Cap. 1 - Eu te conheço?

Primeiro veio a dor.

Meus membros doíam. Minha cabeça doía.

Eu queria muito vomitar.

Tudo doía. Parecia até que eu estava de ressaca, que tinha tido uma noitada das boas.

Mas, lembrei que isso nunca aconteceu, porque, 1. Eu não podia estar de ressaca pois eu tinha certeza absoluta de não ter ido à um bar ontem à noite, 2. Não tinha feito nenhum exercício físico pra estar com o corpo doendo, e 3. Eu tinha mesmo era passado a noite chorando por causa do idiota do meu ex-namorado.

Antes de tentar levantar, um som irritante chegou aos meus ouvidos. A droga do despertador devia estar quebrado de novo, pois ficava repetindo bip-bip-bip o tempo todo.

Abri os olhos e tudo o que vi foi a cor branca. Isso só queria dizer duas coisas: ou eu estava em um hospital, ou me internaram em um hospício.

A primeira opção era a mais racional. Por mais que a segunda ainda esteja de pé.

Tentei me mexer e vi que estava cheia de agulhas, entrei em desespero, eu odiava agulhas. Sentei na maca e fechei olhos na tentativa de puxá-las de uma vez.

Mas a ideia foi totalmente falha a partir do momento em que uma voz do outro lado do quarto se pronunciou.

— Não tire-as querida. São para o seu bem. - falou uma voz, grossa com um toque de rouquidão, de forma calma e paciente. Tornei a abrir os olhos novamente e quase esqueço de como se faz para respirar, ele era lindo, parecia um deus.

Ele segurou minhas mãos e olhou dentro dos meus olhos, e foi naquele momento em que me perdi em seus olhos azuis, o azul escuro mais bonito que eu já tinha visto, combinando perfeitamente com os cabelos negros feito carvão, o corpo tinha músculos, mas nada exagerados, que faziam você perceber que ia a academia, tornando-o mais másculo, mais adulto e muito mais bonito. Ele era lindo, e muito gostoso...

— Não sabe como é um alívio pra mim você ter acordado. - suspirou como se todas as suas preocupações tivessem cessado apenas naquele momento. - Quer alguma coisa? Água? Comida? Está com fome? Posso pegar algo para você. - falou apressado voltando para um rosto preocupado, mas mais relaxado que antes. Não sabia o porquê de toda essa atenção e cuidado com minha pessoa, perguntaria mais tarde.

— Não quero nada. Obrigada. - falei com a voz meio falhada, minha garganta estava meio seca, talvez precisasse de algo líquido, mas não queria me forçar a falar mais nada.

Nos encaramos por um tempo, o me que pareceu uma eternidade. Eu estava um pouco desconfortável com todo essa atenção focada em mim.Era perceptível que ele tinha ficado aqui no hospital, dormindo na poltrona nada confortável que tinha ao lado da maca, as olheiras embaixo dos olhos eram de uma pessoa que havia passado dias sem dormir direito, o cabelo estava totalmente bagunçado.

Havia outros detalhes que mostravam sua exaustão, mas não o deixava menos bonito, apenas mais cansado que o normal, provavelmente.

Quando eu finalmente tomei coragem para perguntar o que tinha acontecido, percebi que minha voz continuava horrível.

— O que... - uma tosse me fez parar no meio da pergunta. Com a voz um pouco mais recuperada voltei a falar. - O que aconteceu?

— Você sofreu um acidente. Foi atropelada. Estava atravessando a rua, o motorista estava bêbado e atingiu você em cheio. Ficou uma semana em coma. - respondeu acariciando meu rosto e cabelos. Era estranho, mas eu perguntaria sobre essa intimidade depois, até porque eu estava gostando de todo esse carinho.

— Normal, eu sempre estou metida em algum tipo de confusão. Desastrada o suficiente até mesmo para não prestar atenção na rua. - reviro os olhos e afasto um pouco o rosto de suas mãos, que ainda estavam me acariciando.

— Eu sei. - falou com um sorriso torto olhando para baixo. Tão lindo...

— Sabe? - perguntei incrédula. O quanto da minha vida aquele cara sabia? Será que estava me perseguindo?

— Se esses últimos 6 anos ao seu lado, contarem, seu lado desastrado foi um dos momentos que mais presenciei. - sorriu agora olhando pra mim.

— Últimos 6 anos? - gaguejei um pouco. Que brincadeira era essa? Isso era para algum tipo de programa de TV?

— Amor, por favor… - sua mão agora tinha voltado para o meu rosto. - Sei que andamos brigando muito, mas isso é irrelevante, não quero discutir isso, não aqui, não agora com seus amigos esperando lá fora. - ele olhou pra mim de uma forma desesperada. Quase como se realmente estivesse falando sério. - Quando chegarmos em casa, estivermos a sós, nós falamos sobre isso. Mas até lá, vamos ficar bem, por favor...

— Ir pra casa? Como assim? Eu não vou a lugar algum! Não com você! - Eu estava desesperada por respostas, não sabia nem como agir diante disso. Ele era o que? Maluco? Quem era ele?

Tirei suas mãos do meu rosto, empurrei seu corpo para trás e coloquei minhas pernas para fora da maca na tentativa de sair para fora desse quarto.

— Skye, fica na maca por favor. - disse com a voz desesperada.

— Como sabe meu nome? Eu nem te conheço! Eu quero ver o James! - Eu caminhava com um pouco de dificuldade, cambaleando algumas vezes, mas nada que me impedisse de ir até a porta e chamar algum segurança.

— Skye, por favor, está tudo bem. Fica calma, eu chamo o James. - suas mãos estavam levantadas nas laterais do corpo, parecia estar se rendendo. - Eu sei que estamos brigados à algum tempo. Nós mudamos, eu mudei, você mudou. A nossa rotina de antes mudou drasticamente. Mas, nós podemos resolver isso. Meus sentimentos continuam o mesmo. Meu amor por você continua do mesmo jeito, desde que te conheci. Olha… Se você quiser passar um tempo fora, esfriar a cabeça de tudo, ficando uns dias em algum hotel ou no apartamento do James, tudo bem. Eu não vou te forçar a nada. Eu só quero que você pense melhor sobre tudo o que está acontecendo entre nós.

Olhei pasma pra ele. Como assim? Eu mudei? Ele mudou? Que papo era esse? Esse cara andou fumando? Ele era pago pra fazer isso?

— Quem é você? - perguntei finalmente.

— Sou eu Skye. O Alex de sempre. O mesmo Alex que te ama, que está sempre com você, mesmo depois de todas as brigas. - essa básica “apresentação” de nada adiantou, eu continuava sem saber quem ele era. Ele deve ter percebido a minha cara de confusão e viu que tinha algo errado. - Espera você não se lembra de mim? - perguntou chocado.

— Como eu posso lembrar de alguém  que eu nem conheço?! - exclamei me apoiando no suporte do soro. Eu estava realmente cogitando a ideia de chamar os seguranças, ligar para o James vir me buscar e obrigá-lo a me levar para o nosso apartamento. Que droga era essa? Porque o James me largou aqui? Porque ele não está aqui comigo?

O cara que dizia me conhecer, tal de Alex, coçou a nuca com a mão direita e depois passou a mão no cabelo bagunçando-o ainda mais. Ele deve ter feito isso muitas vezes no tempo em que fiquei no hospital, cerca de uma semana, pelo que ele disse.

No instante seguinte a porta foi aberta e James entrou no quarto. Eu reconheceria ele nem que tivessem se passado anos e anos, o cheiro continuava o mesmo. Doce, mas forte, um cheiro totalmente masculino.

Mas a pior parte, foi que mesmo reconhecendo seu cheiro, eu não reconheceria seu rosto. Estava mais velho, mais alto, mais forte.

Mais adulto.

Quem era esse homem, que estava com o cheiro, a cara e a voz do James? Será que esses remédios que eles me dão, estão no prazo de validade?

— Meu Deus Skye. Que susto que você nos deu. Sei que você é muito desastrada, mas dessa vez você se superou. - Ele veio para o meu lado com um sorriso no rosto já me pegando pelo braço, me dando um abraço forte, mas cuidadoso. - Como você está? Sente alguma dor? - perguntou dando uma inspecionada no meu corpo de cima a baixo.

— Minha cabeça dói. - falei devagar. Ainda não entendia o que estava acontecendo, mas a minha única oportunidade era agora. - O que está acontecendo?

— Acho que a Skye perdeu a memória. - disse o tal Alex, interrompendo James de responder minha pergunta.

— É bem normal nesses casos não se lembrar do acidente. Ela pode ter tido um surto de amnésia global transitória, que é a perda temporária de memória associada a um mau funcionamento do hipocampo, estrutura localizada nos lobos temporais do cérebro que é considerada a sede da memória. Normalmente são ocasionadas por stress ou um acidente. - James explicou de forma tão profissional, como se fosse normal, do mesmo jeito que se explica para uma criança quais são as cores. Desde quando ele sabia de tudo isso? Ele fazia faculdade de arquitetura… E adorava!

— Acho que vai um tanto além disso, algo mais complexo. Skye não se lembra de mim. - o tal Alex disse dando um suspiro, como se estivesse realmente se lamentando. Cara estranho.

— Skye… - James se virou para mim e com cuidado me levou de volta para a maca. - Do que você se lembra exatamente? - perguntou com cautela.

— Da faculdade de administração. - respondi com lógica. - Estávamos ontem mesmo na faculdade, descobrimos sobre o idiota do meu namorado e sobre a Melissa. - falei tentando explicar como se ele que não se lembrasse de nada.

O corpo dos dois homens que estavam no quarto comigo se tencionaram. Os dois se encararam com preocupação, falando pelo olhar o que iriam fazer.

— Alex, me deixe conversar com ela a sós. - pediu James. Logo depois, o Alex estava saindo o quarto, mas não sem antes dar uma última olhada para o meu rosto, um olhar cheio de mágoa e preocupação. - Skye quero que preste bastante atenção. - disse a

James atraindo minha atenção novamente para ele. - Você não está mais na faculdade, já tem 27 anos e o Alex… É o seu marido. - explicou me encarando com cuidado, esperando uma reação minha.

Olhei para todos os lados possíveis daquele quarto. Onde estariam as câmeras? Quanto será que o James estava ganhando para fazer uma brincadeira dessas? Tudo bem Que estávamos com uns problemas no nosso apartamento, mas isso não é justificativa para brincadeiras de mau gosto. Que merda é essa?

Olhei cheia de sarcasmo, cética, confusa, seja o que for, eu não estava acreditando no que ele estava falando.

— Você está brincando não é? Onde estão as câmeras? Que joguinho idiota é esse?

— Presta atenção Skye. Você sofreu um acidente, Ficou uma semana em coma e perdeu a memória. - falou um pouco frustado. Eu até entenderia sua frustração, mas eu não tinha como acreditar nem um pouquinho nessa história.

Tudo bem, pensa um pouco… A cara do James estava com a aparência de mais velha, ele começou a falar sobre resultados médicos como se soubesse daquilo a vida inteira, um cara chamado Alex aparece no meu quarto se dizendo meu marido… Não dava para acreditar muito nisso.

Pulei da cama e tentei correr o máximo que pude para o banheiro, uma outra porta do outro lado do quarto. Acendi a luz e...

Puta. Que. Pariu.

Ou fizeram uma baita plástica na minha cara, ou o James estava falando a verdade.

Meu corpo estava muito diferente. Eu era magricela, não tinha peitos, e meu cabelo era curto. Totalmente diferente de como estava agora, me olhando no espelho. Eu estava com o corpo mais trabalho, como se tivesse ido à academia nesses tempos, estava na proporção certa, meus seios tinha crescido, dava para perceber através da bata ridícula que eu estava vestindo, e meus cabelos estão longos o suficiente para as pontas estarem abaixo de meus peitos. Ai meu Deus!

Meu estômago se embrulhou, pensei que iria vomitar, mas eu não tinha forças para sair do lugar. E apenas desmaiei.

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Eu ouvia várias vozes, estavam um pouco abafadas, mas mesmo assim não conseguia identificar nenhuma. Porque meu corpo parecia pesar tanto assim? Onde eu estava?

— Senhorita Skye? Pode me ouvir?

Abri meus olhos e pisquei várias vezes, até me acostumar com a claridade. Quem foi que deixou a cortina aberta? Minha visão conseguiu normalizar, e vi que do lado da minha cama estava um cara loiro de jaleco branco. Eu estava no hospital? De novo?

— Como está se sentindo? - perguntou neutro. Sério qual é o problema das pessoas? Já tinham me perguntado isso.

— Bem? - era pra ser uma afirmação, mas saiu mais como uma pergunta.

— Skye, qual é a última coisa que você se lembra? - Franzi o cenho. Já não me tinham feito essa pergunta também? Bufei e respondi com raiva.

— Eu lembro de ter acordado em algum hospital, com um cara falando que era marido, com o meu melhor amigo mais velho e com a minha aparência mais velha. Como se tivesse passado mais tempo do que eu realmente me lembro! - Falei tudo num fôlego só.

— Tudo bem. - disse se levantando da cadeira e anotando algo em sua prancheta, que eu não havia percebido até agora. - Irei chamar seu marido e amigos.  

Eu estava zangada e ansiosa. Zangada porque continuavam indistinto que o cara chamado Alex era meu marido. Eu nem o conhecia! E ansiosa porque o James está lá fora e pode me levar para casa. Eu espero…

O médico abriu a porta e chamou pelo James e pelo Alex. O primeiro a entrar foi o meu melhor amigo, depois veio uma mulher baixinha que estava de mãos dadas com ele. Desde quando o James tem namorada? Por último, entrou o cara que se dizia meu marido, Alex.

— Skye! - exclamou a mulher que estava com o James. Ela soltou sua mão e correu na minha direção me dando um abraço apertado. Eu não conseguia retribuí-lo, estava… Forte… Demais... - Meu Deus, você está bem? Seu acidente apareceu em vários noticiários. Fiquei muito preocupada. Imagina o Alex coitado, teve que passar os dias no hospital. Ficou com o trabalho atrasado algumas vezes , mas parece que deram um jeito. Você estava na minha casa semana passada antes de tudo isso acontecer, me sinto tão culpad... - antes de continuar a me metralhar de muitas informações estranhas, Alex a repreendeu.

— Clary!

— Desculpe, esqueci, sem memórias. - falou ela se afastando com os olhos cheios de lágrimas. Ela correu em direção ao James, que a abraçou forte e deixou que ela chorasse em peito.

— Bem… - começou o médico. - Nós precisamos conversar sobre o caso de Skye. O caso dela, é mais complicado do que parece. - ao falar essa mísera frase, todos no quarto ficaram tensos. A garota que estava agarrada ao James parou de chorar e olhou para o médico, assim como todos os outros. - Sua esposa, Sr. Tollest, está sofrendo de uma perda de memória a longo prazo. É as chances dela recuperar, são mínimas.

Todos os três que estavam em pé escutando o médico falar, olharam para mim com pena, medo e principalmente preocupação.

Agora não tinha como duvidar.

Sem rodeios ou opções, a realidade me bateu com força. Eu estava perdida, porque 1. Estava sem memórias, 2. As chances de voltar a lembrar de tudo o aconteceu a 7 anos atrás eram muito pequenas e 3. Eu estava casada com o cara mais lindo que já visto, o único problema… eu tinha acabado de conhecer ele.