À Espada Pelo Sangue escrita por LahChase


Capítulo 4
Capítulo 4 - Daqui Para Frente


Notas iniciais do capítulo

Heeey
Oi gente, primeiro quero agradecer todos os coments fofos e lindos que vocês deixaram. Eles têm me motivado muito. ^^
Então... aqui está o quarto capítulo, vindo aí talvez para relaxar um pouquinho as coisas. Ou não hahah
Espero que gostem e até o final ^^



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Escuridão. Eu sentia que estava entre a consciência e a tentadora escuridão. Tão confortável. Tão mais simples do que encarar o mundo real. Tão mais atraente... Eu podia simplesmente deixar de lutar e me entregar. Seria fácil viver assim. Ou talvez eu nem precisasse viver. Acabaria a dor, a confusão, a luta. Sim, seria mais fácil... Comecei a me entregar, deixando-me abraçar pela comodidade daquele estado.

“Sentiu frio? ” a voz de Laura ecoou em minha mente.

Alguma coisa dentro de mim despertou de repente. Não. Eu não devia ceder. Havia algo ali, espreitando nessa escuridão. Eu sabia que estava ali, aguardando que eu me deixasse levar, para que nunca mais acordasse. Contrariando meu desejo, voltei-me para a consciência.

Acordei com frio, sem lembrar muito bem porque estava ali. Tentei me levantar, apoiando meu corpo nos braços, mas senti uma dor imensa em meu ombro e desisti. Então as lembranças me invadiram como um turbilhão: a viagem, o ferimento, os deuses, o Sr D. Ao lembra seu nome, o ódio aquela pessoa insensível me atingiu. Quíron havia dito algo sobre minha mãe e minha família quererem vingança, mas isso não fazia muito sentido, e muito menos me fazia sentir melhor. De repente percebi que chorava sem motivo. Imediatamente senti raiva de mim mesma e sequei as lágrimas. O que estava acontecendo?

A porta se abriu e Michael entrou.

— Michael? – eu chamei com a voz rouca.

Ele me olhou como se tivesse pena de mim. Senti um incômodo. Detestava que as pessoas pensassem que sou fraca, mas aquela parecia ser a verdade naquela situação.

— Oi May. Que bom que acordou. Já estava com medo de que não resistisse. – um pequeno sorriso brotou em seu rosto. Ele se sentou na cama. – Mas você é uma garota forte, como já disse.

— É, não parece o caso. – eu disse, fazendo esforço para manter controle sobre minha voz chorosa. Parecia que minhas emoções estavam à flor da pele – Eu não sei o que ele fez comigo, mas... Não sei explicar, ele simplesmente quebrou a corrente...

— Corrente? – ele repetiu, estendendo a mão e me ajudando a sentar – Você esteve resmungando sobre isso por um tempo. Sabe o que quer dizer?

Eu apertei o punho.

— Não, não faço ideia. – falei, como sempre odiando admiti-lo.

— Tudo bem. Não se preocupe com isso – Michael disse – Você vai ficar bem. Apenas descanse, O.K.? Eu trouxe um pouco de Néctar.

— Você não tem ideia do ódio que sinto desse cara por me deixar assim. Não acredito que ele possa ser tão frio. – dessa vez, nem mesmo a bebida maravilhosa foi capaz de afastar meus pensamentos irritados.

—Eu sei. Ele é um traste. Você nunca sabe o que ele vai fazer, não é uma boa pessoa. Ou deus. Mas você realmente não precisa pensar nisso agora. Descanse.

Eu deitei novamente, resignada. Não parecia que eu seria capaz de fazer qualquer outra coisa naquele estado, de qualquer jeito. Não queria sair e correr o risco que desmoronar na frente de alguém novamente. Satisfeito por ver-me obedecer, ele fez menção de se levantar. Fechei os olhos, mas no momento que o fiz, uma imagem surgiu em minha mente: uma correte rachada. Meu peito acelerou e eu abri os olhos de repente.

Antes que pudesse pensar sobre isso, agarrei o braço de Michael.

Ele se virou.

— O que foi? – perguntou – Precisa de mais alguma coisa?

Senti meu rosto esquentar.

— Não. – respondi, mas não o soltei. Por algum motivo, não conseguia fazê-lo.

Ele deu um sorriso gentil.

— Entendo.

Ele sentou na beira da cama novamente, e segurou minha mão, em silêncio. Seu toque era quente, reconfortante. “Talvez,” pensei, “seja por que ele é filho de Apolo? Talvez ele seja tão bom em acalmar as pessoas por que seu pai é o deus dos médicos”.  

— Michael. – chamei.

— Hm?

— Fala pra mim sobre esse lugar. – pedi – Sobre os deuses, sobre seus filhos. Eu... Não quero ficar tão assustada sobre isso.

Durante os trinta minutos que se seguiram, fui capaz de esquecer o que havia acontecido com o Sr D. A voz de Michael era suave, e mesmo seu olhar parecia ser aquecedor, mandando para longe o frio que estava sentindo. Ele me falou sobre verões quentes, com atividades divertidas e uma convivência alegre entre os semideuses do Acampamento. Falou sobre deuses distantes, que, apesar disso, se preocupavam com seus filhos, e haviam fundado aquele lugar, onde todos podiam estar seguros. Falou sobre os chalés, as refeições, os jogos e os estudos.

O jeito como ele narrava fazia tudo parecer muito diferente do que eu havia presenciado até o momento, mas eu não fui capaz de duvidar do que ele falava. Não havia mentira em sua expressão corporal, mas eu não precisava lê-lo para saber disso. Ele parecia realmente em paz ali e isso me acalmou. Explicou que eu provavelmente também teria que passar o verão no Acampamento, mas aquilo não me fez ter medo. Eu pensei que se pudesse ter Shayla, Kyle e ele por perto, talvez não seria tão ruim.

Depois de um tempo, meus olhos começaram a pesar, e ele sugeriu que eu voltasse a dormir. Mas eu não queria fechar os olhos. “Se eu o fizer” pensei “verei aquelas coisas novamente”.

— Não quero dormir. – Falei.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Não é o que sua cara de sono está dizendo.

Eu sentei.

— Há quanto tempo estou aqui? – quis saber.

— Quatro horas.

— Tudo isso? Eu já descansei de mais. Quero me levantar.

— Você não pode. Tem que ficar aí, quieta.

— Por favor, Michael. Eu preciso ver... Onde está Shayla?

Michael hesitou.

— Ela... ela está lá fora, esperando você acordar. Está aflita desde quando tudo aconteceu.

— Shayla está lá fora? – perguntei ansiosa – Quero vê-la. Leve-me até ela.

— Mas você não pode! Está fraca...

— Eu pareço fraca. Sou capaz de te derrubar e ainda sair andando. – ameacei.

 - Ah! Você é impossível. Tudo bem. Mas me prometa que não vai fazer nenhum esforço. 

— Certo. Eu prometo.

Michael me ajudou a levantar e eu caminhei para fora. Apesar de trêmulas, minhas pernas pareciam bem. Meu corpo inteiro parecia bem, na verdade, talvez apenas um pouco cansado. “O verdadeiro problema, no entanto...” Pensei sombriamente.

Shayla estava sentada no chão, ela cobria o rosto com as mãos e soluçava. Estava cercada por dois campistas que tentavam consolá-la. Eram a menina e o menino que haviam me ajudado quando fui ferida mais cedo.

— Shay. – chamei, mais alto do que pretendia.

Ela levantou a cabeça e quando me viu seu rosto se iluminou e seus olhos brilharam. Shay sempre foi sensível, e fazê-la chorar era algo que me deixava apavorada. Mas vê-la naquele momento me fez sentir como se pudesse abandonar todos os meus medos. Fora ela que me ajudara durante todo o ano letivo a aprender a me controlar, a entender as emoções, a manter a calma. Eu não precisava temer. Ela estava ali. Shay me ajudaria.

— May!

Ela se levantou, correu e me abraçou com delicadeza.

— May, você está bem?

Observei seus olhos. Estavam vermelhos. Em conjunto com o rosto manchado por lágrimas, formavam a prova cristalina de que estivera chorando, o que qualquer um poderia perceber. Mas eu a conhecia bem, e sabia que, mais do que preocupada, ela estava apavorada de perder alguém novamente. Sua mãe havia sido assassinada na frende dela quando tinha seis anos. Desde então, ela foi separada da irmã, dos amigos e levada de seu país. A lista de perdas que Shayla já havia experimentado não era algo a que eu queria ser acrescentada. Mas para ela, perder a mim ou a Kyle era algo que jamais seria capaz de suportar.

“Isso mesmo” pensei “somos a tábua de salvação uma da outra”. Era meu dever cuidar dela. E, pelo que observava naquele momento, o que ela precisava não era a verdade, mas que eu acabasse com aquele medo em seu coração.

— Estou sim. – menti – Mas e você?

Ela limpou uma lágrima.

— Eu estou melhor. Digo, agora que você está bem.

— Não precisava se preocupar tanto. Não é qualquer coisa que vai acabar comigo, não é? – Falei, sorrindo e dando um tapinha em sua testa.

— Mas... Michael disse que talvez você não sobrevivesse.

Olhei para Michael.

— As suas chances não eram as melhores. – ele se desculpou - Foi mal. Mas não queria lhe dar... hum... falsas esperanças.

— Tudo bem. – eu disse – Não precisa se desculpar. Além do mais, você cuidou de mim. Devo a você minha vida, não posso ficar com raiva. Ainda.

Michael ergueu uma sobrancelha e depois sorriu.

— O.K. então...

Um sinal soou.

— Hora do jantar. – disse a garota, que outrora estivara consolando Shayla, e agora estava em pé ao lado do outro garoto, de mãos dadas. A menção da palavra “jantar” me fez definitivamente ficar melhor – Em dez minutos temos que estar lá.

— Nos conhecemos? – perguntei.

— Desculpe-me pela falta de educação – disse Michael – Essa é Annabeth Chase, filha de Atena. Este aqui é Percy Jackson, filho de Poseidon. 

De repente uma lembrança me ocorreu. Uma lembrança que parecia ter sido enterrada há muito tempo.

— Jackson? – perguntei.

— Sim. – Disse o garoto.

— É você... – eu disse franzindo a testa – Sim, é você. Percy Jackson. Cara, quem diria? Eu pensei que tivesse morrido ou sei lá.

— Você a conhece? – Perguntou Annabeth.

— Eu não. – disse Percy um tanto confuso.

— É claro que você não se lembra de mim. – eu disse – E não deve nem me conhecer, mas eu conheço você. Foi você que matou aquele monstro no Museu.  

— Como sabe disso? – Perguntou Percy, desconfiado.

— Eu estava no museu com meu pai naquele dia. Ele trabalhava lá – dei de ombros – Eu estava me escondendo dos guardas. Acho que havia aprontado alguma coisa. Vi quando você a matou, só não entendi nada. Aquilo era estranho. Foi o primeiro monstro que eu vi, então fiquei meio confusa. Eu era pequena, tinha descoberto que tinha TDAH fazia pouco tempo e não sabia das suas implicações. Achei que estivesse tendo uma alucinação, mas agora sei que deve ter sido verdade. Alguns meses depois você apareceu na TV. Eles disseram que você era um tipo de assassino, sei lá.

— Cara, isso é loucura. – disse Percy – Eu passei o restante daquele bimestre me considerando maluco. Por que não falou comigo?

— Bom, vejamos. – Comecei – Eu, uma garota que havia acabado de descobrir que tinha TDAH, havia aprontado alguma coisa e estava me escondendo com medo de estar enrascada quando vi um outro menino acabar com um monstro numa sala vazia de museu, usando uma caneta que virava espada. E, claro, que eu fora a única a testemunhar a cena. Pra mim, isso soa como uma desculpa esfarrapada para desviar a atenção da besteira que eu tinha feito. – dei de ombros novamente – Eu não falei sobre aquilo nem com você nem com ninguém. Não precisava do item “maluca alucinada” adicionado à minha lista de diagnósticos estranhos.

— Lógico que não. – disse Annabeth, como se eu tivesse dito a fala do dia – Ela é de Atena, com certeza. Gostei dessa garota.

— E eu deveria considerar isso um elogio?

— Deveria sim. – disse Percy, enquanto ria - Eu demorei quase dois anos para fazer ela gostar de mim.

— Fique quieto, Cabeça-de-Alga! – Annabeth protestou – Em apenas um mês você conseguiu!

— Não tenho tanta certeza disso. – Percy falou.

— Ah! Pois tenha. Porque eu fui contra minha mãe por você!

— Não estou certo de que isso foi por mim ou por você...

— Ah, é?

Percy e Annabeth ficaram discutindo, enquanto eu, Shayla e Michael observávamos extasiados.

— Isso é normal? – perguntei a Michael – Eles ficam brigando muito ou devo me sentir culpada?

— Que nada. – ele respondeu – Isso é normal, mas você precisava ver como eram antes de serem namorados. 

— Ah... – Shayla disse – Isso é realmente estranho.

— Vamos – disse Michael – Temos que ir jantar.

— E eles? – perguntei – Vamos deixá-los aí?

— Não. Por que não grita para eles pararem?

— O que? Por quê?

— Porque Annabeth gosta de você e sabe que está machucada, então não vai te bater.

— Ahn... O.K. então. O que eu digo?

— Apenas mande eles pararem.

— EI! – gritei – VOCÊS DOIS! JÁ CHEGA!

Annabeth me olhou com incredulidade.

— Nós temos que ir jantar – Eu disse meio tímida.

— Claro! Desculpe. – disse Percy sorrindo.

Nós seguimos para o refeitório.

— Onde estão Drake e Kyle? – perguntei discretamente a Shay.

— Saíram há umas duas horas. Não disseram onde iam, só falaram pra te desejar boa sorte.

— May e Shayla. – Disse Michael - Quíron quer que vocês comam na mesa dele hoje. Eu vou para a minha mesa. A gente se vê depois.

— Tchau, Yew. – Disse Shayla.

— Tchau.

Ele saiu e Annabeth nos levou até a mesa de Quíron, que quando me viu deu um suspiro de alívio.

— Ah! Ainda bem que sobreviveu.

— É, ainda bem. Mas não foi graças a ele. – Apontei com a cabeça para o senhor D, sentado do outro lado da mesa de madeira olhando para seu prato e totalmente distraído com suas panquecas. Precisei de toda a minha força de vontade para não voar nele, que murmurava algo sobre planos e crianças perdidas.

— Sei disso, querida. - disse Quíron – As coisas saíram um pouco de controle. Ele sempre detestou que duvidassem de sua divindade, mas ultimamente ele está ainda mais mal-humorado que o normal. Mas ele terá sua punição, acredite.

— Você já relatou ao... você sabe... Olimpo ou seja lá o que?

— Sim, apesar de ter sido difícil. De qualquer jeito, Zeus não gostou nada da notícia. Infelizmente o castigo que ele deu ao Sr. D será ruim tanto para ele quanto para nós.

— Como assim?

— Ser diretor do Acampamento é um castigo que o Sr. D recebeu por causa de uma desobediência há alguns anos. Mas o senhor Zeus não percebe que não é ruim apenas para ele. Ele decretou que o Sr D passaria mais 50 anos aqui.

— O que?! Zeus é o que? Um desmiolado? - gritei, perdendo o controle e atraindo para mim todos os olhares. Um trovão ribombou.

Quando percebi que todos os olhos estavam sobre mim e todas as bocas estavam escancaradas, afundei na cadeira.

— Hum... – disse Annabeth, de uma das mesas, que supus ser a de Atena - May, acho melhor você não se referir ao senhor Zeus dessa maneira. Ele pode não gostar muito disso.

Calei-me enquanto todo o pavilhão se virava para falar sobre meu comentário imprudente com seus amigos.

— Eu quero ir para casa. – sussurrei, já com lágrimas nos olhos e as mãos no rosto – Eu quero ver meu pai, meus irmãos, minha madrasta e fingir que nada disso aconteceu. Quero ter uma vida normal, onde deuses psicóticos não atacam pessoas inocentes sem motivo a não ser por ódio, e onde monstros são apenas histórias para assustar as crianças.

Quíron deu um suspiro triste. Shayla me abraçou.

 O que eu estava fazendo? Eu jamais fora de andar chorando por qualquer coisa. Mesmo com um controle emocional questionável, eu sempre fui daquelas garotas de ferro, cuja vida lhe ensinou que ainda que nada possa piorar ela deveria manter-se firme. Às vezes eu era até firme demais. Mas como manter-se dessa forma quando alguém invade sua cabeça e lhe suga as forças? Quando você descobre que seres imortais podem simplesmente te desintegrar se você der um passo em falso?

— May – disse Quíron –, não pense assim. Claro que sua vida não será normal, mas depois de um tempo você se acostuma. E talvez você até possa ter uma vida no mundo mortal. 

Eu empurrei meu prato.

— Perdi a fome.

Levantei-me e saí do pavilhão. Eu não queria ficar ouvindo-o tentar me consolar. Na verdade, eu não queria ser consolada, por algum motivo. Dirigi-me à praia, que percebi ser perto. Chegando lá, sentei-me perto de onde as ondas morriam.

Sentia o vento levando meus cabelos, e o cheiro do mar me confortava, trazia boas lembranças. Senti algumas lágrimas molharem minhas bochechas. Meus pensamentos acabavam sempre voltando às últimas horas. Monstros, deuses, meio-sangues. Era demais para um só dia. Senti que precisava das palavras sábias do meu pai, agora mais do que nunca.

Fiquei em silencio durante um bom tempo, até que ouvi passos. Virei-me para ver quem se aproximava e percebi quem era.

— Ah, oi, Annabeth. – Eu disse sem ânimo, depois voltei a olhar para o mar.

Ela se sentou ao meu lado e olhou para mim. 

— Você está bem? - perguntou.

— Sinceramente? Não. – eu disse simplesmente.

— Você quer falar sobre isso?

— Você quer saber por que eu estou assim? – perguntei sem olhá-la. – Então tá. Sabe, eu não sou assim. Digo, isso de sair chorando ou explodir do nada. Pelo menos não era, até o Sr. D fazer o que fez.

— O que ele fez?- ela perguntou.

— Quíron não contou?

— Não.

Alisei de leve meu ombro enfaixado.

— O Sr. D deixou minha mente uma bagunça... Parece que ele me quebrou por dentro. É como se eu fosse uma arma com um gatilho sensível, que a qualquer toque dispara. E eu nem sei no que isso implica! – Balancei a cabeça – Ele olhou para mim e os olhos dele brilharam em um tom púrpura intenso. Quando ele fez isso eu senti minha força sendo sugada e minha energia se esvaindo do meu corpo. Não podia me mexer. Foi quando Quíron percebeu o que ele estava fazendo e ordenou que parasse. Quando ele me soltou, eu desmoronei. Mas a imagem de seus olhos horríveis vai permanecer para sempre em minha mente. – Soquei o chão – Desgraçado. Se ele não fosse um deus, acabaria com a raça dele por isso!

Senti meu ombro latejar numa dor enorme e fui obrigada a relaxar o braço.

— Eu não aguento isso. – Murmurei para mim mesma, apoiando a cabeça nos joelhos.

— Não acredito que Dionísio tenha sido capaz de fazer uma coisa dessas! – Annabeth parecia revoltada – Zeus deveria puni-lo!

— E puniu. – eu disse indiferente - Mas a cabeça dele deve ser muito cheia de outras coisas, porque parece não ter espaço para a inteligência. A melhor punição que Zeus pôde pensar foi mais 50 anos aqui.

— O que?! – Annabeth exclamou – Mas isso é loucura! Como vamos sobreviver?

— Agora você entende por que eu chamei Zeus de desmiolado.

— É. Você tem razão. Atena não deve estar sabendo dessa decisão. Ela teria tomado providência.  

Fiquei em silêncio. Annabeth colocou a mão em meu ombro.

— Sinto muito pelo que aconteceu.

— Você já passou por algo parecido? – perguntei.

— Não, mas...

— Então não sente. – respondi, depois percebi o quanto havia sido rude – Desculpe...

Fiquei com raiva de mim mesma. Era assim que seria agora? Iria simplesmente falar tudo o que desse na telha, chorar por besteira e perder o controle que havia trabalhado duro para conseguir? “Precisa se controlar” repreendi-me “Precisa”.

Annabeth se calou. Ela ficou olhando para o mar como se estivesse relembrando algo que aconteceu há muito tempo. Seus dedos esfregavam o colar de contas em seu pescoço. Suspirou. 

— O que está pensando? – perguntei.

— Nada. – ela disse e depois começou a se levantar. – Nós temos que ir. É a hora da Fogueira, talvez você seja reclamada lá.

Eu me levantei devagar e Annabeth me deu o braço como se fossemos velhas amigas. Nós andamos em silêncio até um lugar onde havia uma fogueira enorme e vários campistas cantavam em grego antigo.

Aquilo me deixou maravilhada. Eu adorava fazer fogueiras e cantar de noite. Para minha família isso era uma tradição no Natal. Sentávamos ao redor da lareira e contávamos histórias, cantávamos e ríamos muito.

Annabeth me conduziu ao banco mais baixo da arquibancada e nós nos sentamos.

A cantoria foi suave o tempo todo, fazendo com que eu relaxasse. O momento carregou para longe minhas preocupações e eu me senti mais leve. Quando tudo acabou, Quíron, em sua cadeira de rodas, chamou a atenção de todos e disse:

— Atenção, campistas. Hoje, duas novas semideusas foram trazidas para cá. Levantem-se Mayara Jacobs e Shayla Milan.

Levantei-me e todos me olharam com animação.

 - O que é? - segui seu olhar e vi o que todos viam.

Acima de minha cabeça, havia um símbolo flutuando: Uma coruja.

— Ave Mayara Jacobs, filha de Atena!- Quíron anunciou e os campistas seguiram o coro.

Annabeth se levantou e me abraçou dizendo:

— Mais uma irmã! Eu sabia que você era uma de nós!

Ela me convidou a sentar-me novamente, ao que obedeci ainda meio confusa.

— O que isso quer dizer? - Sussurrei para Annabeth.

— Quer dizer que sua mãe é Atena, a deusa da sabedoria e...

— Eu sei quem ela é. – Eu interrompi - Só quero saber o que quer dizer.

— Quer dizer que é minha irmã e que vai ficar com a gente no chalé de Atena. Você vai amar. Ele é incrível.

— Tem lugar para tocar música, como Michael disse que tem no dele?

— Não exatamente. – ela franziu a testa – Acho que só o chalé de Apolo tem isso.

— Tem livros?

— Uma imensidão deles.

— Então está de bom tamanho.

Voltamos a atenção para o que Quíron estava dizendo, mas ele já estava dispensando os campistas e ordenando que todos fossem para seus chalés. Annabeth se levantou e pediu que a seguisse. Ela me levou até um lindo chalé prateado com o símbolo de coruja na entrada.

— É esse. – Annabeth disse – Sua nova casa.

— Ele é lindo! - Exclamei maravilhada, sem dar atenção à última frase.

— Eu sei. – Disse ela me puxando para dentro.

O lugar não se parecia com um chalé comum. Haviam beliches espalhadas com escrivaninhas e guarda-roupas aos lados de cada uma. No lado esquerdo, havia umas estantes cheias de livros, mais adiante havia um arsenal de armas e um mapa do acampamento. O chalé parecia bem maior por dentro que por fora e aquilo não era a única coisa fora do comum: havia uma estátua de uns dois metros de altura ao lado do arsenal.

— Atena? – perguntei apontando para a estátua.

— É. Gostou? – Annabeth perguntou.

— Claro! Isso aqui é incrível!

— E você não viu nem metade. 

Annabeth me levou até o outro lado do quarto. Passou a mão na parede e um teclado digital apareceu, ela digitou uns números e uma porta apareceu do nada.

— Uau! – eu disse.

— É. – concordou – Pode nos levar a vários lugares. Qualquer lugar que você conheça e se lembre bem ele te leva. Eu mesma projetei. Usei a tecnologia de Dédalo.

— Dédalo?

— É uma longa história.

— E como fez isso?

— É um pouco complicado. Tive uma ajudinha de Atena, dos garotos de Hefesto e de Hécate. O único problema dessa coisa é que ela não te traz de volta. Mas creio que logo vou dar um jeito nisso.

— Annabeth, você é um gênio!

— Obrigada. Bem, você terá acesso ao transportador se jurar que jamais contará a senha para ninguém sem autorização.

— Tudo bem, eu juro.

— Jure pelo Estige.

— Pelo...? Ah, é claro. Eu juro pelo Estige que jamais vou revelar esta senha a alguém sem autorização. – um trovão ribombou e eu quase dei um pulo.

Annabeth sorriu e me disse a senha (que não vou contar a você, ou o Estige vem bater na minha porta).

— Ainda tem mais. – Ela disse – Se você digitar a outra senha poderá ter acesso aos nossos andares inferiores, que são maravilhosos também.

— Wow!- exclamei - Isso é simplesmente bom de mais para ser verdade.

— Eu sei. – Annabeth disse. – Se não fosse tão tarde, você poderia ir lá agora mesmo. Mas já é a hora de dormir e essa é uma regra que não podemos violar, a não ser que queira morrer.

— Não. – eu respondi – Chega de tentar morrer por hoje. Prefiro dormir.

Annabeth riu.

— Venha, esta será sua cama.

Ela me mostrou uma Beliche desocupada ao lado da sua. A cama tinha corujas entalhadas por toda a cabeceira, o guarda-roupa estava cheio de camisas do Acampamento e também algumas outras roupas e sapatos que eu gostava.

— Como sabem que roupas colocar para mim?

— Seu pai. Ele enviou algumas coisas depois que o informamos que estava aqui.

— Meu pai? Ele sabe de tudo? Vocês avisaram a ele que eu estava, tipo, muito mal?

— Ele com certeza já sabia que você era uma semideusa. E sobre contarmos do incidente com o Sr D... Nós dissemos que estava bem para não deixá-lo preocupado com você. Uma hora depois uma caixa do correio de Hermes estava aqui com várias roupas e coisas suas. Também havia um bilhete dizendo que você é filha de Atena, então resolvi trazer suas coisas para cá. Claro, tive que esperar você ser reclamada para te dizer isso.

Assenti devagar enquanto imaginava como meu pai estaria agora.

— É melhor você dormir. – Annabeth disse – Hoje foi um dia difícil e amanhã vou te mostrar o Acampamento e as nossas atividades. Mas agora descanse.

— Certo. – concordei. Embora não tivesse certeza de que seria capaz de dormir, estava com a mente e o corpo cansados. 

Annabeth me mostrou onde era o banheiro e eu tomei um bom banho. Minha preocupação com relação a ser capaz de pegar no sono se mostrou desnecessária. Assim que deitei a cabeça no travesseiro, adormeci, pensando em como seriam as coisas daqui para frente.

 


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Notas finais do capítulo

Hey, eu de novo ^^
E então, gostaram? Há algo que vocês acham que preciso melhorar? Viram algum erro? Deixa aí nos coments a sua opinião ^^
Enfim, sobre a imagem da May: essa seria mais ou menos como eu a imagino neste ponto da história. Algumas alterações podem vir por aí, então eu provavelmente postarei outra em algum outro capítulo.
Anyway, posto o quinto capítulo na Sexta, e queria saber: Quem vocês querem na imagem agora? Shay, Kyle ou Michael?
Espero fazer sempre o meu melhor para vocês ^^
Vou ficando por aqui
Bjs :)