Encontro Marcado escrita por Jessica Calazans


Capítulo 25
Capítulo 25




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Emília nunca foi de rezar, nem mesmo sabia se acreditava em Deus. Mas ali, ao pé da cama, ela rezava para algum ser superior, desabafando todo seu sofrimento

 

— É castigo pelo meu bebê não é? Mas dói em mim também, sabia? Dizem que você é poderoso. Por que  não fez algo dar errado, por que não impediu a morte do meu pequeno? Por que me causa mais essa dor? Por que me marca mais uma vez? Eu já estou tão cansada… – Ela deixava que o choro rompesse, enquanto falava com Deus. Os olhos fechados, deixava que o choro lavasse a alma, e se pudesse, levasse toda dor – Por que tanta mentira? A vitória não pode ser minha mãe, ela não é, não é –

 

Emília não viu Vitória chegar, escutando a pergunta. E se ancorar ali, apoiada na parede rente a porta, observando sua menina.



— Mesmo que você não queira eu sou, Emília, eu sou sua mãe – A voz se mantinha serena, e ela continuava inerte rente a parede a observar

 

O choro se calou, talvez pelo susto. Mas Emília rapidamente levou as mãos ouvidos, tentando impedir, abafar que a voz de Vitória - Não,  não, não – Repetia pra si mesma –

 

— Escuta por favor, eu suplico – Ela pediu, tentando manter a voz inalterada

 

— Não, não, eu não quero escutar – Emília quase suplicou, ainda tampando os ouvidos.

 

— Você vai ter que me escutar, Emília. Não pode julgar antes de saber de toda verdade  A verdade da minha vida  e por que te abandonei. Por que tive que morder meus lábios para mais de uma vez para não gritar antes que você era minha filha. Eu vou lutar pelo seu amor, Emília. Não sairei daqui –

 

Talvez, comovida com a última frase, ela abaixou as mãos, disposta a ouvir

 

(..)

 

Sentadas na cama, a uma certa distância, finalmente havia o que se poderia chamar um diálogo

 

— O inicio você já sabe, eu era jovem como você, seu pai foi meu primeiro amor. Eu não sabia o que o destino me reservava. Não sabia o que teria que sofrer por aquele primeiro amor que enchia minha alma de felicidade... – Abatida, seu semblante era cansado. Impaciente, Emília se levantou e teve que interromper para censura-la

 

— Como foi de capaz de se entregar a um homem  sabendo que ia ia ser um sacerdote

 

— Eu sabia que nosso amor era proibido, mas a ilusão, a inexperiência, até mesmo o nosso amor foi mais forte. Quando sua vó descobriu que eu esperava você, foi implacável. Amou contra mim, me ameaçou, me expulsou da casa dela. Eu não sabia o que fazer, onde ir – Suspirou, não queria se alterar, nem chorar outra vez - Tudo que sabia era que eu esperava um filho –



— Que com certeza te envergonhava, e por isso o abandonou sem se importar com seu destino –  Foi dura e implacável ao interromper mais uma vez. Vitória não pode se manter indiferente a essas palavras, também se pondo de pé

 

— Não foi assim, filha, não!  Eu estava muito alegre, eu ia ter um filho. Um filho que ia acabar com toda minha solidão e a quem eu daria todo o meu amor de mãe, eu já o amava  –  Incrédula, Emília maneou em reprovação, ela não podia mais suportar

 

— Ah.. Mãe!!! Mulheres como eu e você não podem ser chamadas de mãe. Depois de ter tido um filho e abandonado numa porta qualquer… COMO PODE SE CONSIDERAR MÃE? COMO ?? COMO ESPERA QUE EU POSSA PERDOAR? COMO??? ME DIZ, COMO?  – Emília fez menção em sair do quarto, mas Vitória impediu seu caminho

 

— Me escuta, por favor. Eu só abandonei você porque… –

 

— Por que deve ter pensado que eu era um estorvo pra senhora – Respondeu por ela, dando as costas, enxugando as lágrimas que vinham sem pedir licença –

 

— Você estava doente, filha, e eu não tinha nada pra te dar de comer – Vitória voltou a se aproximar, mesmo com a resistência de Emília

 

— Cala a boca, cala a boca  – Emília voltava a tampar os ouvidos, mas não por muito tempo, logo voltava a enxugar as lágrimas, orgulhosa que era.  

 

— Tinha medo que morresse em meus braços, além do mais, eu também estava doente. Numa noite, chovia, e eu tentava proteger você em meus braços da chuva e do frio. E eu a sentindo em meus braços percebi que estava ardendo em febre, filha – Vitória não pode mais segurar as lágrimas, pelas lembranças. E talvez comovida, ou triste demais por si própria, mais lágrimas rolavam pelo rosto de Emília – Eu andei muito, chorei muito, com medo. Então na minha frente eu vi a porta de uma casa, pensei que lá não lhe faltaria nada, que lá cuidariam de você como eu não podia cuidar …. –  Com certa repulsa, Emília se afastou, encarando a genitora  com asco e repugnância;

 

— Você me largou ali na chuva, no frio? Agora eu sei como pude ser tão cruel, eu vim de você –  Foi sarcástica

 

— Mas será que não pode compreender que só fiz isso por você, pro seu bem? – Vitória tentou se aproximar, ignorando a alfinetada – Pra que lhe dessem o carinho, o amor que eu não podia oferecer? Ao meu lado você só conheceria a fome e a miséria..  Eu te procurei tanto, filha!.–

 

— Não, eu não sei onde quer chegar, não sei – Emília lutava contra aquela parte sua que queria ceder, que queria conhecer mais daquela senhora que sentiu um enorme carinho desde o primeiro dia que a conheceu. Mas ela não podia, não queria. Talvez inconscientemente, achava não podia dispor daquela pequena alegria – Mas não vai me comover. Eu não vou acreditar em nada, nada do que me disser. Acha que vou acreditar que foi me procurar? Não vou – Ela voltou a se afastar, Sentando-se na cama. As lágrimas não só pela situação, mas pela dor de lutar contra o que se mais quer.

 

— Precisa acreditar! Quando eu voltei aquela casa, anos depois, recebi a noticia de que seus pais tinham se mudado, disseram até que foram pra Europa. Eu procurei pelos antigos donos da casa, mas já eram mortos, e o novo proprietário não tinha informações sobre nada daquela época… Eu fiquei desolada, senti remorso – Sem desistir, Vitória  voltou a se aproximar, se sentando ao lado de Emília – Eu te adorava, desejava tanto ter você no meu lado, poder pedir perdão, suplicar que gostasse de mim –

 

— Não imagina quantas noites eu sonhei que minha mãe ia aparecer algum dia, ia me pegar em seus braços, me pedir perdão e me levaria embora. E eu não ia precisar mais conviver com a esposa do meu pai. Ele era um bom homem, mas viajava tanto…. Me deixava sozinha e era cego para as atitudes da mulher dele – O choro rompeu mais alto, talvez comovida pelas lembranças ruins –

 

— Eu não sabia como você era, Emília. Mas imaginava você em meus sonhos. Te abraçava, te chamava de filha.  Era só o que faltava para eu poder viver em paz, pra conseguir a felicidade –

 

— Felicidade? - Perguntou sarcastica - Não, esse é o sentimento que sempre me foi negado pela senhora – Responde, logo em seguida, no mesmo tom.

 

— Não, minha filha. Deus sabe que desde o dia que te conheci, não desejei outra coisa além de que fosse feliz. Por isso estive tão presente, por isso quis impedir que abortasse o seu filho, o meu neto, o nosso menino  –

 

— E acreditou que confessando que era minha mãe ia conseguir? Não, senhora, não adianta.  Eu não posso aceitar sua pena   –

 

— Está enganada, Emília, não é pena. É amor  –

 

— Amor? Como pode falar de amor agora, senhora? Agora que estou prestes a perder o pouco que me resta? – As lágrimas rolaram pela maçãs que estava rosadas. Altiva, Emília secou o rosto com as próprias mãos, e cravou os olhos sobre a mulher ao seu lado – Quando eu mais precisei do seu eu não tive, agora é tarde demais

 

— Minha filha, minha filha .. –  Em lágrimas, Vitória suplicou, tentando tocá-la

 

— Não me toque! – Vociferou  – O que a Senhora quer? Me convencer de que me ama e que sempre me quis? Não, senhora!. Eu não sou sua filha e nem quero ser. Eu perdi meu bebê quando fiz a pior escolha da minha vida. Você me perdeu quando me  ABANDONOU NA CHUVA. VIVA COM ISSO –



Emília saiu do próprio quarto. Desceu a escadaria correndo alheia aos gritos de Vitória que implorava pelo seu perdão, implorava para que ela voltasse. Então a Sartorini entrou no carro, ligou o motor e passou a dirigir sem rumo.


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