— E onde está o corpo? – Sophia perguntou, chutando um pedaço de galho pra dentro do lago.

Thor pegou a jaqueta escura que ela trouxera e a vestiu por cima do peito nu, não estava exatamente com frio, mas se sentia desconfortável seminu na frente de Sophia, não porque eram primos, mas não queria dá margens a ela nem liberdades, já era nojento saber que ela e Isaac tinham um caso, não queria de maneira alguma fazer parte disso.

— A correnteza levou, era esse o plano não? Dizer que ela bebeu, entrou no lago e como não sabia nadar se afogou.

— Sim. Por isso o trouxe – ela apontou com o polegar para o corpo caído inconsciente próximo a margem. Sophia tinha tirado toda a roupa do garoto e o abandonado como um pedaço de merda no meio do chão sujo. – A policia vai concluir que eles vieram terminar o que tinham começado aqui. Perfeito.

Era o garoto com quem Lana tinha chegado e dançado durante toda a noite, Thor não conseguia sentir um pingo de remorso pelo que tinha deixado Sophia fazer com ele.

Ela sorriu e pela primeira vez pareceu notar sua roupa molhada.

— Por que você está molhado a propósito?

— Lana deu um pouco de trabalho – deu de ombros – Onde está o medalhão?

Sophia o encarou desconfiada, era obvio que não tinha acreditado, mas não havia muito o que pudesse fazer. Abriu a jaqueta e tirou o cordão tão familiar para Thor de lá, o vira tantas vezes no pescoço de Lana que ele parecia quase como uma extensão dela, e pensar nisso, curiosamente, pinicou algo dentro dele, uma ansiedade que há tempos não sentia, suas mãos coçavam para pegar a pedra das mãos de Sophia e guarda-la pra sempre. Mas ele sabia que não poderia fazer isso, caso contrário, todo o plano e esforço feitos até aqui não valeriam de nada.

— Pensei que quando ela morresse ele fosse ficar diferente – Sophia murmurou girando a peça nos dedos – Mas continua fosco e feio.

Ele não era feio, e ambos sabiam disso.

— Certo. Vamos entrega-lo e acabar com isso – Thor resmungou indo até o corpo inconsciente e o arrastando pra dentro da agua, o odor de álcool e suor chegaram com força nas suas narinas, como Lana tinha ficado com aquele garoto era um mistério, e olhando mais atentamente, ele percebeu que de fato ela não perdeu grande coisa.

Ele não estava morto, percebeu quando o forçou a entrar na agua, seu pulso estava fraco, mas estável, perguntou-se internamente se Sophia sabia disso ou se fora proposital deixa-lo assim, de um jeito ou outro, Thor sabia que se ninguém o encontrasse ele acabaria morrendo afogado.

Ele deu um ultimo empurrão e saiu da agua, andando até onde tinha largado seus sapatos e os calçou.

— Sabe o que é engraçado? – Sophia disse de repente, a voz dela soava distante e entretida – Que ele só está boiando.

Thor olhou por sobre o ombro, de fato, o garoto estava de barriga pra cima e boiando no mesmo lugar onde fora largado.

— A correnteza é fraca – ele murmurou, apressando-se em por o outro sapato e empurrando o vestido e os saltos que Lana largara ali, deixando as peças mais próximas do caminho aonde eles vieram.

— Não é isso. O corpo está parado – Sophia estreitou seus olhos, chegando mais perto da agua, olhou pra ponta do rio, onde a mata fechava a passagem, fechava demais, era impossível alguém passar por ali. Quando um estalo estalou na sua cabeça ela voltou-se imediatamente pra Thor – Esse rio não tem correnteza. Onde está o corpo da garota?!

Thor fechou o zíper da jaqueta com força cobrindo de vez seu peito e virou de frente pra Sophia, os olhos dela estavam arregalados como dois pratos cinza. É agora.

Como um raio ele avançou pra ela, jogando seu corpo com força contra a primeira árvore que viu, Sophia bateu no tronco com força e caiu com um estalo no chão, Thor pegou um galho no caminho e andou até ela, ajoelhando-se ao lado do seu corpo, a segurando pelo ombro no chão quando ela tentou se erguer. Os olhos de Sophia ganharam vida quando ela percebeu o que ele pretendia fazer.

— Não faz isso Thor! Eles vão mata-lo. Você não pode. Por favor – choramingou.

— Adeus Sophia – disse e fechou a mão em seu pescoço, com a outra pegou a ponta afiada do galho e mirou no seu peito.

°°°

Ela acordou, e sua cabeça zunia, como se existisse uma orquestra dentro dela, Lana se arrastou de lado e sentiu terra embaixo dos seus dedos. Ela estava agarrando um amontoado de mato e areia, quando sentiu seus olhos focarem notou a escuridão que a cercava, e como uma avalanche as memórias retornaram, uma a uma, ela dançando na casa com as mãos de Jefferson atrevidas, ela saindo à procura de Luce, Thor, e mais Thor com ela dentro de um lago, tentar lembrar-se do que acontecera depois disso provocou uma dor de cabeça descomunal.

Lana tentou sentar, mas fora impedida por um par de mãos finos e gentis, um perfume familiar surgiu e em um clarão ela identificou o borrão que pairava acima da sua cabeça.

— O que...

— Shhh. Você ainda está tonta. Calma – sussurrou jogando por cima dela um cobertor pesado e quente.

Ela não tentou removê-lo, sentia frio e seu queixo batia, ainda estava usando apenas lingeries e estava descalça. Jasmim pareceu entender a linha dos seus pensamentos.

— Eu trouxe algumas roupas confortáveis, mas achei melhor esperar você acordar. Como está se sentindo? – sussurrou.

— Minha cabeça está doendo, o que está acontecendo? Por que você está aqui?

— Eu não sei – ela disse, ainda mais baixo, Lana estreitou os olhos e tentou escutar com mais clareza, os ombros de Jasmim tremiam e ela ainda estava com as roupas que usara na cerimonia, isso significava que ainda era o mesmo dia, certo? – Thor me disse que precisaria de um favor meu, que eu teria que cuidar de você aqui e não podia falar pra ninguém, e estou fazendo.

— Thor...?

— Sim. Também me pediu pra pegar algumas roupas suas, não foi fácil roubar as chaves da Luce, mas consegui – ela apontou pra uma mochila pequena e familiar, era a bolsa de mão de Lana, que ela usava quando tinha que sair no final de semana pra casa dos pais – Ele só me disse isso.

— E onde ele está?

Jasmim deu de ombros. – Eu não sei. Quando cheguei você já estava inconsciente, não me olhe assim, eu queria te levar pro hospital ou chamar a policia, mas Thor falou que seria perigoso, ele disse que eu teria que ficar aqui, escondida com você esperando ele voltar.

— Jasmim isso... – Lana sentou arrastando-se até sentir o apoio de uma arvore nas costas, ela queria ir até sua mochila e vestir algo, mas ainda não se sentia segura, estava fraca e algo acontecia na sua cabeça, tudo que via fugia de foco, ate o rosto de Jasmim parecia oscilar de vez em quando. Ela estreitou os olhos e tentou mirar nela, esperando que sua voz não tremesse – Isso é loucura, por favor ligue pra alguém, temos que sair daqui.

A garota negou com a cabeça.

— Thor disse que pode ser perigoso, vamos esperar ele voltar.

— Desde quando você aceita o que ele diz? E desde quando vocês são parceiros?

— Meu tio ele... – Jasmim pareceu encolher e colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha – disse que tenho que obedecê-lo, eu não entendo, mas parece o certo a se fazer.

Aquilo estava ficando cada vez mais estranho, Lana tirou o cobertor de cima de si e pegou a mochila, feliz por encontrar roupas leves e confortáveis, ficou de pé com a ajuda de Jasmim e enquanto vestia o short e a blusa de manga comprida observava a amiga pelo canto dos olhos. O que quer que estivesse acontecendo ali Jasmim não sabia de nada, disso tinha certeza, mas duvidava que Thor soubesse realmente o que fazer ou o que acontecia.

Ele queria dizer algo a ela quando a levou ali, algo sobre ele, Isaac e Sophia, e ele teria dito antes de Lana deixar seus hormônios tomarem de conta de si e distraí-lo, ela ainda não sabia se estava arrependida, mas de fato não fora sua ação mais inteligente.

Ela tinha acabado de passar a blusa pela cabeça e arrumá-la no corpo quando Thor surgiu entre as arvores, de frente a ela, o cabelo seco e bagunçado, a jaqueta aberta exibindo além do seu peito também um ferimento grande que sangrava, ele parecia mais pálido que o normal, seus lábios brancos e entreabertos e seus olhos, agora grudados nela, estavam espantados, mas suavizaram, à medida que ele caminhou em sua direção, quando a alcançou Thor jogou seus braços ao seu redor com tudo, junto com seu peito, e ambos caíram, com ele em cima de Lana e seu ferimento sujando sua blusa.

— Thor! O que aconteceu?! – ela gritou. O corpo dele moveu-se pro lado e ela pode respirar, Thor caiu de barriga pra cima e Lana apoiou sua cabeça em seu colo, um sorriso débil estava nos lábios dele.

— Eu... Eu não posso morrer... Não chore... Eu não vou morrer...

Estou chorando? Ela percebeu que sim quando uma lagrima caiu na testa, Lana limpou depressa.

— O que aconteceu? – dessa vez fora Jasmim quem perguntara, ela ajoelhou-se ao lado deles trazendo consigo o cobertor que cobrira Lana, usando-o pra estacar o sangue.

— Fui atacado... Sophia, ela não estava sozinha... Ela conseguiu fugir... Temos que sair daqui...

— O que? Do que você está falando? – Lana perguntou.

Thor ergueu seus olhos e eles pareciam mais focados agora, suas sobrancelhas grossas estavam unidas e uma expressão de duvida em seu rosto, então ele pareceu lembrar que Lana não sabia nada sobre o que ele estava falando, ela viu seu rosto desmanchar em pesar e incertezas.

— Jasmim – ele disse enfim, levantando-se do colo de Lana, tirando o cobertor, agora ensanguentado, de cima de si – Você colocou o carro onde te pedi?

A garota assentiu, parecia um tipo de código, ela ficou de pé apanhando a mochila e dobrando o cobertor. Lana não gostava do que estava sentindo, daquela sensação de que estava por fora de tudo, e também de não está entendendo absolutamente nada.

Thor foi o próximo a ficar de pé, ele parecia mais forte agora e seu ferimento não sangrava tanto, mas ainda sim, Lana não conseguia tirar seus olhos daquele corte e de parar de se perguntar se ele tinha sido machucado em outros lugares.

— Vamos sair daqui, e amanhã te conto tudo – ele disse pra ela, estendendo sua mão. Lana a pegou, apertando-a com força.

Quando saíram daquela floresta fechada Lana conseguiu ver a casa onde até pouco tempo estivera, ela ainda borbulhava em cores coloridas e musica alta, mas não fora pra lá que eles seguiram, e sim pro estacionamento improvisado com vans e SUV´s, Thor andou até um Pálio preto e o destravou, agora entendia porque não o tinha visto antes, ele viera no próprio carro – mesmo que fosse um modelo diferente do que havia imaginado pra ele e suas jaquetas caras.

— Você vai pra um hospital? – Jasmim perguntou, ela vinha um pouco atrás, ainda segurando sua mochila e o cobertor sujo.

Thor abriu a porta de trás e pegou as coisas das mãos de Jasmim, jogando-as no banco.

— Não. Sem hospitais. Nós vamos pra um lugar seguro – ele virou de frente pra ela – Você sabe exatamente o que tem que fazer, não sabe Jasmim?

Jasmim assentiu com força antes de deixar seus olhos caírem em Lana, em seguida avançou até ela, abraçando-a. Lana fora pega de surpresa e demorou dois segundos para retornar seu abraço e perceber que o corpo da amiga tremia.

— Vou sentir saudades – ela murmurou, soltando-a e logo em seguida se afastando.

E foi então que Lana percebeu que o nós era ela e Thor, não Jasmim e Thor como tinha chegado a pensar, virou pra ele, encontrando-o de pé, encostado no carro e de braços cruzados.

— Que foi?

— Como assim que foi? Eu não vou lugar algum com você sem antes saber o que aconteceu, você tem noção do quanto eu to confusa?

Thor desencostou-se do carro e abriu a porta do passageiro. – Entra. Te conto no caminho – murmurou.

— Você está louco.

— Não estou. Cada segundo que ficamos aqui aumenta o perigo, Sophia fugiu, deve está por ai te caçando pra terminar o serviço.

— O que?!

Thor suspirou alto. – Tem alguma coisa em você Lana, alguma coisa que interessa algumas pessoas, algo forte, por isso Sophia está te caçando, por isso tenho que te tirar daqui.

— E como vou saber que você não está mentindo?

Ele sorriu, mas foi um sorriso estranho e falso, Thor se aproximou puxando-a pela cintura, ela jamais iria dizer, mas adorava quando ele a puxava dessa forma, quando os lábios dele buscavam os seus, pelos olhos de Thor que brilhavam ela sabia que não precisava dizer.

— Vem comigo, por favor — ele murmurou doce entre beijos – Vou te contar tudo no caminho, mas preciso te tirar daqui logo.

E ela acreditou nele, foi imprudente, mas ela não se sentia irresponsável quando entrou no carro e nem depois, quando eles saíram da fazenda, deixando qualquer perigo pra trás. Thor não disse nada enquanto dirigia, ele ia em silencio e Lana tentava não olhar pro seu ferimento, mas houve um momento que olhou, e lembrou quando ele próprio disse que não podia morrer, uma memória que puxou outra onde ele dizia que devia mata-la, mas isso foi um pouco antes de ela cair no sono, sonhos estranhos com agua e bichos estranhos a cercaram durante todo o resto de noite.

ººº

Luce tinha acabado de recobrar a consciência quando sentiu o carro parar de novo, mas não conseguia levantar a cabeça ou encontrar foco pros seus olhos, tudo ainda estava embaçado, talvez no futuro ela procurasse a mãe para treinar suas habilidades, não queria passar por isso de novo, essa imobilidade tão prolongada.

Isaac estacionou o carro atrás de um prédio em construção, tudo ainda estava escuro e silencioso quando ele desceu e afastou-se, Luce pôs sua mão no vidro da janela e tentou sentar, conseguiu até ver Isaac um pouco longe, com o celular no ouvido, ele parecia irritado quando virou pra ela, desligou e aproximou-se de novo, abriu sua porta e seu rosto sério surgiu diante dos seus olhos.

— O que você fez Lu? – ele perguntou, e ela odiava quando ele a chamava assim. Luce afastou-se o tanto que conseguiu, mas Isaac a puxou de novo pra si pelo braço.

— Nada. – murmurou.

Ele balançou a cabeça. – Eu sei quando você mente.

O som de pneus cantando surgiu distante e logo em seguida um solavanco no carro, alguém tinha batido na traseira, quase derrubando Luce se não fosse pelos reflexos de Isaac, ele a segurou no lugar.

— Mas que porra! – exclamou, soltando-a e empurrando de volta – Fique ai.

Ela não conseguiria sair, pedir por isso era inútil.

Issac fechou a porta com força, Luce ouviu sons de vidro quebrando e gritos, era uma luta?, tentou de novo sentar, conseguindo com mais firmeza agora e viu pelo vidro de trás quando dois homens grandes vestidos de preto seguraram Isaac por trás, um vulto destacou-se entre eles e sua porta foi de novo aberta, mas dessa vez um par de olhos iguais aos seus e sardas surgiu, Luce nunca imaginou como essa visão poderia deixa-la tão ansiosa e feliz ao mesmo tempo.

— Consegui chegar a tempo, não? – sua mãe perguntou.