Until the very great end escrita por SheWantsDraco


Capítulo 3
Most nights I pray for you to come home


Notas iniciais do capítulo

Música: Joel Adams - Please don't leave me



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Henrique suspirou irritado. Ele não sabia o que estava fazendo ali. Na verdade. Sabia. Mas não queria admitir.

Não podia deixar-se levar pelo lado mais sombrios de seus pensamentos. Sabia que quando criança sua avó sempre tentava ser presente. E agora apesar de todo o Alzheimer que atrapalhava tudo, ele tinha certeza que não seria diferente.

Depois do enterro de Leo, tudo entrou numa monotonia terrível. Os pais de Izabelly ficaram em casa. E os pais de Henrique – como sempre, muito ocupados para ficar – voltaram para o Rio.

Com o pouco de coragem que lhe restava, ele estacionou o carro em frente a casa de repouso. A chuva que caia sob Nova Iorque deixava o clima ainda pior. E ele só tinha vindo porque sabia que Izabelly não estava sozinha e sim sendo cuidada por seus pais que só tinham a passagem comprada de volta para Miami no próximo final de semana.

Henrique não poderia ter agradecido menos por esse apoio. Eles precisavam da família agora. Não conseguiria lidar com tudo sozinho.

Ele saiu do carro com o coração quase escapando pela boca. Era diferente ver as coisas depois de Leo. Aliás, era assim que ele estava separando as coisas agora. Antes de Leo e Depois de Leo. A.L. e D.L. Sua vida e pensamentos se resumiam a isso agora.

Aproveitando que era a hora do almoço, ele aproveitou para servir o mesmo para sua avó e como já era conhecido ali, não foi difícil fazer com que os funcionários lhe deixassem entrar no quarto mesmo que não fosse horário de visitas.

Henrique, sem bater, entrou no mesmo. Era pequeno, mas razoavelmente confortável. A janela dava vista para um belo jardim, e no verão, ele quase conseguia se lembrar dos passarinhos cantando ao redor.

— Quem é você? – Perguntou com certo temor na voz. Não reconhecia aquele menino com aparência triste. Ao ouvir a voz de sua avó, quem por tanto tempo admirou, sentiu seu mundo ruir. Mais um pouco porque as primeiras rachaduras já tinham sido quebradas há muito tempo.

— Sou seu enfermeiro, vovó – Era assim que ele conseguia entrar no quarto sem que ela começasse a gritar por socorro. Por mais estranho que pareça, ela não chiava quando Henrique lhe chamava de vó. Era mais porque ela se sentia como uma. Era velha. Velhos eram avós, não era? Mesmo que ela não tivesse muita certeza de que se lembrasse exatamente como era isso.

Henrique queria gritar com seu pai, dar uns tapas, e o impedi-lo de voltar para o Rio sem antes de visitar sua avó, mas não tinha muito o que fazer.

— Meu enfermeiro não parecia tão triste assim nas ultimas vez que veio me ver – Henrique mordeu os lábios. Provavelmente ela estaria falando de Alexandre. Era um garoto que apesar de trabalhar num lugar tão triste como aquele era, não se deixava abalar com nada.

— Seu enfermeiro provavelmente pode estar passando por um momento muito ruim agora – Henrique comentou. Enquanto depositava a bandeja de almoço perto da cadeira que ela estava sentada. Onde minutos atrás, tentava, miseravelmente, fazer seu crochê.

— Meu enfermeiro deveria saber que as coisas passam – Ela disse confiante. – Nenhuma tristeza dura para sempre.

Henrique sorriu triste. Não imaginava que algum dia perder Leo pudesse doer menos do que estava doendo agora. A dor que fazia sua pele queimar. Queimar em saudade.

— Passam é? – Henrique perguntou apenas para reafirmar.

— Passam o que? – Henrique mordeu os lábios ao escutar a pergunta da avó. Ela já havia esquecido?

— As tristezas?

— Que tristezas, querido?

Henrique sentiu seu coração apertar. Ela só lhe chamava de querido quando ela lhe lembrava quem ele era. Que ele era seu neto. 32 anos. Casado com Izabelly e com um filho de 3 anos.

De repente, sentindo uma tontura tomar conta de si. Ele se levantou de onde estava sentado. Henrique sentiu os olhos de sua avó lhe encarando como se quisesse saber o que tanto lhe magoava. Ele não conseguiu ficar mais ali. Saiu correndo, como o bom covarde que sempre havia sido.

Mas, por incrível que pareça, se sentiu melhor quando saiu do que quando havia entrado.

E se odiou por isso.

***

 

Henrique não podia deixar as coisas como estavam. Depois que os pais de Izabelly foram embora as coisas pioraram gradativamente. Nenhum dos dois iam para o trabalho e por isso ele sabia que as coisas tinham que começar a mudar por aí. Ele sabia que convencê-la daquele jeito seria jogo sujo, mas não teria outro.

Izabelly não poderia definhar na cama, por mais que fosse a vontade dela. E além de tudo isso, pelo menos, para Henrique, vinha sendo difícil de dormir. Seu sono estava sendo prejudicado. Era difícil dormir sabendo que ele e Izabelly estavam sozinhos naquela casa que vinha parecendo maior que o normal.

Assim que terminou de se arrumar, sentou-se na cama novamente e separou os cabelos da esposa que estavam em seu rosto. Algo inaudível foi resmungado por ela, e Henrique sorriu apaixonado. Era adorável o estado da esposa no meio do sono em que as vezes ela resmungava.

Henrique sabia que as vezes, Izabelly lhe observava dormir, mas sabia que esses dias ela não havia feito isso muito, considerando que ela passava mais tempo dormindo do que qualquer outra coisa.

Dormir havia se tornado uma dadiva para Henrique, que todas as vezes, antes de fechar os olhos, implorava para que Leo estivesse bem aonde quer que ele estivesse. E ele só conseguia fazer isso pela visita que tinha feito a sua avó. Depois de tanto bater a cabeça, ele apenas decidiu segurar um pouco mais as lágrimas e se forçar a entender que tristeza nenhuma dura para sempre. E foi exatamente aí que ele mudou seu pensamento.

Já Izabelly implorava para que Leo voltasse para casa, mas Henrique não sabia. Não sabia o que a esposa pensava porque eles não conversavam mais.

— Querida – Henrique tentou – Está na hora de acordar.

Ele já até tinha ligado para o chefe de sua esposa, dizendo que ela voltaria ao trabalho. Era ruim fazer isso nas suas costas, mas achou que se isso já fosse uma verdade concreta, não teria como ser recusado.

— Já levou Leo para aula? - Ela perguntou quando despertou sentindo os olhos do marido em cima de si. Henrique se sentiu pior do que se sentia. Mas escolheu mentir. Se aquele era o jeito de fazer com que Izabelly parasse de definhar, ele faria.

— Já. – Um sorriso bonito cresceu nos lábios da esposa. Sorriso que fez com que Henrique sentisse seu coração doer. – Tem café da manhã pronto para você na mesa.

Izabelly como se nada tivesse acontecido, ela se levantou e foi fazer sua higiene matinal. Henrique desesperado correu para o quarto do filho e bagunçar a roupa de cama que estava tudo intacto nos últimos dias. Leo sempre deixava a cama bagunçada e eles só arrumavam a cama de tarde quando ele voltava da escola. Deixou a porta do quarto aberta assim que saiu do aposento.

Quando saísse do quarto e visse a porta aberta que era de frente para o seu – Izabelly cairia ainda mais naquela mentira.

Tentando viver como se Leo ainda estivesse entre eles, Izabelly terminou de se arrumar com as roupas para ir ao estúdio encontrar os outros que lhe ajudavam a montar o festival de primavera. Mas, justamente por isso, que a encenação de Henrique não durou muito tempo. As pessoas queriam dizer palavras bonitas. Palavras bonitas que não serviam para nada, a não ser para deixar quem as proferia um pouquinho melhor por ter que conviver com alguém que havia perdido um ente querido daquela maneira.

— Sinto muito, Belly.

Nenhuma palavra foi capaz de distraí-la. Diferente da música. Ela tocou. Tocou como nunca havia tocado. Tinha sido de longe o melhor ensaio de sua vida porque havia colocado cada resquício de sentimento confuso e triste que havia guardado dentro de si.

As teclas do piano passavam rápidas por entre seus dedos leves, sua pulsação acompanhando o ritmo da música já conhecida. E quando finalmente todos foram embora, resolveu ficar sozinha lá. Com a desculpa de que ensaiaria o tempo que havia perdido durante aquelas semanas.

Mandou uma mensagem, mentindo que o Ensaio com as outras colegas já tinha acabado. Sabia que o marido nunca a deixaria ficar no estúdio sozinha. Às vezes Henrique era preocupado demais.

Enquanto tocava sua música favorita, Izabelly sentiu seu peito apertar agora dando espaço para outro sentimento além da dor. Começou como se fosse um formigamento em seus pés até sua cabeça, e terminou em seus lábios sendo mordidos com força até que pudesse sentir o gosto metálico de sangue.

Odiava Henrique. Odiava por mentir.

Odiava ele por mentir que Leo voltaria, sendo que não, seu pequeno Panda não voltaria.

Não voltaria para seus braços nunca mais. 


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