Os Avaradores escrita por Yennefer de V


Capítulo 7
Os Sereianos




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“- Não – respondeu Rony sem hesitar. – Ouvir vozes que ninguém mais ouve não é bom sinal, mesmo no mundo da magia.”

HP e a CS – p. 127

 

Havia uma casa que se erguia verticalmente contra o céu e tinha um cilindro negro com uma lua fantasmagórica por trás no topo de um morro.

Embora todo o jardim da casa fosse estranho e qualquer pessoa que estivesse lá se demoraria em estudar, muito curioso, todas as suas peculiaridades, o casal de mulheres estava lá dentro, bem como a filha adolescente chamada Utau.

Lá embaixo havia um rio que corria devagar por baixo de uma ponte velha.

Molly estava fazendo o almoço (elas receberiam muita gente) enquanto Joe ajudava a filha com os megafones. Era a última chance de a banda ensaiar antes de retornar à Hogwarts.

Molly era uma mulher de princípios inquebráveis, cujas regras eram mais importantes que os próprios instintos. Era uma mulher de olhos castanhos, cheia de sardas e longos cabelos que pareciam ferrugem. Joe, por outro lado, era prática e racional. Tinha os olhos muito brilhantes e acinzentados (lembrava vagamente uma criança), possuía longos cabelos loiros que escureciam nas pontas e uma boca cheia.

Utau era uma jovem esguia, alta e de rosto pálido. Ela não ficava bronzeada não importa quanto tempo passasse no sol. Tinha olhos estreitos e acinzentados e os cabelos eram lisos e ruivos gastos, como se a cor estivesse deixando seus fios, compridos até ultrapassar os ombros.

Lá fora, ao lado da casa esquisita e torta (ela pendia um pouco para a esquerda com os três patamares), Joe e Molly criaram uma espécie de barracão sem porta. O chão era de terra. Joe estava colocando os dois megafones de ouro (como os de Prince) no alto. No meio do barracão havia um pedestal e um microfone mais fino que o normal. Lá atrás ficava um espaço aberto que aguardava os outros instrumentos.

Utau olhou para cima. Os megafones estavam girando em suas cabeças sem suporte algum. Ela sorriu. Estava com saudades daquilo.

— Se o seu namorado resolver quebrar tudo de novo, eu não vou consertar. – resmungou Joe, girando para olhar tudo também.

As duas ficaram apreciando a organização. Havia uma lona enorme acima dos megafones, presa em quatro estacas de madeira.

— Eu acho que não vamos nos empolgar tanto. – Utau torceu o nariz. – Só vamos repassar as músicas com o Lohan.

As duas foram entrando para a casa pela porta lateral, que dava para a cozinha. Molly, em geral, não gostava de cozinhar. Mas fazia tanto tempo que os amigos da filha não se reuniam e ela parecia tão melhor do que passou o verão todo que nem fez cara feia.

— Você está muito adiantada, mamãe. – avisou Utau. – Em geral nós só almoçamos depois de uma hora de ensaio.

Molly se engasgou.

— Podem almoçar antes de tocar hoje, não é? – interpôs Joe. – Afinal, vocês decidiram isso de última hora.

Utau fez um gesto obsceno por trás das costas, para que nenhuma percebesse, antes de responder:

— E temos outra escolha?

Joe e Molly trocaram um olhar de “quem criou foi você”.

Craque.

As três ouviram barulho de alguém aparatando lá fora. Utau correu para a ponta do morro depois do portão do jardim.

Ela deu um sorriso enorme ao ver o namorado chegando com o instrumento menor do que o normal, dentro de uma caixa. Geralmente ele diminuía a bateria e os megafones para facilitar a locomoção.

Eles não falaram palavra alguma. Abraçaram-se em um beijo apaixonado e cheio de saudades quando ele largou a caixa no chão com um estardalhaço. Dois meses sem se verem por causa de seus recentes problemas. E Prince nem sabia a gravidade de todos eles.

— Minha sereiana. – Prince resmungou entre o beijo. Utau não queria largá-lo.

— Eu senti sua falta. – ela choramingou.

— E eu estava beijando garotas trouxas por aí de tanta saudade. – Prince brincou.

Utau começou a socar cada parte do corpo dele que conseguiu alcançar de brincadeira.

— Sereiana, você está O.K? – perguntou Prince, se abaixando para pegar os pedaços da bateria guardados. – Eu fiquei realmente preocupado. – Prince mudou o tom de voz. Estava mais sério.

Utau mudou de assunto.

— Eu só passei por uma péssima fase. Mas eu tenho uma música nova!

Prince sorriu.

— Sabia que você tinha um bom motivo para me evitar.

Os dois entraram tagarelando sobre a nova música. Prince a puxou pelo braço antes de encontrarem a porta da sala.

— Sereiana?

Utau se virou, esperando outro beijo. Caiu em seus braços.

— Nós vamos conversar sobre isso. Não aceito informações evasivas. Me preocupo com você.

Utau encontrou seu olhar e percebeu que não tinha escapatória. Nunca deixara de ver o namorado nas férias. Mordeu o lábio inferior e Prince encontrou sua boca. Depois entrou na casa. Não deu tempo de Utau argumentar nada.

— Oi, Joe. Oi, Molly. – Prince cumprimentou na cozinha, enquanto Utau levava sua caixa até o barracão improvisado.

Joe e Molly deram um aceno para o garoto e disseram em uníssono:

— Bom dia, Prince.

— Vocês vão ter que almoçar antes do ensaio. Eu fiz o almoço muito cedo. – anunciou Molly, um pouco escarlate.

— Tomei café da manhã... – começou a dizer Prince, mas levou um cutucão de Joe. – Quero dizer, claro. Será como almoçar em Hogwarts.

Joe ainda o fitava severamente. Prince completou:

— E eu prefiro mais almoçar cedo.

Molly pareceu satisfeita. Joe sorriu lá de seu canto.

Lohan entrou, segurando o antigo baixo de Max. Ele o substituíra como baixista recentemente.

— Bom dia, tia – ele olhou para Johanna. – e Sra. Scamander. – deu um aceno para Molly.

Depois cumprimentou Prince com um toque de mão.

— Onde está Utau?

Prince, largado em uma cadeira, bocejando, apontou para a porta que levava ao barracão. Lohan não se demorou na cozinha.

— Utau? – Lohan chamou a prima.

Utau fez um aceno para que ele esperasse. O bumbo, o surdo, os tons, o chimbal e o prato de ataque da bateria já estavam dispostos ao chão. Ela apontou com a varinha para a caixa da bateria e ordenou:

Finite.

A caixa voltou ao tamanho normal. Logo em seguida apontou para todas as peças:

Erecto!

Aos poucos a bateria se montou sozinha à sua frente, na parte de trás do ambiente. Os megafones giravam na parte de trás, no alto. Utau bocejou. Pegou as baquetas na mão e olhou para o primo. Trocaram um olhar de plena cumplicidade antes de darem um abraço apertado.

— Você tá O.K? – perguntou Lohan ao ouvido de Utau.

— Eu vou ficar. – prometeu ela.

Quando se separaram, Lohan colocou a guitarra em um canto e olhou de novo para ela. Estava normal. Não parecia doente ou triste como mostravam as cartas.

— Me explique melhor tudo aquilo, Utau. – pediu Lohan aos sussurros, olhando para a porta da cozinha.

Utau olhou automaticamente para a porta da cozinha também.

— Vamos descer um pouco.

Os dois tomaram a pequena trilha que levava ao rio. Chegaram à ponte. Utau tirou os sapatos e deixou os pés balançarem na ponte, mas era tão alta que os dedos chegavam à água. Lohan sentou ao seu lado com as pernas dobradas e abraçou os joelhos. Ainda olhava intrigado para a prima.

— Eu não contei. – disse Utau olhando para a casa. – Mas acho que a mãe Joe desconfia. Não dá para esconder nada dela.

— E você não pode pedir ajuda? – perguntou Lohan, horrorizado que ela estivesse escondendo algo tão perturbador só para ela.

— E dizer o quê? – exasperou- se Utau. – “Mãe, estou ouvindo gritos em minha cabeça. Não consigo dormir, às vezes. Gritos agourentos que me fazem quase enlouquecer, e adivinhe só! Eles param do nada!”.

Lohan olhou irritado para ela.

— E você vai deixar simplesmente continuar?

— Tô pensando em falar com algum professor de Hogwarts. Eles entendem dessas porcarias das trevas, não é? Talvez Beren? A Srtª Abby?

— Como é que você sabe que são das trevas? – os olhos de Lohan estavam quase semicerrados.

— São gritos dentro da minha cabeça! Você já leu algo parecido? Já ouviu falar?

Lohan baixou a cabeça. Não, nunca ouvira falar em tal fenômeno estranho e perturbador. Ela parecia a mesma. A Utau divertida e cheia de vida. Como de repente estava se revirando em gritos que não eram dela em sua própria mente?

— Eu quero ficar com você hoje. – Lohan anunciou.

— Como é?

— Vou dormir aqui. Quero ver como é.

— Nem que Merlin perca as calças no meu jardim! – exasperou-se Utau.

— Estou falando sério, Utau. – Lohan disse em tom de bronca. Como ela podia brincar com uma coisa daquelas?

Eles se encararam por um instante. A defesa de Utau a abandonou. Pareceu fragilizada. Então Lohan percebeu olheiras em volta de seus olhos estreitos. Ela bocejou alto. Pareceu cansada como se tivesse vivido mais de cem anos.

— Está bem.

Lohan deu um leve sorriso.

— VOCÊS VÃO ENSAIAR OU FICAR AÍ EMBAIXO PESCANDO DILATEX? – ouviu-se uma voz lá em cima. Era Prince.

Os dois subiram. Deixaram o assunto morrer pela tarde.

Quando chegaram à cozinha, havia outra presença ali. Prince estava almoçando, vigiado por Joe. Molly também estava almoçando, parecendo satisfeita. E com um ar tímido, outro garoto estava parado no portal que dividia a sala e a cozinha.

Tamaki Nakano era um garoto baixo para a idade. Tinha os olhos puxados e o rosto clarinho e suave. Os cabelos negros eram desfiados e caíam propositalmente no rosto. Ele recebeu Utau com um sorriso. Sentia-se muito desconfortável perto de Joe, Molly e Lohan (com quem não convivera muito). Só Prince o fazia se sentir a vontade. Maki era um garoto tranquilo, muito diferente da aura da banda Os Sereianos. No palco ele se transformava em um ótimo guitarrista, mais rebelde e descontrolado.

— Que saudades! – Utau o recebeu aos pulos, enlaçando-o em um abraço efusivo, fazendo Maki corar. Maki sorriu e retribuiu o abraço, um tanto refreado. Estava quase sorrindo quando encontrou o olhar rígido de Lohan – Maki corou, soltou Utau e colocou a guitarra encostada na parede, visivelmente perturbado.

Joe convidou todos a almoçarem (“muito cedo”, resmungou Prince, e levou outro cutucão de Joe). Lohan foi o último a encontrar uma cadeira, altura em que Molly já terminara de comer.

— Ah, meu pai mandou isso para você, tia Joe. – disse Lohan antes de se sentar. Era um rolo de pergaminho do primeiro rascunho de Animais Fantásticos e Onde Habitam. – Ele agradeceu pela ajuda.

Joe pegou o rolo muito sem graça. Molly percebeu a reação da esposa.

— Ajuda? Posso ver?  – Molly pediu, já saindo da mesa.

Joe estendeu o rascunho para ela e ficou na mesa com os garotos.

Quando terminaram de almoçar, Lohan ajudou a tia com a louça enquanto Maki, Prince e Utau saíram para o barracão. Os pés estavam cheio de terra. Lohan não sabia arrumar nada, de qualquer forma.

Utau se esganiçou para mostrar a música nova. Pegou um velho violão da mãe no andar de cima quando tudo já estava arrumado e sentou no meio do chão sujo. Lohan saiu e se apoiou no portal.

— Hm, eu fiz a melodia e depois passei a letra. Pode ser um pouco diferente do que a gente toca.

Prince ergueu as sobrancelhas.

— Como “diferente”?

— A letra. – Utau avisou. – Você pode improvisar em cima? – ela pediu ao namorado.

— Quero ouvir antes. – ele pediu intrigado.

Lohan e Maki pegaram, respectivamente, o baixo e a guitarra para passarem as notas. Utau começou a melodiar em um tom rebelde.


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