Tudo de Mim escrita por Mi Freire


Capítulo 34
Grandes mudanças.




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As horas nunca passaram tão depressa e cada segundo que ficamos juntos sem nos desgrudar nem por um momento não pareceu o bastante quando chegou o terrível momento de soltá-lo e dizer adeus.

Não prometemos que ficaríamos juntos mesmo distantes um do outro por sabe-se lá quanto tempo. Não prometemos não ficar com outras pessoas. Não prometemos que quando ele voltasse, se é que voltaria, largaríamos tudo e retomaríamos de onde paramos. Mas prometemos, com toda certeza, que manteríamos contato sempre que possível.

O voo dele sairia muito cedo e por um momento eu cogitei ficar na cama e não sair dali por nada. Fechar bens os olhos, esperar as horas e dias passarem e perceber que aquilo só tinha sido um pesadelo cruel e maldoso com nós dois.

Mas não foi bem assim que aconteceu.

Acordei sim muito cedo e me arrastei até o chuveiro, troquei de roupa, engoli qualquer coisa e fui ao aeroporto junto dos meus amigos para nos despedir.

Eu não tinha prometido que iria, porque disse que seria muito difícil para mim e que tornaria tudo tão mais doloroso. Mas no fundo, eu sabia que ele torcia para que eu aparecesse para nosso último beijo e nosso último abraço e trocar de olhar.

— Você veio. – Ele veio na minha direção, deixando todos para trás e me pegou nos braços, tirando-me do chão.

— Eu não vou chorar, eu não vou chorar. – Digo, olhando para ele com o meu melhor sorriso.

— Tudo bem. Pode chorar. – Ele segurou meu rosto com as duas mãos, muito perto do dele. — Eu vou chorar com você.

E bastou ele dizer aquilo para começarmos a chorar juntos.

Foi ridículo.

Fiquei grudada nele o máximo que eu podia, próximo aos seus pais e nossos amigos, que estavam por ali, em volta, conversando normalmente, como se fosse só mais um dia normal.

Até que começarem a anunciar o voo dele para todos os lados.

Me afastei, sentindo-me muito pequena e incapaz, deixei que todos se despedissem primeiro.

— Eu te amo. – Disse ele por fim, quando foi a minha vez de me despedir.

Eu queria tantas coisas naquele momento: sequestra-lo, leva-lo de volta pra casa, ajoelhar e implorar que ele ficasse, pedir para ele me levar junto, pedir só mais alguns dias, me agarrar a ele e não deixar ele ir, mas tudo que eu fiz foi abraça-lo bem forte, o máximo que eu podia mesmo que doesse e depois eu o beijei, com toda vontade que eu sentia. Beijei ele com todas as minhas forças, sem me importar com nada.

— Eu amo você.

E ele se foi, olhando para trás e acenando o tempo todo, até desaparecer de vista e eu sentir que não tinha mais forças, eu ia cair a qualquer momento.

Fabi deve ter percebido meu mal-estar e me agarrou, me levou até o banco vazio mais próximo, enquanto o Chris saiu em disparada, para pegar água.

— Ei, não chore mais. – Disse ela, como uma mãe, me abraçando e passando a mão no meu cabelo enquanto eu me sentia muito diminuída e desprotegida. — Por favor, Luci, não chore.

Sabe o que doía mais do que vê-lo partir? Deixa-lo partir quando tínhamos tudo para sermos felizes juntos, um ao lado do outro, mas infelizmente não foi assim.

Bebi água e tentei me acalmar, afinal, tínhamos que ir embora.

— Você sempre será especial para ele. – Disse sua mãe, pegando na minha mão, quando caminhávamos para a saída do aeroporto.

Já em casa, fiquei no meu quarto, deitada pelo resto do dia. Nem levantei para comer, o que já parecia ser um sinal muito grave de que eu não estava bem.

Mas pelo menos meus pais entendiam e não pegaram no meu pé.

Era isso: eu precisava de um tempo sozinha.

Só acordei muito tarde no outro dia e quase me esqueci de que aquilo era real. Mas quando olhei no celular e vi que não tinha nenhuma mensagem dele de “Bom dia” eu me lembrei que ele estava muito longe de mim agora.

Será que já tinha chegado?

E se sim, porque não me ligou ainda?

— Oi, gente. Bom dia! – Desci para comer algo. Estava fazendo um dia muito bonito lá fora, que não combinava em nada com o que eu estava sentindo.

— Oi, Docinho. Fiz bolo de prestigio para você. – Mamãe me deu um rápido abraço. — Seu preferido.

Papai não ia trabalhar até a chegada de um novo ano e a mamãe iria abrir a loja sabe-se lá quando. Por isso, estavam todos em casa. Aproveitando o recesso.

— Alguém ligou, por acaso? – Perguntei, de boca cheia.

— Hum, não. Não ainda, pelo menos.

E eu esperei, esperei, esperei.

Lá pelas sete da noite meu celular tocou.

— O que aconteceu com você?

— Me desculpe. – Ele riu. — Foi uma loucura! Mas não se preocupe, faz um tempinho que cheguei. E eu estou bem. Já me instalei no hotel, já tirei um longo cochilo e saí para conhecer a cidade. – Ele de uma pausa. — Ah, Luci, como eu queria que você estivesse aqui comigo. São tantos lugares lindos para fotografar!

Eu suspirei.

— Não diga isso. – Senti meu peito apertar. — E de qualquer forma, estou com você. Imagine que sim e aproveite. – Tento sorrir. — Mas porque demorou a entrar em contato? Eu estava terrivelmente preocupada com você. Pensei em até ligar para os seus pais.

— Eu tive que procurar uma loja para mudar o chip e todas essas coisas que deixam a gente maluco!

Isso. Esqueci desse detalhe.

— Então – Me joguei na minha cama. — Me conta tudo! Me fala mais sobre os lugares que você já viu, sobre as pessoas, sobre o hotel.... Qual é a cor das paredes do seu quarto e como é a comida do hotel?

~*~

O resto dos dias continuaram horríveis e sem nenhuma emoção.

Eu não fiz nada além de lamentar, chorar e esperar por mensagens ou ligações dele.

A festa de ano novo foi aqui em casa. A mamãe cuidou de todos os detalhes sozinha, já que eu estava sem condições de participar. Eu pensei muito em ficar no meu quarto, fingindo não existir enquanto todos comemoravam lá em baixo. Mas eu tive que fazer um sacrifício por ela, que estava tão animada e contente.

— Você precisa descer e comemorar. – Insistiu o Lorenzo, falando bem sério comigo após eu contar meus planos para a noite de hoje: comer e ver séries, sozinha no meu quarto. — Você não vai querer desapontar a sua mãe, não é? E nem a mim!

E lá fui, com a minha melhor cara.

Mamãe convidou todo mundo: vizinhos, familiares distantes, meus amigos e a família deles.... Mesmo que nossa casa fosse minúscula. Ela convidou também o Alex e o Luiz. E esse convite foi feito na noite de natal, sem eu saber de nada.

Eles apareceram, mas eu estava sem condições de fingir que estava feliz, como todo mundo. Eu me esforcei, mas não podia fingir todo o tempo. Ainda mais porque a presença do Alex na minha casa só tornava tudo ainda pior e mais doloroso.

Eu andei pela casa, forçando sorrindo, cumprimentando as pessoas. Passei um tempo com meus amigos, fingindo estar interessada nos planos que eles faziam para o futuro. Tirei fotos com meus pais, como se fosse a pessoa mais feliz do mundo e comi tudo que eu tinha direito, sem medo de passar mal depois.

A meia-noite eu corri lá para cima, desejando que ninguém tivesse me visto, e eu chorei escondida no corredor, com o celular de encontro ao meu peito.

— Luci... Tudo bem?

Alexandre. Sempre aparecendo nos melhores momentos.

— Some daqui. – Fui ríspida com ele.

— Ei, calma. Só preciso usar o banheiro.

Sem olhar para ele, saí do meio do caminho.

Ele ficou lá dentro por três minutos.

— Você está bem?

Custava muito ele fingir que eu não existia e descer, voltar para a maldita festa, abraçar as pessoas e lhes desejar um “Feliz Ano Novo!”?

— Engraçado, você ter sentindo vontade de usar o banheiro justamente agora. – Observei.

— E agora você se incomoda até com os momentos que eu sinto vontade ou não de usar o banheiro?

Eu ia rebater e dizer exatamente o que eu pensava: que ele tinha me visto subir e vindo atrás de mim com uma desculpa qualquer só para ficar mais perto de mim como se algum dia nós pudéssemos voltar e sermos felizes para sempre.

Como se nada nunca tivesse acontecido.

Mas meu celular começou a tocar.

— Espera. – E eu atendi.

— Luci? Feliz Ano Novo!

Meu coração se encheu de alegria.

— Lorenzo? Espera – Fiquei séria de repente. — Você está bêbado?

— Não! Claro que não! Eu bebi um pouco. Mas eu precisava, é difícil aqui sem você, sem ninguém. Estou numa festa do hotel! Não conheço ninguém! Estou tentando me divertir, só não se preocupe. Porque está tudo sobre controle.

— Ah... Feliz Ano Novo, então.

E a ligação caiu. Eu esperei e nada. Tentei ligar de volta e nada.

— Merda. – Xinguei.

— Está tudo bem?

— Alexandre! Que diabos você ainda está fazendo aqui?

— Estou preocupado com você...

— Ah, por favor, né.

Entrei no meu quarto e bati a porta com tudo.

Não desci mais. E ninguém veio me procurar.

Maravilha.

~*~

Estava cansada da insistência da Fabi, vindo todos os dias na minha casa, sugerindo que fizéssemos algo legal ou quando não podia ela me ligava dizendo ter uma ideia ótima e que eu iria adorar. Mas eu não queria sair do meu quarto. Qual é a parte que ela não consegue entender?

— Fabi. Por favor. – Suspirei.

Ela suspirou de volta.

— Olha aqui, sua imbecil, eu poderia estar curtindo minhas férias, com o meu namorado e deixar você em paz. Dar um tempo a você era exatamente o que eu tinha em mente. Mas aí o maldito do seu namorado me ligou um dia desses e pediu muito que eu desse um jeito em você, te tirasse de casa, fazer você voltar a sorrir...

— O Lorenzo te pediu isso?

Eu estava mais surpresa com esse fato do que ela estar tão furiosa comigo a ponto de me chamar de imbecil. Mas tudo bem, essa parte eu posso relevar.

— Sim! Ele pediu!

— Ah...

Então deveria ser por isso que ele estava me ligando menos, demorando para responder minhas mensagens... Ele queria tornar as coisas mais fáceis para mim.

Só que não estava funcionando.

— Mas quer saber? Dane-se! Fique aí com suas lágrimas. – E ela saiu.

Pronto. Perdi todos. Só falta perder os meus pais também.

— Você não pode fazer isso comigo! – Falei, brava. Assim que eu consegui falar com ele um dia depois da Fabi sair daqui fumaçando pelos cabelos.

— O quê eu não posso fazer com você?

— Não se faça de sonso, Lorenzo. Eu não quero que você pare de me ligar ou de mandar mensagens. Eu não quero que você torne as coisas fáceis para mim. Porque elas não são fáceis!  Não enquanto você estiver aí. E você prometeu que iriamos manter contato sempre que possível. E se eu estou infeliz.... É como eu posso me sentir nesse momento. Ninguém pode fazer nada por mim. Nem você e nem ninguém!

— Você está errada, Luci. Eu posso sim fazer algo e enquanto eu puder, eu vou fazer. Eu quero que você seja feliz. Apenas isso. Não estou tentando ser cruel com você, muito menos te afastar. Eu só acho que já chega, sabe? Você tem uma vida... E você precisa fazer algo a respeito, antes que seja tarde demais.

— O que você quer dizer com isso?

— Que é muito difícil para mim conviver com isso sabendo que você está aí, chorando pelos cantos, se negando a sair do quarto, não comendo direito.... É, eu andei conversando com a sua mãe. E sabe de uma coisa? Ela está preocupada com você! E não sabe o que fazer quanto a isso. Então, dê um jeito de melhorar essa situação, Luciana.

— Você está sendo maldoso, sabia? – Eu comecei a chorar. — Você não pode me pedir algo assim. Ninguém pode! É difícil e dói. Dói muito. Dói tanto!

Não consegui dizer mais nada por causa dos soluços.

— Dói em mim também! Dói em todos! Mas você já passou por coisas parecidas antes, lembra? Você achou que nunca se recuperaria. E você se recuperou! Você não estava esperando, mas aconteceu. De repente tudo mudou e se tornou mais suportável. Não estou dizendo que vai tudo ficar bem de um dia para o outro, o que eu quero dizer é que, não vai adiantar nada você ficar aí deitada se lamentando.

Tudo bem. Eu mereci. Doeu, mas eu entendi.

Entendi que novamente estava fazendo tudo errado.

— Para começar, tome um banho, coma algo descente, vá lá fora respirar um pouco de ar e depois abra o e-mail que te mandei com a sugestão de alguns cursos que eu encontrei aí na sua cidade e que eu achei que faria muito bem a você.

Dá para ser mais perfeito?

Mesmo de longe ele ainda se importa, ele ainda cuida de mim mesmo que eu não mereça.

— O.K. Vou tentar.

~*~

Eu passei a sair mais do meu quarto, comer melhor, passar um tempo com meus pais, sair com meus amigos e dei uma olhada nos cursos e me matriculei em dois deles.

As aulas eram pela manhã, com duração de quatro horas e só duraria um mês, então, eu acho, que podia suportar. Mas eu ainda tinha o resto do dia. Ou eu ficava praticando tudo que tinha aprendido, ou eu ficava de bobeira vendo minhas series, ou eu ia me encontrar com meus amigos para fazer alguma outra coisa ou saia com meus novos amigos do curso para conhece-los melhor e compartilharmos ideias.

Lorenzo continuava me ligando sempre que estava livre do seu novo trabalho e ele me deixava atualizada de tudo: me falando sobre sua rotina no trabalho, o que ele tinha comido no almoço e no jantar, me falando sobre as pessoas que ele tinha conhecido, sobre os lugares que ele andava frequentando e me mandava fotos.

Não havia mais choro. Apenas um pouco de solidão. E muita saudade.

— Eu não quero olhar! Eu não posso olhar!

Estávamos no quarto da Fabi com o computador ligado.

— De qualquer forma, eu vou olhar. - Disse ela, firme.

Hoje sairia o resultado do vestibular e aceitação ou negação das faculdades para qual nós nos inscrevemos no mês passado.

O Christian não estava presente nesse momento, pois tinha tirado um dia de folga para jogar futebol com os velhos amigos do colégio.

Fabi ficou de ver o resultado dele.

— E aí? – Perguntei, de olhos fechados, ela estava demorando muito para dizer alguma coisa e já tinha aberto o site fazia vários minutos.

Aposto que são péssimas notícias!

Ela passou, o Chris passou, mas eu não.

— Eu passei! Eu passei! – Ela começou a gritar histericamente, eu tive que dar uma olhada.

— Meu Deus! – Eu a abracei. — Você passou mesmo, Fabi. Parabéns! Mas – Eu me afastei, confusa. — O C não vem antes do F?

— Ah, é. Esqueci. Vamos voltar!

Ela voltou a página e juntas nós procuramos o nome do Chris e..... Puxa vida. Ele passou também. Estou tão, tão feliz!

— Agora é sua vez. – Ela me olhou, séria.

— Não! – Gritei, voltando para a cama e cobrindo o rosto com o travesseiro. — Eu não quero saber! Não me diga nada! Não quero saber!

— Luci... – Ela me chamou, provavelmente me achando ridícula por todo esse drama. Eu estava me achando ridícula e infantil, mas estava tensa e nervosa...

— O que foi?

— Vem cá ver uma coisa.

Eu corri até ela e...

— Meu Deus! Isso está mesmo certo?

— Aham. – Ela assentiu, sorrindo largamente.

— Então...?

— Sim, nós conseguimos!

Fabi voou na minha direção e nós caímos no chão.

Eu não esperava, é claro. Estava em choque. Estava quase certa de que não passaria. Pelo menos não dessa vez. Mas tentaria de novo no meio do ano.

— Meninas! Que barulho é esse? O que aconteceu? – A mãe da Fabi veio correndo, cheia de preocupação, ver o que era toda aquela histeria.

— Nós conseguimos, mãe! Conseguimos!

A noite saímos, em família, para um jantar comemorativo.

Meus pais nunca me olharam com tanta admiração.

Mais tarde, já em minha cama, eu liguei para o Lorenzo e lhe dei as boas notícias. Ele comemorou junto comigo! Disse que me amava, que já sabia que eu ia conseguir e que estava orgulhoso. Eu só conseguia sorrir e desejar que ele estivesse ali para me abraçar. Lorenzo me contou do seu avanço no emprego, que no início estava difícil, mas que ele vinha pegando jeito com a ajuda dos seus novos colegas.

Pelo visto, as coisas estavam melhorando para todos. Especialmente para mim. Haviam tantas coisas acontecendo na minha vida ultimamente que eu nunca achei que fosse capaz de algum dia isso acontecer: ter uma irmã, passar na faculdade, terminar dois relançamentos especiais, sofrer com isso, pensar em desistir de tudo, chorar horrores, levantar a cabeça, seguir em frente...

Isso que é avanço, Luciana.

Acordei animada na manhã seguinte para ir para o meu curso. Sabia, bem lá no fundo, que estava fazendo a coisa certa. Não só pelo Lorenzo, pelos meus amigos ou pelos meus pais. Estava fazendo por mim. Para crescer, evoluir, aprender.

Era isso que eu precisava agora: focar em mim.

— Uau! Quem é aquele gato de cachinhos escuros do outro lado da rua? – Perguntou a Nayara, uma colega que eu tinha feito no curso logos nos primeiros dias e que era uma graça. Muito gentil, esperta e divertida. Uma ótima companhia.

Olhei na direção em que ela estava olhando só para ter certeza.

Alexandre. Parado. Encostado em sua lata velha. Os cachos rebeldes um pouco maiores do que eu costumava me lembrar. Os olhos verdes muito claros por causa do sol. Calça jeans surrada. Camiseta preta. Tênis velho. Braços cruzado. Um sorriso.

— Nay, nós vemos amanhã, ta bom? – Dei um beijinho nela. — Tchau!

E corri até o outro lado da rua, após olhar para os dois lados da avenida.

— Que diabos você está fazendo aqui, Alex?

— Ei, calma. Não precisa me atacar!

— Responda a minha pergunta.

— Tudo bem. – Ele deu de ombros. — Estava te procurando. Fui até sua casa e não tinha ninguém. Depois passei na loja da sua mãe e ela disse que você estaria por aqui. Resolvi esperar para lhe dar meus parabéns. Não imaginava que...

— Eu fosse capaz?

— Não! Não é isso. Eu só não imaginava que você, de repente, se tornaria uma grande mulher.

— Eu ainda sou uma garota, Alex. Uma garota de 18 anos.

— É, eu sei. Mas você não é mais aquela garota. Você está melhor agora. E eu fico muito feliz com isso. Não duvidava que você capaz. Então... Meus parabéns!

Ele estendeu a mão. Um gesto estranho.

— Obrigada. – Resolvi aperta-la só para não deixá-lo no vácuo. E dei meu melhor sorriso, contente, de certa forma, por ele ter notado minhas... Mudanças.

— Quer sair pra comer algo? Vamos comemorar!

— Ah, não. Muito obrigada. Vou para casa... Tenho coisas pra fazer.

— Por favor. – Ele toca meu braço, insistente. — Não seja uma megera.

Para completar ele fez beicinho.

— Só como amigos. Eu juro.

Tá... Acho que posso lidar com isso.

— Ta bom. Mas só por algumas horas.

Não foi tão estranho quanto eu imaginava que seria. Na verdade, foi bem agradável. Tinha me esquecido como era sair com ele e ter que aceitar o fato de que ele era vegetariano. E nós conversamos, feito duas pessoas normais e descentes.

 Falamos sobre meus novos cursos, sobre eu ter passado no vestibular, sobre a Fabi e o Chris e o namoro deles, sobre a evolução da mãe dele na reabilitação, sobre seu irmão estar se saindo bem no novo colégio com seus novos amigos, sobre ele estar fazendo muito bicos para conseguir uma grana extra para sustentar uma casa inteira...

Depois ele me levou em casa. E mais uma vez pensei que passaríamos por aquele momento constrangedor da hora da despedida onde não saberíamos como agir. Pensei que ele tentaria alguma gracinha. Tentaria me beijar ou tocar em alguma das nossas feridas. Mas nada disso aconteceu. Ele sorriu. Eu sorri. Nós despedimos com um aceno. Desci do carro. Ele foi embora e eu finalmente entrei em casa.

Ufa. Não discutimos dessa vez. Não dessa vez.

Os outros dias foram todos muito parecidos. Após ter descoberto o horário em que eu saia do curso, ele passou a ir me buscar. Mas eu nunca estava esperando, porque ele nunca avisava. Eu saia do curso e lá estava ele do outro lado, aguardando. O que no começo foi bem esquisito, mas depois eu meio que, sei lá, me acostumei.

Parecia normal. Familiar.

— O que você acha sobre isso? – Resolvi pedir algum conselho ao Lorenzo naquela noite, durante nosso vídeo-chat pelo Skype.

— Ah, eu acho que.... Tudo bem. Talvez ele só esteja querendo ser seu amigo, fazer companhia, estar por perto. Concertar as coisas numa boa.

— E para você, tudo bem? – Não era uma pergunta fácil para se fazer. Mas eu precisava fazer. Queria ouvir isso dele. Diretamente da boca dele.

Assim eu me sentiria mais tranquila.

— Eu acho que eu não tenho muito no que opinar, Luci. – Ele fez uma careta. — Já que eu estou aqui e você aí.... Tão, tão, tão distantes. Mas e pra você, tudo bem?

— Acho que sim. É. Tudo bem, sim.

Para ser sincera, eu não sabia bem o que isso poderia significar, mas estava disposta a descobrir em breve.

— Quem é ele? Até agora você não me falou nada sobre ele. – A Nayara estava sendo bem insistente ultimamente.

— Ah, bom, ele só meu ex-namorado. É estranho, não é?

— O quê? Vocês saírem o tempo todo? – Assenti e ela sorriu. — Não, na verdade eu acho bem fofo que vocês estejam dispostos a ser amigos depois de tudo.

Antes de ir me encontrar com o Alex, resolvi contar a ela de forma bem resumida o que tinha exatamente acontecido entre mim e ele no passado.

— E onde está o seu irmão agora? – Perguntei, quando nos sentamos na mesinha do lado de fora de uma sorveteria do bairro.

— Foi passar algumas horas com a nossa mãe.

— Ah, legal. Não sabia que era permitido.

— Às vezes, dependendo do estado de evolução dela, é permitido sim.

— Deve ser ótimo para eles. E você, já foi alguma vez?

— Não... Por enquanto, eu só levo ele até lá.

O assunto não parecia muito confortável pra ele, por isso resolvi não me aprofundar.

Meu celular começou a tocar de repente. Levamos um susto.

— Pai? O que houve?

— É... a sua mãe. Acho que... O bebê... Vai nascer.

Alex e eu voamos até o hospital. Minha mãe já estava na sala de parto, junto do meu pai Toda aquela situação me deixava agitada e apavorada, por isso achei melhor ficar ali e apenas aguardar o momento certo. Enquanto isso, fechei os olhos e torci para que tudo desse certo e minha irmã e minha mãe ficassem bem.

Meu pai apareceu as pressas algum tempo depois.

Parecia uma eternidade.

— Nasceu! Ela é linda. A sua cara.

Entrei para ver minha irmã com lágrimas nos olhos. A mamãe também estava emocionada, mas parecia muito fraca.... Ou cansada. Minha irmã estava em seus braços. E mesmo que eu nunca tivesse segurado um bebê antes, senti que aquele momento seria o ideal. Eu queria segurar ela. Queria ser a minha irmã. Ter certeza de que ela era real.

— Ela parece um anjinho. – Comentei, sorrindo. Sem conseguir tirar os olhos do pequeno embrulho cor-de-rosa em meus braços.

— A nossa anjinha. – Disse meu pai, trocando um olhar cúmplice com a mamãe. — Luci, queremos que você escolha um nome para ela.

— Eu? – Arregalei os olhos. — Mas...

— Por favor, docinho. – Insistiu a mamãe, sorridente.

— O.K. – Voltei a olhar bem para ela, com sua pele rosada, seu nariz pequeno, seus olhinhos fechados, a bochecha gorducha, a cabelereira escura... — Eu gosto de Nicole.

Acabou que eles adoraram e assim ficou.

Após alguns minutos, Nicole começou a abrir o berreiro. Era hora de amamentar. Optei por me retirar. Deixar esse momento mágico entre pais e filha mais íntimo.

Alex ainda estava me esperando no corredor.

— Você pode me levar para casa? Eu preciso ir buscar umas coisas e depois voltar.

Sem mais palavras, fomos lá.

Estava tudo bem.... Até ele parar com o carro em frente à minha casa escura e eu começar a chorar descontroladamente.

A realidade bateu com tudo.

— Luci, porque você está chorando? – Ele se aproximou para me amparar.

— Eu não sei! Só estou com medo. Muito medo! Ela é tão linda, tão pequena, delicada e frágil. E se eu não for uma boa irmã? E se a mamãe ficar apavorada e precisar de ajuda e eu não souber o que fazer? E se quando ela crescer, não gostar de mim? E se....

Eram tantas perguntas.

Assim que ele me abraçou, eu me silenciei. Mas continuei chorando.

— Vai dar tudo certo. Você vai ver. Sempre dá, não é?

Fiz que sim. Achava que sim.

— Eu sou tão boba! – Consigo sorrir depois de um tempo e aproveito para enxugar as lágrimas na manga da minha blusa.

— Não, você não é boba. – Ele puxou meu rosto com delicadeza, me fazendo olhar para ele. — Você só é uma boa pessoa. Excelente filha, ótima amiga e com certeza será uma irmã maravilhosa.

Eu sorrio de leve, me dando conta da nossa proximidade e como a atual situação me fazia lembrar dos velhos tempos. Onde mesmo que nem tudo fosse perfeito, nós estávamos conectados de alguma forma. Exatamente como agora, um tempão depois.

Meu sorriso desaparece quando percebo a forma como ele está me olhando. Diferente do olhar dos últimos dias. Não tem mais aquela inocência. Dessa vez ele parece mais urgente. Um olhar cheio de desejo, saudade, vontade, paixão. Tudo misturado. E meu coração parece paralisado, assim como meu corpo inteiro. Eu não sei o que fazer, não sei o que dizer. Mas acho que quero que ele me beije. Quero sentir aquelas coisas todas de volta aflorando dentro do meu peito.

Quero me lembrar me sentir daquele jeito que só ele é capaz de me fazer sentir.

— Luci... Eu... – Ele se aproxima mais e mais. Parece em câmera lenta. E eu estou ali, olhando para ele. Hipnotizada e congelada no meu lugar. Sem respirar.

Quando ele está perto o bastante... Fecho meus olhos. E espero.

Passam alguns segundos e..... Nada.

— Me desculpe. – Ele se afasta. — Não pode ser assim. Não é assim que tem que ser. Essa não era minha intenção. Me desculpe. Eu não.... Eu...

Entendi.

Ele me quer de volta, mas talvez não tanto quanto antes. Muitas coisas mudaram. Eu mudei, ele mudou. Nada é igual. Somos diferentes agora. E muito tempo se passou. Não demos certo antes, não daremos certo agora. Por isso devemos ser somente amigos. Como amigos pode ser que dê certo. Vamos tentar. Temos que pelo menos tentar.

Um beijo estragaria tudo.

— Certo. Tchau. – Abro a porta do carro o mais depressa possível. — Obrigada por tudo e..... Até qualquer dia.


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Notas finais do capítulo

Será que ainda existe esperanças pra esses dois? Comentem!!!