I Never Learn escrita por Laurent


Capítulo 1
Prólogo - Not knowing who you were


Notas iniciais do capítulo

Gente, aqui está o prólogo. É baseado na música My Love - Lykke Li. É a única da fic que não faz parte do álbum I Never Learn. Espero que gostem, deem uma comentada aí se quiserem :)

Vou deixar o link da música e a letra no fim do capítulo. Bjs :*

*Not knowing who you were = sem saber quem você era



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Christian’s. Um pequeno bar que ficava perto do meu apartamento, e no qual eu ia todos os sábados. Lembrava um pub europeu. O dono era meu amigo, descendente de imigrantes ingleses, e tinha vindo para o Brasil aos 8 anos de idade, junto com a avó e os pais. Geralmente, ele recebia muitas pessoas ali, mas era um lugar silencioso apesar disso, o que nos dava a chance de conversar enquanto ele ficava atrás do balcão. Eu gostava de passar as sextas em alguma festa, mas os sábados eram reservados à tranquilidade do Christian’s.

Naquele sábado, o bar não estava vazio. Em um dos bancos, com uma lata de cerveja, um rapaz estava sentado e falando com Christian. Eu só via as suas costas. Usava uma jaqueta de couro preta parecida com uma das minhas.

— Eu ainda não sei muito bem. Me disseram que o curso é bom. Aí eu vim pra cá.

Parei na porta. Confesso que fiquei um pouco surpreso, pois as pessoas não tinham o costume de sentar no balcão e falar com Christian, exceto eu. Os indivíduos que frequentavam o bar preferiam ficar nas pequenas mesas cobertas com toalhas azul-marinho dispostas pelo ambiente do que solitários naqueles banquinhos.

Aproxime-me e sentei também.

— E aí, Christian, beleza? — falei. Cumprimentei o outro cara com um aceno de cabeça.

— O que vai querer? — Christian indagou.

— Me vê uma Heineken.

— Claro.

Ele foi até a geladeira e trouxe uma garrafa pra mim.

Encarei o cara ao meu lado. Reparei que só não éramos as únicas pessoas no bar por causa de um casal aconchegado em uma das mesas. Foi então que percebi eu que já conhecia aquele rapaz.

— Rafael? — perguntei, surpreso.

Ele olhou pra mim, e subitamente sorrindo, estendeu a mão.

— Kevin?

— Cara, o que você tá fazendo aqui em Curitiba? — retribuí o sorriso. — Tá só de passagem?

— Não. Na verdade eu vim estudar aqui — disse ele, parecendo orgulhoso. — Fui aprovado em Ciência da Computação na Utfpr. Me mudei há duas semanas.

— Nossa, parabéns, cara.

— Valeu.

— Mal chegou e já conhece o meu lugar. Isso é pra poucos. — Christian tinha um português muito bem treinado, embora fosse perceptível um certo sotaque na letra r que o fazia parecer um brasileiro do interior paranaense.

Bebemos nossas cervejas.

Rafael tinha sido meu colega no Ensino Médio. Morávamos em Maringá, naquele tempo. Então eu passara em Arquitetura e Urbanismo na Utfpr e me mudara para Curitiba. Na escola, não costumávamos nos falar muito, vez ou outra fazíamos um trabalho em grupo juntos. Mas havia alguma parceiragem entre nós, uma certa mutualidade. De algum modo, eu sabia que ele era uma boa pessoa.

— Ainda estou me acostumando com esse clima — disse Rafael.

— Ah — começou Christian. — O céu de Curitiba me lembra bastante o de Dover, onde eu nasci.

— Por favor, quando o tempo ficar quente, aproveite — eu disse, rindo. — Não é tão comum.

— Eu não gosto muito do calor mesmo — respondeu Rafael, batucando a mão no balcão. — Na verdade eu achava Maringá quente demais.

— Sempre saia com um guarda-chuva de casa. Quando você menos espera, cai uma torrente do céu e de repente você se pergunta de onde veio tanta água.

Rafael riu. O telefone de Christian, que ficava na cozinha do bar, começou a tocar. Ele saiu do balcão, esfregando as mãos no avental, e atravessou o pequeno arco de cortinas azul-escuras, desaparecendo por trás delas.

Um silêncio breve preencheu o ambiente depois que Christian atendeu o telefone. A voz dele era baixa e discreta.

— Você tá morando sozinho? — perguntei a Rafael.

— Tô sim. Na verdade... — ele bebericou a cerveja, deixando-a alguns instantes na boca antes de engolir. —... eu tinha combinado de morar com alguém. Não era pra eu estar sozinho.

— E o que aconteceu?

Rafael demorou alguns instantes para responder.

— Ele terminou comigo. Meu... meu ex-namorado.

— Ah... — Senti-me como se estivesse invadindo a privacidade dele. — Sinto muito.

— É a vida.

Tentei não ficar surpreso. Pra falar a verdade, até esse momento, nunca passara pela minha cabeça que Rafael fosse gay. Embora eu não me lembrasse realmente de ter visto ele com alguma menina antes, pensando melhor. Na escola ele costumava andar com os meninos — mesmo que também falasse com as garotas da nossa turma.

Rafael bebeu o resto de sua cerveja. Eu bebi a minha também. Ele parecia um pouco tímido agora, meio relutante em olhar pra mim. Ficou passando a mão no queixo, sobre a barba que estava por fazer, encarando os arredores do bar como se subitamente a decoração do local tivesse chamado sua atenção.

— E você? — finalmente ele disse. — Tá sozinho aqui?

— Por pouco tempo. — eu falei. — Por enquanto estou morando num apartamento aqui por perto, mas vou me mudar pro da minha namorada daqui dois meses.

— Entendo. Dividir apartamento corta muitos gastos.

— Sim. Muitos.

Ele suspirou.

— Cara, nem sei se vou conseguir terminar esse curso. — disse, girando a lata vazia nas mãos e parecendo um pouco triste.

— Por quê diz isso?

— Meus pais estão me ajudando a pagar tudo. Aluguei meu apartamento antes de terminar meu namoro, achando que iria dividir os gastos também. Não é nada muito chique. Mas agora vou ter que arcar com as despesas sozinho.

— Poxa, que chato... por que você não tenta encontrar outro mais barato?

— Acredite, eu já procurei — Rafael voltou a passar a mão na barba. — Preciso mesmo é arranjar um emprego e começar a ganhar dinheiro de alguma forma.

— Você mora aqui perto também?

Ele me encarou, subitamente interessado.

— Sim, por quê?

— Bem, eu trabalho em uma loja de artigos esportivos aqui perto — falei. — Um dos meus colegas vai sair em duas semanas porque conseguiu um estágio do outro lado da cidade. Você poderia tentar.

Ele sorriu, enquanto Christian retornava da cozinha.

— Poxa. Obrigado, Kevin — voltou a batucar os dedos na mesa. — Onde é essa loja?

— Christian, você tem papel e caneta aí? — indaguei, e ele se agachou no balcão, pegando um pequeno bloco de post-its e uma caneta preta. Anotei o endereço e telefone e entreguei a Rafael. — Acho que você tem boas chances.

— O que eu preciso pra ser chamado?

— Provavelmente você será encarregado de atender os clientes, então uma boa educação. E obviamente uma boa memória pra lembrar onde cada tênis de corrida fica.

— Ótimo — disse ele. — Valeu, cara. Te devo uma por isso.

— Que nada.

Nós sorrimos um pro outro.

— Bem... eu preciso ir. Ainda tem caixas de papelão no meu apartamento em que eu preciso dar um jeito. — Rafael entregou o dinheiro da cerveja para Christian e se levantou, estendendo a mão para mim. — Foi muito bom te ver, Kevin.

— Foi muito bom te ver também, Rafa. Você vai a pé?

— Vou sim.

— Eu vou com você então.

— Ah, não precisa — ele disse. — Você acabou de chegar.

— Vamos ser colegas de trabalho, não vamos? — falei, sorrindo. — Lá na loja a gente sempre escolhe o canto de alguém pra fazer uma reunião de amigos. Quero ver como é o seu. Eu não tenho nada pra fazer mesmo.

— Ok — ele respondeu, animado. — Fica a três quarteirões daqui.

Paguei a minha cerveja a Christian e nós nos despedimos. O casal que estava na mesa ainda não tinha ido embora. Saímos para a noite, que estava fria e silenciosa, mas que logo foi preenchida com nossas risadas. No caminho, relembramos a vida de ensino médio, falamos sobre faculdade, apartamentos e para onde tinham ido os nossos outros amigos do colégio. Repentinamente, começou a garoar. Era verão, mas aquela noite parecia uma prévia de outono. Abri meu guarda-chuva — Rafael não tinha nenhum — e continuamos andando enquanto a água caía leve e tranquila do céu imprevisível de Curitiba.

 

 


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Notas finais do capítulo

Link da música no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=9ewcX47JCrM
Link da letra: https://www.letras.mus.br/lykke-li/1361841/traducao.html



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