Voltamos para casa, o caminho era silencioso, mas a certa altura eu quebrei-o quando paramos no semáforo.

—O que é que vamos fazer, Peeta? São dois! - falei olhando para ele, que retribuiu o olhar.

—Não sei... Vai correr bem, vais ver, não estamos sozinhos nisto, além do mais nós somos fortes! - otimizou, estava a tentar acalmar-me, porém apenas me alarmou mais, ele estava de cabeça perdida, e eu não quero ter de fazer isto sozinha, não consigo!

Voltamos ao nosso caminho e mal chegamos a casa dos meus pais, o lugar onde marcamos encontrar-nos para dar as novidades devido a não querermos acompanhamento. Entramos e todos se levantaram alarmados.

—Que se passou com o meu sobrinho? - humorizou a Johanna.

—Sim, a minha sobrinha, como está? - tentou suavizar a Prim.

—Os vossos sobrinhos estão bem - afirmei e todos ficaram estupefactos.

—Como assim sobrinhos? São dois? - questionou o Finn e nós assentimos.

—Parabéns! - veio o Finnick abraçar-me, se bem que pela expressão percebi que me vinha acalmar. - Vai ficar tudo bem, eu vou estar aqui para tudo - sussurrou-me ao ouvido, e eu apertei-o ainda mais.

Depois dele veio a carroçaria toda atrás, mães e pais emocionados, todos babados por crianças que nem sequer sabem quem eles são, que nem completamente desenvolvidas estão.

Lanchamos por lá e voltamos para casa, felizmente as náuseas já são passado, posso comer sem vomitar! Fui tomar um banho e quando saí e vesti a roupa interior olhei-me ao espelho e resolvi falar com os meus filhos.

—Oii! Aqui a mamã, quero que saibam que apesar de não terem sido desejados, eu e o vosso papá vos adoramos e não há um momento em que nos arrependamos de esperar por vocês, estão a demorar e a deixar a mamã gorda duplamente, mas não faz mal, porque sei que vai valer a pena, e a perfeição demora tempo. Ainda não conheceram este mundo, mas mesmo assim já têm muitas pessoas a amar-vos, não se esqueçam, a mamã adora-vos! - falei em lágrimas e senti alguém a abraçar-me por trás e a colocar a mão na minha barriga.

—O papá também vos ama! - declarou olhando para mim e secando-me as lágrimas. - Não estás muito bem.

—Como é óbvio, não és tu que tens de perder o ano, e também não és tu que vais ficar duas vezes gigante e ganhar estrias, não és tu que vais sentir a dor do parto, não és tu que vais ter de ficar em casa eternamente até eles terem idade suficiente para irem para a escola, não és tu que vais perder a tua vida a 100%, sou eu - desabafei.

—Tens razão, eu posso não vir a perder o ano, o que é o mais certo acontecer porque quero ficar em casa e tomar conta de vocês, isso da barriga em posso beber tanta cerveja e comer tantos tremoços até ficar com o teu tamanho, as estrias só vão demonstrar o quão corajosa e forte tu és em levar esta gravidez para a frente, e quanto a eles irem para a escola, tu sabes que os podes por na creche, ou então contratar uma ama, certo? - ele sorria ao tentar acalmar-me e isso deixava-me mais feliz.

—Tu não existes! - abracei-o.

—Claro que sim, não vês as provas na barriga e ainda mais evidentes aqui à tua frente? - beijei-o e ele correspondeu, já estava a pôr-se em cima de mim quando o parei.

—Não me apetece, faz-me impressão e confusão agora que estou grávida - confessei.

—Tudo bem, tens razão - beijou-me afastando-se. - Que dizes assistirmos um filme?

—Claro, qual? - ia-lhe dar o poder de escolha.

—Que tal vermos "The Revenant", é o novo do DiCaprio! - sugeriu e eu concordei.

Vimos o filme e fomos dormir, tudo estava a ir tão bem, melhor que o que pensei, mas custa-me aceitar que podia estar numa festa em vez de estar aqui.

Acordei no dia seguinte determinada a ir à escola buscar a Annie e a Johanna para irmos comprar roupas e essas coisas para os bebés. Escusado será dizer que, como a minha barriga já estava bastante visível, e como me tornei famosa no colégio, toda a gente ficou a olhar-me de lado, o que me incomodou.

—Olá Katniss! - cumprimentou-me uma voz familiar.

—Olá Cato! - cumprimentei de volta assim que vi que se tratava do melhor amigo do Peeta.

—Então, como estão essas duas fofuras? - questionou e eu sorri.

—Bem, de vez em quando lá dão uns pontapés - respondi tentando ser simpática.

—Vais voltar ao colégio? - perguntou.

—Não, pelo menos não esse ano, e o Peeta também não - contei e ele sorriu estranhamente olhando para o horizonte.

—Deixa lá que eu também não - afirmou e eu surpreendi-me.

—Porquê? O que é que fizeste? - interroguei interessada.

—O mesmo que o Peeta - confessou e eu fiquei estupefacta.

—Quem é ela? - perguntei.

—A Clove, uma amiga da Johanna, conheci-a numa noite e pronto, agora ela está grávida de um rapaz! - soltou a bomba.

—Ah, de quanto tempo? - indaguei olhando também para o horizonte.

—Tanto quanto tu, foi na mesma altura - declarou e eu assenti.

—Tens de vir lá a casa um dia lanchar, podes trazê-la, sempre a conheço e encontro alguém que oficialmente conhece a minha dor - convidei.

—Aceito o convite, eu falo com ela depois e combinamos isso - aceitou e ficámos em silêncio constrangidos, nestes momentos é melhor ficarmos calados. - Como é ser casada? - quebrou o silêncio no ar.

—Estranho, ainda mais com 16 anos, está a correr bem, mas mesmo assim, fomos pressionados! - contei.

—Pois... eu tive a sorte de os meus pais e os pais dela terem bom senso, mas o vosso caso era diferente, os vossos pais são referência e estão constantemente na boca do mundo, seria um escândalo que soubessem - ironizou e eu ri porque eu tive uma reação parecida a essa no princípio de tudo.

Entretanto tocou e as meninas saíram com o Finnick, eu ficou todo chateado por tê-lo deixado de fora ligando para o Peeta em seguida a combinar irem jogar um jogo qualquer.

—Já soubeste? - fofocas na área.

—O quê, Johanna? - perguntei revirando os olhos.

—Tu e o Peeta não foram os únicos a não usar a lancheira e comer o lanche cedo demais! - que raio de metáfora.

—O que ela quer dizer é que o Cato também engravidou uma amiga da Johanna e agora desistiu do colégio - contou a Annie, que novidade!

—Eu já sabia, estive a falar com ele enquanto esperava por vocês. A miúda está do mesmo tempo que eu. Já os convidei para ir lá a casa para a conhecer, alguém que me compreende por experiência própria podia ser bom - afirmei sem grande entusiasmo.

Acabamos por ir comprar as coisinhas para o bebé e lanchamos por lá mesmo, estávamos na risada e tudo quando algo me salta à vista: o Haymitch com a Effie.

—O que é aquilo? - esta incrédula e logo que elas olham também ficam da mesma maneira, o que piorou mal eles se beijaram. Levantei-me e caminhei até à mesa onde se encontravam. - Que lindo, vejam só, a Effie e o Haymitch aos beijos!

—Olá boneca! - cumprimentou ele com um sorriso. - Como vão essas pestinhas?

—Não chames de pestinhas aos meus filhos! - estava a ficar impaciente.

—Calma, os hormônios estão a fazer-te ficar irritada, isso é mau para as crianças! - alertou gozando comigo.

—Katniss querida, eu quis dizer-te mais cedo, mas eu não pude ir visitar-te! - desculpas D. Effie, são só desculpas esfarrapadas.

—Claro Effie, eu compreendo perfeitamente que andes com o bêbado do meu professor de debate e Filosofia que fez com que eu engravidasse! - em parte era verdade o que eu tinha afirmado.

—Eu? Como é que eu te fiz engravidar! Ninguém te mandou andar à chuva nem uma gabardina! - já estou cansada de metáforas de mau gosto!

—Foi quando fui fazer o maldito trabalho que nos mandaste que isso aconteceu! Eu fui a casa dele fazer aquele estúpido trabalho! Preferia mil vezes ter chumbado, o efeito era o mesmo! Ainda por cima já não tem uso, não vou voltar ao colégio este ano!- reclamei.

—Para a próxima vais fazer o trabalho à biblioteca onde não há perigos a correr! Não te preocupes, não és a única! Tu, o Peeta e o Cato saíram, foi para se fazerem companhia uns aos outros! "Os Adolescentes de 16 anos sem preservativos em casa!" - juro que lhe desfaço aquele sorrisinho! Eu desfazia se a Annie não me tivesse puxado para sair.

—Eles estão juntos! - protestei e a Johanna segurava o riso.

Acabamos por ir embora antes que eu tivesse outra grande crise. Cheguei ao apartamento irritadíssima, lá estavam o Peeta, o Finnick e o Cato que ficaram a olhar para mim com cara de "Ups! Tempestade!". Assim que lhes contei eles ficaram sem acreditar, a espalhafatosa e cheia de classe Effie Trinket com o bêbado do Haymitch Abernathy.

Combinamos o lanche para amanhã, a Clove já tinha confirmado e tudo. Pelo que disse o Cato ela ficou feliz por ter alguém a passar pela mesma situação que ela, alguém que a pudesse compreender verdadeiramente, uma amiga com quem falar sem ser as do colégio onde estudava que se tinham afastado dela. Felizmente isso não aconteceu muito comigo, os verdadeiros ficaram comigo e continuam comigo, não me abandonaram e sinto-me agradecida por isso, por ter amigos tão bons e que se preocupam realmente comigo, com o Peeta e com os nossos filhos. Pelo que conta o Cato, assim como aconteceu com o Peeta, toda a equipa de basketball se afastou deles, só que ao passo que o Peeta me tem a mim, a irmã e os meus amigos que se tornaram nos dele, o Cato só tem o Peeta e a Clove, e mais recentemente a mim.

Conversei com o Peeta depois do Cato e o Finnick terem ido embora e resolvi que talvez incluir a Clove e o Cato no nosso grupo de amigos não seria uma má ideia, precisamos de apoio nesta altura, de todo o apoio do mundo, e o Finn parece ter gostado do Cato, a Johanna já conhece ambos em questão, a Annie de certeza que os iria adorar também, portanto, que mal é que faria?

Esta conversa com o Cato fez-me compreender que dentro da minha vida atribulada e aborrecida, triste e complicada vida, sou uma sortuda. Tenho um casamento feliz dentro do possível, uma boa casa, em breve dois filhos, amigos que não me deixam para trás e me adoravam a mim e aos meus, dois irmãos maravilhosos... tenho tudo e eles não têm nada.

A vida é injusta, fácil para uns, difícil para outros, sendo que o difícil pode ser fácil para uns e para outros pode ser mesmo complicado.

Continua...