Outro dia. O sol já raiava no céu. Não, não raiava. O dia estava sombrio, escuro. As nuvens fofas e branquinhas como algodão agora estavam cinzas e pesadas, parecendo que iriam se desmanchar a qualquer momento. Finalmente o exorcista abrira o olho verde esmeralda brilhante. Mas hoje ele não estava brilhante. Estava opaco, sem vida, triste. Refletindo com precisão o estado de espírito do ruivo.

Suas esperanças de que tudo aquilo que havia acontecido tivesse sido um sonho acabaram assim que pousou os pés no refeitório da Ordem. O samurai estava lá, sentado do lado do albino. Quando percebeu o ruivo no recinto, virou o rosto para o outro lado tentando ignorá-lo, com sucesso.

O olhar morto do ruivo acompanhou o movimento do refeitório. Depois percebeu que a irmã do supervisor chamava-o para sentar junto com eles. Sua vontade era de dar meia volta e sair daquele lugar. Mas resolveu se contrariar e pegou seu café da manhã, indo sentar-se à mesa dos amigos. Não estava com fome, mas não queria ser interrogado logo pela manhã. Sentou ao lado de Lenalee.

Era difícil de acreditar que já havia gostado da garota. Não que ela fosse feia ou algo parecido. Era só alguns centímetros mais baixa que ele, tinha os cabelos pouco abaixo do ombro, verde-escuros. Na verdade, era considerada uma das exorcistas mais bonitas da Ordem. Mas, depois de nutrir uma paixonite por uma garota linda como ela, era estranho pensar que começara a desenvolver sentimentos fortes por um homem. Ainda mais seu parceiro – que, aparentemente, o detestava. Não. Agora com certeza ele o detestava.

Quase não tinha tocado na comida. A garota perguntara-lhe intrigada o porquê. Simplesmente respondeu que não tinha acordado com muita fome. Ao que parecia, ela não tinha ficado totalmente satisfeita com aquela resposta, mas serviu para a garota não perguntar mais nada sobre o assunto. Rapidamente se retirou da mesa, com a desculpa que tinha muitas coisas para pesquisar a mando do Bookman. Ninguém fez nenhuma observação, mas tanto Lenalee quanto Allen olhavam-no com certa desconfiança.

Tinha se enfiado na biblioteca e metido a cara nos livros, literalmente. Duas pilhas de livros estavam a sua frente e ele parecia ler cada um deles fazendo algumas anotações com uma cara de extremo tédio. Mas não era o tédio de costume de quando precisava fazer algum dos seus trabalhos de Bookman Junior. Era uma expressão mesclada de um tédio meio sem emoção. Mas era como ele se sentia no momento. Sem emoções. Sentia-se destruído por dentro. Como se nada lhe tivesse restado.

Nem havia notado o tempo passar. Só quando o Bookman insistiu para que parasse um pouco, que 7 horas seguidas já eram suficientemente boas para ele poder tirar o resto do dia de folga. Tinha perdido o almoço. Mas não era tão ruim assim. Não era a fome que lhe perturbava no momento. Era o pensamento de que estava sendo “traído” pelo seu melhor amigo. Que era seu rival. Não queria competir com Allen, mas não podia simplesmente forçar o moreno a gostar de si. “Ou será que não?” Sacudiu rapidamente esse pensamento fora. Acabou encontrando com Miranda. Ela parecia feliz em vê-lo. Dissera que o Supervisor procurava-o; precisava vê-lo agora. Ele assentiu e tentou forçar um sorriso para a alemã, porém saiu um pouco forçado demais.

Bateu na porta da sala do Supervisor e depois entrou no escritório bagunçado. Olhou em volta e viu Lenalee e Kanda. Sua expressão mudou para séria ao ver o espadachim. Ele somente ignorou o ruivo virando o rosto. Komui deu as ordens para eles e disse que partiriam em meia hora. Todos assentiram e foram arrumar suas malas. Em vinte minutos já estavam dentro do trem que os levaria até o destino: Espanha.

Foi uma viagem bastante tensa: ninguém proferia uma palavra, tampouco se mexia. Lenalee já estava começando a se incomodar com tal situação. Lavi era sempre tão sorridente, alegre, espontâneo, mas estava tão sério desde a véspera. Mal reconhecia o ruivo chato e brincalhão de antes. Também era estranho o fato dele não proferir uma palavra à Kanda. Seu passatempo favorito era provocar o moreno chamando-o pelo primeiro nome, só que até então não tinha sequer dirigido-lhe o olhar. Alguma coisa não estava bem, ela sabia disso. Em pouco tempo já estavam hospedados num hotel em Madrid. Parecia que dessa vez Komui havia se lembrado de reservar um quarto para cada exorcista. “Graças a Deus!” Pensaram os dois exorcistas ao mesmo tempo. Lavi não queria mais decepções. Yuu não queria mais surpresas desagradáveis.

“So try you best now, baby

Try your best to break me

You can’t break a broken heart

No damage you can do now

I’m immune to you now

You can’t break a broken heart

There’s nothing you can do to me no more

You can’t break a broken heart”

You Can’t Break A Broken Heart – Kate Voegele