Lucy...

Alguém me chamava mas a voz parecia estar longe, fazendo-me questionar se era apenas minha imaginação.

Lucy...

Abri os olhos.

O céu acima de mim estava claro porém encoberto por nuvens e na minha visão periférica pude ver as copas das árvores grandes. O chão estava coberto por folhas e galhos. Levantei-me e instantaneamente senti várias partes do corpo arderem muito, também estava tonta. Então o que vi me surpreendeu.

Havia um corte profundo logo acima do meu joelho direito que continuava por toda minha coxa e também outros menores na perna esquerda e nos dois braços. Os cortes não pareciam ter qualquer padrão e todos eles sangravam principalmente o da minha perna direita em que eu podia sentir o sangue escorrendo quente numa grande proporção por toda minha perna. Minha blusa branca também estava rasgada e manchada de sangue onde descobri mais um ferimento ali. Apesar de não ser grande, sangrava bastante.

Lucy!

A voz ainda me parecia vaga e distante mas mesmo assim tentei segui-la.

Dei uns passos vacilantes e me apoiei na árvore mais próxima. Olhei por cima do meu ombro pra verificar se estava mesmo sozinha então continuei andando.

Ouvi um barulho suave nas folhas atrás de mim. Virei-me novamente.

Cat estava a um centímetro de mim com os olhos brancos, mortos e borrados com sangue como se ela tivesse chorado, seu cabelo estava embaraçado e desgrenhado, estava com um vestido branco longo todo rasgado sujo de terra e sangue. Então ela gritou:

LUCY!!

~’’~

Acordei e levantei bem rápido com medo. Olhei para todos os lados e constatei que ainda estava no quarto de Dale. Minha visão escureceu e eu fiquei tonta, esbarrando em alguma coisa o que fez o garoto que também estava no quarto correr para o meu lado e gentilmente me sentar na sua cama novamente.

— Lucy você parecia estar tendo um pesadelo então eu te chamei.

Minha visão voltou ao normal e eu apenas assenti.

— Eu fiz alguma coisa pra você comer porque acho que faz tempo que você não come. – Ele estendeu um pratinho para mim com um sanduíche. – Ah e sobre você comer, não é opcional sabe?

Virou a cabeça levemente para o lado e sorriu o que me fez sorrir de volta, então peguei o pratinho da mão dele e comecei a comer.

— Também não se preocupe com seus pais porque eu liguei pra eles e disse que você veio para a casa de um amigo depois da escola.

Meu Deus, meus pais!

— AI MEU DEUS o que eles falaram?? – Perguntei arregalando os olhos diante de tal alegação.

Ele riu da minha reação.

— Eles disseram que tudo bem, oras. – Disse dando de ombros.

— Ah. – Disse dando mais uma mordida no sanduíche dele. – Inclusive está muito bom, obrigada.

— Claro que esta bom, fui eu que fiz. – Disse fazendo uma cara de convencido a qual eu retribuí com um olhar zombeteiro. – Disponha. – Riu depois de um tempo.

— Então... Com o que você estava sonhando afinal?

Lembrei-me de Cat e perdi o apetite.

— Lucy, está tudo bem se não quiser contar ok? – Ele deve ter notado minha expressão.

— Não, não tem problema... Eu sonhei com Cat e ela está desaparecida.

Essa era a palavra que a mãe dela havia usado. Soava-me estranha.

— Eu sei, as aulas foram suspensas hoje por isso. – Olhou para o chão e pegou minha mão.

Meu pesadelo ainda estava me perturbando e sem perceber comecei a lembrar da noite anterior na qual eu saí correndo inutilmente a procura de Cat.

 Então me lembrei de que eu havia cortado meu rosto.

Levei minha mão ao mesmo mas estava normal, sem corte nenhum.

— Hm, Dale?

— Hm?

— Como você me achou ontem?

Ele ficou um instante em silêncio, parecia estar escolhendo as palavras.

— Eu estava andando pela floresta como eu faço normalmente e começou a chover, então eu comecei a voltar pra casa. – Ele olhou para mim. – Então eu te vi.

— E quando você me viu, meu rosto estava cortado?

Ele franziu o cenho.

— Não que eu me lembre, por quê?

— Ah nada não, acho que foi só meu pesadelo mesmo.

Inevitavelmente o artigo que eu havia lido no dia anterior voltou a minha mente

“... Os anjos caídos possuem a habilidade de cura quase imediata para qualquer machucado mundano...”

Isso tudo era muito estranho e não saía da minha cabeça, eu devia estar ficando louca. Só sabia de uma coisa:

Precisava encontrar o bibliotecário de novo.

— Dale. – Disse suavemente. -Eu acho que devia ir para casa agora.

Levantei-me, beijei seu rosto e deu um abraço nele.

— Muito obrigada por ter cuidado de mim ontem, eu não vou me esquecer disso.

E com isso, saí sem dar chance de ele dizer qualquer coisa ou me acompanhar.

~’’~

Cheguei à biblioteca e tinha apenas duas pessoas sentadas nas mesas lendo. Fui ate a mesa do bibliotecário que também se encontrava lendo. O titulo dizia “ É fácil morrer”.

— Eu sabia que você voltaria. – Disse ele de repente, abaixando o livro me assustando. – Fico feliz que tenha voltado.

— Ainda não sei se acredito em você.

— Acredita. – Disse preguiçosamente. – Por isso que está aqui, quer respostas.

Encarei-o duramente. Isso não iria dar certo, nem um pouco.

— Olha, Lucy, minha função aqui é apenas te ensinar e ajudar em tudo que eu puder, eu não estou contra você, eu tinha um grande respeito pela sua mãe e se eu puder te ajudar no que for, o farei.

Abaixei o olhar.

— Você está certo afinal... – Olhei para ele novamente. – Eu quero respostas.

O homem mais velho assentiu.

—Por favor me siga então.

Colocou uma plaquinha em cima da mesa dele escrita “ausente” e me guiou até uma porta na parede logo atrás da mesa. Entramos em uma pequena sala com varias caixas cheias de livros que deviam ser devoluções e atrás de uma delas se encontrava um alçapão. Ele abriu o mesmo e pude ver o começo do que deveria ser uma longa escada, então pegou um lampião e desceu as escadas. Respirei fundo com meu coração acelerado e segui-o.