Chocolate Amargo escrita por mikaheeel


Capítulo 1
Hipnoze




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/678183/chapter/1

 

 

Meus pensamentos variavam entre sobre o quanto entediada eu estava e a obrigação de prestar a atenção na aula daquele professor que gesticula demais, desviando meu olhar do power point para suas mãos.

A porta da sala range, logo abrindo. Meus pensamentos tediosos são interrompidos por uma figura esguia e preta que adentra a sala. Levanto meus olhos preguiçosos e observo tal figura percorrer a sala até o meio. Sua roupa era preta, seu sapato era preto, seu cabelo era preto... Tudo preto, menos sua pele, que mais parecia uma pedra de marfim do que uma pele humana. Hipnose é a descrição para o que eu estava sentindo, já que não conseguia mover meus olhos para outro alvo a não ser aquele moço. Seu cabelo era tão preto quanto carvão e sua franja ultrapassava seus olhos, que também eram negros. Aquelas roupas, aqueles piercings... Algo me intrigava naquela composição. Foi então que a boca daquela figura começou a movimentar-se, dando sinais de que iria falar e eu, claro, só consegui prestar a atenção em suas breves palavras.

 

— Venho representando o quarto ano para convidá-los a nossa exposição, que será na próxima sexta-feira, no saguão do prédio de Design. Quem for prestigiar ganhará as devidas horas extracurriculares. Aguardamos vocês.

 

Da mesma forma silenciosa que entrou, aquela pessoa atravessou a sala e saiu. E eu só conseguia – pelo menos durante as próximas três horas – pensar em “próxima sexta, próxima sexta...”

 

—_________________________________________________________

 

 

“ Hell, Sandrine, tais me ouvindo?!?” E foi isso que mais escutei naquele dia, já que a única coisa em que conseguia prestar atenção era na memória de quando vi aquela pessoa adentrar a sala. A pessoa que está brava comigo se chama Charlie, e a considero minha melhor amiga. Ela é Canadense, porém veio morar no Brasil há uns quatro anos, juntamente com seus pais, que são brasileiros.

— Oi, agora tô. - Levantei meu olhar e o direcionei aos olhos azuis acinzentados de Charlie, logo

lançando um sorriso desajeitado de desculpas.

— Que pensas tanto que nem minha voz penetra nessa mente? - Ela perguntou, bufando e revirando os olhos.

— Em nada... Na verdade estava cogitando a ideia de ir naquela exposição do quarto ano, lembra? - Me acomodei um pouco no banco de madeira em que estávamos sentadas, com a intenção de omitir o quão eu estava pensando nesta exposição.

— Não sei, maybe... Posso te acompanhar, afinal vamos ganhar horas, né? - Charlie levou a boca de uma garrafinha com água até seus lábios carnudos.

— Pois é, tava pensando em ir por causa disso. É bom a gente já se preocupar com essas coisas desde agora, pra não ficar correndo atrás depois... - Respondi para Charlie pensando ' Aham, claro que é SÓ por causa disso, claro...'.

— Tens razão. Podemos ir, então.

— Certo, então temos compromisso pra sexta. - Lancei uma ligeira piscada para Charlie.

 

Levantamos do banco em que estávamos e seguimos pelo corredor do prédio até a saída e de lá seguimos rumo à nossas casas. O caminho era interessante, pois sempre passávamos por uma praça onde ficávamos nomeando as árvores. Charlie morava com seus pais na mesma cidade, e eu morava na cidade vizinha, porém vim para a atual para estudar. Aqui não é exatamente um paraíso, já que o trânsito é um tanto desgovernado, e a violência tem doses maiores do que eu gostaria. Porém, é uma cidade que tem seus pontos queridos: é pequena mas não tanto, pois tem muitas coisas culturais para se fazer e, também, lugares legais e diferentes pra ir. Gosto daqui mas realmente não tenho um motivo para ficar.

Desde que fiz dezessete anos estou morando aqui para cursar Design. Meus avós me criaram e sempre me ajudam com as despesas, mas eu gosto de ter meu próprio dinheiro, então trabalho num café alternativo daqui da cidade. Minha vida se resume a basicamente três atividades: ir para as aulas, ir trabalhar, visitar meus avós. É bem monótomo.

 

—_________________________________________________________________

 

Um barulho agudo e irritante soa. “Despertador do inferno” é a primeira frase que penso no dia, e ela me vem à cabeça quando acordo exatamente as 6:15 da manhã, graças a maravilhosa melodia do meu despertador azul.

 

— Preciso comprar um celular e usá-lo como despertador... Ao menos uma música melhor deve ter.

 

Levanta, lava o rosto, escova os dentes, muda de roupa, come algo. Todos os dias a mesma coisa e eu nem percebo. Como a vida vai nos empurrando e, quando vemos, passamos anos fazendo uma mesma coisa. O que mais me motiva a levantar da cama todos os dias é ir pra aula e encontrar Charlie. Nós realmente nos damos bem e ela é minha melhor amiga, a pessoa que mais me entende. Eu adoro passar meus dias com ela, ver aquele cabelo rosa bebê e suas bochechas vermelhas e gordinhas. Apesar dela ser muito magra e pequena, suas bochechas são fofas e grandes. Nos conhecemos no curso de Design, pois entramos juntas. Charlie quem veio falar comigo me pedindo informações sobre os horários, e quando vimos nos tornamos amigas e já se passou quase um ano.

Ela sempre me acompanha em tudo, seja festas ou no caminho de volta pra casa. Não fizemos muitos amigos no curso, na verdade nenhum. Mas não nos importamos, pois temos uma a outra e isso já me é bastante. Muitas vezes sinto que Charlie sente-se um pouco responsável por mim, principalmente se estou triste ou chateada. Ela pensa que por eu morar sozinha, me sinto só e ou abandonada e é função dela amenizar isso... Mas não é verdade e eu já falei isso muitas vezes pra ela. Mas confesso que gosto quando ela faz isso, pois me sinto importante e amada.

Termino de comer minha batida vitaminada e abro a porta da pequena casa onde moro. A luz juntamente com o cabelo rosa e o bom humor de Charlie me cegam por alguns segundos.

 

— Bom dia, San!!

— Bom dia. Acordou bem?

— Tô muito bem, e tu? Sonhei que estávamos viajando.

— Tô bem, até. Viajando onde? Gostaria de ir viajar...

— Acho que era Canadá. Pelo cenário de floresta e lagos, parecia bastante. Nós realmente deveríamos viajar!

 

É sempre assim: vamos conversando até chegar no prédio onde temos aulas. E lá, conversamos mais um pouco durante as aulas chatas. Posso dizer que Charlie me salvou, pois quando vim pra cá acreditei que fosse virar a excluída da turma, que ninguém iria falar comigo e eu não teria ânimo para falar com alguém. Obrigada, Charlie.

Chegamos ao prédio e a primeira sala que passamos é o saguão. Lá ficam muitos estudantes conversando até que as aulas comecem. Eu e Charlie estávamos cruzando o ambiente quando um vulto negro apareceu em minha visão periférica. Sem parar de caminhar virei minha cabeça para aquela forma que me chamou a atenção. Era aquela pessoa... aquela do quarto ano que foi fazer o convite para a exposição. Ainda andando, não consegui tirar os olhos daquela figura que olhava para um quadro de avisos. Percebi que ela movimentou-se e gelei, logo desviando o olhar. O que prende tanto a minha atenção àquele moço pálido? Realmente não sei, mas desde aquele dia meu olhar tornou-se impossível de controlar quando ele está por perto.

 

— Hey! Tá me ouvindo?! Olha pra frente ou vai bater em alguma coisa. - Charlie notou minha falta de atenção e bufou.

— Desculpa, me distraí por alguns segundos...

— No que estavas pensando ou olhando?

— Nada demais... apenas uma pessoa.

 

Realmente não sei o por que, mas aquela pessoa estranhamente me hipnotiza.

 

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Chocolate Amargo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.