Carpe Diem escrita por Maga Clari


Capítulo 19
Temos os mesmos defeitos, somos suspeitos


Notas iniciais do capítulo

Olá, todo mundo!
A música de hoje é "Pra ser sincero" do "Engenheiros do Hawaii". A minha leitora-amiga Thaís Medeiros me sugeriu essa música desde o comecinho da fic, e eu estava aguardando um momento ideal para usá-la. Bem... Já encontrei ♥
Estou trabalhando neste capítulo há dias durante minhas aulas "super interessantes" da faculdade.
Tem uma amiga nova me ajudando com betagem de grátis haha. Estou louca da vida para saber o que ela vai dizer sobre este capítulo agora. Sei que tem muita coisa que preciso mexer nesta história, mas só farei isso quando terminar de postá-la. Está na reta final, já.
Bem... Sem mais delongas.
Here we go...



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Scorpius demorou quinze minutos para achar-me digna de sua atenção. Ele virou-se para mim, com aqueles olhos que pela primeira vez na vida demonstraram transparência: Scorpius estava magoado.

E a culpa era minha.

Toda minha.

Eu não aguentava mais. Então disse:

— Scorpius, fale comigo. Não podemos continuar assim.

— Oh, mesmo?

— Scorpius, acabamos de nos casar. Aja como um adulto.

— Agir de qual modo? Descontrolando-me até lhe dar um crucio?

Meus olhos piscaram, assustados com o lado agressivo de volta em Scorpius. Ele, então, apertou as sobrancelhas, sua expressão era dura e firme.

— O que você esperava, afinal? Que nos beijássemos loucamente como se estivéssemos numa fantasia sexy numa Askaban ilusória? Ah, por favor! Não me olhe assim. Você sabe que é verdade! Por que atacou Nott, afinal? Achava que eu ia aparecer e limpar sua barra? É isso?

Scorpius falava, e falava, e falava. Vomitava as palavras, como se as guardasse há séculos, e de fato o fizera. Ele parecia estar transbordando de tanta emoção.

— Sinto muito estragar sua utópica fantasia de uma casamento à la contos de fadas. Mas eu fiz tudo o que pude, quem atrapalhou os planos foi você. Precisava ser um crucio? Um estupefaça não bastava?

— Scorpius, eu queria mata-lo se pudesse. A culpa foi dele.

— Não foi bem assim.

Scorpius então respirou fundo. Eu nunca o havia visto daquela maneira antes. Ele voltou a falar:

— Na vida, não há vítimas ou culpados. Somos um pouco dos dois.

— Scorpius — tornei a insistir. Meu tom de voz era de advertência — O que houve na Romênia?

— Não interessa a você.

Aquilo foi o suficiente para que a minha raiva voltasse.

— Não estou lhe reconhecendo mais — deixei escapar.

— Compartilho do mesmo sentimento — ele confessou. Seus olhos estavam pesados, ele parecia ter envelhecido anos em apenas vinte e quatro horas — Mas somos todos enigmas, Rose. Sempre haverá facetas pelas quais lutaremos para trancafiar. Só que não faremos isso por muito tempo, Rose. Nossos defeitos irão surgir. Nós dois somos assim. Apenas aceite.

— E se eu não quiser aceitar?

— Será apenas perda de tempo, então. Aceite esta parte de você. Esta parte de mim. Admita: somos vítimas de nós mesmos. Mas isso não significa que você precisa gostar disso ou que tenhamos que nos perdoar.

— Ensaiou tudo isso pra dizer pra mim, não foi?

— Tive a noite toda pra pensar.

Scorpius ofereceu-me um breve sorriso. Mas logo voltou ao semblante taciturno de antes. Sua respiração era assustadoramente calma, mas  os dedos por baixo das algemas revelavam seu nervosismo. Ele tremia sem parar e balançava os pés de um lado para o outro.

Pensei que a conversa estivesse encerrada, mas Scorpius voltou a falar após um longo silêncio.

Na verdade, não sei quanto tempos ficamos sem dizer nada.

Quando se está em Askaban, as horas simplesmente passam. Não conseguimos acompanhá-las do mesmo modo de sempre.

É como se Askaban fosse outra dimensão.

Mas voltando a Scorpius, ele disse:

— Talvez eu não saia daqui nunca mais.

Meus olhos se arregalaram. O que de tão grave ele havia feito, afinal?

— O tempo que passei com você me fez esquecer de tudo — ele continuou, olhando para lugar nenhum — Eu fazia de conta que era um cara novo, numa cidade nova, como uma garota nova. E achei realmente que você houvesse entendido meus sinais. Minhas dicas para a vida. Sabe, Rose...

— Ei, ei, ei — interrompi-o, intrigada — Sinais? Que sinais? Você estava me usando?!

Scorpius respirou fundo antes de me responder:

 — É claro que não, Rose. Eu só queria que aprendesse a se defender e a lidar com certas coisas. Eu sabia que algo assim poderia acontecer. Rose, ações têm consequências. Não podemos fazer nada aleatoriamente. Mesmo os crimes precisam de planos. Você não entendeu nada.

— Se você não ia deter Nott, quem mais o faria senão eu? É tão difícil assim entender, Scorpius? Ele matou sua mãe!

Scorpius piscou os olhos e ficou calado por alguns longos segundos. Aproveitei o momento para continuar falando:

— Você foi passivo demais. Poderia ter acabado com ele em instantes.

— E você foi impulsiva demais. Não raciocinou de jeito nenhum.

— E como poderia?!

— Veja, Rose... — a paciência de Scorpius parecia estar pendurada no limite — Se você quer mesmo abrir as cartas desse jogo, por favor, escute sem me interromper.

Relutantemente, balancei a cabeça em afirmação. Scorpius enrijeceu o corpo encostado na parede de pedras, e tive a suspeita de que ele procurava as palavras certas, que nunca viriam.

Desistindo de qualquer formalidade, Scorpius baixou os olhos e focou em algum ponto do chão. Um ponto possivelmente mais interessante do que o meu rosto.

— Nem tudo foi fácil pra mim, Rose. Já cheguei a extremos. E imagino que você nunca tenha ouvido falar disso. Mas... — um longo suspiro saiu de sua boca. Consegui escutar as batidas loucas de seu coração — Nunca quis, ou melhor: não quero. Não quero que pense que estou me vitimizando ou que sou fraco. Mas a minha adolescência foi uma droga. É isso que ela foi. Nada comparada a sua, se me permite dizer. Ei, ei, ei, pedi pra não me interromper!

Quando estava prestes a retrucar, ele calou-me apenas com os olhos. Derrotada, deixei-o prosseguir.

— Ótimo — ele retomou a palavra, evidentemente irritado, mas continuou — Veja bem. Minha família sempre foi a família perfeita. Até um filho da puta tirar meu irmão de casa. Um cara do Ministério dizendo que seria melhor para ele ser criado com trouxas, para não causar danos psicológicos de baixa autoestima ou sei lá mais o quê. Acontece que eu sofri mais do que Mark. Ele era meu único amigo. Quem queria ser amigo de um Malfoy?

— Você já foi bem popular, Scorp.

Respirando fundo para não brigar comigo, suponho, Scorpius respondeu ao meu comentário:

— Muito engraçado isso ter acontecido no auge de minha puberdade, não acha? De repente, o fetiche pelo “filhote de Comensal gatão” parecia legal de novo. Não foi isso, Rose?

Não consegui dizer nada.

Scorpius tinha razão, não pude responder.

— Meus pais me ajudaram muito nessa época. Tentaram me deixar mais confiante, você sabe. Mas a verdade verdadeira é que eu estava apenas vivendo. Treinar na Romênia foi o melhor que me aconteceu. Fiquei forte lá. A adrenalina foi o que tirou os constantes pensamentos perigosos de minha cabeça. Eu não sei do que seria capaz, Rose. Eu estava mal demais. Nada fazia sentido pra mim. Simplesmente não fazia.

A respiração de Scorpius estava rápida e intensa demais para a calmaria de minutos atrás. Enquanto recobrava o ar, chutou alguns pedregulhos para longe, distraindo-se com o movimento.

Ele tornou a falar:

— Não me orgulho de coisas que aconteceram enquanto estive lá. Você talvez não entenda, Rose. Me deram um trabalho como agente-duplo. O que Snape fez na época de Voldemort, sabe? Pois então...

— Você não foi lá... estudar?

— E como você acha que funciona a coisa toda? Hã? — Scorpius deu uma risadinha e balançou a cabeça — Somos treinados com trabalhos reais. Riscos reais.

Havia uma expressão de insegurança no rosto de Scorpius. Como se tentasse decidir o que contar ou não contar para mim. Ele tinha a testa franzida, os olhos apertadíssimos.

— Chegou uma hora que me vi perdido. Eu não sabia mais quem eu era ou devia ser. O que era certo ou errado. Quem era herói ou vilão. Aí eu recebi a correspondência falando de minha mãe. Mas já era tarde demais. Tudo já havia saído do meu controle há muito tempo...

— Scorpius — chamei-o, sem me aguentar de curiosidade e preocupação — Vou lhe fazer uma pergunta e quero sinceridade.

— Vá logo.

— Scorpius — encarei seus olhos, morrendo de medo — Você já matou alguém?

A pergunta pareceu incomodá-lo como um gosto nojento na boca. Ele se remexeu em seu lugar, e seus olhos não conseguiam escolher para onde olhar.

— Já, não é? Esse foi seu crime.

— Não exatamente. Ah... — Scorpius balançou o rosto para um lado e para o outro, e me perguntei se ele não sentia falta de seus cigarros — Vamos por favor parar de falar disso? Eu tinha um cargo, fui agente-duplo. Ponto. Já falamos demais. E você? Não vai embora?

— Espera — franzi a testa, surpresa com seu comentário — Como sabe que não fui condenada?

— Ah, qual é, Rose. Eles nunca deixariam uma condenada aqui sem algemas. E a propósito, por que não a levaram ainda?

— Uma amiga sua lhe deve um favor. Uma dos aurores que guardam Askaban.

— Dulce. A de cabelo roxo.

— Essa mesma.

— Como salvou a vida dela? Sim, ela me contou.

— Aí, Rose, fica para outro dia. Falamos demais por hoje, não acha? Só me deixa descansar em paz.

— Minha presença incomoda?

A pergunta que eu fiz talvez soasse inocente. Mas por dentro, meu coração se despedaçava mais e mais.

— Desistiu de casar comigo? — insisti.

— Não — ele disse simplesmente — Não, Rose, só estou cansado.

Posso estar enganada, mas nesse momento, Scorpius pareceu amolecer um pouco. Isso porque o vi chamar-me com um aceno de cabeça, indicando que eu podia chegar mais perto. E quando eu o fiz, Scorpius recostou-se em meus ombros e começou a me beijar: primeiro o pescoço, o queixo, a boca.

— Uma grande pena essas algemas, não é? — ele brincou, de repente, com sua risada quase de volta.

— Posso dar um jeito nisso — tentei soar displicente, mas ele me olhou parecendo intrigado — Há boatos de que uma última criminosa arrancou as próprias algemas com a força do pensamento e fugiu para achar o marido em Askaban.

Ao ouvir isso, Scorpius riu pra valer. Ele riu de verdade. E eu fiquei feliz em vê-lo esquecer-se da situação em que estávamos, para poder rir como antes.

— Ora, vamos, Senhor M — brinquei, lembrando-me de sua assinatura no convite de casamento — No fundo, você queria, ou melhor, quer, uma lua de mel. Você sabe que quer.

— Tudo bem. Talvez você tenha razão. Coloquei tudo para fora, afinal.

— E não se sinta assim, por favor. Eu entendo você — toquei sua mão fria, aos suspiros — Nunca me senti entre verdadeiros amigos, também. Os verdadeiros estavam na Grifinória. Bem longe de mim.

Scorpius, por incrível que pareça, estava prestando atenção. Continuei:

— Sei que não posso comparar. Que tenho meu irmão, meu pai, minha mãe. Mas eu já o via antes, Scorpius. Eu achava que você não dava a mínima pra mim. Que não queria minha companhia, você sabe.

Scorpius esboçou um sorriso fofo.

Muito fofo.

De repente, o grifinório de quatorze anos surgiu na minha frente, com o sorriso tímido e inocente causando um disparo em meus batimentos cardíacos.

Scorpius não sabia, mas eu só conseguia vê-lo assim naquele momento.

Para mim, não estávamos numa cela de penitenciária.

Não havíamos brigado e dito coisas que não deviam.

Era apenas Scorpius e eu.

E então, ele disse:

— Anda logo, cabelo-de-fogo. Está quente demais para minhas mãos estarem presas nessas algemas. Há lugares melhores, não acha?

Mas eu não cheguei a responder nada.

Apenas ri e pedi que fizesse o feitiço não-verbal junto comigo, e se concentrasse o máximo possível.

As algemas se soltaram e por sorte ninguém nos ouviu. Aposto que a tal Dulce dera um jeito em tudo.

E quando Scorpius agarrou meu rosto com força, ele confessou:

— Posso até ainda estar com raiva de você, Rose. E não faço ideia do que será de nós daqui para frente. Mas você tem razão, afinal. Uma última noite talvez não seja tão ruim assim.

— Pelo visto, não somente eu estava certa, mas você errado. Olha pra nós: prestes a nos beijar loucamente numa fantasia sexy em Askaban não-ilusória.

E aí Scorpius gargalhou.

E eu gargalhei.


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