Sobre Príncipes e Princesas escrita por Hanna Martins


Capítulo 36
Se eu ficar...


Notas iniciais do capítulo

Desculpa pelo sumiço, eu realmente não pretendia ter ficado tanto tempo fora do Nyah, mas aconteceu tanta coisa nesse começo de ano! Até comecei uma nova etapa na minha vida. Voltei para a faculdade! hehehe. Olha, aquilo lá é uma loucura, nem sei porque quis voltar para lá de novo, fazer uma nova graduação... ai, ai, sou louca não há outra explicação! Mas, vamos voltar ao que interessa, né? Aqui vai o penúltimo capítulo dessa história que amo tanto, mas que está chegando ao final, já estou com saudades!



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A brisa do mar brinca com os meus cabelos. Embora estejamos tecnicamente no começo do outono, o verão ainda não se foi de todo, há resquícios dele no ar, um visitante teimoso que se recusa a partir. Observo a praia deserta e o mar de um verde translucido, basta dar alguns passos para alcançá-lo. Gaivotas e o vai e vem das ondas sãos os únicos sons que quebram a monotonia do silêncio.  

Volto as costas para o mar e caminho em direção a casa branca que fica a poucos passos de mim. Grande, mas não de uma grandeza descomunal, na qual se perde facilmente, da qual estou tão farta. Não, não é assim, essa é uma casa de um tamanho confortável, espaçosa e aconchegante, do tipo que abrigaria uma família numerosa.  

Entro na casa. A decoração é simples, nada de excessos. Sento-me com as pernas cruzadas em uma das almofadas no chão da sala, perto de uma janela que ocupa boa parte da parede. O sol suave e morno entra por ela. Perfeito para uma soneca.    

Meus olhos voltam-se para um relógio na parede, nove horas. Fecho meus olhos e me concentro na sensação quente do sol em minha pele.  

— Vamos ao mercado? — pergunta Leon, sentando-se ao meu lado. — Quero fazer algo com frutos do mar. Os pescadores costumam ir pescar quando o sol nasce e depois vendem as pescas no mercado. Quero frutos do mar bem fresquinhos, do tipo que você juraria que foi tirado do mar poucos segundos antes de estar no seu prato.  

— Então hoje irei provar de seus dotes culinários, hein? 

Ele ri.  

— Oh, sim. Sei fazer uma coisa ou outra com frutos do mar. 

— Mal posso esperar! — Sorrio. 

Leon acaricia meu queixo e me beija suavemente.  

— Vamos ao mercado! — falo, me levantando. — Ele fica perto daqui? Percebi que não temos nenhum vizinho!  

— Perfeito! Ouvi dizer que vizinhos são o grande mal do século XXI. — Ele se levanta do chão.  

— Certo... Mas eu acho que há outras intenções por trás disso, não é somente nos livrarmos de vizinhos... 

— Você sempre descobre minhas intenções. Não há como te enganar — fala com um sorriso travesso e uma expressão terrivelmente sexy, me atraindo para seus braços.  

— E os frutos do mar? 

— Eles podem esperar. 

— Sei... Nada disso. — Me esquivo de seus braços. — Você acabou de me prometer uma refeição, agora terá que fazer uma!  

— Uma refeição, é? — Sorri maliciosamente. 

— Seu pervertido! — Empurro-o até a porta. — Vamos ao mercado! 

Leon faz um muxoxo e pega as chaves do carro. 

— Ok, mas depois... Bem, depois... vamos ter outro tipo de... 

O encaro com a sobrancelha arqueada.  

— Nem mais uma palavra, seu espertinho! Você não vai fugir de suas promessas — falo, enquanto o puxo para o carro, enquanto ele finge indignação.  

O mercado fica a meia hora da casa. Na verdade, é uma grande feira a céu aberto, com um verdadeiro mar de barracas amarelas. Há muitas pessoas, todas muito ocupadas em apalpar as frutas maduras, escolher os legumes e verduras mais vistosos, os peixes e frutos do mar mais fresquinhos.  

Leon circula pelas barracas, enquanto eu esmago entre meus dentes um cacho de uvas. O sumo da fruta escorre por meus dedos. Limpo-os com pequenas lambidas, como uma garotinha sem bons modos Daphné diria. Dou os ombros. Não há mais Daphné em minha vida. Enfio outra uva na boca.  

— Emma, peguei os frutos do mar que eu queria, vão dar uma ótima paella! — fala Leon, andando ao meu lado. — Quer mais alguma coisa? — indaga, indicando com cabeça as barracas.  

— Talvez mais um cacho de uva. Isso aqui está muito bom! — Coloco uma em sua boca.  

— Hum! Gostosas!  

Voltamos a barraca de uvas. Leon pede mais alguns cachos. Noto o olhar da moça ao me entregar as uvas, como se ela fosse me reconhecer. Por hábito volto meu rosto em outra direção, me aferrando aos óculos escuros que escondem boa parte de minha face.  

Leon percebe meu gesto, paga rapidamente a moça, e aproxima-se de mim. 

— Tudo bem? — pergunta, passando o braço por meus ombros. 

— Pensei que ela fosse nos reconhecer...  

— Não se preocupe com isso. Estamos seguros aqui. Ninguém vai nos reconhecer.  

Assinto. 

Foi uma bobagem, estamos em outro país, acho que ninguém vai saber quem somos nós por aqui.  

Ele beija meus cabelos e caminhamos lentamente até o carro.  

Abro a janela e deixo que a brisa do mar acaricie meu rosto. Fico hipnotizada pela imensidão verde do mar. Eu posso facilmente me perder nesse verde e nunca mais voltar à tona... 

— Emma? — A voz de Leon me puxa de volta para a terra firme. — Em que estava pensando?  

— Em nada...  

— E o que seria esse “nada”? 

— É que... prometemos que não iremos pensar, bem, pelo menos por hoje, sobre aquilo... estou tentando...  

Ele apanha minha mão e a leva até os lábios depositando um beijo quente.  

— Carpe diem. 

— Carpe diem — ecoa ele.  

Assim que chegamos na casa, Leon começa a cozinhar. Me instalo no balcão da cozinha, munida com um pacote de salgadinho, e observo seus movimentos calmos e precisos. Sua expressão concentrada, o modo que ele move as mãos, a pequena mordida na boca quando está decidindo sobre algo, quase imperceptível para olhos desatentos. Memorizo cada detalhe em minha mente como um pintor que deseja recordar uma paisagem para pintá-la depois.  

— Ei! — Ele joga gotas de água em mim. — Nada de estragar o apetite! — Aponta para o pacote de salgadinho.  

— Só estou aquecendo meu estômago! E esse almoço quando sai? Não quero morrer de fome — Jogo um salgadinho em sua direção. Ele se esquiva e mostra a língua. — Ei, você é um idiota às vezes! 

— Engraçadinha.  

— Lembra do nosso primeiro encontro, hein?  

— Lembro-me do segundo — provoca. — Você me deu um chute no traseiro! Um chute nesse belo traseiro! — resmunga com indignação.  

— Sinto por seu traseiro bonito, mas você mereceu, não é mesmo? 

— É, mereci sim. Não fui nada legal com você... 

— Com certeza não foi. — Cruzo os braços.  

Ele aproxima-se de mim, invadindo meu espaço pessoal (espaço pessoal? Acho que não existe mais isso entre nós dois há muito tempo) e coloca as mãos sobre o balcão.  

— Me perdoei, Emma, quando nos conhecemos fui um completo idiota. Sei que essa não é uma justificativa, até porque o que eu fiz não tem uma justificativa, mas naquele momento estava com raiva de tudo e de todos... e acabei, bem, acabei jogando boa parte de minha raiva em você. Você fez bem em me dar aquele chute no traseiro.  

— Eu sei. Você realmente era um idiota!  

— Um grande idiota... — Ele coloca uma mecha de cabelo atrás da minha orelha.  

Bato o dedo indicador em sua testa.  

— Mas, acho que aprendeu sua lição, não é? 

Ele sorri. Oh, um daqueles sorrisos feitos para conquistar uma nação e deixar garotas indefesas sem argumentos. Eu não sou uma garota indefesa, porém, com certeza, sou uma garota sem argumentos.  

— Jogo baixo como sempre — resmungo, me referindo ao seu sorriso.  

Ele tenta captar meus lábios. Coloco a mão em seu peito. 

— Minha comida! — exijo.  

— Estou desconfiado que apenas meus dotes culinários são minhas partes que interessa você.  

— Claro. E outras partes também. — Lhe lanço um olhar sugestivo.  

Leon ri, voltando-se para as panelas.  

Caminhamos pela praia após o almoço. E voltamos para a casa com as roupas molhadas e frios, não havíamos levado roupa de banho e nem desconfiávamos que o convidativo mar estava na verdade gelado.  

Após um banho quente, deitamos sobre as almofadas na sala em completo estado de abandono. Pulamos de assunto em assunto, sem no determos em nenhum em particular. Às vezes meus olhos teimam em olhar para o relógio, volto-os imediatamente para Leon e seus feiticeiros olhos verdes me libertam das regras de tempo e espaço.  

No jantar temos camarão salteado com legumes e batatinhas fritas. As batatinhas foram um pedido meu.  

Leon liga o som e uma música suave começa a tocar: 

 

Estou caminhando pela noite toda em mistérios 

Você está cantando o dia inteiro no labirinto 

Sem música no meu coração  

 

Ele me estende a mão. 

— Vamos dançar — convida.  

Aceito sua mão, Leon enlaça minha cintura, encosto a cabeça em seu peito. E juntos nos movemos no ritmo lento da melodia:  

 

Não quero dizer adeus  

Quero ouvir suas vozes em sonhos 

Não quero ver suas lágrimas 

 

Ele acaricia meu rosto e beija a minha testa. 

— Está acabando o dia — digo baixinho. 

— Eu sei — sussurra.  

 

Nós amamos  

Amor por satélite 

Através da chuva, às estrelas  

Amor por satélite 

 

A música vai ficando mais lenta até se acabar e apenas restar o silêncio. Resta o silêncio e a batida de nossos corações, o calor de nossa pele. Nossas bocas se encontram com avidez.   

Os longos dedos de Leon deslizam por meu corpo, como se ele estivesse acariciando as teclas de um piano. Sou agora seu piano e ele toca em mim a música mais bela que já existiu. Perco a noção de tudo ao meu redor.  

Somente volto aos poucos ao mundo habitado por outros seres humanos quando nossas respirações se acalmam e voltam a normalidade. Leon traça com as pontas dos dedos o meu braço. Passo a mão por seus cabelos incrivelmente macios, são deliciosamente bons de tocar.  

— Nós pulamos muitas etapas. — A voz de Leon é baixinha quase um murmúrio. — Fomos direito para o casamento, não que me arrependa de me casar com você... 

— Mas teria sido ótimo se tivéssemos iniciado nossa história como as pessoas normais geralmente fazem — completo seus pensamentos. — Primeiro iremos nos conhecer...  

— Você me consideraria um cara um tanto irritante, mas com um ótimo cabelo e muito, muito, muito atraente, não conseguiria deixar de pensar em mim.  

— Ei! — Dou uma cotovelada nele. — Convencido!  

— Eu só trabalho com a verdade! 

Bufo e ele ri. Acabo deixando escapar uma risadinha.  

— E você me acharia uma garota singular, já que estaria mais interessada em ler do que prestar atenção na sua bela bundinha.  

— Mentira! Você prestaria atenção sim em minha bela bunda, mesmo que não quisesse admitir. Não há como resistir!  

— Bem... talvez um olhar ou dois...  

Rimos.  

— Então, começaríamos a ter pequenas discussões por causa de nossos gostos — continua ele. — E eu te provocaria ainda mais ao descobrir que gosto de ver suas bochechas vermelhas e sua expressão de enfado quando é provocada. Você fica tão fofinha quando zangada. 

—  Ah, fico? 

— Perigosamente adorável — sorri, beijando meu rosto.  

— Certo. Eu ainda te consideraria um cara irritante.  

— Eu faria com que mudasse de opinião.  

— Como? 

— Com meus beijos. — Sorri. — E você não poderia resistir a esse belo rostinho. 

— Convencido! 

— Seus pais ficariam preocupados ao me conhecerem, pensaria que a filha foi longe demais ao escolher um homem muito bonito, pensariam que isso poderia causar sérios problemas na rua... 

— Ai, ai, você não toma jeito. — Aperto sua bochecha.  

— Iríamos namorar por alguns anos e quando você terminasse a faculdade, faríamos uma viagem, uma daquelas sem destino certo por algum país distante, talvez algo... no oriente... O Japão... — diz com a voz sonhadora. — Sim, esse seria um bom destino. Então, sob as flores de cerejeira eu te pediria em casamento e você... 

— Eu não aceitaria porque começaria minha pós-graduação em outro país.  

— Tá bom — resmunga. — Depois que você terminasse sua pós-graduação, então nós casaríamos. 

— Eu não disse que aceitava seu pedido — provoco.  

— Ah, você aceitaria, sim. — Ele me lança um daqueles seus sorrisos cheios de certeza. — Você não conseguiria resistir a meus encantos.  

— Sei...  

— Nossas famílias não chegariam a um acordo sobre o casamento. Então, nós escaparíamos e nos casaríamos em um lugar qualquer, depois enviaríamos cartões postais comunicando nosso casamento. Nossos pais ficariam zangados o que provocaria natais estranhos... 

— Estou achando que você deveria ser o romancista por aqui.  

Ele me abraça.  

— Se um dia nos encontramos novamente então vamos iniciar nossa história dessa vez de um modo mais normal — digo, beijando seu ombro.  

— Sim, e dessa vez será do nosso jeito.  

Uma lágrima me escapa. Eu prometi que não iria chorar hoje, mas não posso cumprir com essa promessa. Hoje é nosso último dia juntos.  

— Não vamos nos despedir, ok? — peço. — Assim será mais fácil para nós dois. Se eu me despedir de você terei a impressão de que nunca mais o verei e eu não quero pensar assim. 

— Emma... — Ele limpa minha lágrima com o polegar, há também dor em seus olhos que ele tenta esconder para não me deixar infeliz ou preocupada. — Há tanta coisa que queria falar... Mas não temos tempo... 

— Não, não vamos pensar nisso, certo?  

Beijo sua bochecha, seus lábios.  

— Me faça esquecer de tudo — peço.  

Leon me beija e nossos corpos se misturam. Não há nada para se preocupar, porque apenas existe eu e ele e mais nada nesse instante. Apenas eu e ele.  

O sol ainda não saiu quando acordo, porém é tempo de partir.  

Leon dorme ao meu lado, o quarto está mergulhado em uma semipenumbra, mas ainda consigo distinguir seu rosto. Traço delicadamente com as pontas dos dedos o contorno de seu rosto. Memorizo cada pequeno detalhe.  

Se eu ficar... seu eu ficar... tudo apenas seria uma grande merda. Eu não consigo viver nesse mundo, ainda que ele tenha Leon. Há aquelas histórias que dizem que o amor vence tudo que se você ama verdadeiramente alguém ficaria com essa pessoa até o final. Bem, elas estão erradas. Porque se eu ficar, ainda que eu ame Leon desde a pontinha da unha do pé até meu último fio de cabelo, ainda que o ame com todo o meu ser, sei que no final só nos machucaríamos um ao outro. Apenas nos restaria a dor no final. As cinzas de um amor.  

Amar é também dizer adeus. Amar também é deixar ir.  

Deixar ir talvez seja a expressão mais autentica de amor.     

Porque amo Leon preciso ir.  

Levanto-me da cama. Visto as roupas rapidamente e apanho uma pequena mala onde estão guardadas minhas coisas. Não posso me deter mais nenhum instante, preciso fazer isso agora, temo que não tenha valentia o suficiente para fazer em outro instante.  

Beijo os lábios de Leon e sem me voltar uma única vez para trás, saio do quarto. 

Caminho determinada até o carro que me espera. O motorista abre a porta e pega minha parca bagagem. Cerro meus olhos. 

Em poucos dias vão começar a anunciar nosso divórcio ao público. A realeza achou melhor que eu fosso para outro país, um bem distante. E Leon fez o possível para que tudo corresse do modo mais discreto.  

A pressão, a batalha que enfrentamos ao comunicar nossa decisão a realeza... são coisas que quero esquecer, elas fazem parte do meu passado agora.  

Baixo o vidro da janela, o sol começa a nascer. Respiro o ar fresco da manhã e observo o nascer do sol.  

Minha pele ainda detém o calor do corpo e o aroma de Leon.  

— Amo você — sussurro em direção a casa que fica cada vez mais distante. — Eu te amo. 


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Triste, não? Mas prometo que vou tentar não demorar com o capítulo final!
E a música que Emma e Leon escutam se chama Satellite de Saltnpaper.
Então, é isso, vejo vocês em breve, seus lindos!



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