Choque de Tempo escrita por Miss Krux


Capítulo 17
Capítulo 17 – Algumas mudanças.




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Todos os moradores estavam agora juntos na mesa do café da manhã. Ainda que William estava no lugar de John, este, por sua vez, preferiu não falar nada, não pedir o lugar de direito, principalmente pelo fato de a trégua entre eles parecer estar dando certo. Marguerite sentou-se no seu lugar de costume, mesmo que quem sentava ao seu lado não era John, mas isso era algo que não tinha tanta importância assim.

Todos conversavam sobre a rotina do dia que teriam pela frente, sobre alguns planos. Challenger, Malone e William iam explorar o platô por meio do balão, assim o homem recém chegado poderia conhecer um pouco mais o local, além de dar a oportunidade do cientista testar mais uma vez o funcionamento do balão, o qual já estava um tempo parado e sem fazer os testes devidos.

Verônica optou por ficar, pois a casa precisava ser limpa e Marguerite teria que se dividir entre lavar e costurar as roupas, além de cuidar do caçador, que ainda ficaria de repouso nem que fosse apenas por mais este dia. Challenger o havia avisado que quanto menos esforço fizesse, melhor e mais rápido seria sua recuperação, embora este teimava em dizer que já estava muito bem.

William, de certo modo cavalheiro, decide se oferecer para ajudar, sabendo que as mulheres ficariam sobrecarregadas e até para poupá-las de tal esforço.

W - Se quiserem, posso ajudar Verônica com o jantar quando retornar, já que devemos voltar antes do escurecer. E, Marguerite, posso lhe ajudar a cuidar do meu irmão durante a noite.

Verônica foi a primeira a se pronunciar; não conhecia bem o estranho, mas pôde observar que seus modos eram de fato os de um homem muito bem educado.

V - Agradeço, William. Vou querer sua ajuda sim.

W - Certo então, Verônica, faço com gosto. Marguerite?

John mais uma vez torna a responder por Marguerite, se antecipando na resposta que, por sinal, foi um tanto grosseira.

J - Obrigada, William, mas ela não precisa de sua ajuda. A partir de hoje mesmo iremos dividir o mesmo quarto, não há com o que se preocupar.

Marguerite não gostou do modo áspero como o caçador havia respondido e muito menos por, mais uma vez, responder em seu lugar. Aquilo definitivamente já a estava irritando e sabia que se quisesse que ele parasse com tais atitudes ela mesma teria que cortar e desde já.

M - Obrigada, Lord John Roxton, por mais uma vez me interromper grosseiramente. Sabe eu tenho boca para conseguir responder por mim mesma. William, obrigada por sua oferta, mas dispenso. Como seu irmão já fez o favor de responder, e muito educadamente, a partir de hoje planejamos dividir o mesmo quarto.

Malone, por sua vez, não aguenta e acaba por fazer um comentário ingrato.

N - Estão pensando em dividir o mesmo quarto? Vocês dois? Assim com esse clima? Digo, do modo como estão?

Challenger e Verônica chegam a trocar olhares, pois sabiam que a herdeira não iria perdoar tal comentário. John certamente não se importaria, mas Marguerite já olhava para o jornalista por cima de sua xícara de café, um olhar que não precisava ser explicado e fazia Malone se arrepender de imediato do comentário. Os olhos da herdeira, verdes, estavam brilhando de raiva, e a mesma raiva era demonstrada por seu rosto corado e a expressão que ficava ainda mais carregada.

M - Não, Malone, pensei em dividir meu quarto com um maldito selvagem. Quem sabe com um guerreiro Zanga? Claro que é com John! Com quem mais poderia ser? Quanto ao clima, deveria checar as temperaturas, pois está ficando quente sabia? Fervendo, para você.

Antes que algum deles pudesse responder algo, a herdeira se levantou e foi seguindo para o elevador. Ela sabia que o dia seria exaustivo, infelizmente as roupas haviam se acumulado e ela tinha que cumprir com as suas tarefas antes que Verônica começasse a pegar em seu pé, e no momento tudo o que ela não precisava era de mais um enchendo a paciência.

Os demais ainda ficaram na mesa do café da manhã. Malone agora não conseguia nem sequer olhar para os amigos de tão encabulado que se sentia, sabia que tinha ido além de seus limites com a herdeira, tinha que aprender a segurar-se mais quanto a esses comentários. John também havia levado uma resposta atravessada da mulher, na verdade, não teve tempo nem de revidar. Challenger já descia para o laboratório para pegar seus instrumentos, mochila e demais itens.

William ajudava gentilmente a garota da selva a retirar a mesa do café, conversando com Verônica sobre os planos para o jantar, pois ele conhecia vários molhos, vários tipos de culinárias que aprendeu em suas viagens ou mesmo com a mãe. Porém, não podia deixar de pensar no comportamento da herdeira, sentiu-se preocupado; sentia certa afinidade por ela e mesmo uma vontade de protegê-la - talvez a mesma vontade que John sentia e, por isso, lhe despertava tanto ciúme. Em um tom baixo para que só Verônica pudesse ouvir, ele acabou por perguntar algo que estava “engasgado”.

W - Verônica, me desculpe, sei que nada tenho a ver, mas Marguerite ficará bem sozinha lá em baixo? Ou melhor, ela não está bem, me pareceu estar com o semblante carregado, não seria adequado alguém ficar com ela?

Verônica, antes de responder, analisou a expressão do homem ao seu lado. Sabia que ele estava sendo sincero, tentando ser gentil, mas sua preocupação por Marguerite poderia causar problemas, já que John parecia estar um tanto enciumado e o casal também não aparentava ter tido uma manhã agradável, era melhor preveni-lo.

V - William, ela ficará bem, posso lhe assegurar. As vezes todos nós precisamos passar um tempo sozinhos. Agora um conselho que te dou: não se aproxime muito, pode se ferir. Ela é a esposa do seu irmão e, quando se trata de Marguerite, John não pensa duas vezes para agir.

W - Claro, entendo-o perfeitamente. Se eu estivesse no lugar dele faria o mesmo. Porém, não estou. Vou seguir seus conselhos, Verônica, acho que pude ver na expressão de meu irmão sua fúria e ciúme ontem.

V - É, ele não estava para brincadeiras. Mas fico feliz em saber que estão tentando manter uma trégua.

W - É. Tentando. Espero que dê certo.

V - Eu também, para o bem de todos nós.

Não demorou muito para que William, Malone e Challenger partissem. Levavam, além de suas armas, mochilas e instrumentos, alguns alimentos, pois pretendiam passar o dia fora. Já passando pela cerca elétrica, William não pôde deixar de perceber, em um canto mais afastado, a herdeira apenas com a sua calça cáqui, botas e uma mini blusa branca, o cabelo trançado. Ela estava de costas, o cinto sobre a mesa assim como um recipiente com água e roupa e mais dois próximos no chão.

Ainda que discretamente, ele não desviava o olhar; era sem dúvida uma mulher que tinha presença, que era notada por onde passava. A pele branca agora mais exposta o deixava ainda mais atordoado. Não era só paixão, tinha o desejo de tocá-la, de beijá-la, de poder tê-la em seus braços. Porém, vendo pelo lado racional, ele não podia, pois ela era esposa do seu irmão e se John apenas desconfiasse destes pensamentos na certa estaria por cima dele em questões de segundos. Ainda que machucado, a idade só havia feito bem ao seu irmão, estava mais forte e provavelmente mais ágil, só não revidou a surra anterior por ainda estar em choque, senão William tinha dúvidas que o venceria em um confronto.

C - William, está tudo bem?

W - Sim, claro, professor. Por que? Algo de errado?

C - Não, é que você parecia estar com a cabeça em outro lugar.

W - Ohh… Não, não, imagina. Estava pensando que terei o prazer de conhecer melhor esse lugar, nas possibilidades que terei nesse tempo que estiver com vocês.

Challenger não havia reparado no olhar do jovem sobre a herdeira, não usou de malícia em seu comentário. O jornalista, porém, já estava um tanto quanto desconfiado; ele notou o olhar de William, mas por hora talvez fosse melhor não falar nada, isso só causaria mais problemas - e problemas era algo de que eles estavam fugindo, ou tentando.

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O dia passava na mais perfeita paz.

Marguerite lavava as roupas ainda que o horário do almoço estivesse se aproximando; ela não sentia nem apetite, nem desejos de subir e ter que conversar com alguém ou dar satisfação; estava bem sozinha e precisava daquele momento. Precisava também descobrir como usaria de forma correta o Oroboros e como iria contar sobre isso aos demais. Além disso, também teria que lidar com um John enciumado; ela não esperava por tal reação e não se lembrava de tê-lo visto assim, não como estava dessa vez. Sabia que, ainda que o comentário de Malone tivesse sido ingrato, ele tinha razão e ela mesma ainda tinha dúvidas em ter que dividir seu quarto, mas não poderia voltar atrás.

Verônica limpava a casa, varria, esfregava, passava um pano no chão, tirava o pó.

John, ainda que machucado, estava cuidando de cortar os legumes e as carnes para preparar o almoço. Ele, assim como William havia feito mais cedo, se ofereceu para auxiliar Verônica; nunca foi de ficar parado e não seria agora que alguns ferimentos leves iriam detê-lo.

As horas passavam, o almoço já estava terminado, a garota da selva colocava a mesa, e nada da herdeira subir.

V - Acho melhor eu ir chamá-la.

J - Não, Verônica, eu vou. Digamos que precisamos conversar.

V - Tem certeza, John? Ainda não pode ficar se esforçando tanto.

J - Tenho sim. E não irei me esforçar, vou usar as muletas antigas de Challenger. Além disso, Marguerite está dentro do parâmetro da cerca elétrica.

V - Como preferir. Quer que eu espere por vocês?

J - Acho melhor não. Isso pode demorar.

Verônica apenas lhe fez um aceno de positivo.

O caçador, com auxílio das muletas para não se esforçar muito, logo desapareceu no elevador. Já no chão, pôde ver a figura da mulher. As roupas todas lavadas e estendidas, a herdeira estava apenas sentada no chão apoiando as costas no tronco da árvore, com os olhos fechados, sua expressão, ainda que bela, era notório que estava pesada e também até um pouco mais pálida que o normal. O nervoso que eles haviam passado infelizmente tinha afetado a todos, principalmente ela. Naquela manhã ela estava com os nervos a flor da pele. John também soube por meio de Verônica que a herdeira quase atirou em William, o que lhe provava que a mulher estava de fato irritada, no mínimo, e que para o seu próprio bem o mais sensato a ser feito era pedir desculpas. Ele tinha culpa, ou pelo menos parcialmente.

O caçador tentou se aproximar o mais devagar possível para não fazer barulho caso ela estivesse dormindo, porém, para sua surpresa, a herdeira abre os olhos e o encara. Ela provavelmente só estava descansando, aproveitando o pouco tempo que tinha.

M - O que faz aqui?

J - Vim lhe chamar para o almoço.

M - Estou sem fome, dispenso. Só isso?

John ainda ponderou um pouco sobre a resposta que devia lhe dar e por mais que a herdeira talvez fosse lhe rechaçar ele não poderia deixar as coisas como estão.

J - Não, Marguerite, não é só isso.

M - Pois então diga logo, ainda tenho muito o que fazer.

J - Se você deixar.

Os dois se olharam por um breve instante encarando-se nos olhos, até que o caçador prosseguiu, visto que a morena estava disposta a ouvir.

J - Acho que lhe devo desculpas. Não só por ter sido rude mais cedo, mas por ter lhe atravessado e antecipado suas respostas. Na verdade, respondendo eu mesmo por perguntas que foram feitas para você. Por também ter dormido em seu quarto sem consultar; nunca foi segredo para ninguém que não gosta que invadam sua privacidade. Mas também peço pelo menos que procure entender, eu não sabia onde dormir e ainda em meu estado não poderia ser no chão ou no sofá. E acho que o mais importante: desculpe por ter me incomodado a respeito de William.Sabe, Marguerite, quando mais novos sempre brigávamos por causa de muitas coisas, uma delas eram mulheres. Ainda que ele não fosse tão mulherengo como eu fui, e hoje não me orgulho disso, ele sempre soube como me roubar namoradas. Será que pode me desculpar?

Marguerite o especulava, cada expressão, cada movimento, ela mesma nem sequer saiu do lugar. Ainda que as desculpas de John fossem sinceras, não era o que ela queria exatamente ouvir.

M - Quanto a responder por mim, já te falei que tenho boca e não preciso que ninguém faça. Dormir meu quarto… Bem, admito também ter agido por impulso, mas você poderia muito bem ter escrito um bilhete e deixado ao meu lado explicando a situação ao invés de me fazer acordar achando que tinha lhe acontecido algo.
Quanto ao seu irmão, você está com ciúmes e, se quer saber, quero sim ouvir você dizendo isso. E outra: você não era mulherengo, você é. Se me lembro bem, até poucos meses você não sentia vergonha disso. Não preciso citar quantas mulheres aqui no platô você já teve e eu não sou uma namorada qualquer que seu irmão lhe roubou, sou sua esposa; acredito que ele não ousaria, até porque se fizesse eu sei me cuidar muito bem, com ou sem você por perto.
Agora, se não tem mais nada para falar, preciso terminar meus afazeres, não quero saber da Verônica me pegando no pé hoje. Aliás, meu dia hoje não poderia melhorar, não é mesmo?

A herdeira já estava de pé e simplesmente saindo de perto do caçador, o quanto antes melhor. O pedido de desculpas dele só a fez ficar ainda mais enfurecida. Ele preferia manter sua honra de homem intacta do que admitir que havia sentido ciúmes. Porém, o caçador, após assimilar tal resposta de Marguerite, resposta que o fez sentir-se mal e cobri-la de razão, decidiu pelo menos uma vez deixar sua honra de lado. Ela valia e merecia mais do que isso.

J - Está bem, está bem. Eu estou sim com ciúme. Não aguentei ver meu irmão flertando com você, senti como se meu sangue fervesse. Já havia sentido ciúme antes e você sabe disso, mas não assim. Talvez por ele ser meu irmão, por nós dois, digo eu e você, termos um relacionamento agora. Eu tenho medo de perdê-la, Marguerite. Me desculpe, mas me deixei levar pelo ciúme. Só não pensei que esses atos fossem atingir você, sabe muito bem que eu daria tudo o que tenho para lhe proteger.

A herdeira estava de costas para John podendo, assim, deixar que um sorriso lhe atravessasse os lábios sem que ele percebesse. Sentia-se vitoriosa de certa maneira. Quem poderia imaginar, o famoso caçador, mundialmente conhecido, com ciúme? E pior, admitindo estar sentindo ciúme.

Ela ainda ficou um tempo virada, saboreando o gosto de ter ouvido tais palavras; não que aprovasse o sentimento, pois John tinha que confiar mais nela, mas era algo diferente e que ela gostou de saber.

J - Marguerite? Não vai me responder? Quero dizer, pelo menos me dizer se pode me desculpar?

M - Você não sabe esperar, não é mesmo?! Nunca vai aprender. Mas sim, acho que desta vez posso lhe desculpar. Com uma condição, claro.

Os dois agora se encaravam. John a olhava profundamente nos olhos no intuito de descobrir que condição seria esta que ela iria impor. Embora soubesse decifra-la como ninguém jamais soube, ainda tinham certos traços que ele mesmo reconhecia que precisava aprender mais um pouco.

J - Qual condição?

M - Quero que confie mais em mim. Sei que já faz isso e que talvez eu esteja lhe pedindo demais, mas tem que fazer, John, tem que confiar em mim. Eu nunca te trocaria e sabe muito bem que de todas as vezes que flertei com algum homem foi para nos salvar de encrencas. E se não puder confiar em mim, acho que não faz sentido permanecermos juntos.

O caçador não escondeu sua expressão de espanto. Não ele não iria perde-la, não agora. Só Deus sabe o quanto ele teve que lutar para conquistá-la e agora, por causa de um ciúme besta, não iria arriscar. Sim, ele aceitaria tal condição, nada mais justo.

J - Aceito sua condição, Marguerite. Ainda que pareça difícil, você está certa, eu deveria ter confiado mais em você e irei, daqui em diante, me empenhar em fazer, em confiar mais em você.

M - Certo. Já que aceitou minha condição, suas desculpas estão aceitas. Porém, John, eu prefiro hoje, agora, permanecer sozinha. Estou sem apetite, não vou subir para comer, e logo também tenho que ir costurar algumas peças que estão lá em cima. Além do mais, já terei que lidar com você à noite se bem me lembro.

J - Sim, terá. Bem, eu ainda acho que deveria subir e se alimentar, mas não irei insistir por hoje.

John pensa em ir até a morena e lhe depositar um beijo afetuoso na testa como costumava fazer, mas antes que pudesse a herdeira o barra com uma mão na frente de seu tórax fazendo-o recuar diante o ato.

M - Não, John, agora não.

Marguerite vira-se de costas mais uma vez sem nem sequer olhar para trás, o deixando sozinho, e segue rumo ao varal de roupas para estender mais algumas peças e recolher outras que com o calor do sol já haviam secado. O caçador, diante de tal cena e percebendo que, de fato, ela não queria conversar, também seque para o elevador.

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No balão, sobrevoando o platô, William se sentia um jovem estudante entusiasmado ao ver tais espécies de dinossauros que, claro, estavam extintas a milhares de anos, menos não naquele lugar. O homem era deveras estudioso, sabia o nome de cada uma das espécies vistas. Também conhecia determinadas propriedades, do que se alimentavam, o tamanho, se eram herbívoros ou carnívoros. Challenger, claro, como cientista e como bom estudioso, admirou tal capacidade de William. Além de poder compartilhar com alguém suas experiências, ele era um bom ouvinte.

Malone, embora soubesse que os dois irmãos não se davam muito bem, admitia que William era uma companhia agradável, um grande entendedor de diversos assuntos. Era nítido como ele conhecia sobre muitas coisas, até mesmo o balão ele sabia como pilotar.

C - William, onde aprendeu sobre todas essas coisas?

W - Um pouco aqui, um pouco lá. Fiz muitos cursos, assisti várias palestras, sempre estava lendo algo inusitado, diferente, minhas viagens também me proporcionaram diversos conhecimentos.

C - E o que o induziu a aprender, William? Digo, não foi só por negócios da família. Bem, em pouco tempo que o conhecemos podemos ver que tem domínio sobre diversas áreas.

W - Nada em especial, Professor. Sendo o oposto de meu irmão, que ama aventura, eu sou mais caseiro e também sempre pendia mais para o lado de minha mãe, que, como sabe, é uma mulher bela, sofisticada, educada, prendada, dotada de conhecimentos vastos. Uma perfeita Lady, diga-se de passagem. E como eu era o sucessor do título, me empenhei em não só manter a linhagem, mas também com a mesma classe que ela possuía. Na verdade, admito que pude reparar que embora impulsiva e impiedosa, Marguerite parece ser alguém assim como minha mãe.

C - Marguerite sempre nos surpreende. Ela tem um conhecimento vasto. Suas especialidades são pedras e línguas, mas ainda assim conhece muitas outras áreas.

N - Sim, ela também já viajou muito, mas a sua vida até mesmo para nós é um mistério.

Challenger olha para o jornalista como um sinal para que não revelasse mais que o suficiente e que mesmo o detalhe falado já era demais.

W - Um mistério? Por que um mistério?

C - Por nada meu caro, por nada. Como te falei, Marguerite preza muito por sua privacidade e é melhor não se intrometer onde não é chamado. Ainda mais em se tratando dela, da vida dela.

N - Isso é verdade, William. Ela pode ser letal em se tratando de sua privacidade, sua vida. John demorou todos esses anos para conquistá-la e ainda às vezes acho que tem muita coisa que ela esconde dele. Porém, isso cabe aos dois, não a nenhum de nós.

W - Sim, isso eu entendo perfeitamente. Só não consigo ver esse perigo, ainda mais letal, que vocês veem. Sei que ela pode machucar, mas matar... Acho que é um pouco de exagero. Além do mais, se minha família souber dos segredos dela, de quem ela é, como se referem, duvido que John ficará com ela. Não irão permitir, tentarão de tudo para separá-los.

Challenger e Malone trocaram mais uma vez um olhar cúmplice, ambos sabiam que o casal teria que enfrentar diversos problemas se voltassem a Londres, mas que a família Roxton iria fazer de tudo para separá-los os deixou um tanto preocupados com o destino de John e Marguerite.

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Estavam já todos reunidos na casa da árvore, passava do horário do jantar.

Malone, John e Challenger tiravam a cama do caçador de seu quarto para transferir para o da herdeira e também levavam mais algumas coisas, itens pessoais.

Marguerite observava de perto a mudança. O quarto era grande e, ainda que tivesse talvez que se desfazer de alguns itens que ela não usava mais, tinha sobrado um espaço relativamente bom para os dois.

Após terminarem a mudança, John preferiu não subir novamente, estava sentindo dores nos ferimentos; como Challenger o explicou, talvez tenha se esforçado demais naquele dia. Marguerite subiu para buscar o kit médico e ainda aproveitou para tomar mais uma xícara de café. John havia feito antes do jantar e o café dele era sem dúvida o melhor que já havia experimentado. William estava ao seu lado também servindo-se de uma dose da bebida.

W - O café está muito bom, não está, Marguerite?

M - Está sim.

W - Foi a senhorita quem fez?

M - Não, foi o John. Eu não costumo chegar perto da cozinha, senão para comer.

W - Meu irmão, de fato, se superou no café. Está muito bom. Sabe, isso é um dom de família.

M - O que é um dom de família?

W - Temos muitas qualidades, isso é um dom. Veja, ambos são educados, sabemos cozinhar muito bem, viajamos por vários lugares do mundo…

M - Ah sim, claro. E ambos também tem a mesma cantada barata. Aposto que falam isso, esse tipo de coisa, para toda mulher bonita que verem. Boa noite, William.

A herdeira se despede dos demais e também decide se juntar a John. Na verdade, nem mesmo ele Marguerite queria por perto, mas a situação dos dois não permitia que ela escolhesse.

Já em seu quarto, Marguerite estava refazendo o curativo do caçador. Ela não parecia bem, estava calada demais, uma vez ou outra olhava para o caçador, expressava um sorriso “torto”, mas nada mais que isso.

O homem já estava com suas roupas de baixo para dormir, sabia que talvez nem para ele e nem para Marguerite aquela noite não seria como imaginaram ter para a primeira que dormiam juntos. Marguerite também se troca por trás de seu biombo, estava com um pequeno short branco de renda e a blusa que lhe fazia o conjunto. John estava deitado do lado esquerdo, ela logo deitou-se do lado direito, mas não conseguia pronunciar nenhuma palavra, nem expressão, estava apenas olhando para qualquer canto de seu quarto, mesmo sabendo que os olhos do caçador estavam nela. Este, por sua vez, sabia que ela ainda estava chateada, que queria ficar sozinha, mas tinha receios que tivesse algo a mais, algo que Marguerite não queria contar.

J - Marguerite, tem algo que queira falar? Está diferente hoje.

M - Só estou cansada, minha cabeça parece que vai explodir. Nada demais.

J - Tem certeza? Parece abatida e dispersa.

M - John, como queria que eu estivesse? Nós não dormimos, não comemos corretamente. Eu, principalmente eu, não sendo egoísta, só passei nervoso e tive que assumir a frente de tudo como se não tivessetivessem homens nessa casa. Além disso tudo, quero ver como Challenger irá levar seu irmão para o tempo certo ou, pior, e se não conseguir? Se tiver que ficar conosco? Já pensou nisso? Ou só esteve pensando nos seus ferimentos e orgulho ferido.

J - Ei, espera aí! Calma, Marguerite. Eu já pensei, sim, em tudo isso. Acha o que? Que sou tão egoísta ao ponto de não pensar nos outros, ou em você? Marguerite, eu penso mais em você, do que em mim mesmo. Mas você não pode resolver tudo, nós sempre conseguimos, não é mesmo? Tenho certeza que Challenger vai encontrar uma solução para tudo isso. Agora, por que você não dorme um pouco? Talvez seja isso que está precisando.
M - Pode ser. Talvez tenha razão, sempre conseguimos.
J - Sim. Então, aceita?

Marguerite observou ainda um pouco o caçador com os braços estendidos para que ela se aconchegasse, para que repousasse nele; era um dos poucos lugares do mundo que a fazia se sentir segura, os braços e abraços de John, onde que sabia que nada nem ninguém poderia lhe ferir. Ela se aproxima, depositando sua cabeça entre um dos braços e o tórax de John, abraçando-o de volta e, por mais incrível que parecesse, em poucos minutos a herdeira dormia, enquanto o caçador lhe acariciava os cabelos soltos. Logo, os dois adormeciam assim juntos, abraçados, oferecendo proteção um ao outro. Agora que tudo tinha se acertado, que eles estavam bem, assim como os demais também estavam.


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