A aula ainda não havia começado quando Mia entrou. Como era o primeiro dia de aula, os alunos nem prestaram atenção nela. Alguns conversavam sobre as férias, outros sobre programas de TV, outros fofocavam mentiras, outros comentavam o quanto os amigos haviam mudado. Todos conversavam, menos Mia, que se sentou no canto da sala, pegou seu caderno de desenho e começou a desenhar. Ela desenhava algo parecido com animes e mangás.

— Que personagem é esse? – Perguntou um menino ao chegar perto dela.

— Eu estou criando ele agora...

— Ah, que legal! – Exclamou o garoto – Você desenha bem.

— Hm... – Mia ficou sem jeito – Obrigada...

— Eu me chamo Thomaz – cumprimentou o garoto – Qual seu nome?

— Mia.

— Bonito... – falou baixinho Thomaz – Bom, pode me chamar de Tony!

— Ok então, Tony – sorriu Mia, observando mais atentamente o garoto. Ele tinha um cabelo espetado de cor castanho-dourado, seu rosto tinha feições suaves, era alto e seus olhos eram cor-de-mel.

— Você estudava em que escola? – Perguntou Thomaz, tentando puxar assunto.

— Colégio Brennand Bluewater.

— Nossa! Ele é muito bom – disse Thomaz – E difícil de entrar... afinal, por que você saiu dele?

— Eu... – Mia hesitou antes de responder, se perguntando se deveria contar a verdade ou não. Optou pela verdade – Fui expulsa...

— Expulsa?!? – Exclamou o garoto – Foi por causa das notas?

— Não – disse Mia. Estava pensando como dizer sem parecer uma encrenqueira desleixada – Eu... Quebrei... O braço de... um outro aluno...

Thomaz riu.

— O que foi? – Perguntou Mia, ele tinha começado a irritá-la.

— É que você não parece uma pessoa que se irrita fácil – disse Thomaz – Incrível você ter chegado ao ponto de quebrar um braço!

— Me irritar não é difícil. É só interromper algo que eu gosto por um motivo besta que eu já fico com raiva.

— Desculpe – disse Thomaz, achando que ela estava se irritando com o fato dele ter interrompido o desenho dela – Eu...

— Eu disse que ficava irritada – interrompeu Mia – se fosse por um motivo besta. Mas eu realmente queria voltar a desenhar...

— Claro – disse Thomaz, aliviado – Logo, logo a aula começa.

Mia assentiu e Thomaz se virou e foi para outro grupo de pessoas. Ela voltou a desenhar, enquanto esperava a aula começar. Pouco depois de fazer a maior parte do rascunho do desenho, um professor entrou na sala. Ele era alto, tinha cabelos grisalhos e uma tatuagem de um tigre no braço.

— Algum novato? – Disse o professor, logo após dar bom dia à turma.

Mia levantou a mão. Imaginava que seria a única novata, mas outra garota no outro lado da sala também levantou a mão. Ela era ruiva, tinha olhos azuis e era mais magra do que o normal. Tinha algumas sardas um tanto discretas e corou um pouco quando todos olharam para ela e logo depois para Mia.

— As duas então... – continuou o professor – por favor, se levantem.

Ambas obedeceram.

— Sou Kyle Duncan – continuou o professor – seu professor de Geografia. Por favor, diga seu nome e sua idade.

Kyle apontou para Mia.

— Mia Rost. 13 anos.

Kyle assentiu e apontou para a outra garota.

— Harriet Jones. 12 anos.

Alguns riram, outros ficaram um tanto impressionados. Estavam na 8ª série, e a garota tinha 12 anos. Mia ficou indiferente quanto a isso, assim como Kyle.

— Então, por que vocês mudaram de escola? – Perguntou Kyle.

— Fui expulsa – disse simplesmente Mia.

— Me mudei – disse Harriet logo depois.

— Então, podem se sentar.

Ambas obedeceram. O resto da aula daquele dia foi basicamente a mesma coisa: os professores perguntavam sobre os novatos, Mia e Harriet falavam seus nomes, o porquê de terem mudado de escola e se sentavam. No dia seguinte, não mudou muita coisa. As coisas só começaram a mudar na aula de Educação Física que tiveram na Quinta-Feira da mesma semana.

O professor de Educação Física perguntou sobre os novatos, assim como os outros, mas apenas perguntou seus nomes, e logo começaram a aula. O professor dividiu a sala em duplas, e juntou as duas novatas. Elas tinham que conversar sobre como havia sido as férias. Sim: conversar. Na Educação Física. E assim fizeram.

— Então... – começou Mia – A gente deveria falar sobre as férias... como foram as suas?

— Foram chatas e monótonas – suspirou Harriet – o máximo que fiz foi ir para um parque perto de casa.

— Ah... as minhas também – disse Mia – mas eu fiquei trabalhando.

— Trabalhando?— Perguntou Harriet, aparentando estar impressionada.

— É...

— Não acho que tenhamos algo para falar sobre nossas férias então – comentou Harriet – o que a gente pode fazer?

— Sei lá... – disse Mia pensando em seus pais.

Passaram-se alguns minutos, as duas caladas, com seus pensamentos distantes. Algum tempo depois, Mia voltou para a realidade.

— Eu moro sozinha – disse de repente.

— Eu também – disse Harriet, ainda com o pensamento distante.

— A gente não devia morar sozinha – comentou Mia – somos menores de idade, devíamos ter alguém para cuidar da gente.

— É, mas acho que não dá, né? – Perguntou Harriet.

— É... – Concordou Mia – por que você mora sozinha? E seus pais? – Era estranho para Mia fazer essa pergunta, já que ela mesma não tinha pais.

— Minha mãe morreu quando eu tinha 3 anos – respondeu Harriet depois de hesitar por um momento – Meu pai trabalha pelo mundo, viajando, e tira apenas um dia de folga por mês, mas nunca me visita.

— Por que? – Mia estava começando a se interessar. Talvez eu não esteja realmente sozinha, pensou ela.

— Porque ele não gosta de mim – disse Harriet simplesmente.

— E quando você se mudou? – Perguntou Mia depois de alguns instantes calada.

— Foi no início das férias – disse Harriet, suspirando – meu pai me mandou para uma casa maior, por algum motivo aleatório da cabeça dele.

— Ah...

— Mas e você? – Perguntou Harriet após alguns instantes em silêncio.

— Eu... – Mia nunca tinha falado isso tão de cara com alguém. Mas ela me falou da vida dela, pensou, não seria justo eu não responder— Meus pais morreram... quando eu tinha 9 anos.

— Como? – Perguntou Harriet sem se preocupar em parecer intrometida.

— Na verdade não sei direito – disse Mia, parando para pensar. Ela sempre procurou saber qual o propósito da vida dela, o que ela mais queria no mundo. Havia acabado de achar: descobrir o que aconteceu com seus pais – Só sei que levaram tiros. Não sei de que arma, nem de quem e nem onde exatamente.

— Então foram assassinados... – disse Harriet – assim como minha mãe.

— Sua mãe também? – Perguntou Mia.

— Sim, de acordo com meu pai.

As duas continuaram conversando sobre assuntos aleatórios. Ambas gostavam de animes, livros e filmes. Ambas gostavam de jogos de FPS, apesar de não terem consoles e jogarem no computador. Ambas gostavam dos mesmos estilos de música. Ambas se tornaram amigas.