Gods among us escrita por Miss Cherry


Capítulo 1
Capítulo 1 - Salvando a bunda de um semideus inocente


Notas iniciais do capítulo

Lembrando que a fic é uma realidade alternativa!

Obs:
— Gram é a espada mais "poderosa" da mitologia nórdica, ela foi criada por Sigfried para matar o dragão Fafner.
— Lâmia é um monstro que não foi abordado nos livros do Rick (pelo que me lembro). Existem duas histórias mitológicas para ela, sugiro que cheque as duas :) É bem interessante.

Boa leitura!



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Runaway - Ed Sheeran

"Gonna grab clothes, six in the morning go"

— Tem certeza que ele está nesse prédio? Parece abandonado por anos! – Perguntei, deixando mais uma flecha deslizar por meu arco prateado, friccionando-o novamente para um novo ataque.

O local estava coberto de poeira e fuligem do chão ao teto. As vidraças estavam quebradas ou extremamente sujas, antes aquilo poderia ter sido um hall belíssimo de hotel, mas agora só não passava de algum lugar sucateado e deixado para a história de Nova York. O prédio tinha cheiro de enxofre e mofo, a pouca iluminação que tínhamos vinha dos poucos raios de sol que conseguiam atravessar a sujeira.

— Nos mandaram pra cá, não foi? Duvido que eles tenham errado, eles nunca erram – Resmungou Grover, analisando a situação — E além do mais, porque teriam tantos monstros por nada?

— Realmente, não havia pensado nisso. Monstros até de mais, na minha opinião. Parece que Zeus pulou a cerca de novo.
Um trovão ecoou fora do edifício, aquele som parecia música para os meus ouvidos.

— E porque não seria filho de Hades ou Poseidon? - questionou, se escondendo atrás de mim como uma criança assustada.

— Em todos os seus anos de acampamento já viu algum filho de Poseidon que tivesse os dois olhos? E Hades não arriscaria de novo, fiquei sabendo que Perséfone anda terrivelmente irritada com o esposo chifrudo.

— Algo contra chifres? - O sátiro cruzou os braços, indignado.
Dei uma breve risada, chacoalhei o arco ao ver o ultimo monstro se transformando em uma bela pilha de pó amarelo e guardei o utensílio diagonalmente em meu torso.

Grover era um sátiro, humano da cintura para cima e bode para baixo. Tinha pequenos chifres, escondidos pelos cabelos encaracolados de cor escura, além de uma barbicha rala e um grave problema de acne. 

— Vamos logo. Espero que ele não tenha morrido.


Suspirei e fiz um sinal para que Grover me seguisse cuidadosamente.

Seguimos até uma pequena porta no final do corredor que daria acesso às escadas, ao lado dos elevadores sem energia.

Uma levava para cima e a outra para baixo. Paramos, esperava que o sátiro desse as direções, mas ele permaneceu estático ao meu lado aguardando alguma decisão. Bati levemente atrás da cabeça do mesmo, que olhou-me com indignação. Encarei-o, e só aquele gesto foi suficiente para que ele caísse em si e começasse a subir as escadas.

— Por que EU tenho que mostrar o caminho? Quem está liderando essa missão é você! – protestou Grover, passando os dedos onde lhe fora dado o tapa.

— Porque eu não tenho um maldito focinho - Revirei os olhos e apoiei minha mão esquerda sobre seu ombro - Acalme-se Groo, estamos quase acabando.

Sorri gentilmente e ele assentiu com a cabeça enquanto seguíamos o caminho até o telhado.

Localizamos a porta que nos levaria até lá, era verde, corta fogo e parecia não ser usada há pelo menos uma década. Tentei abri-la do jeito convencional, mas parecia ter sido trancada por fora.

— Como se trancar a porta fosse deter algum monstro - Disse para mim mesma, balançando a cabeça negativamente.

— O que vamos fazer agora?

— Melhor se afastar.

O sátiro assim o fez, enquanto me aproximava da porta. Pousei a mão direita na primeira dobradiça, vagando com a ponta dos dedos por todas as outras duas. As mesmas derreteram depois de segundos, escorrendo por toda a extensão da porta até caírem ao chão, formando uma poça metálica.

Bati com o ombro na superfície até que a porta caísse ao chão no outro lado.

Bati as mãos, embora estivessem quase que perfeitamente limpas e caminhei a cautelosos passos até metade do telhado.

Um garoto esguio, com pouco mais de 1,60 e cabelo preto estava na borda, apontando uma caneta em minha direção. Achei graça.

— Menino, vai por mim, uma caneta não pode salvar você de muita coisa - cruzei os braços por cima da jaqueta de couro vermelha, encarando os olhos verde mar daquele que estava em minha frente.

Mesmo com o comentário, ele continuou apontando a caneta, como se fosse Gram de Siegfried, e eu, Fafner.

— Ok, vamos recomeçar. Sou Solária, estamos no telhado de um prédio infestado de criaturas mágicas que você atraiu e vamos te levar para um lugar seguro. Ah, e esse é meu bichinho de estimação, o Grover. Cuidado, ele morde.

Disse, apontando para trás com o dedão em direção ao sátiro, que cruzava os braços e assentia com a cabeça.

— É isso aí...Espera, o que?

Grover arqueou uma das sobrancelhas, modelei os lábios vermelhos em um meio sorriso e voltei a atenção ao garoto, que processava aquelas informações. Ele parecia querer fazer um turbilhão de perguntas, mas não sabia por qual começar.

— Poupe as palavras, te explicamos tudo no caminho.

Eu já me virava, quando ele finalmente encontrou a pergunta que queria.

— No caminho para onde? - O garoto permanecia na mesma posição, apontando a elegante caneta para mim.

— Uma loja de rosquinhas, é claro - Respondi-lhe ironicamente, caminhando para a saída.

— Ah, então vamos - ele finalmente guardou a caneta no bolso do jeans azul, com uma expressão mais amigável no rosto.

Grover bateu na própria testa ao ver a reação do garoto, virei-me para ele, incrédula com sua ingenuidade. Espero que tenha sido uma brincadeira.

— Aposto que dura dois minutos no treino - disse, olhando para o sátiro.

— Vou ser otimista, aposto em cinco.

Estendemos a mão, entretanto, antes da aposta ser selada, retirei o arco do torso, friccionando a corda e apontando-o para o menino. Deixei que a flecha deslizasse pela prata, o menino apenas teve tempo de esboçar seu espanto e fechar os olhos antes da flecha zunir ao lado de seu ouvido, atingindo a asa esquerda de uma Harpia.

— Já nos encontraram novamente. Não temos tempo, corram! - gritei, puxando o garoto atordoado uma única vez pelo braço, correndo em direção à porta caída.

Grover liderava o caminho até os andares mais baixos. Paramos diante da porta do terceiro andar.

— Não tenho certeza, mas acho que está livre de monstros. Os de baixo parecem infestados - disse Grover, suas palavras vacilavam por seu nervosismo.

— Não podemos pular da janela do terceiro andar, é suicídio! Se não morrermos, com certeza vamos quebrar alguns ossos - retrucou o garoto, hesitante.

— Não querendo ser chato nem nada, mas prefiro quebrar alguns ossos do que ser comido por um monstro. – balbuciou o sátiro.

— O prédio tem saída de incêndio em cada apartamento. Vocês realmente não olham para nada? - suspirei, guardando o arco em meu torso - Vamos, temos que correr se quisermos chegar ao acampamento antes do sol se pôr. Não posso garantir a proteção de ninguém depois disso - disse sinceramente, abrindo com calma a porta que nos levaria ao hall do terceiro andar.

Como Grover havia dito, aparentemente estava livre de monstros, o que era um alívio para os três, acredito eu. Eu tomava a liderança, seguindo de quarto em quarto, procurando por algum que estivesse destrancado. Logo no começo do corredor, quarto 303, consegui abrir e seguimos imediatamente até as escadarias de incêndio.

— Vocês dois vão na frente. Estarei de olho na porta - instrui, virando-me de costas para a janela enquanto observava a pequena porta de madeira.

Os dois, sem pestanejar, fizeram fila para descer. Grover foi o primeiro, tentando fazer o melhor com seus pés falsos. O garoto desceu logo depois que o sátiro pousou os pés no chão.

Saí de meu posto de vigia e me locomovi até a janela, checando uma última vez atrás de mim antes de descer. De súbito, algo reduziu a porta a migalhas. Lascas de madeira voaram por todo o pequeno apartamento. Encolhi-me para não ser atingida, retirando velozmente um bastão de ouro de um dos compartimentos de minha mochila. Impulsionei o objeto para trás, fazendo-o se desdobrar até se tornar um machado de duplo fio, adornado com uma fita de couro avermelhada.

Finalmente vi meu agressor. Melhor dizendo, minha agressora.

Corpo de serpente da cintura para baixo, porém, nenhum traço do réptil nos cabelos. Muito pelo contrário, era uma mulher deslumbrante. Seus fios eram constituídos de largas ondas acastanhadas, a pele negra era sedutora e seus olhos cor de mel brilhavam diante sua presa. A aparência do monstro poderia surpreender qualquer um, menos a mim. Monstros como ela não me assustavam. Franzi o cenho, meus olhos alaranjados encaravam a Lâmia com destreza.

Sem mais delongas, o monstro atacou, exibindo suas longas e polidas garras. Rolei para o lado, desferindo um golpe lateral em direção a calda da Lâmia. Contudo, por sua enorme agilidade, o monstro esquivou rapidamente e logo impulsionou-se para cima de mim, levando-me para trás até deixar-me contra a parede.

Com o impacto, deixei minha arma cair ao chão, amaldiçoando a mim mesma por ter cometido aquele erro. Respirei fundo quando a Lâmia aproximou-se ainda mais com sua bocarra aberta, escancarando os dentes pontudos e amarelados.

Ouvi luta do lado de fora. Lembrei-me que não havia deixado nenhum meio de proteção para os dois.

— Droga!

Empurrei o corpo em minha frente com toda minha força e aproximei-me do vão da porta. Minhas mãos irradiavam um brilho alaranjado, que logo se espalhou por todo o papel de parede do cômodo. Fogo.

— Boa sorte para sair dessa, querida - soltei meu melhor sorriso maldoso.

A entrada estava em chamas, enquanto a Lâmia percorria os olhos pelo lugar procurando uma saída, corri até a janela - recolhendo antes meu machado do chão - e fechei-a, garantindo que ela também estivesse em chamas depois do ato.

Desci as escadas rapidamente, com o bastão dourado em mãos e olhei ao redor. Uma mochila estava largada ao chão, quase completamente aberta. Só poderia ser de Grover, certamente procurando por algo para se defender. Não encontrei nenhum sinal do menino, mas sabia que se ele estivesse com Grover, tudo correria bem. Aquele sátiro sabia se defender.

Peguei a mochila dele e andei a passos apressados contornando o prédio, eles não deveriam estar longe, considerando o cheiro forte de enxofre, característico dos monstros depois que morrem.

Avistei-os ao longe, estavam de costas para mim, encarando algo à frente. Corri até alcançá-los, me deparando com uma grande pilha de pó amarelado. A caneta ainda estava na mão do garoto, que tremia, atordoado.

— O que aconteceu? - perguntei, olhando diretamente para Grover.

— Essa caneta...Não use-a para escrever. Nunca. - respondeu, ainda um pouco surpreso.

— Por que? É só uma maldita caneta!

Peguei o objeto das mãos trêmulas do semideus, tirando a tampa em seguida. O que poderia dar errado?

A caneta modelou-se em minha mão até se tornar uma espada de bronze. Pisquei algumas vezes, evitando reações indesejadas. Era uma bela espada, isso eu não poderia negar de forma alguma. O semideus ao meu lado parecia suficientemente atônito com a descoberta, então decidi não pergunta-lo sobre o objeto mágico.

— Parece que não deixei vocês indefesos afinal. Vamos, precisamos sair daqui antes que os bombeiros cheguem. – joguei a bolsa para Grover, que me agradeceu.

— Bombeiros? - murmurou o garoto, saindo de seu estado de transe.

— Longa história. – lembrei-me da Lâmia no quarto em chamas, mas logo desviei a imagem da cabeça — Vamos pegar um ônibus até a estação de trem, estaremos seguros lá.

O menino assentiu, seguindo-me de perto e a frente de Grover.


***

A locomotiva já estava para sair. Nós três estávamos sentados nas confortáveis cabines individuais do trem. O silêncio era angustiante, mas não seria sábio comentar algo até o trem fazer barulho o suficiente para abafar nossa conversa.

Quando a locomotiva finalmente arrancava pelos trilhos, respirei fundo.

— Então, acho que te devemos algumas respostas - disse por fim, quebrando o silêncio.

— É, eu acho que sim - respondeu o garoto, olhando para a caneta em suas mãos.

— Devo avisar que sou direta. Não vou ficar dando voltas em uma história que você provavelmente já conhece - ele assentiu, então continuei — Você já deve saber sobre a mitologia grega. Deuses, monstros, titãs e toda essa história. A prole gerada de um deus e um mortal chama-se semideus, como Aquiles e Teseu. Acontece que os deuses existem em nossa sociedade atual, e se encontram aqui em Nova York. Você é filho de um deles, só não posso te dizer qual. Perguntas?

Ele encarou-me no fundo de meus olhos amarelos, tentando perceber se havia algum tipo de humor escondido ali. Se houvesse, ele não encontrou.

— Deuses gregos? Em Nova York? – ele deu uma risada, descrente, enquanto movia a tampa da caneta de um lado para o outro, pouco à vontade com a situação.

— Sim, você pode não acreditar no começo, mas creio que você também não acreditava em monstros antes de ser atacado por um, estou certa?

O semideus permaneceu em silêncio, me observando com atenção.

— Então, se eu sou um semideus, tenho poderes e tudo mais? – percebi um brilho em seu olhar, uma pontada de animação.

— Você já tem poderes, garoto. Déficit de atenção e dislexia, obrigatoriamente.

Seus olhos verdes se cravaram nos meus, tentando entender como eu sabia de tudo aquilo sem nem ao menos conhece-lo. Sorri.

— Déficit de atenção. É o que te faz sobreviver em batalha, você sempre está ciente e observa tudo em sua volta. Dislexia. Sua mente está programada para ler o grego antigo, não o inglês. – ele pareceu pensar por um longo minuto, então prossegui — E sobre os poderes, levando em conta a quantidade de monstros naquele prédio abandonado, eu poderia chutar que você é filho de um dos três grandes. Mas isso é extremamente raro, e eu já errei antes.

— Já? - disse Grover, como se estivesse assustado, para me provocar.
Fiz uma expressão raivosa, ele respondeu com uma risada seca, como se estivesse brincando. Por fim, deu uma mordida generosa em uma lata de Diet Coke. O semideus pareceu chocado com a situação, mas falou nada sobre.

— Enfim, estamos te levando para um acampamento, onde filhos de diferentes deuses gregos residem. Geralmente só passamos o verão lá, mas alguns precisam ficar o ano todo pois o risco de ser atacado por monstros é grande. De resto, passamos as outras estações procurando semideuses ou trabalhando no acampamento. Bem, pelo menos eu passo.

— Entendi. Espero que eu seja um desses que fica sempre no acampamento - ele disse com certa magoa na voz, mas estava decidido a isso.

— Qual seu nome mesmo? Percebi que não te perguntei.

— Percy. Percy Jackson.

— Hm.

Foi tudo o que respondi. Não queria mais conversar com ele, não estava disposta a começar uma amizade com um novato idiota e ingênuo. Não fazia meu tipo.

Fiquei observando a paisagem se transformar por todo o caminho até parar na estação de destino.

O cheiro de fumaça, carvão queimado e o atrito dos freios era inebriante ali, mas reconfortante. Estávamos em plena área rural de Nova York, cercados por plantações e animais confinados em fazendas. Grover, sendo um protetor da natureza, ficou desconfortável com a prisão dos animais, mas sabia que não podia fazer nada a respeito.

— O acampamento é aqui perto, podemos ir a pé. Permaneçam juntos, não quero voltar porque esqueci de alguém. E nem vou.

Caminhamos alguns quilômetros até avistarmos a floresta. Percy havia reclamado algumas vezes que suas pernas doíam, mas não paramos. Grover acelerou o passo quando viu as grandes árvores do acampamento, eu continuei andando normalmente. Os últimos raios de sol tocavam minha pele como beijos, preenchendo-me de vigor, embora também estivesse um pouco cansada.

— Bem, parece que chegamos - disse finalmente a ele, que parecia estar prestes a beijar o chão de alívio.

Grover nos esperava na entrada, observando o arco com certo orgulho. Annabeth chegou correndo para dar as boas-vindas ao amigo sátiro, mas no momento em que me viu, seu grande sorriso desapareceu.
Percy chegou pouco depois, fazendo com que Anna o encarasse com curiosidade. Ela é filha de Atena, e por padrão, tem cabelos loiros enrolados e olhos cinzentos, a cor do céu em um dia nublado.

— Quem é o novato? - perguntou a Grover, ainda olhando para o garoto.

— Percy Jackson. Pai e mãe desconhecidos - respondeu Grover, imitando a voz de algum ancora de jornal - O adolescente foi encontrado em um prédio abandonado no centro da cidade, infestado de monstros.

— Ele deu sorte então - ela então rolou seus olhos dos meus pés até a cabeça - Ou nem tanta. Quíron deveria ter me dado essa missão - disse um pouco desapontada.

— É porque Quíron não confia em você para esse tipo de coisa.
Ri secamente, evitando o olhar de Annabeth. Caminhei a passos lentos até depois da entrada, mas parei por um instante, me virando para trás.

— Ah, e aliás Percy...Seja bem-vindo ao acampamento Meio Sangue.


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Notas finais do capítulo

E então cerejas semideusas, o que acharam? Dá aquele review maroto! Lembrando que críticas construtivas são perfeitamente bem-vindas ;)
Beijinhos de açúcar e até o próximo capítulo!