Thomas Bonfrey e o Livro Sepulcral escrita por Mateus Rodrigues


Capítulo 2
A Proposta Absurda




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O dia seguinte arrastou-se maçante, pelo menos, para Thomas que limpava o verdejante jardim do orfanato, nos fundos. Havia muitos galhos e folhas regurgitados pela chuva da noite anterior. Geralmente era assim. Os órfãos deviam cumprir tarefas, seria algo até comum, se não fosse pelo modo traiçoeiro e cruel que estas eram atribuídas. Alguns faziam mais, muito, muito mais. Outros se entreolhavam cheios de tédio, acotovelando e insultando entre os cômodos.

Entrementes: Eram, normalmente, os órfãos mais grandes e burros, apelidados pelos demasiadamente magricelas e esguios como "os Suínos", que se embebedavam desses privilégios, por razões de força e poder.

Thomas tinha quinze anos, seus cabelos pretos, e devidamente aparados, caíam sobre sua face ossuda e rancorosa. Seu corpo franzino quase era imperceptível aos olhos. Estava acostumado a ser ignorado...

— Olá, posso te ajudar? – Anunciava uma garota magricela e sorridente pulando por de trás de um tronco ainda úmido. Nunca tinha visto aquela menina. "Deve ser nova aqui!". Logo concluiu. 

O menino titubeou. Nunca alguém falara com ele antes naquele lugar, a não ser as monitoras, quando ordenavam algo, quase sempre, de modo ríspido.

— Não que eu não quisesse... mas, mas, existem regras para as tarefas que devemos fazer todos os dias, logo vai descobrir, infelizmente. – Ele parou, o rosto da menina contorcera-se em desaprovação – E uma delas - Continuou relutante - é esta que você estava prestes a quebrar: Não se deve ajudar os demais em suas designações!

— Quanta besteira, vamos lá... Vou ajuda-lo mesmo assim. – Respondeu pescando alguns gravetos do chão. - A propósito, qual é mesmo seu nome?

—Thomas. - Ele quase não podia acreditar no que ela estava fazendo. "Está louca?", pensou ele. Algumas pessoas demoravam a se acostumar com o local, com essa nova vida, se é que poderia chamar o que acontecia ali dentro assim. "Não... Talvez só não compactuava com o fato de ter que seguir regras... Perigosa!"

— Hum... Me chamo Sacta, prazer em conhece-lo Thomas. Poderíamos ser amigos, não é?! Quer dizer... talvez, você sabe, sem pressão.

— É... Talvez! - "Definitivamente, não".

As horas se passaram. A noite logo alcançou o cume onde o orfanato se soerguia. E com ela, intrínsecas, as estrelas.

“Estrelado. Sem chuvas hoje!” – Percebeu Thomas.

O garoto estava na torre, desvencilhando-se, costumeiramente, de frases soltas e reflexões sobre o clima. Mas, no entanto, não estava só. Sacta, após muito segui-lo, e importuná-lo, encarava em coro a obscuridade e o negror dos céus. Estava boquiaberta. Era uma paisagem sublime e sepulcral, ao mesmo tempo.

A luz coalhada do luar tingia os cabelos loiros da menina, enquanto seus olhos azuis aguados miravam o horizonte. Era linda.

— Sabe Thomas – Revelou-se ela subitamente – Acho que posso, afinal, confiar em você. Já que confiou isso tudo a mim – Afirmou fazendo um gesto com a mão para a vidraça – Estive pensado em dar umas voltinhas pelo prédio.

— Pra quê? - "E o espírito rebelde ataca novamente!"...

— Você sabe... Pra ver se achamos alguma coisa de interessante nessa merda de lugar. Pra variar. Sacou?!

— É proibi...

— Não me venha falar de regras cara. Estou te dando uma oportunidade de descontração, de aventura. Antes de eu ser mandada para cá, no meu antigo orfanato, fiquei sabendo que esse lugar era assombrado ou coisa parecida. E... acho que podemos descobrir algo. Topa, ou não?

Thomas tinha várias perguntas à serem feitas, dúvidas ainda por esclarecer. Porém, estava exausto da inércia à contragosto. Dos corpulentos e, incrivelmente, folgados Suínos. Das rabugentas e enrugadas monitoras. Das fatigantes tarefas... De tudo.

— Topo! - Disse rapidamente, antes que pudesse pensar e decidir pelo contrário.

Passados alguns minutos, os dois se retiraram. Sem quaisquer tipos de despedidas. Cada qual para seu dormitório. Atiçados por um sentimento de curiosidade e empecilhos. Estavam, certamente, ansiosos. E, decididamente, abobados.

O Orfanato Trivisonário exalava o surreal em seus contornos. Era, de fato, difícil não assentir à uma tensão fúnebre que se alastrava em suas entranhas. Assemelhava-se a um cemitério. Todavia, isso não pertencia ao desconhecido. A história do prédio acentuava fenômenos não explicados: Ruídos, vultos dentre outras coisas medonhamente inenarráveis. E as pessoas que pernoitaram nos leitos canhestros do lugar jamais, segundo elas, deixaram as fatídicas perturbações.

Alguns dias se sucederam nublados, desagradáveis. Só o que impelia Thomas e Sacta era a ideia de vasculhar, corromper, todos os segredos confiados àquelas paredes.

E enfim. Eles que muito procuraram, acharam, por sorte, uma oportunidade perfeita de conseguir a desventura que lhes, finalmente, arrancaria do tédio, lançando-os em uma jornada envolta por mistérios, morte e supresas...

Era um dia estranho, olhar pro céu, muito cinza, causava enjoos. A chuva não caiu. O vento, porém, encarregou-se de indispor, por completo, aquele ambiente: oscilando feroz entre as árvores e assoviando, pelas janelas, que resistiam, com dificuldade, em não abrir, trazendo consigo um agouro capaz de mudar o mundo.

 

 


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Notas finais do capítulo

"Enigmas sepultados pelo tempo vão, enfim, submergir... Para chocar e desesperar novamente."



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