Os Mistérios de Ethan Quinn escrita por Nathalie Alves


Capítulo 3
Ataque Surpresa


Notas iniciais do capítulo

Ethan tenta proteger seu tesouro, mas nem tudo ocorre como o esperado. A noite na floresta se revela sombria e traiçoeira.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/681389/chapter/3

Ele sentia-se mais vivo que nunca. Todas as suas experiências e descobertas recentes revelavam um mundo nunca visto antes. Seu maior desejo era correr infinitamente, saltando sob as árvores, descobrindo mais segredos. Na pequena mesa ao seu lado, a pedra brilhava, majestosa e imponente, mais vermelha do que antes, refletindo suas faíscas profundamente nos olhos de Ethan. Muitas vezes ele se perguntou o que faria com aquele objeto. Um tesouro como aquele devia possuir uma origem, uma história, um segredo profundo. Devia haver alguma utilidade, uma função escondida por trás de tanto brilho.

Ele ansiava por mergulhar nesse mundo fascinante. Por outro lado, bastava um simples olhar sobre aquela pedra para fazê-lo esquecer tudo à sua volta. Às vezes não importava se ela tinha ou não alguma funcionalidade. O importante era mantê-la ali, imóvel e intacta, como uma lembrança, uma prova de que tudo aquilo era real.

O relógio marcava onze e meia da manhã. Lá fora as árvores balançavam com o leve soprar da brisa fria, e o céu quase nublado tentava esconder os raios de Sol, por trás de suas nuvens esbranquiçadas.

A noite passada fora como um sonho. A presença e o brilho daquela pedra mágica hipnotizara Ethan, mantendo-o num sono profundo durante toda a madrugada, e inclusive pela manhã, tanto que ele perdera as aulas no colégio. Apesar de tudo, ele sentiu-se melhor. Foi bom ter passado um dia longe da escola, longe de todos aqueles olhares, ainda mais naquele momento confuso em sua vida. Foi bom acreditar, mesmo que fosse só por um dia, que ele não fazia parte de outra realidade a não ser aquela, como lobo. Não o agradava pensar que ele estava dividido entre dois mundos completamente diferentes.

Sob o cobertor, Ethan sentia seus músculos e seu peito moreno incrivelmente rígidos e fortes. Sentia uma disposição muito grande e uma vontade imensa de correr e lutar, expor ao mundo a sua força. Era incrível o que duas noites como lobo podiam fazer.

Com um salto, ele levantou-se da cama. Tirou delicadamente a pedra da mesa, caminhou até seu armário e escondeu o objeto dentro de uma caixa de madeira, cobrindo-a com uma pilha de roupas dobradas. Enquanto escondia a pedra, ele ouviu alguém gritando o seu nome lá embaixo.

“Ethan! Preciso falar com você”.

Ele se aproximou da janela. Bridgit estava lá, com a mochila atrás das costas, os cabelos cacheados voando com o vento. Ele já sabia aonde aquela conversa iria levar.

“Não tenho muito tempo. Preciso voltar para casa logo”, disse Bridgit.

Ethan saiu do quarto e desceu as escadas rapidamente. Na pequena varanda em frente à casa, sua amiga esperava ansiosamente.

“O que aconteceu com você hoje? Por que desapareceu assim, sem me avisar? Você nem me ligou... Tá tudo bem?”, indagou ela, preocupada.

Ethan permaneceu calado por um tempo, tentando achar alguma resposta para aquelas perguntas.

“Fala alguma coisa”, insistiu Bridgit, suavemente.

“Eu...” ele respirou fundo antes de continuar “Eu não estava me sentindo muito bem hoje de manhã... uma dor de cabeça, só isso, nada de mais”, ele respondeu, desorientado.

“E por que não me contou? Eu podia ter ficado aqui com você”.

“Não podia perder aula por minha causa”, afirmou ele.

“Sabe que pode contar comigo sempre que precisar”, disse Bridgit, olhando profundamente nos olhos de Ethan, esperando mais alguma resposta do garoto. Estudando o rosto do amigo, ela soube que havia algo que ele não queria lhe contar.

Não obtendo as explicações que esperava, Bridgit prosseguiu:

“Você não vai me explicar o que aconteceu naquele dia, na aula de História?” Indagou ela, calmamente.  

“Eu já disse Bridgit, eu só estava nervoso e estressado... Você não deveria se preocupar tanto”, respondeu ele, perplexo.

“Eu não entendo, Ethan! O que eu vi não era normal.... Foi muito sinistro. O jeito como você me olhou...”, ela confessou, agitada. A voz firme e intensa.

“Bridgit, tenta esquecer, tá legal? Não foi nada, confia em mim!”, Ethan tentou apaziguar a situação.

“Por que você não me diz a verdade?”, indagou ela, a voz enfraquecida, o olhar aflito.

 Seguiram-se alguns instantes de silêncio.

“Se temos segredos entre nós, eu me pergunto se somos realmente amigos”, declarou Bridgit, desapontada.

Ela virou-se subitamente, desceu a pequena escada da varanda e, caminhando a passos largos, desapareceu por entre as árvores.

Ethan não gritou, não tentou impedi-la de ir embora. Ele apenas ficou parado, imóvel, observando-a partir. Era o melhor que ele poderia fazer naquele momento.

..................

Ethan não conseguia parar de pensar em Bridgit. Era justo o que ele estava fazendo com ela? Amigos não deveriam manter segredos, ainda mais um como aquele, tão importante para a vida de Ethan. Será que a velha amizade entre eles chegaria ao fim? Como poderia dizer-lhe a verdade? Ele se esforçou para encontrar uma solução e consertar as coisas. Subitamente, seus pensamentos foram interrompidos pelo toque do celular.

“Oi Ethan. Aqui é o Grayson. Marcamos de estudar na sua casa. Estou livre hoje à tarde. O que você acha?”

Ethan refletiu por alguns instantes. Talvez fosse uma boa ideia. Enquanto estudasse com o seu amigo, poderia esquecer a discussão com Bridgit e finalmente manter o foco nos estudos, depois de tudo que aconteceu.

“Por mim tudo bem. A gente se vê, então”, respondeu Ethan.

Às duas da tarde, Grayson apareceu. Os dois começaram a conversar sobre as matérias da escola. Havia livros e papéis espalhados pela cama de Ethan.

“Quer começar por biologia?”

“Na verdade, quero sim”, respondeu Grayson. “Tenho uma dúvida no exercício que ele passou semana passada. Na questão seis, a resposta não seria apenas esse trecho? Ao invés disso, ele respondeu desenhando todo o ciclo da respiração”, ele explicou, apontando para uma folha de papel.

“É a maneira mais completa de explicar cada processo que a questão pede”, esclareceu Ethan. Ele começou a explicar todo o sistema cautelosamente. A saída de gás carbônico, a formação de enzimas e de energia, cada etapa e cada mecanismo envolvido.

Ele ficou surpreso por ainda manter tanto conhecimento, com tamanha riqueza de detalhes, mesmo depois de suas constantes distrações durante as aulas. Ele sentiu-se muito bem por voltar a se envolver com os estudos. Era o único jeito de esquecer os problemas à sua volta.

Nas horas que se seguiram, eles estudaram matemática, história e química, um pouco de cada matéria. Por volta das cinco da tarde, Ethan começou a ouvir uns latidos. Olhando pela janela, ele viu Sam pulando e saltando freneticamente.

“Eu vou lá embaixo ver o que ele tem”, disse Ethan.

Ele desceu as escadas, saiu para a varanda e encontrou seu cão alvoroçado e irrequieto. Apreensivo, o garoto foi buscar um pouco de ração para tentar acalmar o labrador. Mas Sam não quis comer. Ele continuou latindo incessantemente. Ethan não conseguia compreender o motivo daquela inquietação. Ele começou a acariciar lentamente as orelhas do cachorro. Levou algum tempo até que Sam ficasse sossegado e parasse de latir. Ethan observou enquanto o animal desaparecia na floresta.

Ele estava pronto para voltar ao seu quarto, quando se deparou com Grayson diante da porta. Ele segurava a mochila nas costas e alguns livros nas mãos.  

“Jeffrey acabou de me ligar. Vamos encontrar uns amigos hoje à noite. Estou indo para lá agora. Você vem comigo, não vem?” Percebendo uma expressão de dúvida no rosto de Ethan, Grayson acrescentou: “Vamos lá, Ethan! Vai ser divertido”.

O garoto pensou por um tempo. Até que seria uma boa ideia. Distrair-se um pouco. Ultimamente, ele tem passado muito tempo dentro de casa, afogado em pensamentos. Precisava esquecer todos os seus problemas, seus medos e preocupações, nem que fosse durante poucas horas.

Os dois começaram a caminhar, e dentro de quinze minutos, estavam em frente à Jack’s Burger, uma lanchonete que ficava a poucos quilômetros da casa de Ethan.

À medida em que a noite ia caindo, mais amigos juntavam-se a eles. As horas passaram-se rapidamente, mas Ethan nem percebeu. Era como se o tempo estivesse parado, como se aquele momento nunca fosse acabar. Ele não conseguia lembrar-se da última vez em que se divertiu tanto. Eles pediram lanches e bebidas, e em volta de uma mesa, seus amigos conversavam, rindo e jogando cartas.

Por volta das oito da noite, Ethan se deu conta de que estava ficando tarde. Ele se despediu dos amigos e começou seu caminho de volta para casa.

Sam o recebeu aos saltos, entusiasmado. O garoto afagou brevemente os pelos do cão. Em seguida, abriu a porta e subiu as escadas. Ao entrar em seu quarto, ele ficou subitamente alarmado. Todas as suas roupas, os seus pertences estavam espalhados pelo chão, sua cama estava desfeita, e as gavetas, abertas e reviradas.

Num ímpeto de desespero e sobressalto, Ethan correu para o seu armário e começou a procurar freneticamente a caixa de madeira onde havia escondido a pedra. Ao encontrar, ele parou por alguns segundos, atônito e ofegante. Em seguida, ele abriu. A caixa estava vazia.

..................

O único pensamento que ocupava a mente de Ethan naquele momento era o sumiço da pedra. Como aquilo havia acontecido? Alguém invadira o seu quarto enquanto estava fora. Alguém que o vira durante a noite na floresta, e que sabia que ele estava com a pedra. Como alguém poderia conhecer o seu segredo? De uma coisa Ethan tinha plena convicção: ele estava exposto agora, e a sua vida corria perigo. Ele precisava estar atento a qualquer ameaça, principalmente à noite, quando os riscos eram ainda maiores.

Estava ficando cada vez mais tarde. A meia-noite se aproximava. Ethan procurou alcançar o equilíbrio. Tentou manter a mente livre desses pensamentos. Era preciso estar concentrado em meio à escuridão da floresta.

Minutos depois, sob sua forma de lobo, ele começou a caminhar por entre as árvores, o vento gelado em seus pelos. Era uma noite calma e tranquila, como as anteriores. Ele sentia-se feliz por estar sozinho e poder vagar livremente por todos os lados. Era uma sensação incrível. Por mais que ele já estivesse habituado, era como se aquela fosse sua primeira noite como lobo. Toda vez havia uma sensação nova para experimentar.

Ele caminhou até chegar naquele espaço aberto no meio da floresta. O lugar onde tudo havia começado. Onde sua transformação havia acontecido. Aquele círculo tinha algo de especial. Ele sentiu que havia muitos segredos escondidos ali.

Ethan ouviu um súbito restolhar de folhas. Ele virou-se rapidamente para ver o que era. Não havia nada ali. Segundos depois, o barulho se repetiu, seguido de sons de patas e rosnar de lobos. Ele virou-se novamente, espantado. Nesse mesmo instante, uma alcateia emergiu vagarosamente da escuridão. Ethan conseguia enxergar apenas os olhos sombrios e ferozes que o encaravam com raiva. Os lobos foram saindo das sombras, e em pouco tempo, eles estavam diante de Ethan. Ele não conseguiu contar quantos havia exatamente. Estava tão desnorteado. Os lobos começaram a se dispersar, e quando Ethan menos esperava, ele estava rodeado pela alcateia. Não havia por onde escapar.

Em sua frente, um lobo de pelos negros como carvão e olhos vermelhos como sangue estendia-se, rangendo os dentes ferozmente, com uma expressão de ódio e rancor. Ele era diferente dos outros lobos, cujos pelos eram marrom-acinzentados.

Ethan olhou profundamente nos olhos do lobo negro. A fúria refletida ali era tão tenebrosa que ele sentiu arrepios percorrerem o seu corpo.

De repente, o lobo se aproximou, e num pulo veloz e impetuoso, ele saltou sobre Ethan, revelou as garras e começou a arranhar agressivamente a pele do adversário. Ethan sentiu uma dor profunda e insuportável, sangue escorria das suas feridas. Um formigamento acometeu todo o seu corpo, enfraquecendo-o aos poucos. Ele sentia sua pele rasgando-se. Os sons de rosnados ferozes preenchiam o ar. O lobo continuava agredindo-o cruelmente. Ethan se esforçou para defender-se, mas o inimigo era mais forte e astuto do que ele. Cada tentativa de escapar era inútil.

Quando seu corpo não tinha mais forças para lutar, ele despencou no chão e ficou imóvel, praticamente inconsciente. Não tinha noção do que acontecia à sua volta. Sua visão estava embaçada. A única coisa que pôde enxergar com um pouco de clareza era os lobos retornando para a escuridão da floresta. Segundos depois, o silêncio preencheu o ar. Ethan estava sozinho. Ele permaneceu estendido na terra úmida, naquela noite fria, deitado no chão, sob a luz da Lua.  


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Os Mistérios de Ethan Quinn" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.