Sobre Príncipes e Princesas escrita por Hanna Martins


Capítulo 21
Olhos secos


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado à linda da Adrielly Costa que fez uma recomendação simplesmente linda para a fic e que me deixou aqui surtando. Obrigada, Adrielly!



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Cada pessoa tem um modo de lidar com a perda. O modo de Charlie é fazer loucuras, como escapar do palácio e ir parar em um bar no meio da noite, causando um alvoroço.

— A encontrei... — fala Sebastian, carregando uma Charlie bêbada em seus braços.

Encolhida, com a cabeça descansada sobre o peito de Sebastian, ela dorme tranquilamente.

— Ela vai ficar bem?

— Vai acordar com uma bela ressaca amanhã, mas ela vai ficar bem — me tranquiliza.

— Ainda bem... — solto um suspiro. — Leve-a para o quarto — peço. — E avise ao palácio que ela vai ficar aqui hoje.

Não há uma fórmula sobre o modo correto de lidar com a perda. Não há uma receita. Cada pessoa tentará de seu modo. Enquanto Charlie tenta acabar com sua dor recorrendo a festas, Leon age o mais normalmente possível. Ele esconde a sua dor por meio de uma expressão serena.  

Aquela noite no jardim foi a única vez que Leon se permitiu ser vulnerável, depois fechou-se em si mesmo.

Hoje faz exatamente oito dias que Francis e Guinevere já não estão mais entre nós. Ainda é difícil para mim acreditar que nunca mais os verei.

O absurdo da morte. Em um dia a pessoa está aqui com você, sorri, seu corpo tem vida, tem calor, tem sonhos, planos, em outro, não está mais. E você se dá conta que ela nunca estará aqui novamente.

Francis e Guinevere eram pessoas realmente especiais. Embora eu não tenha tido muito contato com eles, o pouco que tive foi o suficiente para eles permanecerem para sempre em meu coração. O falecimento dos príncipes herdeiros partiu o coração de todos.

Eles morreram em um acidente de carro, enquanto se dirigiam para um evento. O motorista perdeu o controle. Todos que estavam no carro faleceram no local do acidente. Quando o socorro chegou, já não havia mais nada a fazer.

Desde então, nossa vida tem sido cercada por solenidades. Leon se mostra sempre com uma expressão austera e serena nestas ocasiões. Recebe os cumprimentos, agradece e mostra uma expressão plácida. Mas, sei que isso é apenas uma máscara que ele está utilizando.

A família real decretou luto por dois meses. Neste período, nenhum membro da realeza comparecerá a compromissos públicos oficiais. As coisas na realeza estão um verdadeiro caos com a morte do príncipe herdeiro. Tento não pensar nas consequências disso tudo. Leon agora é oficialmente o príncipe herdeiro.

Respiro fundo.

Encontro a sala de música com as luzes acendidas. Ouço uma suave melodia. Abro a porta com cuidado. Os habilidosos dedos de Leon voam pelas teclas do piano, como se ele estivesse sentindo cada nota que produz. 

Me aproximo sem fazer qualquer barulho. Sento-me ao seu lado. Ele nota a minha presença, porém continua a tocar como se eu não estivesse aqui. Ficamos assim por um bom momento.

— Gosta desta música? — ele pergunta subitamente.

— Gosto. 

— Eu compus hoje — um sorriso surge no canto de seus lábios. 

— É uma música muito bonita. 

Olho para seu sorriso. Este não é seu verdadeiro sorriso. É apenas uma máscara.

— Leon... — começo a falar hesitante.

— Hum... — ele continua a tocar.

— Leon — chama-o.  — Você está bem?

Nenhuma resposta.

Os dedos dele adquirem uma velocidade prodigiosa. Vejo-o fechando-se, construindo um murro intransponível. Se continuar assim, não conseguirei jamais alcançá-lo.

— Você pode se permitir ficar triste, sabia? — digo.

Seus dedos ficam estáticos imediatamente. A música morre.

— Emma, não me dê conselhos — fala friamente.

— Leon, apenas estou preocupada com você! Só pensei que...

Ele nada diz. Agora, está utilizando a máscara da impassibilidade. É impossível cruzar o muro.

 — Ah...— me levanto. — Me desculpe, eu não deveria ter tocado neste assunto... — dou as costas a ele e começo a andar em direção a saída.

— Emma... — ele me chama, sua voz não é mais fria, é amável.

Volto-me para ele.

— Eu não deveria ter falado assim com você, me desculpa. Eu sei que você apenas quer ajudar... mas... eu...

— Tudo bem — volto a me sentar ao seu lado. — Eu realmente deveria não ter tocado neste assunto já que você não quer falar sobre isso.

Pego a mão dele, está gelada. Envolvo-a nas minhas. Por um momento, penso que ele vai me repelir, porém, não o faz.

— Obrigado — seus incríveis olhos verdes vão parar nos meus.

— Você sabe que pode contar comigo, Leon. Se quiser conversar...

Ele assente.

Envolvo-o em um abraço. Ele apoia a testa em meu ombro. Ficamos assim por um logo tempo.

— Emma... — ele levanta o rosto para mim.

Seus olhos se detêm nos meus. Seus olhos estão secos, mas seu olhar é tão triste. Tristeza. A tristeza em seu estado puro. É torturante olhar para seus olhos neste estado. Seus fascinantes e expressivos olhos. Porém, não recuo, mantenho meu olhar.

Não sei quem fez o primeiro movimento, não sei quem deu o próximo passo, apenas sei que nossas bocas se encontram.

O beijo é calmo. Calmo como a brisa em uma manhã ensolarada.

Nos beijamos até que sentimos a necessidade respirar novamente. Porém, não nos distanciamos. Leon encosta a testa na minha. Capturo os seus lábios. Ele passa o braço por minha cintura me trazendo para mais perto. Seus lábios deslizam da minha boca até meu pescoço, detendo-se em determinado ponto. Seus lábios, sua língua, seus dentes experimentam o sabor de minha pele. Meu corpo todo vibra e se enche de calor. Minhas mãos apertam suas costas.

Os lábios dele voltam para meus. Desta vez, o beijo não é nem um pouco calmo, é necessitado. Nossas bocas se procuram com avidez.

O que estamos fazendo? Não me pergunte, porque eu realmente não tenho uma resposta para esta questão.

Nossas mãos percorrem o corpo um do outro em completa liberdade. Diria que não sou eu a responsável por minhas ações, meu corpo se guia pelas sensações.

Estou tão emergida nas sensações provocadas pelos lábios, pelo toque de Leon em minha pele, que só depois de um tempo me dou conta que alguém está batendo na porta.

Separo meus lábios dos dele.

— Quem é?

— Sou eu, Sebastian.

— Entre — digo, tentando voltar ao mundo da razão.

Leon volta-se para o piano, e eu me volto para a porta.

— Desculpem-me — diz Sebastian, entrando na sala. — É que... Charlie...

— O que tem ela? — indago alarmada.

— Ela acordou e está um pouco incontrolável.

— Onde ela está? — pergunta Leon.

— Está na adega...

Eu e Leon, seguidos por Sebastian, vamos até lá.

Bem, como posso explicar o que vejo... Charlie está cortando o cabelo com um caco de vidro e ela já fez boa parte do trabalho.

Sebastian corre para tentar retirar o caco de vidro das mãos dela.

— Me dá isso, Charlie... — ele tenta utilizar uma voz que transmite tranquilidade.

— Não! — ela continua a cortar o cabelo. — Eu cansei deste corte, agora, quero cortar meu cabelo bem curto...

Sebastian suspira, sem saber o que fazer.

Leon se aproxima dela.

— Charlie — ele fala com uma voz muito gentil. — Francis, quando você era pequena, dizia que seu cabelo era tão lindo quanto ao da Rapunzel, não é?

Ela para imediatamente de cortar o cabelo e o olha.

— Francis... — uma lágrima escorre por sua face ao escutar o nome do irmão. — Francis — repete o nome do irmão com uma expressão cheia de dor. — Francis... — o nome ressoa em seus lábios como a de um pássaro desesperado porque não pode mais voar.

— Eu também sinto tanta falta dele... — fala. — Muita falta! — ele estende a mão para Charlie.

Ela entrega o caco de vidro e Leon a envolve em um abraço.

— Vamos, Sebastian...

Ele assente. Saímos e deixamos os dois sozinhos. Os dois compreendem a dor um do outro como ninguém neste mundo poderia compreender.

Leon traz Charlie adormecida para o quarto, depois de algum tempo.

— Ela está bem? — indago.

O rosto de Charlie está completamente inchado e há vestígios de lágrimas.

— Vai ficar... — responde, depositando Charlie na cama.

Leon a cobre cuidadosamente e acaricia seus cabelos ou o que restou dos cabelos. Ele solta um suspiro.

— Ela agora vai dormir à noite inteira, está mais calma... mas, para prevenir, avisei os guarda-costas para ficarem de vigia.

— Você está cansado, precisa dormir — digo, o olhando.

Ele levanta-se da cama da irmã e assente.

Caminhamos lentamente pelos corredores do silencioso palácio de verão. Chegamos até o corredor em que devemos seguir em direções opostas. Eu, à esquerda, Leon, à direita.

— Eu... vou por aqui... — digo. — Tenha uma boa noite... descanse, você precisa.

Leon não diz nada. Começo a andar em direção ao meu quarto. No entanto, não dou muitos passos. Meu corpo é envolvido por um par de braços.

Ele se inclina, sinto sua respiração em meu pescoço, fico arrepiada.

— Fica comigo esta noite — pede, sua voz é baixinha, rouca, quase uma súplica.

— Sim — respondo.

 Um beijo suave como o roçar das asas de uma borboleta é depositado em meu ombro.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do capítulo? Emma está procurando ajudar Leon de alguma forma, e ela está destruindo o muro que ele tentou construir após a morte do irmão. Como será que as coisas ficarão?