Inevitavelmente Sua escrita por Nah


Capítulo 11
Capítulo 11


Notas iniciais do capítulo

Acho que vocês já perceberam que eu gosto de um drama, haha... Boa leitura!!



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Ele permanece imóvel, me encarando atônito mesmo. Sustento seu olhar por poucos segundos e então me ocupo com os papeis sobre minha mesa, tentando evitar prolongar o contato com aqueles olhos que tanto me perturbam.

— Espera, você tá de brincadeira né?

Olho para ele novamente, completamente séria, transparecendo nada, mas por dentro estrou arrancando meus cabelos. No fundo uma vozinha insiste que eu estou fazendo uma burrada, mas a ignoro, empurrando pra longe minhas emoções.

— Pareço estar brincando?

Ele solta uma risada, sem humor algum.

— Posso pelo menos saber por que a senhora está me demitindo? - ergo uma sobrancelha quando noto seu escarnio ao falar ‘senhora’. Ele tá furioso.

— Digamos que nossa relação passou de limites intransponíveis para mim. Eu estava procurando um profissional, mas parece que não foi isso que eu encontrei.

Ele está estranhamente quieto, apenas seu peito sobe e desce com sua respiração irregular. Enquanto eu estou balançando compulsivamente meu pé, tentando me conter. Que saco.

— Tá fazendo isso por que vi suas cicatrizes? Eu deixo pra lá, se é esse o problema. – sinto um incomodo ao ouvir menciona-las, ninguém jamais as menciona, e em sua boca pareceu ainda mais intimo, como se eu tivesse mostrado minha alma para ele. No fundo não acredito que ele deixaria isso pra lá.

— O problema é diversas coisas. Você é meu funcionário. Apenas isso. E nossa relação está ultrapassando um nível de atitudes improprias e perturbadoras.

Ele ri.

— Perturbadoras? – Felipe apoia suas mãos sobre minha mesa e inclina-se até estar mais próximo do meu rosto. Quero recuar, mas permaneço imóvel, tentando parecer forte, seu cheiro me inebriando. – Entenda que pessoas ficam afim uma das outras, independente do meio em que elas convivem. Acontece.

Franzo o cenho. Ele tá falando dele, ou de mim? Será que ele tá afim de mim ou eu tô deixando muito na cara minha bagunça emocional? Não sei qual das duas opções é a menos assustadora.

— Pode funcionar assim no seu mundo, mas não no meu. Muito menos dentro da minha empresa.

Ele ri novamente, voltando a sua posição inicial. Passando a mão nos cabelos, os deixa em perfeito desalinho. Desvio meu olhar, que infelizmente acaba indo parar em seus braços, e noto com tristeza o modo como a camisa social aperta em seus músculos. Sinto meu rosto esquentar, e volto minha atenção para os papeis no mesmo segundo.

— Você está me culpando por uma coisa que não é apenas por minha causa.

— Até parece. Você está sempre me provocando, me rondando. Você disse naquele dia que não ia me deixar em paz. Vai negar?

— Não, não vou negar que disse isso depois que você me beijou igual louca.

Não acredito que ele tá me fazendo corar. Respiro fundo.

— Chega. Tá legal? Quero você fora. Receba e aceite isso.

Seu rosto se contorce agora em fúria e acho que ele não está acreditando nisso. No fundo, nem eu estou.

— Você está incomodada com a falta de profissionalismo entre nós, mas está me demitindo porque se apaixonou por mim. Parabéns, você é com certeza uma mulher brilhante. – caramba, ele tá com muita raiva. E ainda por cima ainda arranja brecha pra bancar o convencido. Fala sério.

Finjo uma risada, mas nada digo sobre. Não consigo organizar meus pensamentos com ele por perto.

— Pra sua infelicidade, sou eu que mando aqui, não você. – digo, pegando o telefone. Disco o ramal do RH, e Joyce atende em dois toques. – Joyce, arrume a papelada da demissão do Felipe Bragança. Sem aviso prévio. Ele está indo para sua sala agora.

Posso notar a surpresa de Joyce, mas não dou tempo para que fale qualquer coisa e desligo.

— Beleza. – ele ergue as mãos, em sinal de derrota. – Boa sorte nessa sua vidinha de merda, senhora Albuquerque.

E sai, batendo a porta com força. Realmente com força, tanto que estremeço com o barulho. Vidinha de merda, ele com certeza definiu bem. Permaneço encarando a porta, enquanto a realidade do que fiz cai sobre mim. Desde que esse homem apareceu na minha vida, tem bagunçado todas as minhas convicções. Tanto a ponto de eu fazer algo tão antiprofissional, colocando a perder um funcionário tão bom porque não consigo controlar minhas emoções.

Respiro fundo. Varias vezes.

Mas vai ficar tudo bem agora. Criei uma empresa renomada sem ele, não é porque ele se foi que agora vai dar merda. Ele se foi. Porra.

Volto minha atenção para o trabalho, bloqueando qualquer tipo de pensamento alheio. Permaneço assim até por volta das 2 da tarde, quando finalmente saio da minha sala para buscar algo para comer. Sinto o olhar do pessoal sobre mim, como se gritassem para mim “como você é burra”, e pela primeira vez na minha vida, isso realmente me incomoda.

Me limito a comer uma salada no restaurante do outro lado da rua. Encaro desanimada as pessoas, e até penso na possibilidade de ir para casa. Mas não. Já perdi um ótimo funcionário por sua causa, não vou deixar que atrase meu trabalho também. Chega de interferência do Bragança.

Antes que eu consiga fechar a porta da minha sala quando entro, Fabricio aparecesse, segurando papeis. Sento à minha mesa e o olho, esperando.

— Com licença, senhora. Ontem um cliente tentou desfazer o contrato conosco porque ficou incomodado com... hã... A cena que ele presenciou na quarta. – alguém, por favor, cava um buraco pra que eu possa enfiar minha cara. – Mas o Felipe resolveu tudo. Apresentou novas propostas e realmente os convenceu a ficar. Aqui estão os papeis que era pra a senhora analisar mais cedo, mas o Felipe... Hã... É isso.

Vacilo antes de pegar os papeis. Ele evitou que perdêssemos um cliente por minha culpa. E eu o demiti. Burra.

— Obrigada, Fabricio.

Ele permanece imóvel, me encarando de um jeito estranho.

— Senhora, o...

— Saia, Fabricio. Você acabou por aqui.

Encaro os papeis ainda sem acreditar no que Felipe fez. Como eu pude demitir uma cara assim? Sentimentos idiotas. Passo o resto do dia com esse dilema na cabeça, mal consigo me concentrar no trabalho. No caminho pra casa, resolvo mudar minha rota, tentando lembrar onde o Felipe morava. Sabia que estava prestes a cometer mais uma possível loucura, mas então, talvez, tudo mudasse depois disso.

*

Quando finalmente encontrei o prédio de Felipe, já era por volta das 19h30. Estava cansada e precisando de banho e cama. E estava ali, pronta para implorar para aquele babaca voltar. Eu realmente estava precisando dormir.

Me aproximei da portaria, praguejando não ter um sapato mais baixo para poder tirar esses saltos.

— Ele saiu mais cedo. – o porteiro nem sequer me olhou ao responder quando questionei sobre Felipe, permanecia mascando um chiclete com a cara enfiada num jornal.

Ótimo. Não acredito que vim até aqui pra nada. Pesco meu celular na bolsa e acesso o arquivo da empresa por ele. Procuro o numero de Felipe, e surpreendentemente ele ainda está lá. Quando estou prestes a ligar, bate uma vergonha e eu deixo pra lá. Ligo então para Fabricio, e ele só me atende na segunda tentativa, me irritando.

Alô?

— Fabricio, você sabe onde o Felipe tá?

Há muito barulho do outro lado da linha, e ele permanece calado por um tempo. Reviro os olhos e quando abro a boca para reclamar (xingar) ele me corta.

Ele tá aqui. Quer que eu passe pra ele?

Droga. Ele deve ter contado que sou eu. Por que tô com tanta vergonha?

— Não...Hã... Preciso falar pessoalmente. Onde vocês estão?

— Num bar na orla. – ele diz o nome e coincidência ou não, era o mesmo bar que a Carol e eu sempre frequentávamos.

— Estou indo para aí. Eu sei que você falou que sou eu, então não permita que ele saia daí até eu chegar. – ouço sua risada do outro lado da linha, me irritando mais. – É uma ordem.

— Não estamos em expediente, senhora.

E desliga na minha cara. Se eu não estivesse tão louca em acabar logo com isso, teria continuado praguejando Fabricio.  Como ele ousa desligar na minha casa? Para sorte dele, não estamos em expediente.

Me recorre então o pensamento de que talvez todos os meus funcionários um dia sonharam em me tratar de tal forma. Talvez ainda sonhem. Bufo, expulsando esse tipo de pensamento. Que se dane.

Dirijo o mais rápido que consigo até o bar, ainda sem acreditar que estava pegando meia hora de transito para implorar qualquer coisa que seja para aquele cara. Se eu acreditava ter sido louca o suficiente ao demiti-lo, agora acho que realmente me superei. Eu nunca me rebaixava para um cara, nunca. Eles não mereciam. E eu sabia, como bom babaca que o Felipe era, que ele iria me torturar.

A única vaga que consegui para estacionar fora a 5 minutos de onde o bar ficava. Cheguei com os pés doendo ainda mais, desejando poder arrancar eles ali mesmo. Talvez para jogar no Bragança. O lugar estava lotado, mas então uma coisa estranha aconteceu. Algo como se houvesse uma conexão ente nós, uma força invisível aos olhos puxando-me inteiramente para ele, meu corpo reagindo a sua presença. Um único movimento que fiz com a cabeça e dei de cara com ele.

Felipe tinha uma garrafa de cerveja à boca, tomando um gole, e quase se engasgou de tanto rir com algo que Fabricio, ao seu lado, contava. Ele não parecia nenhum pouco chateado como parecera mais cedo. Aposto que estava fingindo, apenas para que eu me sentisse culpada. Caminhei com determinação até sua mesa, e parei ao seu lado, com as mãos na cintura. Seu sorriso foi sumindo aos poucos e a conversa à mesa cessou no mesmo segundo.

Ele sabia que era eu, mas não se deu o trabalho de sequer olhar em minha direção.

— Felipe, precisamos conversar. – tentei soar o mais forte possível, como se estivesse prestes apenas a convencer um cliente a fechar contrato comigo. E era quase isso. Não era? Deus, eu estava nervosa até os ossos.

Ele, enfim, levantou seu olhar lentamente para mim. Havia tanta hostilidade em seus olhos que precisei resistir à vontade de dar meia volta e ir embora.

— O que tá fazendo aqui?

— Vou te dizer quando conversarmos. – fiz um gesto com a mão, indiciando para irmos para fora, mas ele não se moveu. Apenas sorriu, um sorriso que não tocou os olhos, enquanto focava novamente em sua cerveja.

— Não vou a lugar algum.

— Felipe...

— Não sou mais seu funcionário, você não manda mais em mim. E mesmo se fosse, não estamos no seu reino. – Fabricio tentou conter uma risadinha, e fora acompanhado pelos outros três caras que estavam a mesma. Felipe me fazia parecer uma idiota. – Se quiser falar comigo, vai ter que ser aqui.

Olhei desesperada para os outros da mesa. Poderia ser mais humilhante?

Respirei fundo. Não seja covarde Mariana, você chegou até aqui. – Eu cometi um erro, está bem? Quero que volte para a empresa.

Felipe me analisava, lentamente. Seus olhos se demoraram mais na minha boca, e isso me afetou mais do que deveria.

— Esse pedido chulo não vai me convencer.

— O que tenho que fazer então?

Ele coçou o queixo, parecendo ponderar algo. Acompanhei os movimentos dos seus dedos compridos com os olhos, lembrando que aquela mão já me tocou – não tanto quanto eu gostaria. Bufei mentalmente, sem acreditar que pensei nisso. Deve haver álcool no ar.

— Você pode começar se ajoelhando e beijando meus pés.

Minha boca caiu aberta, incrédula. Não acredito que ele vai fazer se vingar, aqui, no meio de tanta gente. Seria a pior das humilhações.

Permaneci imóvel, meus pensamentos correndo desordenados na minha cabeça, que eu não fazia ideia de qual seria minha próxima ação. Enquanto isso, Felipe ria de mim, assim como os  outros homens da mesa.

— Caramba... Você está verde. – Felipe riu ainda mais. – Ok, eu volto para sua empresa. Mesmo que você não mereça. Na verdade, você não merece ninguém ali. São todos bons demais para conviver com uma pessoa como você.

Foi como um chute no estomago. Então alguém, outra vez, tinha me machucado. Eu tinha lagrimas nos olhos quando dei meia volta em meus saltos e saí dali, sem dizer nada. Praticamente corri de volta para meu carro, já não segurando mais a lagrimas, que deslizavam por meu rosto. Quando estava a apenas alguns metros do bar, senti um puxão em meu braço, me fazendo virar para trás e encontrar Felipe com o rosto torcido, parecendo preocupado.

— Me solta. – tentei me soltar de seu aperto com ignorância, mas ele não cedeu.

— Não. Mariana, eu...

— Me solta, seu idiota. Você conseguiu o que queria. Conseguiu me humilhar, me machucar, como provavelmente eu faço com as pessoas não é mesmo? Fique feliz, você conseguiu o que ninguém consegue faz um tempo. – puxei novamente meu braço, e ele não protestou dessa vez, apenas me encarava. – Apareça na segunda naquela empresa de merda se ainda quiser seu trabalho com uma chefa de merda. Caso contrario, suma da minha vida.

Corro para longe dele, agora chorando ainda mais, tanto que precisei cobrir minha boca com a mão para impedir que um soluço grosseiro escapasse. Corri para longe, sentindo como se, além de minhas palavras duras, eu houvesse deixado parte de mim com Felipe.


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