Ario’s POV

Minha cabeça doía. Levantei e observei o lugar onde me encontrava: parecia uma espécie de jaula, porém, quando olhei para baixo, vi um enorme buraco. Dei dois passos para trás, parando ao sentir minhas costas baterem nas grades da cela. Então olhei para o lado pedindo aos deuses que eu não fosse o único naquela situação. Não que eu quisesse que um amigo meu se ferrasse comigo, eu só não queria estar sozinho. Vi Leeh ainda desacordada.

Espera, eu me lembro que não era só a Leeh que estava comigo, onde está a Camy? Ela conseguiu fugir? Meus deuses, será que aconteceu alguma coisa com ela? Tentei afastar esses pensamentos da minha cabeça e me sentei no chão. Agora só me restava esperar que Camy estivesse em segurança e o Acampamento mandasse um resgate.

Camila’s POV

Ótimo, eu sabia que Davi ia acabar metendo aqueles três em confusão em algum momento. Corri até o chalé treze atrás de Raquel e Ávilla, rezando para as duas estarem lá. Bati na porta e logo ouvi passos. Ávilla apareceu sorrindo, mas logo fechou a cara ao ver nossas expressões.

— O que aconteceu? Parecem preocupados.

— Nós estamos preocupados! — Jack exclamou, se apressando em explicar — Se lembra da missão para a qual a Camy, o Ario e a Leeh foram recrutados pelo Davi? — Ela assentiu.

— Então, Ario e Leeh sumiram e quem voltou foi só a Camylla — Isa completou.

— Ávil, me diz que a Quell está ai. Precisamos reunir a equipe o mais rápido possível, temos que ir atrás do Ario e da Leeh antes que algo de ruim aconteça a eles.

— Ela está, só que deitada numa bad que até agora não acabou.

— Ah, mas agora eu sinto muito, ela vai ter que sair. — Eu falei entrando no chalé e indo ate a cama da garota — A irmã de vocês está em perigo e é obrigação de vocês irem ajudar.

— Eu não sou obrigada a nada. — Ela disse se sentando na cama.

— Você passa a ser obrigada sim quando a sua irmã está correndo risco de vida. — Isa disse pegando a mão da garota e puxando-a — Levanta dai, doente!

— Ai, que grossa! – Exclamou a mais nova, sendo empurrada para fora do chalé.

Nós as seguimos, acabando por nos deparar com Quíron na porta. O centauro arqueou uma das sobrancelhas e cruzou os braços.

— Posso saber que bagunça é essa?

Antes que Quell ou Isa pudessem começar a discutir, tomei a frente, olhando feio para as duas:

— Nós precisávamos mesmo falar com você, Quíron. A Camy se lembrou de mais algumas coisas, mas ainda não sabe onde eles estavam. – Expliquei – Mesmo assim, já esperamos tempo demais. O Ario e a Leeh estão em perigo, não podemos arriscar chegar tarde. E ela diz que acha que consegue se lembrar do caminho se passarmos por ele. Eu já estava juntando o pessoal.

— Entendo. E você tem razão, cada minuto pode fazer a diferença. – Ele parou para pensar, nos analisando por alguns instantes – Terminem de se organizar e me encontrem na Casa Grande. Precisamos planejar direito o que fazer antes de manda-los em uma missão sem destino certo.

Todos concordamos, nos separando para avisar o resto assim que Quíron se retirou. Minutos depois, estávamos os nove reunidos na varanda, apreensivos. Gih acabou se juntando a nós quando viu a comoção, querendo ajudar também. Éramos muitos querendo ir, quem quer que ficasse como líder teria responsabilidade demais nas mãos. Mordi meu lábio em expectativa. Camy, porém, parecia em pior estado que o resto e me senti mal pela criança. A coitada não conseguia mesmo se lembrar e devia estar sentindo toda a pressão e culpa por ter sido a única a voltar. Apertei seu pulso de leve, tentando confortar minha irmã, e consegui um sorriso fraco antes de Quíron reaparecer e nos guiar para a sala de reuniões.

Lá, nos espalhamos pelas cadeiras que normalmente eram tomadas pelos líderes dos chalés, mas agora eram ocupadas por quatro filhas e um filho de Atena, um filho de Poseidon, um filho de Quione, uma filha de Íris e duas filhas de Hades.

— Camy – Quíron chamou primeiro – Camila disse que você se lembrou de mais coisas. Do que exatamente você se lembrou?

Ouvimos atentamente minha irmã recitar pela centésima vez a história da missão – ou pelo menos das partes que sabia – e adicionar a mais recente memória ao conto. Parecia surreal demais que aquilo estivesse realmente acontecendo, e nós éramos semideuses, surreal era nosso nome do meio. Mesmo assim, era difícil de acreditar. Ao final, Quíron estava pensativo.

— E então? – Perguntou Bruno – O que a gente faz?

— Nós talvez tenhamos esperado tempo demais. – Respondeu o centauro – Eu sinceramente espero que não. Vou enviar uma missão de resgate. – Ele olhou ao redor da sala, analisando cada um de nós, antes de concluir – Camila. Você costuma ser capaz de mantê-los sob controle, e sei que todos os presentes vão ser voluntários para se juntar a você. Sei o quanto se importam com Ario e Leeh. Você fica de líder desta missão. – Meus olhos se arregalaram. Não não não não. – Terá de levar Camy com você, obviamente. Quem vai ser a outra pessoa?

Engoli em seco.

— Eu... – Olhei ao redor. Eu tinha esperança de ir, ok, mas não queria ser líder! Eu não tinha ideia do que fazer! – Quíron, eu posso pensar um pouco? Realmente não sei o que te responder.

Ele me encarou de volta por alguns instantes antes de assentir.

— Vocês partem amanhã ao amanhecer. Tem até o anoitecer de hoje para decidir, antes de visitar o Oráculo. Até lá, estão dispensados.

Droga. Eu tinha praticamente uma hora de prazo. Não era nem de longe o suficiente para decidir a melhor opção, mas ia ter que servir.

Passei a maior parte desse tempo isolada do resto dos campistas. Arranjei um local mais vazio perto do lago, coloquei meus fones de ouvido e fiquei tentando chegar a uma decisão. Ainda não completamente certa do que fazer, voltei à casa grande, cumprimentando Quíron com um aceno de cabeça e subindo direto para ver o Oráculo.

Quando desci alguns minutos depois, eu tinha certeza de estar tremendo. O centauro, assim que me viu, veio preocupado me amparar.

— Está tudo bem? O que houve?

— Dez. – Murmurei simplesmente – A profecia. Dez.

— Camila, acalme-se. Você não está fazendo sentido. Respire fundo. – Ele instruiu, me guiando delicadamente para me sentar em uma cadeira que eu nem sequer havia notado antes.

Passei uma mão pelo rosto, obedecendo. Foco! Não é hora de ter um ataque, faz isso na volta da missão, Camila! Respirei fundo mais uma vez antes de encontrar seu olhar e me explicar.

— Eu tinha escolhido um terceiro semideus para ir conosco. Eu achei que éramos só três, como sempre. Mas... – Balancei a cabeça de um lado para o outro – A profecia. O Oráculo disse que era uma missão de dez meio-sangues. Dez, Quíron! Somos todos nós! Todos que estávamos na sala de reuniões mais cedo! Eu não posso ser responsável pelas vidas de todos eles! Já bastava o Ario, a Leeh, a Camy e a Quell, mas agora são 11 vidas nas minhas costas! Eu não posso, eu...

— Acalme-se. – O centauro instruiu – Você pode sim, ou eu não confiaria a missão a você. Mas você precisa manter a calma. Respire.

Obedeci, fechando os olhos. Ele tinha razão. Eu não tinha tanta certeza se era capaz, mas uma coisa eu sabia: se não me controlasse, ai mesmo que a missão ia ser um fracasso. Eu não queria aquela responsabilidade, é verdade, mas ela era minha agora. Eles contavam comigo e eu não podia decepcioná-los. Surtar agora só ia resultar em todos nós virando lanchinho de monstro. E seria única e exclusivamente minha culpa. Puxei o ar mais uma vez, trêmula.

— Tudo bem. Eu estou bem. – Garanti – Estou bem.

— Tem certeza?

— Tenho. – Respirei fundo mais uma vez – Eu vou avisá-los. Eles não sabiam quem eu iria escolher, já devem estar todos meio preparados para ir.

— Já está quase na hora do jantar. Fale com eles lá. – Arregalei meus olhos. Faltava ainda uma hora e meia para o jantar quando eu subi – A sensação de conversar com o Oráculo altera sua percepção do tempo, é normal. Não se preocupe.

Engoli em seco e assenti. Levantei-me então e fui me encontrar com todos os outros campistas. Até chegar à fonte das conversas, luz e cheiro delicioso da comida, a maioria dos outros semideuses já estavam sentados em suas respectivas mesas, jantando.

Peguei meu prato, joguei parte do macarrão no fogo para Atena, e me juntei aos meus irmãos na mesa.

— E então, Mila – perguntou Maria – Já decidiu quem vai com você e com a Camy?

Engoli em seco, encontrando o olhar da criatura sem memória. Ela ainda estava assustada, eu podia ver. E levemente magoada pela quantidade de vezes que insinuaram que ela lembrava, mas não queria contar. Controle-se Camila. Eles precisam que você seja forte.

— Sobre isso. – Comecei, empurrando levemente meu prato. Como se eu precisasse de mais motivos para perder o apetite – Eu tinha escolhido alguém. E então fui visitar o Oráculo, como Quíron tinha me dito para fazer. Só que a profecia fala de dez meio-sangues, não três. – Camy, Maria e Cadu me encararam chocados.

— Como assim, dez? – Indagou Cadu.

— Pensa um pouco. – Disse a mais nova, olhando de mim para nosso irmão – Quantas pessoas estavam na sala de reunião hoje cedo? Quantas pessoas ficaram me monitorando desde que eu voltei? – Ele, Giovana e Maria mudaram suas expressões para levemente amedrontados ao entender – Vamos todos nós.

— Exatamente – Respondi. – Vou avisar os outros assim que acabar de comer.

Eu podia ver em seus olhos que eles queriam perguntar. Queriam saber sobre a profecia, o que mais ela dizia, o que nós íamos fazer. Mas eles também sabiam que não conseguiriam reposta alguma agora. Não se considerássemos que era de mim que estávamos falando. Terminei meu jantar mais por obrigação que fome, me mantendo em silêncio por boa parte do tempo, e me levantei, dirigindo-me primeiro à mesa de Hades.

— Quell, Ávil, estejam prontas pra ir ao amanhecer. – Elas me olharam confusas, mas segui em frente antes que tivessem chance de pedir uma explicação. Camy podia explicar se elas quisessem, eu precisava sair do meio das pessoas o quanto antes.

Repeti o processo nas mesas de Poseidon, Quione e Íris, exatamente do mesmo jeito, e então fui direto para o chalé. É, seria legal me despedir do resto do pessoal antes de partir numa missão, mas eu realmente não estava com cabeça. Só o que consegui fazer foi fechar minha mala, colocar um pijama e apagar na cama.

Na manhã seguinte, acordei com alguém me chacoalhando.

— Toledo, levanta – Ouvi a voz familiar me chamar.

— Precisa mesmo? – Perguntei sonolenta. Lima suspirou, se afastando.

— Sim, precisa. Você vai sair em missão, lembra? Já ta amanhecendo.

Arregalei os olhos assustada e pulei para fora da cama.

— Ai meus deuses, eu quase esqueci! Obrigada por me acordar! – Exclamei enquanto começava a m arrumar correndo.

— Sem problemas – Leonardo respondeu – Boa sorte lá fora. E não seja tão dura consigo mesma.

Com aquele comentário, parei tudo o que estava fazendo. Virei para olhá-lo, meu amigo muito antes de descobrirmos que éramos irmãos. Estreitei meus olhos e, em vez de responder, disse:

— Você não acorda cedo. Aposto que ainda nem foi dormir. Vai pra cama antes que eu te ponha pra dormir à força.

O garoto apenas balançou a cabeça de um lado para o outro, desistindo de argumentar, me deu um abraço rápido de despedida e foi deitar. Os únicos acordados no chalé éramos eu, Camy, Gih, Maria e Cadu, nos preparando para partir em silêncio. Do lado de fora, encontramos o resto do pessoal, cada um com uma mala pequena nas costas.

Quíron e o Sr. D se juntaram a nós, passando algumas instruções básicas. Bom, Quíron passou instruções, o Sr. D só ficou nos encarando com uma expressão extremamente entediada e tomando sua coca diet. Ao final, nos desejaram boa sorte e partimos. “Por favor Atena, não me deixa estragar tudo” rezei silenciosamente ao observar o acampamento diminuindo à distância.