Chiquitito Coração escrita por Nadia Luz


Capítulo 4
Capítulo 4




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No dia seguinte Fernando acordou mais cedo e foi checar a pequena paciente. Ela já estava acordada, segurando a sua boneca. Ele sorriu e se aproximou, sentando-se ao lado dela e ficando feliz por ver que ela já estava se sentindo melhor, quando ela sorriu e o abraçou forte.

— Bom dia minha rainha! – ela sorriu – você tá se sentindo melhor? – ela concordou, sorridente – que bom meu amor! Hoje vamos no hospital tá bom? Para vermos o que está acontecendo, mas vai ser bem rapidinho eu prometo! Agora vamos tomar um café bem gostoso?

Ela automaticamente colocou seus braços ao redor do pescoço dele e ele a pegou no colo e a levou até a cozinha. Ele a colocou sentada no banco alto que ficava na bancada que separava a cozinha da sala. Logo pegou o liquidificador e preparou o nutrem que a menina precisava tomar e antes de lhe entregar o copo, lhe deu as vitaminas que precisava tomar. Então, enquanto ela tomava o shake ele amassou uma banana e acrescentou mel e aveia, do jeito que ele sabia que ela amava. Preparou também duas torradas com requeijão, que ele sabia que ela não ia querer comer, mas ela ainda estava numa dieta intensa para ganhar peso, então ele ia dar uma forçadinha.

Carol acordou pouco tempo depois e percebeu estar sozinha na cama, o que achou estranho. Então se levantou e viu que ele não estava no banheiro. Foi até o quarto onde Maria estava e nenhum dos dois estavam lá e ela começou a se preocupar, quando foi até a sala e viu a pequena tomando seu shake enquanto ele terminava de preparar seu café.

— Bom dia meus amores – ela disse se aproximando da menina – acordaram cedo hoje é? Como está minha princesinha?

— Ela acordou bem melhor hoje, né mocinha? – ele respondeu, enquanto Maria recebia Carol com um sorriso e um abraço apertado.

Carol o ajudou a preparar as coisas e também sentaram para comer, conversando juntos sobre os exames e tudo mais. Foi quando Maria ouviu sobre um coração doente e como fazer ele sarar que ela sentiu pela primeira vez a necessidade incontrolável de dizer alguma coisa.

— Meu coração não tá mais dodói – ela disse numa voz baixinha e tão, mas tão meiga que o ambiente ficou em silêncio por um tempo. Os dois se olharam e depois olharam para ela, como se não acreditassem.

— Você falou alguma coisa minha princesa? – perguntou Carol, quase explodindo de animação. Ela concordou com a cabeça e repetiu.

— Meu coração não tá mais dodói.

— A gente não tá entendendo minha rainha – ele disse, igualmente extasiado por ouvir a sua voz.

— Vocês disseram que meu coração tá dodói, mas ele não tá mais. O coração da gente só fica dodói quando a gente tá triste né? Eu tava triste, mas agora eu não to mais, nunca mais.

— Você não tá? – disse Carol, segurando as lágrimas

— Não... – agora ela abaixou a cabeça, olhando um pouco envergonhada para suas mãozinhas – agora eu tenho vocês.

Com esse comentário nenhum dos dois conseguiu mais segurar as lágrimas e levantaram para abraçar a menina ao mesmo tempo. Fernando a levantou quase até o teto de tanta animação. Pareciam animados como a própria Maria ficou na primeira vez que a Laurinha falou com ela.

— Meu amor, eu to tão feliz por ouvir a sua voz! Você nem faz ideia!

Os três comemoraram juntos e se sentiram inteiramente como uma família naquele momento. Logo todos se arrumaram para o dia e mais rápido do que imaginavam os exames de laboratório, o ecocardiograma com Doppler e a ressonância magnética foram feitos com prioridade, depois de Fernando ter requerido com urgência. Ele fez questão de leva-las de volta para o orfanato depois de terminarem os exames e prometeu que iria até lá dar os resultados quando eles saíssem, o que seria ainda naquele dia devido a urgência pedida pelo doutor. 

Assim que as crianças voltaram da escola foram ver a se a Maria estava bem, incluindo a Dani, que ainda estava assustada. Encontraram a pequena no pátio brincando com a sua boneca e tudo parecia normal. Carol sorriu quando viu Dani abraçando a menor, aliviada por ela estar bem. Sempre soube que seriam boas amigas.

Mais tarde o Fernando apareceu com os resultados dos exames e se encontrou com Carol na diretoria para conversarem.

— E então, o que você tem pra me falar? É bom? É ruim?

— É médio. As minhas suspeitas estavam certas. Existe uma tendência específica, advinda da condição especial do sistema imunológico da Maria, de os anticorpos não reconhecerem devidamente as células do miocárdio

— O que significa que...

— O que significa que os anticorpos começaram a atacar o coração, o que gerou uma insuficiência cardíaca, que infelizmente nesse ponto já é considerada crônica.

— O que isso pode causar a ela?

— Isso piora consideravelmente seu quadro, porque com sua condição imunológica ela já teria muita facilidade de adoecer, porque seu corpo é mais vulnerável, então doenças como anemia, pneumonia, e todo tipo de infecções sempre serão mais comuns na vida dela do que na de uma pessoa normal. Com esse agravo, agora os cuidados precisam ser maiores, já que qualquer uma dessas doenças ou infecções podem piorar o seu quadro cardíaco.

— Então o que você está me dizendo é que ela já tem o organismo todo frágil demais e agora, além disso, o coração dela é mais frágil do que o normal.

— Infelizmente é mais ou menos isso. Na verdade o coração dela não é mais frágil, ele é insuficiente.

— E o que faremos agora? – ela perguntou, sem conseguir evitar que as lágrimas caíssem.

— Ela vai precisar tomar um medicamento específico, que chamamos de betabloqueadores. Eles diminuem a carga de adrenalina, reduzindo a frequência de contrações do coração. Nesse primeiro estágio isso irá servir, junto com todos os demais cuidados que já estamos tendo, além de nos certificarmos que ela não exagere muito nos exercícios físicos e etc.

— Isso vai servir? Por quanto tempo?

— A princípio sim, mas ela terá que toma-los indefinidamente. Caso o quadro piore temos opções cirurgias, mas que estão completamente fora de discussão devido a sua idade e ao estágio do quadro – ele respondeu tentando se manter profissional. Esse não era um trabalho fácil muitas vezes, mas era bom saber que ele poderia proporcionar o cuidado necessário para sua mais nova garotinha.

— E esse remédio é forte? Ela vai ficar bem com ele?

— Ele tem alguns efeitos colaterais e por isso no começo ela pode sofrer um pouco mais, até encontrarmos a dose certa para o seu organismo. Precisamos ficar muito atentos porque ela já tem um quadro quase crônico de anemia e tem pressão baixa, o que pode fazer com que ela não se acostume com o remédio

— E por que isso?

— Porque ele justamente diminui a frequência das batidas cardíacas. Pode causar o que chamamos de bradicardia sinusal, que é quando a frequência cardíaca fica abaixo de 60 batimentos por minuto. Esse e o possível bloqueio atrioventricular são os possíveis efeitos mais graves. Fora isso ela pode sentir tonturas por hipotensão, náuseas, vômitos, alterações do trânsito intestinal e dores abdominais. Mas como eu disse, vamos trabalhar em uma dosagem ideal para que ela sinta o menor peso possível desses efeitos.

— Ela vai precisar de um especialista?

— Ela já tem um, o Dr. Hugo Oliveira, meu companheiro de trabalho. Ele já está atualizado do caso e de todo o histórico dela e totalmente à disposição para ser seu cardiologista pediátrico.

— Eu não sei o que faria sem você, sabia?

— Sabia! – disse ele sorrindo e levantando para beijar sua namorada. Em seguida ele secou suas lágrimas e acariciou seu rosto – não precisa ter medo, vai ficar tudo bem, eu prometo!

Fernando ficou para jantar com as crianças naquela noite. Mili encontrou os dois quando estavam saindo do escritório da diretora Cintia e notou que Carol tinha chorado.

— Carol, tá tudo bem?

— Tudo sim princesa, tá tudo bem.

— Vocês tavam falando da Maria? Ela tá bem?

— A gente tava sim pequena, mas está tudo bem, eu só me emocionei um pouquinho – sem mais nenhuma palavra, a menina a abraçou forte. Carol sabia que podia contar com ela pra tudo o que precisasse. Carol foi até o banheiro para lavar o rosto e depois encontrou todos, incluindo a Maria e o Fernando, sentados na cozinha, jantando. Ela sorriu, trocou algumas palavras com os meninos, se serviu e sentou na mesa com a caçula, o médico e a Dani.

Os dias se passaram e os novos resultados dos exames de Maria chegaram, o que indicava que era a hora de introduzir os novos medicamentos. Ela continuava tendo a mesma postura, quieta, com todos, apesar de ter voltado a brincar alegremente com as meninas e parecer melhor. Com a Carol e com o Fernando ela trocava algumas, poucas palavras e apenas quando estavam sozinhos. Fernando não queria externar, mas estava preocupado com a aceitação do medicamento pelo organismo da menina, que ainda era tão nova e tão frágil. Tinha medo também porque sabia que durante a noite a Carol não estaria com ela e que a Ernestina não prestaria o mesmo papel cuidadoso. Pensou em sugerir algo nesse sentido, mas preferiu não fazê-lo para evitar que ela se preocupasse ainda mais, sem ainda ter acontecido nada de fato. O fato mesmo é que ele estava preocupado. Ele gostaria de estar ali em todos os momentos. Ele estava se arrumando para mais um dia pela manhã, quando pegou uma foto que Carol tinha lhe dado naquela semana, dos três juntos. “O que você fez comigo pequena?’’ perguntou para as paredes. Estava nervoso com esse tratamento, estava tão ansioso quanto a Carol. Nunca se sentira assim com nenhuma criança que estivesse sob seus cuidados. Nem mesmo de dividir os cuidados médicos com Hugo, seu colega de trabalho, ele estava gostando. Terminou de se arrumar, pegou os remédios que já havia comprado na noite anterior depois da consulta com o cardiologista pediátrico Hugo para analisarem os exames e saiu. Foi direto para o Raio de Luz. Quando chegou encontrou a van saindo e a Carol no portão se despedindo das crianças que estavam indo para a escola. Se aproximou e a cumprimentou com um beijo. Os dois entraram e ela ofereceu café, sabendo que ele não tinha comido nada ainda. Ela sabia o quanto ele também estava apreensivo. Ele aceitou e naquele café da manhã tiveram mais uma demonstração de afeto da pequena que lhes fez brilhar os olhos. Os dois se sentaram juntos para tomar o café e estavam conversando, quando a menina apareceu correndo.

— Carol! Fernando! – disse ela sorrindo. Chico que estava presente se surpreendeu. Carol já tinha dito que a menina estava começando a falar com eles, mas ele nunca tinha ouvido a sua voz.

— Bom dia meu amor!

— Oi minha princesa! – disse Fernando se levantando e dando um abraço que a levantava do chão. – você dormiu bem? – ela concordou.

— Está na hora de se alimentar então! – disse Chico, levando o shake de sempre para a menina. Fernando se sentou novamente com ela em seu colo.

— Eu sonhei com vocês – disse a pequena. Chico apenas observava admirado aquela cena, até mesmo emocionado. Naquele momento ele soube que algo importante estava acontecendo na vida daqueles três.

— É mesmo? E o que acontecia no sonho princesa?

— Eu não lembro – ela deu de ombros – mas tinha você – disse apontando pra Carol – você – agora para o Fernando – e eu estava muitão feliz.

— Muitão feliz é? – disse ela rindo. – eu é que sou muitão feliz do seu lado pequena!

Eles ficaram por ali mais algum tempo conversando e Fernando notou que a menina não estava muito afim de tomar o nutrem naquele dia.

— Não vai tomar o shake princesa? – ela fez que não com a cabeça. – mas você precisa, lembra? Pra crescer e ficar bem fortinha. – ele olhou para a Carol pedindo ajuda. Mais do que qualquer outro dia, hoje ela tinha que comer bem, se não o medicamento seria ainda mais danoso para o seu organismo.

— Meu amor, você quer aquele sanduíche que eu fiz no dia do cinema? – a menina recusou – mas você gostou tanto!

— Princesa, você lembra do que a gente conversou? Você precisa comer! – ela abraçou a boneca mais forte, se esquivando.

— O que aconteceu Maria? Você estava indo tão bem!

— Eu não sei... – ela respondeu dando de ombros e olhando para baixo.

— Você lembra o que eu te falei ontem? – ela voltou a olhar para ele. – que hoje a gente ia começar a tomar aquele remedinho, lembra? – ela concordou. – mas, pra tomar o remedinho você precisa fazer uma força e tomar o seu shake, as suas vitaminas e comer pelo menos um pouquinho. Você acha que pode fazer isso? – ela voltou a olhar pra baixo

— Por favor princesa? – ela olhou para a Carol na sua frente e como resposta apenas pegou o copo e começou a tomar o shake.

Ela tomou o shake inteiro e todas as vitaminas, começou a comer o sanduíche que a própria Carol tinha preparado, mas sentiu uma vontade imensa de ir ao banheiro e se levantou.

— Hey, hey, onde você vai?

— Xixi! – ela disse simplesmente e saiu correndo pro banheiro. Carol deu uma risada pela forma que a menina agiu e voltou a olhar para o namorado.

— Pelo menos ela comeu alguma coisa.

— É, mas isso deve melhorar com os remédios. O xixi também.

— Como assim?

— São dois sintomas da insuficiência cardíaca. O apetite pode ser devido à isso, tanto quanto o quadro de anemia. A vontade de fazer xixi o tempo todo é devido à insuficiência cardíaca. Vai melhorar muito. – disse ele não muito animado. Carol notou, mas já sabia seus motivos e por isso não questionou. Continuaram conversando por mais algum tempo, aproveitando a companhia um do outro.

— E como estão os outros pequenos?

— Estão bem, você sabe... To preocupada com a Dani. Ela se sente muito intimidada com a Maria e todo o processo de guarda não está indo nada bem.

— Eu imagino como deve estar sendo difícil. Ainda bem que vocês ainda continuam perto uma da outra.

— Nem me fale! Eu não sei o que eu faria sem ela aqui.

— Que mudinha preguiçosa! – disse Ernestina entrando na cozinha, como sempre fazia, falando das crianças por aí.

— Que que foi agora hein Ernestina? – perguntou Chico

— A mudinha é uma garotinha preguiçosa, só sabe dormir.

— Já falei pra tomar cuidado com o jeito que fala da minha... – disse Fernando, quase chamando a menina de filha sem querer e chamando a atenção de todos. Logo, se recompondo, prosseguiu – da Maria. – concluiu, sério, se levantando e se retirando da cozinha. Carol, um pouco confusa, sem dizer nada, o seguiu. Os dois se encontraram novamente na sala.

— Tá tudo bem meu amor? – perguntou ela.

— Tá... tá, tudo. Eu só não suporto o jeito que essa senhora trata a Maria... quero dizer, as crianças.

— É, a Ernê é complicada mesmo. Mas vamos deixar ela pra lá e espiar a nossa pequena, o que acha?

— Esse sono todo não é culpa dela, ela não é preguiçosa e nem mudinha. O coração dela a deixa cansada, será que essa mulher não entende.

— Eu sei meu amor, vamos subir, venha – disse ela lhe dando um selinho. Quando chegaram viram a menina deitada novamente em sua cama, adormecida. Fernando se sentia tão envolvido que não esperava a Carol tomar as atitudes como quando ele ia tratas das outras crianças. Ele simplesmente foi na frente até a menina e se abaixou em frente à cama, tirando uma mecha de cabelo do rosto da pequena adormecida.

— Princesa – chamou ele cochichando – Oi! – disse quando ela despertou. – O que você tá sentindo? – a menina que não sabia responder exatamente o que estava sentindo, apenas olhou para baixo.

— Você não tá boa né minha princesa? – perguntou Carol – então vamos fazer assim, vamos começar a tomar aquele remedinho que conversamos e então você pode dormir mais um pouquinho, tudo bem?

Maria concordou e então Fernando buscou as pílulas e um copo d’água. Ele deu as duas pílulas do remédio para a pequena e se despediu, deixando Carol acomodá-la na cama novamente. Depois disso ele e Carol se despediram e ele foi até o hospital começar sua jornada de trabalho.


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