A Terra e o Mar - o encontro de dois mundos escrita por Lu Rosa


Capítulo 21
Vinte




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/682389/chapter/21

Leonor olhou para o teto e não se animou a sair da rede. Só conseguira dormir quando a aurora já se anunciava. Há dias assim. Dormindo só depois de exausta de tanto chorar. Sabia que os outros comentavam a seu respeito, mas Leonor não se importava. Tudo o que ela queria era uma noite eterna para poder dormir sem ter que enfrentar o amanhecer.

Sentia os olhos inchados, a cabeça lhe doía horrivelmente. Mas, pior do de que as dores físicas era a dor de sua alma.

Saber que Thomas não mais a estreitaria nos braços, não mais sentira o sabor e o calor dos lábios dele contra os seus. Sentir-se amada e protegida.

Uma raiva acumulou-se dentro dela. Por Deus, teria mesmo que se casar com D. Constâncio; um homem violento e cruel, mas rico e poderoso?

Leonor levantou-se da rede e foi até a janela. Ela arregalou os olhos ao ver Thomas parado na frente da casa. O que aquele louco estaria fazendo ali? Já não bastava toda a dor que ela passava toda noite? Ele haveria de lhe atormentar também durante o dia?

Rapidamente, ela saiu do quarto e desceu as escadas, encontrando-se com D. Eugenia.

— Minha filha, por que desceste? Ainda precisas descansar muito. Não parece que estás refeita das situações terríveis que passaste.

— Eu estou bem, D. Eugenia. Meu pai sempre dizia que nada como o amanhecer para não pensarmos no passado.

— Escutei vosmecê a chorar a noite. – a senhora fez um carinho no rosto da moça.

Leonor deu um sorriso singelo para D. Eugenia embora seu coração sangrasse.

Quando a moça começou a se dirigir à área externa da casa, um homem horroroso lhe barrou o caminho.

— Não, senhora. Não deve sair.

— O que?! Eu quero ir até a casa de D. Isabel de Proença.

— Tenho ordens de D. Constancio.

— Quem é você?

— Sou Francisco, a serviço de D. Constancio.

— Pois bem, Francisco. Acho que vosmecê deve saber quem eu sou.

O homem a olhou de cima abaixo. Leonor sentiu-se imunda com o olhar dele, mas não recuou.

— A noiva de D. Constâncio.

— Então... Vosmecê vai sair da minha frente ou não?

— Posso até sair, senhora. Mas vou acompanhá-la.

— O que?! Eu não vou ter um espião seguindo meus passos. Vou agora falar com D. Constâncio.

Francisco fez um ar de pouco caso, o que aborreceu mais a moça.

Ela caminhou até o escritório de D. Constâncio, parando quando ouviu vozes.

Para seu espanto e horror, D. Constâncio recebia Sir Thomas Cavendish, o corsário inglês.

***

— Aqui está! – D. Constâncio abriu o baú. – Quarenta mil peças de ouro. Sem dividir nem regatear, meu caro Cavendish.

Sir Thomas passou a mão pelas moedas, mergulhando sua mão até a metade do antebraço. Ele pegou uma das moedas do fundo.

— Você me ofende, irmão.

— Negócios entre piratas devem sempre ser baseados na confiança, não acha irmão?

Constâncio deu uma risada e Cavendish fechou o baú.

— Levem para o Leicester. E nem pensem em me roubar.

Os dois homens pegaram o baú e saíram da sala. Quase encontraram com Leonor que rapidamente se escondeu atrás de uma tapeçaria. Depois que eles passaram, Leonor se esgueirou pela parede até outra tapeçaria mais próxima para ouvir o que eles diziam. Mas, para sua frustração, eles falavam em inglês.

— Aqui está. – D. Constâncio estendeu um papel a Cavendish. – A propriedade de um navio nas mesmas condições e tamanho do Black Pinnace.

— Muito bem. – Cavendish terminou de ler o documento. – Eu não deveria cumprir minha parte do acordo e ficar com esse navio só pelo que você fez ao meu.

— Vosmecê afundou o meu primeiro, Sir Thomas.

— É verdade. Bem, como eu estou querendo pegar a próxima maré, acho melhor eu ir.

Constâncio assentiu.

— Espero que nossos caminhos não voltem a ser cruzar. – disse o português.

— Mas se voltarem, eu vou terei o prazer de lhe afundar um ou outro navio, El cuervo negro.

“O corvo negro?”, pensou Leonor. “Porque o corsário inglês tinha chamado D. Constâncio daquele jeito?”

Então uma história que ela ouviu de seu pai lhe veio à mente. D. Bernardo conversava com D. Martim Afonso de Souza, o donatário da Capitania de São Vicente, numa das visitas que ele fizera a seu pai, enquanto ela servia vinho e petiscos a pedido da mãe:

“Ouvi dizer que El cuervo negro atacou novamente. É verdade D. Martim?” – perguntara D. Bernardo.

“Aquele infame!”, respondera D. Martim bravo. “Capturou uma corveta que ia de Pernambuco para o Rio de Janeiro. O miserável depois de roubar toda a carga, estuprar a esposa e as filhas do capitão, uma delas uma menina de dez anos, destruiu o navio a balas de canhão.”

“Miserável desgraçado!” D. Bernardo urrou furioso “Portugal tem que fazer algo a respeito disso, D. Martim. Nem em nossa costa estaremos seguros”.

Então El cuervo negro... Era D. Constâncio?! O homem que iria se tornar seu marido. Um violador de crianças?!

Leonor correu antes que vomitasse ali mesmo. Seu estomago contorcia-se em ânsia e nem Francisco conseguiu segurá-la. Num canteiro, colocou todo seu café da manhã para fora. Ela tremia devido aos espasmos e a raiva. Como aquele homem conseguia conviver com pessoas de bem tendo um passado daqueles?

Ela nem percebeu quando Thomas se aproximou dela e lhe tocou o ombro.

— Leonor, você está bem?

Ele recuou assustado ao vê-la pálida como um fantasma. Ela estava em choque, o inglês constatou. Segurou-lhe pelos ombros e a sacudiu.

— Leonor, o que foi? O que você tem?

A voz incisiva dele penetrou-lhe na mente, fazendo que ela piscasse tentando recobrar a razão. Mas a voz elevada também chamou a atenção de Agoirá que estava saindo dos estábulos. Achou que Thomas estava atacando Leonor e num átimo, estava sobre o pirata inglês.

Os dois embolaram-se no chão trocando socos. Agilmente, Thomas conseguiu jogar Agoirá por cima de seu corpo e se levantou em seguida, sacando seu punhal. O índio fez o mesmo movendo-se para atacar o inglês.

— Não! Thomas pare! – Leonor correu até Thomas e o segurou.

— Leonor saia daqui! – ordenou ele sem tirar os olhos de Agoirá.

— Não Thomas! – Leonor estendeu uma das mãos para frente para parar Agoirá – Agoirá só esta me defendendo. Ele é meu protetor.

Durante a troca de palavras, o índio olhou para Leonor sem entender muito bem por que ela correra para o pirata.

            A moça se afastou de Thomas e caminhou até Agoirá e segurou a mão dele que carregava a faca.

            - Não, meu amigo. Ele dono de meu coração. – indicou Thomas.

            - Leonor achou dono coração?

            - Sim. – a moça assentiu chorando e sorrindo. Ela fez um sinal para Thomas se aproximar.

            Ele veio na direção dela, contudo sem guardar o punhal.

            - Meus anjos da guarda. – ainda ressabiados um com o outro, os dois deixaram que ela unisse suas mãos num aperto.

            - João Guilherme! João Guilherme! – apareceu Mãe Maria chamando o menino.

            - Venham! Não convém que sejamos vistos. – Ela puxou os dois para uma cerca viva.

            - O que vosmecê está fazendo aqui? – a moça perguntou ao pirata.

            - Vim acompanhar meu capitão. Ele tem assuntos com seu noivo.

            - Eu vi dois piratas saírem do gabinete de D. Constâncio carregando um baú. – Leonor esclareceu.

            - Quer dizer que ele fez o pagamento... – concluiu Thomas em voz baixa.

            - Do meu resgate?

            - Não. Pela cabeça de D. Brás Cubas.

            - Não acredito!

            - Eu os ouvi conversando. D. Constancio ofereceu uma quantia enorme pela morte de D. Brás e sua família.

            - Isabel... – Leonor colocou a mão na boca.

            - Eu tenho que agir. – ele a beijou rapidamente nos lábios e voltou para junto de Cavendish que saia da casa naquele momento.

            Leonor e Agoirá continuavam atrás da cerca viva observando os dois homens se afastando.

            - Moça Leonor confia nesse homem? – perguntou o índio.

            - Tanto quanto confio em você, Agoirá. – ela apoiou a mão no braço moreno. – Devo minha vida a ele.

            - João Guilherme! Onde anda esse minino?

            Leonor correu para Mãe Maria seguida de perto por Agoirá.

            - O que aconteceu, Mãe Maria?

            - Aquele diabo de minino! Não tá em lugar ninhum.

            - Para onde ele pode ter ido? Já viram no barracão de ferramentas, nos estábulos, na praia?

            - Já sim. Aquele danado não tá por aqui.

            - Vamos Agoirá, temos que achar João Guilherme.

Constâncio aproximou-se do grupo.

            - O que acontece?

            - João Guilherme sumiu. Temos que encontrá-lo.

            - Mandarei um grupo de busca. Fique aqui.

            - Não. Ele é meu irmão. Minha responsabilidade. – Leonor virou-se para sair.

            - Não discuta menina. – D. Constâncio a segurou pelo braço.

            Agoirá segurou a mão que D. Constâncio segurava o braço de Leonor.

            - Solte de mim, bugre! – ordenou D. Constâncio.

            - Soltar moça Leonor primeiro. Se ela diz buscar irmão, ela buscar irmão.

            Eles estavam nesse impasse quando Carmo e um índio rapazola chamado Tuí aproximaram-se do grupo.

            - Mãe Maria, ninguém viu minino. Perguntei em toda parte. – relatou Carmo.

            - No engenho ele também não tá, Mãe Maria. – avisou Tuí.

            Agoirá olhou para Leonor e para Mãe Maria.

            - Agoirá acha que sabe paradeiro de minino João Guilherme. Agoirá busca menino. – e ele saiu em disparada.

            Leonor segurou na mão de Carmo.

            - Carmo venha comigo. Tenho que ir à casa de D. Isabel de Proença.

            Antes que D. Constancio falasse alguma coisa, as duas moças já estavam se distanciando. Ele fez um sinal para que Francisco as seguisse. O homem correu atrás das moças.

            Ainda reclamando do sumiço de João Guilherme, Mãe Maria voltou para a cozinha deixando D. Constancio sozinho com Tuí.

            - O que vosmecê ainda faz aqui, seu traste! Volte agora para o engenho.

            Mas o rapaz não deu sinal de tê-lo ouvido.

            - Estou falando com vosmecê, miserável. – D. Constancio pegou no braço do menino e o sacudiu.

            - D. Constâncio... – o menino disse em voz baixa.

            - O que é seu traste?

            - Carijós D. Constancio. Estão na mata...

***

            Cavendish e Thomas caminhavam em ritmo acelerado na direção da igreja onde estavam os reféns.

            - Você sabe por que eu decidi agora ir embora desse lugar?

            - Eu realmente estranhei. Por que hoje senhor? E assim de repente.

            - Quando eu cheguei aqui, eu recebi uma visita. Durante a noite, encontrei dois índios no meu quarto.

            - Índios, senhor? Deveria ter dado o alarme. Como eles conseguiram subir a bordo?

            - Isso não interessa mais. A questão é que, não sei como, eu devia estar em alguma espécie de transe, então consegui compreender o que eles me diziam.

            - Isso é fascinante, senhor.

            - Eles queriam que eu exterminasse todos os colonos e assumisse a vila.

            Thomas parou estupefato.

            - E o senhor?!

— Declinei do convite, é claro. Não tenho interesse na política dessa terra. Eles não insistiram, para o meu alívio. Mas me deram um aviso: Quando a última lua grande estivesse no céu, eles atacariam. E não deixariam pedra sobre pedra, na linguagem deles. Advinha que noite será hoje? – perguntou sarcasticamente.

            Eles chegaram às portas da Igreja e Cavendish sacou a sua pistola. Thomas estava um pouco atrás dele.

            - Está na hora de acabarmos com isso.

            Cavendish só não esperava ouvir uma pistola sendo engatilhada próximo ao ouvido.

            - Eu acho que não Sir Thomas...

            - O que?! Ficou louco Horton?

            - Não senhor. Apenas estou agindo de acordo com a minha consciência. Me dê sua arma, por favor.

            Cavendish entregou sua pistola a Thomas e os dois entraram na igreja.     Os outros piratas olharam para a porta, atraídos pela voz de Cavendish.

            - Seu miserável! Isso é motim, Horton! Vou enforca-lo por isso! – esbravejava o corsário enquanto entrava na igreja.

            - Não, porque não vou embarcar com o senhor. Joguem as armas no altar! Agora, ou eu estouro a cabeça dele! – Thomas gritou para os outros piratas.

            - Senhor? – um deles perguntou.

            - Ficaram surdos, imbecis? Ele está com uma pistola na minha cabeça. Façam o que ele mandou.

            Os piratas foram colocar as pistolas, facas e arcabuzes no altar da igreja.

            - Está satisfeito, seu traidor? – Cavendish perguntou

            - Agora voltem todos para o navio. Afinal, Sir Thomas quer voltar para a Inglaterra e não vai deixar ninguém para trás, não é capitão? Andem logo! Vão!

            Os piratas saíram da igreja. Os reféns soltaram gritos de zombaria.

            Thomas se afastou de Cavendish, mas continuou apontando a pistola para ele.

            - Agora você vai inverter os papéis, Horton? Vai me matar? Deixe de ser idiota. Eles vão te enforcar assim que nós partimos.

            - Não! Esse jovem provou que, apesar das companhias, ele não é como você, seu patife. Ele está sob a minha garantia. – respondeu D. Brás.

            - Você tramava pelas minhas costas, seu traidor? Você é mesmo muito covarde para ser um pirata.

            - Eu embarquei em sua expedição para encontrar a morte. Mas, ao invés disso eu encontrei a vida nessas terras. E é por isso que eu não vou matar o senhor capitão.

            - E tudo por causa daquela vadia, não é? Desde o início, quando Cocke me disse que ela mandou o selvagem procurar ajuda e você não a matou por isso.

            Thomas engatilhou a segunda arma.

            - Não sou homem de matar outro desarmado como o senhor iria fazer, capitão. Mas toque no nome de Leonor mais uma vez e eu posso mudar de ideia. Agora vá! Tenho certeza que o senhor tem muitas moedas para contar.

            - Eu vou. Mas será o diabo se nossos caminhos voltarem a se cruzar Horton.

            - Eu espero que não, Sir Thomas.

            Cavendish saiu pisando duro e reuniu-se com os homens do lado de fora.

            - Vamos embora desse inferno! Se ele quer virar churrasco de índio é problema dele.

            Dentro da igreja, Thomas ocupava-se em soltar D. Brás e os outros.

            - Peguem as armas e preparem-se. Uma horda de índios está vindo atacar a vila.

            - Quanto tempo? – perguntou D. Brás.

            - Possivelmente ao cair da noite. Na última lua cheia.

— Temos que ir até o forte ver se restou alguma arma, D. Brás. – disse D. Paulo de Proença.

            - Isabel deve estar em casa. Vá para lá. Eu irei ao forte com Pedro. Amigos, - ele se virou para os outros – vão para suas casas e reúnam todos os homens na praça. – D. Brás comandou e todos se apressaram em obedecer. Apenas ele, Thomas e Pedro Cubas ficaram na igreja.

            - Rapaz, eu espero que isso não seja nenhuma armadilha. – D. Brás disse a Thomas.

            - Estou tranquilo quanto a isso, D. Brás. Resta agora saber o que mais pode ter sido tramado por Cavendish e seu associado.

Brás assentiu com a cabeça. Tinha entendido que Thomas não queria citar o nome de D. Constâncio na frente do rapaz.

            - E o que vosmecê vai fazer agora? – perguntou D. Brás à Thomas

            - Se o senhor permitir, quero lutar ao seu lado. Talvez eu possa me retratar por ter vindo com os corsários. – respondeu o rapaz.

            - Prove seu valor, rapaz e com certeza isso será apagado. E eu o apoiarei quando vosmecê for pedir a mão da bela Leonor Duarte da Meira. – o velho estendeu a mão a ele.

            - Obrigado, D. Brás. – Thomas apertou-lhe a mão com firmeza.

            - Agora vamos que temos muita coisa para fazer.

***

            - Leonor! – Isabel a abraçou forte. – Como estás? Fui te visitar algumas vezes, mas D. Constâncio sempre nos dizia que vosmecê estava indisposta.

            - Nos primeiros dias sim. – Leonor sentiu as lágrimas aflorarem diante da preocupação da amiga – Doía demais... Tudo que passei o medo por causa da morte daquele fanático. Padre Afonso foi me visitar. Disse que eu ficasse tranquila. Deus não iria me castigar por defender nossa fé.

            - Graças a Deus! – Isabel a fez se sentar e tomou as mãos de Leonor entre as suas– E como vosmecê está se sentindo?

            - Eu estou preocupada com João Guilherme. Ninguém o vê desde manhã cedo e já passou da hora do almoço. Estou percorrendo a vila com Carmo e nenhum sinal. Achei que talvez ele estivesse aqui com Pedro e Fernão.

            - Não... Ele esteve ontem aqui com a ama de vosmecês, Mãe Maria. Brincou um pouco com Fernão e logo se foi.

            - Meu Deus... Eu não suportaria perde-lo também... – Leonor murmurou.

            - E quem mais vosmecê perdeu, Leonor? – a mulher perguntou.

            A moça olhou para a amiga e tentou dizer algo, mas a voz não saía. Ela sentiu seu peito tão apertado como se pudesse sufoca-la e então ela jogou-se aos pés de Isabel assustando tanto a fidalga quanto a índia que acompanhava Leonor.

            - D. Leonor! O que a senhora tem? Estás se sentindo mal.

            - Carmo, vá até a cozinha e peça para Fátima preparar um chá. Vá menina que eu cuido de sua senhora.

            A índia correu para os fundos da casa enquanto Isabel passava os dedos sobre a cabeça de Leonor tentando acalma-la enquanto a moça sacudia-se com soluços.

— Leonor, Leonor... O que tens minha miúda? D. Constâncio atreveu a lhe bater novamente? Se for isso, vou contigo agora na casa desse infame pegar tuas coisas e as de João Guilherme.

            - Não... Não é isso. – Leonor falou entre os soluços. – Ah Isabel! Estou perdida...

            A moça levou um susto ao ouvir as palavras de Leonor. Pronto! Aconteceu o que ela mais temia.

            - Ele te forçou... Ai Leonor fale logo, criatura! Estou a morrer de aflição contigo desse jeito.

            - Eu o amo e o mandei embora. Nunca mais sentirei o abraço dele, os beijos dele...

            - Dele quem menina?

            - Thomas... Thomas Horton. Um dos piratas.

            - Virgem santíssima! Um dos piratas? Acho que me lembro do nome... – Isabel fez um esforço de memória. – Não é o que te trouxe pelo braço no dia da invasão?

            - Sim. Eu o impedi de atirar em Igaracê. Depois nos encontramos algumas vezes na vila e ele me salvou de dois bandidos. Depois disso, eu pensava nele, sentia-o perto de mim, mesmo à distância. Numa tarde, eu lhe dei meu coração e ele me deu o seu.

            - Lindo...  Se não fosse por um motivo: ele é um pirata, Leonor! Onde estavas com a cabeça?

            - Nas nuvens, minha amiga. Quando ele me beijou eu me senti arrebatada aos céus. Quando fui levada, após o episódio da nossa santa roubada, passei a noite em seus braços. Não aconteceu nada! – ela assegurou ao ver Isabel arregalar os olhos – Nós apenas dormimos.

            - Vosmecê pode ter dormido, mas tenho certeza que ele não deixou a oportunidade passar.

            - Ah Isabel. Nunca me senti mais segura, mais cuidada do que nos braços de Thomas. Se pudesses ver o brilho nos olhos dele quando ele afirmava com voz grave o quanto me amava. O calor de seu corpo me embalando. E os beijos... – Leonor fechou os olhos e tocou os lábios com a ponta dos dedos.

            - Meu Deus! Estás mesmo apaixonada por esse... Rapaz.  – Isabel com certeza iria usar outra palavra, mas corrigiu-se a tempo.

            Um alarido nas ruas chegou até elas. As duas correram até o alpendre.

            - Parece que ele fez o que você pediu. Veja Leonor, eles estão indo embora. – Isabel mostrou as velas. – Venha, talvez ele ainda esteja no cais.

            - Mas Isabel... – Leonor foi puxada pela outra.

            As duas correram, seguidas de Carmo, desviando da multidão que festejava a saída dos piratas. Quando elas conseguiram chegar, os navios já se afastavam do cais.

            - Ele foi embora, Isabel! – Leonor voltou-se para a amiga e recomeçou a chorar abraçada a ela. – Foi embora e eu nunca mais vou vê-lo.

            Isabel só podia consolar a moça, enquanto ao redor delas a alegria imperava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Terra e o Mar - o encontro de dois mundos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.