve como se fosse uma pessoa do seu futuro que tivesse escrito para você, contando como vão ser as coisas para você. 

—Parece meio dramático – digo. – Vou tentar escrever uma depois.

Pego uma das formas de bolo da minha mãe que tem o formato de metade de um círculo e despejo a massa alaranjada dentro depois de untá-la; ligo o forno profissional que minha mãe comprou no ano retrasado e coloco o bolo para assar.

Me sento na cadeira junto ao balcão ao lado de João e ficamos conversando e mexendo em nossos telefones esperando pelo bolo.

Quando ele finalmente termina de assar o tiro do forno e começo a preparar a calda de chocolate.

—Olhando para você eu nunca diria que é do tipo que sabe cozinhar. – João diz. – Tipo, por você ter dinheiro para pagar os outros para fazer o que você quiser.

—Não que eu não abuse o quanto posso do dinheiro da minha família – começo a falar. –, mas quando eu gosto de algo eu aprendo a fazer, o conhecimento você tem para sempre, mas o dinheiro não é algo que se pode ter certeza. 

Assim que termino a calda deixo a panela encima da pia para que esfrie um pouco e pego um prato grande e desenformo o bolo. Pego a panela com a calda e com uma concha começo a despejá-lo sobre o bolo.

—Eu vou aceitar um pedaço do seu bolo Thomás, por favor. – Frederico, o tio de João, diz ao entrar na cozinha ao lado do meu pai.

Coloco a panela dentro da pia e depois pego o prato com o bolo e colo em frente a João.

—Na verdade o bolo é do João, ele ganhou em uma aposta, mas acho que ele vai amar dividir com você. – Digo e começo a andar em direção à porta da cozinha. – Espero que esteja bom, agora eu vou tomar um banho, aproveitem.

Eu nem quero tomar banho, é só que não quero ficar no mesmo cômodo com meu pai enquanto ele finge que está tudo bem, sendo que não está nem perto disso. E eu não vou permitir ficar. 

Ás sete da noite Aline me manda uma mensagem:

Nós vamos esperar por vocês na praça

do comércio. Cheguem ás oito e ponto.

Depois de ir até a biblioteca e dizer para João ir se arrumar – ele tomou banho antes de mim – corro até o meu banheiro e tomo um banho rápido, quando saio João está sentado na minha cama usando calça jeans, uma camiseta preta e All Star preto.  

—Não que tenha algo errado com sua roupa, porque não tem – digo andando até meu guarda-roupa –, mas você não vai vestido assim.

—Qual o problema? – Ele diz olhando para a roupa.

—A noite na Galaxy’s é sempre um verdadeiro evento, e ninguém que estará acompanhando comigo vai entrar lá parecendo que está indo fazer uma prova de vestibular. – Pego uma camiseta preta com estampa floral de botões e uma calça preta e entrego para ele. – Veste isso e depois pode escolher um dos meus sapatos no closet.  

Enquanto ele troca de roupa pego uma camiseta branca com uma estampa colorida e a visto, depois de vestir a cueca visto uma calça jeans clara rasgada nos joelhos e então pego uma blusa vermelha xadrez de manga longa e a amarro na cintura. Quando vou ao closet João está saindo, já vestido com a roupa que lhe dei, e calçado com um par de tênis verde e marrom de cano alto.

—Esse ficou bom? – Ele pergunta apontando para os pés.

—Ficou ótimo! – Digo e ando para dentro do closet, escolho um coturno marrom com aspecto envelhecido e calço. – Estou pronto, vamos. – Digo e nós dois saímos do quarto.

Depois que João avisa para o tio que está saindo comigo, saímos os dois e vamos andando até a praça do comércio, Aline e Marcos estão nos esperando perto de onde um palco está sendo montado.

—E esse palco aí? – Pergunto parando em frente à Aline.

—Amanhã é o festival das bandas, você se esqueceu? – Ela diz sorrindo.

—Como você pode não se lembrar do festival? – Marcos fala. – Você encheu a gente por dois meses dizendo que estava ansioso por ele.

—Eu sou maluco, vocês sabem disso. – Falo. – Vamos logo para a Galaxy’s.

Quando chegamos a boate já está a mil, o que é realmente meio estranho já que a maioria das boates só começa a festa umas dez da noite –, mas isso é facilmente explicado já que a Galaxy’s é um sucesso. 

—Vamos beber algo. – Aline diz andando em direção ao bar.

Compramos alguns refrigerantes e quando uma música que Marcos, Aline e eu gostamos começa a tocar vamos dançar no meio da pista.

—Thomás! – Alguém grita atrás de mim e fecho a cara quando vejo que é o Frederico Batista. – Você acabou com a minha festa. – Ele parece estar um pouco alterado. 

—E fiz isso com muito prazer! – Respondo sorrindo.

—Você só faz eu querer cada vez mais beijar sua boca – ele diz bem perto da minha orelha direita.

—E você só vai ficar nisso: querendo. – Viro as costas para ele e volto a dançar com meus amigos.

Três ou quatro músicas depois – não sei ao certo – voltamos para o bar para descansarmos um pouco e bebemos um pouco de água mineral.

—Posso conversar com você? – Um cara de cabelo louro longo diz apoiando a mão em meu ombro.

—Claro! – Digo andando com ele me distanciando dos outros.

—Oi, eu sou Beto. Estava te olhando de longe e te achei muito bonito – ele diz sorrindo.

—Eu sou o Thomás e eu não estava te olhando de longe, mas posso dizer o mesmo sobre você.

—Que bom! Você se destacou no meio dos outros caras... afeminados demais por metro quadrado.

—Ah não – digo fechando meu sorriso. – Tão lindo, mas é heteronormativo.

—Você tem algo contra garotos que não são afeminados? – Ele pergunta me olhando com a cara fechada.

—Não, problema nenhum na verdade. Mas prefiro evitar aqueles que são contra quem é. – Digo e então me lembro de uma coisa. – Mas se você quer ficar com um cara que não é afeminado e que até prefere não falar sobre sua sexualidade, eu conheço um.

—Ele é gato? – Ele pergunta e eu confirmo com a cabeça, a pesar que eu nem ache ele essas coisas.

Deixo o Beto-heteronormativo no mesmo lugar e ando pela pista de dança procurando por Frederico, o encontro escorado na parede do outro lado completamente sozinho.

—Tenho um lance pra você! – Digo segurando seu braço e lhe puxando indo em direção ao cara louro.

—Você finalmente vai ficar comigo? – Ele diz todo animado.

—Eu disse que tenho um lance para você, não que eu sou seu lance.

Empurro as pessoas para passar com Frederico e acho Beto parado no mesmo lugar.

—Beto este é Frederico – digo segurando no braço dele e levando os dois para o banheiro masculino. – Frederico este é Beto. Vocês dois são muito parecidos e estão querendo beijar alguém essa noite, aproveitem.

Quando saio e fecho a porta os dois começam a se beijar.

—Acabei de fazer minha boa ação do dia – digo parando no bar perto de Aline, Marcos e João. – Agora eu posso aproveitar de verdade.

Voltamos a dançar e no meio da música um garoto com o cabelo pintado de azul e rosa vem falar comigo.

—Oi, eu sou o Victor. – Ele diz sorrindo. – Essa é minha irmã Valentina – ele aponta para o outro lado e sorrio ao ver uma menina muito parecida com ele com os cabelos também pintados de azul e rosa.

—A gente estava de olho em você – ela diz perto do meu rosto. 

Cinco minutos depois estou beijando os gêmeos de cabelos pintados dentro do banheiro feminino.


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