Estava tocando"1,2,3,4". Era uma das minhas músicas favoritas do Plain White T's, mas "Hey There, Delilah"  era um hino. Quando ouvi o comecinho dela, meus olhos marejaram de emoção, isso era a única coisa que não mudou desde o primeiro show dele que eu fui.

A plateia já estava mais calma e cansada, provavelmente aquela seria a última música do show. Metade das pessoas cantavam num coro tão bonito e eu cantava junto com eles; a outra metade era composta por casais dançando juntos.

"A senhorita me concederia a honra de uma dança?" eu ri ao ver a mão de Harry estendida em minha direção.

"Claro."

Eu juntei as nossas mãos e ele sorriu mostrando seus dentes brancos e suas covinhas.

Ele pôs as duas mãos em minha cintura e eu pus as minhas em seus ombros. Harry me puxou para si juntando nossos corpos e eu deitei minha cabeça em seu peito.

Ele cantarolava baixinho e naquele momento estávamos mais abraçados do que realmente dançando, mas não reclamei.

"O show acabou." ele sussurrou no momento que as pessoas começavam a se dispersar. "Quer ficar um pouco mais?" eu confirmei com a cabeça.

Ficamos mais uns minutos assim até que Harry perguntou:

"Cadê seus óculos?"

"Coloquei dentro da minha bolsa. Estava bem sujo, esqueci o paninho na kombi." uma de suas mãos acariciou meu braço, provocando um arrepio em mim.

Ele percebeu pois parou  de fazê-lo.

"Podemos nomear esse dia como o melhor da viagem, certo?"

"Considerando que não estamos fugindo enquanto somos perseguidos por alguém com uma arma, nem estamos presos em uma cidade por causa da chuva, nem a Scarlet está quebrada. Ainda por cima você assistiu o Plain White T's pela primeira vez ao vivo. Então sim, acho que podemos." eu ri, mas Harry não me acompanhou.

"Tá tudo bem?"então ele olhou para mim, no fundo dos meus olhos, pegou uma mecha do meu cabelo, a enrolou entre os dedos e assentiu com a cabeça.

Antes que ele pudesse recolher a mão dele, eu a peguei no ar.

"Aster...eu não consigo." Harry disse tão baixo que por um momento achei que tivesse imaginado sua voz, mas ele repetiu e dessa vez eu pude ver seus lábios se mexendo.

Franzi a testa.

"Me desculpa." ele tirou a mão da minha e se virou ficando de lado para mim.

"Você não consegue o quê? Eu disse algo errado?" eu coloquei a mão em seu ombro e ele negou com a cabeça.

"Você não disse nada de errado, você não faz nada de errado, esse é o problema." ele resmungou e olhou para mim de novo. "Seria muito mais fácil se você fosse uma filha da mãe." ele riu sem humor.

Eu não poderia ver minha expressão, mas tinha certeza que ela era de completa confusão.

"Eu não consigo esquecer." Harry disse derrotado. " Eu sei que eu concordei em esquecer, mas.. me desculpa, Aster, eu não vou conseguir esquecer assim... é melhor eu me afastar, antes que eu piore as coisas. Ainda mais."

Cada palavra era como uma facada no meu coração, mas ele continuou:

"Não acho saudável para mim, muito menos para você estarmos juntos. Eu tentei me afastar de você depois daquele beijo, mas então você veio novamente como se nada tivesse acontecido, como se aquele beijo não tivesse sido uma ofensa para você, como se você sentisse pelo menos um terço do que eu sinto por você, como se fosse só eu e você."

Eu engoli seco. Eu não devia, mas continuava querendo ouvir mais. 

Harry voltou a olhar para qualquer direção que não fosse a minha.

"Involuntariamente, você age devagar derrubando minhas barreiras uma por uma, e quando me dou por mim, você já conseguiu preencher cada espaço do meu pensamento." a voz dele foi ganhando um tom de desespero, como se fosse necessário para ele expelir todas as palavras de uma só vez.

Harry se recompôs respirando fundo e olhou para mim.

"Isso é injusto comigo porque eu sou um idiota que gosto de coisas que não posso ter, e é injusto com você porque meus sentimentos por você são muito mais intensos do que os seus por mim. Eu nunca vou poder ser seu melhor amigo porque nunca vai ser suficiente para mim."

O silêncio era insuportável enquanto eu absorvia suas palavras com a cabeça baixa.

"Desculpa por jogar tudo isso sobre você de uma vez, mas sinto que iria explodir se não fizesse."

"Você realmente sente tudo isso por mim?" ele confirmou com a cabeça. "Estamos juntos há duas semanas."

"Infelizmente, não posso escolher como me sentir sobre você." ele desviou o olhar."

"Infelizmente, você quer se afastar, mas eu não quero que você se afaste."Harry me olhou surpreso."Olha, Harry, para ser sincera eu também não consigo esquecer. Nem por um segundo e não acho que seria capaz disso mesmo que fôssemos para pólos opostos do planeta."

Minha voz aumentava e ficava mais aguda então eu tive que retomar o fôlego.

"Por que você acha que nos afastarmos melhoraria alguma coisa?"  minha voz soou como um sussurro, mas eu estava séria. "Já parou para pensar que você pode ter se tornado importante para mim? Eu te contei coisas que ninguém mais sabe porque você foi a única pessoa que eu achei que estaria do meu lado e não me julgaria." eu sabia que estava perto do momento em que as lágrimas apareceriam então adotei um tom mais impessoal possível.

"Se queria se afastar, tudo bem, mas não precisava ter dito que sente algo por mim para depois fazer isso. Foi incoerente e desnecessário."

"Eu não queria te deixar assim, sinto muito." ele abaixou a cabeça e me pegou de surpresa ao me puxar para um abraço.

Retribuí o abraço o mais intensamente possível e eu não sabia o que estava acontecendo comigo.

Me afastar de Harry pareceria uma boa ideia para quem visse de longe. Seria a solução dos meus problemas, não é? Ficar longe dele me ajudaria a reorganizar meus sentimentos e concluir que cada compasso acelerado que o meu coração dava era pura carência, não ajudaria?

Minha mente parecia concordar que isso era uma boa ideia e que Harry estaria me dando essa opção sem maiores problemas, mas meu corpo era involuntariamente atraído pelo dele.

Como dois pólos opostos.

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