Mais um garoto fugindo, o olhar assustado como se corresse de uma besta. Era de mim que corria. Todos dirigiam aquele olhar para mim, e, por mais que eu realmente queira, não sinto nada.

Não sinto nada ao bater nesses garotos até sangrarem, não sinto quando me olham reprovadores ou medrosos. Apenas esse vazio. Eu gostaria de sentir algo, como raiva, tristeza ou prazer, no entanto, nada.

Alguns garotos que me seguiam bateram nas minhas costas, rindo e me parabenizando por mais um garoto assustado. Forcei um sorriso, fingindo estar feliz com o ato. Passaram o braço pelo meu pescoço e me levaram para dentro do colégio, rindo e conversando sobre banalidades. Logo, fui incluído na conversa.

Conversávamos alto, rindo vez ou outra com piadas sujas. O professor se irritou, mas nada fez além de reclamar um pouco. Nunca faziam nada, eu não entendia isso. Se estivéssemos com os lugares trocados, seria certo que eu faria algo a respeito.

Quando a aula acabou, não fui acompanhado dos outros, que queriam dar uma lição a um estudante qualquer por ter feito uma coisa que não era de meu interesse. Assim que me pûs a andar, grossas gotas de chuva começaram a cair, me obrigando a procurar um abrigo. De lugar protegido a lugar protegido, consegui chegar no ponto de ônibus coberto.

Havia apenas um garoto ali. Ele era bem magro e alto, além de ser pálido e ter grandes olheiras. Me sentei ao seu lado, sem ter mas nenhuma opção, considerando que o banco era pequeno. O garoto parecia nem ter notado minha presença, e continuou lendo o pequeno livro que estava em suas mãos. Me inclinei disfarçadamente, para poder ler o título. "O Pequeno Príncipe", dizia a capa simples, que parecia ser desenhada por uma criança.

— Está interessado? - Perguntou, sem tirar os olhos do livro. Sobressaltei-me, não esperava que estivesse prestando atenção em mim.

— Não... eu apenas queria ver o que era. - Respondi, um pouco sem jeito. Vi um pequeno sorriso debochado fazer os cantos de sua boca subirem.

— É legal demais para se interessar por um livro? - Perguntou, finalmente desviando seus olhos azuis do livro e direcionando-os a mim.

Se meus amigos estivessem aqui, eu provavelmente teria o dado um soco ou algo assim, no entanto, permaneci na posição que estava, apenas fazendo uma careta.

Estava prestes a responder, mas ele fechou o livro e se levantou, pegando a mochila largada no chão e dando sinal para um ônibus que eu nem percebi que estava vindo. Sem olhar para trás ou pronunciar mais uma palavra, ele entrou no veiculo.