Sobre Príncipes e Princesas escrita por Hanna Martins


Capítulo 14
Um estranho entre plebeus


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado à Ashley Weasley Potter que presentou a fic com uma recomendação maravilhosa e que me deixou sorrindo aqui. Obrigada, sua linda!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/671087/chapter/14

— Muito bem, Emma, isso mesmo — incentiva Helga.

Fiz até que alguns progressos em minhas aulas de equitação. Na verdade, esta é a segunda aula, e me equilibrar direito em cima de Morango é um grande avanço. Boa parte deste meu progresso é mérito exclusivo de Morango.

— Certo, encerramos por hoje — diz Helga, me ajudando a descer.

Conduzo Morango até o estábulo. Dou algumas cenouras para ela como recompensa por não tentar me derrubar nenhuma vez, mesmo quando fiz algumas coisas erradas.

Um dos empregados leva Morango. E me entretenho observando um cavalo branco, digno dos cavalos brancos dos príncipes encantados, sim, eles existem (os cavalos, não os príncipes encantados).

— Gostou de Snow? — indaga uma voz feminina atrás de mim, como estou entretida com o cavalo não havia percebido a presença de ninguém.

— Ele é lindo — me volto.

A mulher sorri, mostrando seus alvíssimos dentes. Seus olhos verdes me analisam.

Princesa Sylvia, a irmã caçula do rei.

— Olá, Emma!

— Sua Alteza Real — cumprimento.

— Ah, não precisamos disso — sorri. — Apenas me chame de Sylvia como todos os amigos de meu filho Will fazem.

— Ah — digo, sem saber bem o que fazer.

A família real tem este efeito em mim. Não tenho culpa, se eles parecem mais deuses do que meros humanos. Pessoas quase irreais.

 A princesa Sylvia é apenas alguns minutos mais nova do que o rei Carlos IV, os dois são gêmeos. Ela viveu por bastante tempo na Itália, depois de seu casamento com um milionário italiano.

Lembro de tê-la vista em meu casamento, mas foi bem rapidamente.

— Se quiser, pode montá-lo — aponta para o cavalo.

— Não, obrigada, eu sou uma iniciante...

— Tudo bem, quando quiser, está a sua disposição.

Assinto.

— E como você está, Emma? Sei que Charlie deu uma festa em minha casa estes dias para você.

— É, ela deu — assinto.

— Foi divertido?

— Sim, foi. Obrigada por emprestar sua casa para nós.

— Que bom que vocês se divertiram! — exclama.

A princesa Sylvia tem algo de autoridade nela. Sabe aquelas pessoas que você olha para elas e sente que está diante de um líder nato que comandaria milhares de pessoas? Ou aquelas pessoas imponentes que impõe respeito somente com um olhar? Esta é a princesa Sylvia. Além disso, ela é muita alta, o que torna sua figura ainda mais impressionante. Ela é igual a uma daquelas bonecas, perfeitas e irreais que você encontra em uma loja luxuosa de brinquedos.

— Sempre que quiser está a sua disposição — sorri, mas os olhos não acompanham os lábios. 

— Obrigada.

O silêncio cai sobre nós. Como eu detesto este silêncio. Os olhos analíticos da princesa não saem de mim, e o sorriso continua pairando em seus lábios, como se esperasse que eu continue a conversa.

Eu não sou a pessoa mais tagarela do mundo, muito pelo contrário, então, nunca me senti tão feliz em avistar Muriel trazendo seu cavalo para o estábulo. Pelo menos tenho agora um motivo para sair daqui e acabar com o silêncio constrangedor.

— Preciso falar com uma... amiga, com licença — digo.

— Tudo bem, querida. Espero termos outras oportunidades para nos vermos.

Saio quase correndo em direção a Muriel.

Ela arqueia a sobrancelha ao me ver chegar.

— Ah... oi — falo, um tanto sem jeito, porque percebo que o olhar da princesa está em minhas costas.

— Oi — responde Muriel.

— Lyane está aqui? — pergunto apenas por ter algo para falar.

— Não, ela tem aula hoje.

— Ah.

Eu não encontrei mais com Lyane desde a festa (aquele encontro no vestiário não conta).

— Tenho que ir — falo.

Muriel me olha intrigada. Ela deve me considerar uma garota estranha. Não a culpo.

Ok, esta foi uma conversa muito esquisita. Ultimamente, os momentos embaraçosos têm me perseguido. Com certeza, eu em minha outra vida, queimei uma cidade, porque só assim para explicar tanto desastre.

Quando chego ao palácio, só quero uma coisa, comer. Estou morrendo de fome. A hora do almoço já passou há muito tempo. E só de pensar que ainda tenho aula com Daphné nesta tarde... Que bela tarde de sexta-feira!

Entro no meu quarto e (por que isso acontece comigo?) Leon lança um daqueles sorrisos de príncipe encantado. Suspeito. Muito suspeito. 

— O que você está fazendo aqui?

— E isso lá é jeito de tratar seu lindo marido? — diz, fingindo-se de ofendido.

Lanço meu olhar: “menos”. Mas rapidamente desvio o olhar, já que meus olhos foram parar em uma área problemática, seus lábios. Olhá-los me traz determinadas recordações. Droga, por que eu tinha que me lembrar daquele maldito beijo? Não quero que ele perceba que eu gostei do beijo, isso daria a ele uma arma fortíssima para ficar me zombando. Não, não vou dar nenhum trunfo a esse príncipe. Até vejo-o sorrindo e se vangloriando: “oh, a plebeia gostou do meu beijo. Eu sei, eu sei, sou perfeito em tudo o que faço”.

A propósito, o beijo rendeu muito falatório. Revistas, jornais, sites, estão todos abarrotados de fotos daquela cena.  O tema se tornou algo em alta estes dias. E até agora não recebemos mais nenhum sermão. Tenho que reconhecer, a tática de Leon deu certo.

— Eu até preparei uma surpresa para você — fala como alguém que não quer nada.

 Cruzo meus braços e o encaro, tentando decifrar seus pensamentos. Uma missão que beira ao impossível. 

— Não vai querer saber? — pergunta casualmente.

— Com toda a minha experiência com presentes reais... — lanço um olhar significativo para ele.

Leon se aproxima de mim com um ar misterioso. 

— Vamos visitar os plebeus!

— O quê?

— Não me diga que já se esqueceu, pensei que você fosse mais filial.

Minha família, a visita aos pais da noiva.

— Você conseguiu? 

— É, eu sei, eu sei, sou demais. Deu trabalho, mas eu consegui permissão para visitarmos seus pais neste final de semana.

— Jura? — quase nem acredito na notícia.

Um sorriso enorme se abre em meu rosto, vou ver minha família, vou voltar ao meu lar.

— E quando nós vamos? — pergunto entusiasmada.

—  Agora. Vamos voltar no domingo à tarde.

— Tenho que arrumar minhas coisas — começo a correr pelo quarto.

— Os empregados já fizeram isso — diz Leon, me observando.

— Então, tenho que levar aquela blusa que comprei para minha mãe, o presente para Andy, o casaco para meu pai — murmuro sem prestar atenção nele. — Também tenho que pegar aquilo...

— Isso vai ser interessante, como será que os plebeus vivem?

Ignoro-o e continuo a minha lista de coisas que tenho que fazer.

— Ei, estou falando com você!

Empurro Leon até o closet e fecho a porta.

— É assim que você agradece quem deu um presente a você? — protesta ele.

Abro a porta.

— Obrigada! — fecho a porta, deixando-o com uma expressão interrogativa.

Logo Sebastian vem me buscar. Leon já está no carro. Passo o trajeto inteiro tão empolgada com a perspectiva de voltar ao meu lar que não ligo para mais nada, nem mesmo para as pequenas provocações dele, como ficar me encarando como se eu estivesse com vários parafusos a menos.

A nossa segurança é reduzida. Os guarda-costas apenas ficarão vigiando de longe. 

Aqui estou eu, em frente à casa em que passei 18 anos de minha vida. Aqui, eu dei meus primeiros passos, proferi minhas primeiras palavras, li meu primeiro livro. Chorei. Sorri.

A lavanderia de meus pais não está mais aberta. Eles precisaram fechar, já que ter uma filha que é esposa de um príncipe pode chamar muito a atenção. E sogros reais, que têm uma lavanderia, não são bens vistos. A realeza é cheia destas coisas sem sentido. Parece até que ofereceram uma loja de roupas para meus pais administrarem, isso pegaria mais bem para os sogros reais.

Desço do carro e subo as escadas correndo. Meus pais e Andy estão na sala me esperando. Corro e dou um grande abraço em cada um deles. Bagunço o cabelo de Andy, causando queixas no pirralho. Rio. Parece até que voltei no tempo.

Uma limpada na garganta me faz voltar a realidade. Me volto e encontro Leon no meio da sala.

Meus pais e meu irmão olham para ele. Eles estão um tanto acanhados com a presença de Sua Alteza Real, percebo logo.

— Boa tarde, senhor e senhora Jones, Andrew — cumprimenta, apertando a mão de cada membro de minha família. — Como vocês estão?

— Bem — respondem um tanto sem jeito.

Leon sorri, utilizando seu típico sorriso de príncipe encantado. Um sorriso que conquista e abre todas as portas. Minha família respira um pouco aliviada, mas ainda se nota a tenção no ar. E o silêncio cai sobre nós.

Ele olha para tudo e para todos com curiosidade, não tem como saber quais são seus pensamentos. Minha família se entreolha.

— Ah, temos que levar isso para o quarto! — aponto para nossas coisas que estão no meio da sala.

Começo a pegar as coisas. Leon apanha o resto de nossa bagagem, que não é muita, grande parte é formada pelos presentes para minha família. 

— Vocês vão ficar em nosso quarto — diz minha mãe timidamente.

Nossa casa tem apenas três quartos. O quarto de meus pais é o maior.

— Não — diz Leon. — Iremos ficar no quarto que foi de Emma — ele passa o braço por meus ombros me trazendo para perto de seu corpo.

— Não! — começam a protestar meus pais.

Mas, ele lança outro de seus encantadores sorrisos.

— Onde ficava o seu quarto, Emma? — diz em um tom extremamente agradável.

Com certeza, o professor de interpretação dele era muito bom.

— Fica ali — aponto para a porta do meu quarto.

Leon, sem retirar o braço dos meus ombros, caminha até lá.

— Então, este é seu quarto? — lança um olhar analítico por toda a breve extensão de minha amada caixa de fósforo.

Meu quarto é bem pequeno, não tem muitos móveis: uma cama (que é maior que uma de solteiro, mas bem menor que uma de casal), um guarda-roupa pequeno, uma escrivaninha e uma pequena estante de livros abarrotada de coisas.

— É — afirmo. — Este é meu quarto.

— Interessante... nunca dormi em um banheiro antes.

— Ei! — protesto.

Leon se espreguiça e boceja.

— Estou morrendo de sono.

E sem que eu possa impedir, deita-se na cama. É sério isso? Esse príncipe está deitado em minha cama? Ele tomou posse dela como se ela pertencesse a ele desde sempre. E a noite, como eu vou dormir? Será que vou ter que dormir no chão? Temos um problema aqui. Apenas uma cama (uma cama pequena) e duas pessoas.

— Emma! — chama a minha mãe.

Olho para Leon que colocou os fones de ouvido e fechou os olhos, resolvo deixar isso para depois. Pego os presentes que escolhi para minha família e volto para a sala.

Sem a presença dele, minha família fica bem mais relaxada. É muito bom passar um tempo com eles.

Minha família maluca e anormal, como senti falta deles. Não somos uma família de comercial de margarina, temos várias desavenças, mas, esta é a minha família, são as pessoas que eu amo. Minha louca e querida família.

Minha mãe e meu pai preparam o jantar, enquanto eu e Andy jogamos uma partida de vídeo game. Esta até parece uma noite típica da minha vida, antes dela se tornar algo incompreensível, obviamente. 

O agradável aroma do jantar, invade minhas narinas. Eu e Andy colocamos a mesa. Tudo isso é tão familiar e nostálgico. Nunca pensei que algo tão pequeno como ver meus pais preparando o jantar, ajudar a colocar a mesa, fosse um momento especial. Talvez, seja verdade o que dizem sobre você só reconhecer as coisas boas, quando você as perde.

— Emma... — minha mãe me olha. — Chame o... príncipe para o jantar.

Assinto e vou até meu quarto.

Encontro Leon inspecionando minha prateleira de livros.

— Ahã! — chamo a atenção dele.

Vê-lo tocando em meus livros é estranho.

— O que foi? — ele se volta para mim e age como se fosse eu a intrusa e não ele. Este príncipe é mesmo petulante.

— O jantar está na mesa — digo.

— Ok — ele coloca o livro, que estava folheando, na prateleira.

Observo-o. Descascar esta cebola cheia de camadas denominada Leon é algo impossível.

— Como é difícil ser bonito e gostoso — fala, após pegar o meu olhar sobre ele, aproximando-se de mim. 

Dou uma cotovelada em seu estômago.

— Ei! Não me machuque, eu apenas estou constatando uma verdade, não há motivo para violência!

— Seu... — procuro uma palavra para xingá-lo, mas nenhuma que me vem à mente parece apropriada.

— Apenas aceite! — passa o braço por meus ombros em uma atitude provocante.

Lembro de algo. Seu ponto fraco. Minhas mãos começam a atacá-lo com cosquinhas. O efeito é imediato, ele se contorce todo. Leon me agarra para tentar impedir as cosquinhas. No entanto, eu continuo o atacá-lo, o que provoca nossa queda. Caio por cima dele. Meu rosto encosta em seu peito (para não dizer que caí de cara no peito dele).

— Emma... — a voz de minha mãe chega até nós. Levanto meu rosto — Ah... desculpe — diz ela, envergonhada.

Andy e meu pai também olham a cena. Não demora nem um segundo para me dar conta da situação em que me encontro. Meu rosto está no peito de Leon e minha mão, com a queda, foi parar perto de um lugar um tanto estranho. Sim, perto dos países baixos, da joia da família... Cadê uma pá para eu cavar meu próprio buraco e sumir?

Trato de sair de cima dele, e ele se levanta do chão.

Por que estas coisas só acontecem comigo? E por que meus pais estão com cara de que flagraram sua filha fazendo algo impróprio? Eles não estão pensando... Oh, não!

— É... — começo, sorrindo. Um sorriso bem amarelo. — Vamos jantar! Eu e Leon tivemos um acidente, não é mesmo, Leon?

— É — ele confirma. — Um acidente — olha para mim.

Esse príncipe não está colaborando.

Andy até lança um olhar malicioso para mim. Irmãos mais novos, quem os inventou? Meus pais parecem atrapalhados. Muito atrapalhados.

O constrangimento é nosso sexto convidado no jantar. Até tento amenizar o clima, mas a presença do príncipe e a cena estranha e fora de contexto que minha família presenciou não colabora.  

— A salada está muito boa — diz Leon.

— Obrigada — agradece minha mãe.

— Uma ótima salada! Mãe, qual receita você usou? Foi aquela da avó? — tento animar a conversa. 

— É, foi.

— Mãe, a salada está realmente muito boa! Acho que você aperfeiçoou suas habilidades com a salada!

Nenhuma resposta.

— Andy, como vai o colégio?

— Você sabe que estou tendo aulas particulares em casa... — começa Andy.

Claro que sei, Andy não pode voltar a sua vida normal ainda devido ao meu casamento. Ele até teve que tirar alguns meses de licença do colégio.

— Pai, foi você que fez este ensopado?

— Foi.

— Está perfeito! — elogio.

Nenhuma resposta.

Leon me olha com o canto dos olhos. É impressão minha ou ele está se divertindo com a cena? Noto um pequeno esboço de sorriso no canto de seus lábios.

— Tudo estava muito bom. Obrigado pelo jantar — agradece ele. — Eu posso lavar as louças.

Eu, meus pais e meu irmão olhamos para Leon como se acabasse de ter anunciado o início de um apocalipse zumbi.

— Não, obrigado, Sua Alteza Real, Andy irá fazer isso — garante meu pai. — Não é mesmo Andy?

— É.

— Podem me chamar de Leon — afirma ele.

— Que isso? — diz minha mãe. — Nós... não podemos chamar o príncipe pelo nome...

— Mas, é que claro que podem me chamar de Leon! — enfatiza ele.

Embora seja educado e apresente um sorriso muito encantador, isso mais assusta minha família do que os deixa tranquilos. Resolvo salvar minha família.

— Ah, Leon, está na hora de você conhecer minha heroína favorita!

Ele olha para mim, sem entender onde quero chegar. 

— Vamos assistir Buffy, a caça-vampiros! — anuncio, o empurrando para a sala.

Pego minha coleção de DVDs da série e coloco um deles.

Leon senta-se no sofá. Apenas temos um sofá na sala, por isso me instalo ao lado dele.

— Observe minha heroína em ação!

— Então, esta é sua heroína? Interessante... ela sabe chutar um traseiro — comenta, após uma cena em que Buffy dá uma boa lição em certos vampiros metidos a gostosões.

— É isso, ai! Buffy é a melhor! O que eu disse sobre ter aprendido ótimas técnicas com ela?

Ele sorri do meu comentário e continua a assistir a série. Assistimos vários episódios.

— Então, este cara é um vampiro? — fala, apontando para Angel, o cara sexy por quem Buffy tem uma grande queda, que acabou de se revelar um vampiro. — Alguém vai ter problemas!

— Angel é um vampiro com alma e vai ajudar muito a Buffy — explico.

— Como? — ele me olha. — Você está me dando spoiler?

Jogo uma almofada nele.

Meus pais e meu irmão já foram dormir há muito tempo, somos os únicos acordados.

Continuamos a assistir a série e o sono chega como um ladrão silencioso.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O que acharam do capítulo? Leon foi visitar a família da Emma, e já começou com o pé esquerdo, com direito a cena estranha rsrsrsrs. O que será que esta visita ainda nos reserva? Também conhecemos a mãe do Will neste capítulo...