Monster escrita por Strawaltz


Capítulo 1
Capítulo 1: Infância e Corrupção




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Monster

Capítulo 1: Infância – Corrupção.

 

As folhas que caiam das árvores e jaziam sobre as calçadas escorregadias naquela noite de outono ajudavam a dar um ar mais frio para o que acontecia dentro de uma casa a alguns quilômetros dalí, em Meridian, Mississippi.

A chuva torrencial caía violentamente pela janela enquanto a jovem Hannah olhava para seu filho recém-nascido, que ria incansavelmente para sua mãe, dentro de um confortável berço de segunda mão que ganhara dos vizinhos. Os adornos coloridos de ursinhos com balões entretinham a criança quando sua mãe não estava por perto; mas, com ela aqui, o pequeno só tinha olhos para ela. Batia seus pequenos punhos, tentando se comunicar com sua mãe. Estava com frio. Necessitava do amor dela. Mas ela nunca o segurava. Os pais da jovem sempre vinham cuidar do bebê, ou então algum dos vizinhos. O pai, sempre no trabalho, o via algumas horas por dia. A ausência de calor de sua mãe o deixava agitado. Se já fosse grande o bastante para falar, se perguntaria quem era aquela mulher que o olhava desde o dia de seu nascimento, mas que nunca tocara nele, nem mesmo após o parto. Haveria algo de errado com ele? Mas não, ele não podia falar. Não ainda. Se contentaria, então, a olhar para a bela face daquela jovem mulher; a ter sua companhia, noite e dia, durante toda sua infância.

Enquanto isso, Hannah olhava para sua criança com verdadeiro desgosto. Se perguntava como pudera deixar o fruto de seus mais decorrentes pesadelos ganhar vida. Era sua culpa. Tudo era sua culpa. Ele era sua culpa. Teria de olhar para o rosto daquela criança pelo resto de sua vida e ser lembrada de como é usada, todas as noites. Aquilo não servira nem mesmo para protegê-la durante nove meses. Mesmo grávida, as ações continuaram. Aquela coisa estar viva era realmente o que a perturbava.

Não via como aquilo poderia ser sua criança.

Não era.

Nunca seria.

 

8 anos depois...

 

Ele se encontrava agora na escola. Crescera e já estava mais velho. Sabia falar e entender algumas coisas. Adorava vir a esse lugar e poder se sentir normal por algum período do dia. Aqui ele tinha colegas. Sim, colegas, pois não conseguia fazer amigos. Não com tudo o que vivenciava, além de seus problemas emocionais.

Recolhia seu material que permanecia em cima da mesa e o guardava lentamente dentro de sua mochila. Quanto mais demorasse a chegar em casa, melhor. Com uma idade tão inferior, já possuía as lástimas de um adulto.

Ouviu então uma voz doce o chamar.

“Henry, querido. Se apresse ou sua mãe ficará preocupada”, Sua professora disse em um tom cálido.

Ele sabia que não. Ela nunca ficara. Nunca ficará. Mas ele não disse isso. Simplesmente sorriu, fechou o zíper de sua mochila e saiu apressado pela porta. Não queria falar de seus problemas para os outros. Eles não entenderiam. E, além do mais, não gostaria de ser levado embora de casa. Queria ficar ali e tentar receber o amor de seus pais por mais algum tempo. Sabia que poderia conseguir. Algum dia, quem sabe...

Saiu pelo portão da escola enquanto olhava com cobiça para as outras crianças, todas de mãos dadas com seus pais, indo pacificamente para casa. Todas menos ele. Tinha uma rotina diária que seguia sozinho. Nada nela envolvendo seus pais. “Durante a noite...”, um arrepio percorreu sua espinha.

Andou, sozinho, doze quarteirões. Nunca olhava para cima, sempre para seus pés. Não encarava as pessoas, pois sabia que isso traria lágrimas a seus olhos; a felicidade, sempre estampada em seus rostos, o incomodava. Nunca sentira aquilo e, provavelmente, nunca sentiria. Mas, oh, ele sabia fingir. Não tão bem quanto gostaria, mas sabia. Sua mãe gritara com ele uma vez, dizendo que não poderia trazer problemas para casa. Isso, porque sua professora perguntou a ela porque Henry era tão calado e triste. Para ele, isso não era nada, além de uma vitória. Ao menos ela falara com ele e admitira sua existência. O chamara de Henry... tinha três anos quando ela finalmente começou a falar com ele. Isso porque de seu pai a obrigara...

Chegou a sua porta da frente, ofegante. Parou e sentou nos degraus da porta. Ficaria ali o máximo que pudesse. Não queria entrar em casa. Olhou para o céu, se perguntando como seria sentir algo. Só por um momento, desejou que pudesse, qualquer emoção positiva que fosse. Por um momento, um minuto, um segundo que fosse. Mas nada aconteceu. Ficou sentado ali por dezessete minutos e finalmente resolveu entrar quando ouviu seu estômago reclamar a fome.

Abriu a porta e entrou na fria casa. Olhou para as cores escuras com que já estava tão familiarizado. Faziam um contraste incrível com o céu lá fora. As cores refletiam a felicidade de sua família. Tão obscura que era difícil dizer se algum dia existira realmente. Sua mãe a pintou pouco antes dele nascer.

Ouviu o barulho de copos se quebrando na cozinha, seguido de vários xingamentos. Era a voz de seu pai. Tentava fazer algo comestível para si. Sua mãe não fazia mais nada. “Essa daí só serve pra uma coisa”, dissera seu pai há alguns meses.

Na sala-de-estar, dificilmente se ouvia o barulho da televisão, ligada no volume mais baixo possível. A mulher, deitada no sofá, não notara sua presença. Mas seu pai, infelizmente, sim.

“Veja quem está aqui, se não é nosso pequeno monstro. Venha, sirva de algo e me ajude a limpar a cozinha.” Pegando o pobre garoto pelo braço, ele o arrastou até o local. Henry, por baixo de suas roupas, era coberto de hematomas. Fazia tudo que podia para agradar seus pais, mas ‘tudo’ nunca era o bastante.

O homem, apertando-o cada vez mais, arremessou seu filho com força em direção ao chão. O garoto, mesmo sentindo dor, não reclamou. A cozinha estava uma bagunça. Pegou um pano de chão velho e começou a esfregar pelos lugares. Enquanto limpava, sua mãe adentrou o local e, propositalmente, derrubou um copo de vidro no chão.

“Mamãe, o copo-” O inocente tentou dizer o óbvio.

Ouvindo aquela palavra sair da boca de seu filho, Hannah se virou abruptamente e deu um tapa violento no rosto de Henry, impedindo o mesmo de terminar sua sentença. Ele perdeu o fôlego e equilíbrio, caindo afobadamente para trás.

“Do que você me chamou?” Ela perguntou rispidamente. “Eu já não lhe ensinei? Será que é tão inútil a ponto de não aprender nada?”

A criança se encolhia cada vez mais contra a parede. Sua mãe batia nele com força. Não havia nada que ele pudesse fazer. Seu pai o obrigava a chamá-lo de Senhor, e sua mãe, Hannah.

 

Eles o chamavam de Henry na escola.

 

Eles o chamavam de Henry na igreja.

 

Eles o chamavam de Monstro em casa.

 

Minutos depois, mesmo dolorido pela surra, ele continuou a limpar. Esfregava a sujeira e enxugava suas lágrimas. Não sabia o que fizera de errado para merecer aquilo. Todas as crianças chamavam seus pais assim, por que com ele tinha de ser diferente?

 

Com o chegar da noite, a criança corre para seu quarto e tranca a porta. Uma pequena janela jaz no alto da parede do minúsculo cômodo. Manteve a luz acesa e se enrolou entre as cobertas. Durante a noite os monstros apareciam para lhe perturbar.

Essa também era a hora que seu pai fazia sua mãe gritar.

Olhando distraidamente para o teto de seu quarto, o garoto tremeu de medo ao ouvir uma forte pancada na porta de seu quarto, seguida pela voz de seu pai.

“Não me faça entrar aí para desligar a porcaria dessa luz!” Ele gritou em tom ameaçador.

Rapidamente, o jovem Henry levantou-se de sua cama e, ficando na ponta de seus pés e esticando seus pequenos dedos da mão, desligou o interruptor. De repente, todo seu quarto estava cheio de sombras; via criaturas embaixo de sua cama, dentro de seu guarda-roupa, olhando através de sua janela... isso fora o bastante para fazê-lo ofegar rapidamente. Correu então para sua cama, jogando as cobertas sobre seu rosto.

Via monstros de todas as formas e tamanhos passeando pelo seu quarto. Eram aterradores, bizarros, grotescos; existiam muitas palavras para representar os monstros que Henry via, mas nenhuma para descrever o que ele sentia ao enfrentar o mais amedrontador de todos. O que residia no quarto ao lado. O quarto de seus pais.

 

Quinze minutos. Silêncio.

 

Vinte minutos. Silêncio absoluto.

 

Trinta minutos. Silêncio mortal. Nem mesmo os grilos cantavam mais. Era exatamente quando o medo de Henry começava a crescer.

 

Quarenta minutos. O tempo máximo. Ouviu-se então algo duro bater contra a parede de seu quarto. Uma batida, duas batidas, três, quatro... BAM! O golpe mais forte de todos. Ele sabia o que era aquilo; sabia que era o corpo de sua mãe sendo jogado e imprensado contra a parede dura de concreto. Os barulhos repetitivos... eram quando seu senhor batia a cabeça de Hannah fortemente contra a parede, até a mesma se encontrar inconsciente. Perguntou um dia a sua avó o que eram aqueles barulhos estranhos vindos do quarto de seus pais. Ela lhe respondera, então: “Oh, querido. É o amor. Você vai entender quando for mais velho”. Dois anos se passaram e Henry ainda não entendia. Achou que nunca iria entender. Sua professora lhe contava estórias sobre cavaleiros e princesas encontrando o verdadeiro amor. Mas isso não se parecia com o que Henry presenciara uma vez. Ele nunca, em todo o restante de sua vida, se esqueceria daquela cena.

“Mas, aos seis anos de idade, é normal se assustar”, eles diziam. Aos seis anos de idade ele já não era o que se podia definir como normal. Nunca fora. Nunca seria. Jamais.

Não... Não...” eram as palavras abafadas que Henry escutava todas as noites, saindo pelos lábios de Hannah, entre soluços e lágrimas. A mesma não sabia porque ainda se importava em chorar; acontecia todas as noites.

Cale... essa boca!” BAM! Seu senhor esmagava o rosto da jovem contra a parede.

A mãe da criança era linda, isso ninguém poderia negar. Mas, agora, seu estado era crítico. Após o nascimento de Henry, ela não deixava mais a casa. Não se importava mais com nada. Um dia o pobre menino entrou no banheiro enquanto sua mãe tomava banho. Ele a viu arranhar o próprio corpo, dizendo estar suja por causa de seus pecados. Abaixou sua cabeça, saindo do banheiro. De alguma forma, aquilo também era sua culpa. Monstro. Sim, esse era ele. Hannah falava que seu maior pecado era seu filho. Ter algo como aquilo fora seu maior erro. O mataria se pudesse. Tinha a vontade e a razão, mas não a coragem.

Lágrimas escorriam pela frágil face da criança, enquanto esta rezava para que os monstros deixassem seu senhor e parassem de machucar Hannah. Tinha medo também por ele mesmo; as luzes apagadas agora davam chances de seu quarto ser invadido pelos seus medos.

 

Era somente uma criança.

 

Estava sozinho em meio a tanta frieza e injustiça.

 

Não entendia o amor. E esperava nunca entender.

 

Seu futuro agora estava traçado.


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