Capítulo I

"Sei que às vezes nos encontramos sem esperança e perspectivas, mas vejam como é a vida, sempre nos dando uma nova rasteira. Aprender se levantar é uma arte, e infelizmente chorar faz parte."

Meus pés já estavam inchados, aqueles saltos eram infernais, lembrete mental: “Nunca mais vim dar plantão com salto agulha.” Mas finalmente agora me encontrava sentada em uma das mesas da cantina, aqui o burburinho sempre era maior, pessoas vinham e iam sem cessar, sempre tudo tão automático e passivo, mas às vezes nos deparávamos com cenas inéditas como esta que eu presenciava agora. Eram duas crianças, elas estavam sentadas em uma mesa próxima a minha e gesticulavam alegremente sobre a chegada do novo irmãozinho. Era engraçado e ao mesmo tempo encantador, não conseguia desviar o olhar e mais pessoas se distraíam com a cena familiar. E enfim o cheiro do meu café meu chamou de volta e uma nostalgia me atingiu, “Eles teriam a mesma idade agora.”, este pensamento me acertou em cheio, como era possível, depois de tanto tempo por que logo agora este tipo de sentimento?

Bom, tentar refletir sobre a vida logo ás oito da manhã de domingo depois de uma madrugada agitada não dá, ri comigo mesma. Meu café já estava frio então tomei coragem e decidi ir para casa, precisava descansar. Porém um fato era irrevogável, minha vida mudou muito nesses últimos dois meses.

Chegar em casa era a minha parte preferida, aprendi a gostar do meu silêncio. Abri as cortinas da sala, o sol já dava indícios do belo domingo que viríamos a ter, sorri, eu gostava de dias ensolarados, eles me remetiam a boas lembranças.

 Peguei minhas correspondências e fui em direção a varanda, me espreguicei em um dos sofás após constatar que não havia recebido nada de mais. A visão de meu apartamento era de fato incrível, meus pais sabem me agradar quando querem, era como ter Tóquio aos meus pés. A brisa era fresca e aconchegante, fechei meus olhos por um momento e então um sorriso que modelou meus lábios nestes últimos dias surgiu, as lembranças eram dele.

— Flashback On –

— Eu posso apostar como faço um café melhor que este aqui. – Apontou a xícara, após bebericar mais um gole. Estávamos na cantina do hospital, ele havia acabado de receber alta, após uma semana internado seu humor variou muito, em momentos o via como antigamente em outros um Sasuke rancinsa que eu preferia não me lembrar, ou tipo agora, um menino brincalhão que fazia piadas a cada segundo.

— Bom então eu pago para ver Uchiha. – Respondi em desafio, e claro ele arqueou uma de suas sobrancelhas e seu olhar era inquisitivo, ah garoto, tem coisas que nunca mudam.

— Posso saber o que eu ganho se eu vencer Haruno? – Sob seu olhar corei, que droga. Mas não recuei, o encarei até que palavras não fossem mais necessárias, e nossos sorrisos se completassem.

— Bom agora tenho que ir e este é o meu número, me ligue. – Estendeu o cartão para mim, o peguei. Então levantou se e inclinou se sobre mim, beijou-me a bochecha em despedida. Quando já se distanciava com as mãos no bolso da jaqueta virou-se mais uma vez – Espero que realmente me ligue Doutora.- Gritou e piscou para mim, depois disso só consegui rir. Bom este era o seu efeito em mim, felicidade.

— Flashback Off –

Continuava a me deliciar com a brisa e minhas lembranças quando sinto meu celular vibrar no bolso da minha calça, puxei-o, era uma mensagem:

“Cheguei e espero poder te ver. O congresso foi um saco kkk Senti saudades de conversar. Até mais tarde?”

Hoje o dia realmente prometia. Fazia dois meses que nos reencontramos e depois disso, bom, mantivemos contato, foram vários jantares, cafés da manhã, tarde e alguns almoços. Nós estávamos nos reaproximando, mas eu sempre sentia que o tempo não tinha passado para nós dois. Era engraçado, pois ao mesmo tempo em que nossas conversas fluíam o silêncio voltava a nos incomodar, ou não, só sei que fazia parte de nós agora.

“Bom dia J Que bom que já chegou, tive plantão essa madrugada e preciso descansar. Que tal um jantar?”

“Pensei que poderíamos nos ver antes.”

“Realmente preciso tomar um banho e dormir. À noite Uchiha.”

“Sinto em lhe informar Haruno, mas o dia está belíssimo e não pretendo desperdiçá-lo.”

“Faça bom proveito.”

“Faremos gata, faremos.”

E de repente a campainha toca. Sorrio, não sei por que ainda me surpreendo com ele. Caminho em direção a porta e vou desprendendo meus cabelos e tirando meus saltos. Quando abro, nossos olhares se encontram e simplesmente palavras não são necessárias, dou passagem, ele entra já se sentindo em casa vai arrumando a mesa com a cesta de café da manhã que trouxera e quando termina só puxa uma cadeira para mim.

— Pensei que só chegaria amanhã. – Analisava o, ele estava cansado e com algumas marcas de olheiras. Sorri. – Obrigada pelo café.

— Bom eu liguei para o hospital e me disseram sobre seu plantão, então quis fazer uma surpresa. E estava pensando em darmos uma ida ao clube, se lembra você me deve. – Seus olhos caiam sobre mim, sua voz demonstrava sinais de canseira, estava grave.

— Não deveria tentar ser tão forte. – Desviou seu olhar. – Eu sei que essa semana foi complicada para você, deveria descansar assim como eu. – Beberico um pouco de suco e enfim escuto um suspiro de sua parte.

— Vitória Haruno. Você tem razão. – Levanta-se e me beija no rosto. – Bom descanso.

— Não era minha intenção que você fosse embora.

— Então qual era?

— Bem – sorri- Poderíamos dormir juntos Uchiha, o que acha? – Me esforcei ao máximo para não rir e tentar fazer à sensual. Seu olhar começou a processar minhas palavras e um brilho começava a iluminar seu rosto.

— Humpt. Sabe que posso querer mais que dormir com você gata. – Começava a diminuir a distancia entre nós. - E então garanto que descansar seria a ultima coisa que faríamos. – Pega meu pulso e me levanta me puxando para seu abraço.

Respiro lentamente, sei que esta blefando. Por incrível que pareça nossas brincadeiras nunca avançavam, tínhamos uma relação que ao mesmo tempo em que era intima era mais que cordial e respeitosa, eu me sentia frustrada com isso. Sasuke nunca fora muito paciente, controlado com certeza, mas paciente não. Havia coisas que talvez eu ainda precisasse aprender a decifrar. Há única certeza que eu tinha, éramos só amigos e ponto.

— Sei que me respeita e não faria nada que eu não quisesse. – Respondi manhosa, por mais que tentasse fingir eu o queria desde o dia em que voltamos a conversar. Estar com ele sempre fora meu sonho e por mais que ele demonstrasse distância eu iria tentar, estava decidida.

— Sabe que a proposta é interessante. – Seus lábios chegaram ao meu ouvido. – Poderia eu recusar?

— Não. – Me recompus e o respondi beijando seu rosto. Desvencilhei-me de seu abraço e fui caminhando em direção aos quartos. Sentia seu olhar e seu exaspero, não me contive e olhei-o mais uma vez. Sua expressão agora era estranha, estaria ele com medo? Não consegui decifrá-lo e tenho certeza que agora minha expressão passara para curiosidade. Acredito que tenha percebido, pois logo se suavizou e seguiu em direção a porta. Deus o que esta acontecendo?   

— Desculpe Haruno, mas tenho que ir agora. Obrigada pela companhia. – Olhava- me já com a mão na maçaneta, simplesmente acenou e saiu.

Somente o baque da porta me convenceu da cena que se desenrolara. Ainda não entendia o porquê da sua atitude. A única coisa que entendi foi que ele ficara com medo de ficar sozinho comigo, o que era mais estranho ainda, apesar dele sempre dar a entender que não queria nada mais que amizade e conversas agradáveis eu sentia que existia algo a mais. Não podia acreditar nas minhas hipóteses, ri de mim mesma, só tinha um jeito de descobrir. Se Sasuke Uchiha ainda pensava em mim de outra forma eu com certeza seria a mulher mais feliz do mundo.

“Não entendi muito bem o que acabou de acontecer, mas não importa. Amanhã é o meu dia de folga e com sei o seu também. E como o sol parece que veio para ficar, que tal irmos ao clube?”

Não sei quanto tempo fiquei encarando meu celular na mesa de centro. Ele não me respondia, o que será que aconteceu, tudo ia tão bem, droga Sakura. Mas porque estou me sentindo culpada se eu não fiz nada. Levantei-me do sofá e fui tomar um banho, continuar ali me deixaria maluca. Ah Uchiha mais que problemático você.

♦

A noite já se iniciava, o dia na verdade passou se como um borrão depois que ele se foi. Meu celular continuava na mesa de centro esperando-o. Passara a tarde toda deitada, na verdade dormindo e até em sonhos ele não me deixava, sonhei com o dia em que nos conhecemos. Éramos tão jovens...

— Flashback On –

— Sakura, querida acorde. Levante-se mocinha, o café já esta pronto, não vai querer se atrasar no seu primeiro dia de aula, não é?- Sentei em minha cama, coçava os olhos e ainda bocejava minha mãe já havia aberto as cortinas e andava de um lado para o outro organizando meus materiais e uniforme. Quando saia do quarto ainda resmungou,          “Quinze minutos Sakura.”

O caminho para escola foi tranqüilo, mamãe me deixara em frente ao portão e seguira para o trabalho, ela era editora chefa de uma revista cientifica, papai dizia que ela era brilhante, eu também achava isso.

O inicio das aulas sempre era uma loucura, crianças corriam e sorriam, se abraçavam aos pulos, as férias foram boas acredito. Este ano era diferente para mim, mamãe disse que eu já era uma mocinha, mas eu simplesmente tinha sete anos, ela era um sarro. Porém eu sentia que as coisas seriam diferentes agora, estava na primeira série, nada mais de hora da soneca e chega de musiquinhas, as coisas começariam a valer e eu tinha que me esforçar.

Enquanto ficava com meus pensamentos percebi que o fluxo de pessoas havia diminuído, precisava me apressar ou iria me atrasar. Quando comecei a caminhar em direção aos portões ouvi uma risada que me chamou a atenção, olhei para o meu lado esquerdo. Não os conhecia, seriam alunos novos? Um deles era bem alto, carregava uma mochila nos braços, esta era azul escura e continha um símbolo em vermelho e branco bordada. Seus cabelos eram grandes e escuros e junto aos seus olhos possuíam mesma cor, ébano. Suas expressões eram fortes e quando sorria parecia um anjo protetor. Carregava nas costas um menininho alegre, este era uma cópia mais nova de si mesmo, ele ria cada vez mais alto com que o maior lhe dizia. Ambos estavam a poucos passos de mim, não conseguia parar de observá-los, era uma cena invejável, eu era filha única e pelo jeito não saberia o que era ter um irmão.

Quando chegaram ao portão o mais velho percebeu que eu os observava, mas não disse nada somente sorriu para mim. Enquanto isso o mais novo fazia um pouco de birra dizendo que não queria ir, seu irmão simplesmente o desceu de suas costas e ajoelhou- se em sua frente e ao meu lado, o encarou por alguns segundos e por fim sorriu tocando-lhe a testa, dizendo-lhe “Até a próxima Sasuke.” Levantou-se e foi. Sasuke, este era seu nome, muito bonito na verdade. Ficamos lado a lado vendo o partir.

— Seu irmão parece um anjo. – Sussurrei mais para mim mesma, não achei que ele fosse ouvir, mas ele ouviu e me encarou como se só agora percebesse a minha presença.

— Tsk. – virou o olhar mais uma vez por onde o irmão seguiu, já estava fora de nossa visão, então suspirou.- Sou Uchiha Sasuke. – Estendeu a mão para mim, fiquei um pouco surpresa, mas a peguei.

— Prazer, Haruno Sakura. – Sorri e ele me acompanhou. Enfim ouvimos o sinal tocar, nos lembrando que estávamos atrasados, começamos a correr e no caminho descobrimos que éramos da mesma sala, e que Sasuke acabara de se mudar de Kioto.

E assim começou nossa amizade, junto a Naruto. Pois os únicos lugares eram ao lado do loiro, este era bem sozinho e atrapalhado, nunca havia conversado com ele, na verdade foi graças á Sasuke que tudo começou.

— Flashback Off –

Bons tempos aqueles, sinto falta de tudo e de todos. Ino esta na Espanha com Sai para uma exposição, Naruto e Hinata estão casados à anos e pouco saem, Temari e Shikamaru estão no Egito comemorando o aniversario da loira, e quando menos esperava Sasuke voltou e agora sumiu de novo.

Já me preparava para dormir novamente, quando enfim uma mensagem chegou, uma ansiedade imensa invadiu-me, seria ele. Corri até a mesinha e abri-a.

“Sakura espero que não tenha se esquecido da sua consulta terça. Um beijo, Hinata.”

Ah Hina! Droga, respondi-lhe confirmando o horário. Foi quando percebi uma notificação na tela, ele havia me respondido e já fazia 10 minutos, como eu não percebi, sua lesada. Tratei logo de lê-la.

“Desculpe por hoje gata. Adorei a idéia, nos vemos lá amanhã, que tal ás 09 hrs?”

“Por mim está perfeito, e não se preocupe já disse que o que aconteceu não importa.”

“Mentirosa, que feio. Te conheço e sei que esta louca tentando desvendar o enigma que sou eu”

“Convencido de uma figa. Não se ache tanto Uchiha, tenho coisas mais importantes para pensar.”

“Tipo?”

“Tipo moda, novela e cirurgias infinitas.”

“Ok Doutora, sei que é uma mulher ocupadíssima por isso deixarei que descanse. Durma bem e até amanhã Sakura.”

“Até amanhã Sasuke.”