31 de Janeiro de 2022.

— Su... Falta muito? – perguntei enquanto me espreguiçava.

— Kazuto Kirigaya! Se você perguntar outra vez eu te mato! – respondeu Suguha com a cara de feliz que ela sempre ostenta no rosto.

— Mas por que tão longe? – choraminguei como uma criancinha.

— Não se preocupe Kirito, já estamos chegando. – falou com o mesmo sorriso fofo a cara.

Kirito é meu apelido, aliás, eu gosto dele. Como eu consegui não faço a menor ideia, mas as pessoas me chamam assim já faz tanto tempo que até eu me chamo assim. E eu não costumo reclamar tanto da vida, só não aguento mais ficar nesse carro. A mudança tá sendo um inferno pra mim, deixar a capital e vir parar na roça nunca passou pela minha cabeça. Eu adorava tudo que tinha lá: os carros, as pessoas, todo o caos da cidade grande era apaixonante.

Olhei através da janela do carro e além do escuro extremo que fazia aquela noite, estava bem frio, aquele de embaçar o vidro e sair fumaça da boca. Mesmo dentro do carro eu estava tremendo e esfregando as mãos. Decidi ouvir um pouco de música, os acordes de “November Rain” talvez me fizessem esquecer toda essa loucura de mudança. E não, não está chovendo, só tá muito frio.

Quando eu cansei de repetir a mesma música umas duzentas vezes, tirei os fones e me ajeitei no banco de passageiros ao lado da minha irmã. Ela não parecia se importar com o frio, nem mesmo com a distância que estávamos da capital e de tudo que tínhamos.

— Suguha – chamei baixinho para não assustá-la – Onde estamos?

— Aqui é Kanto! Vou treinar meu kendô e me tornar a melhor de todas! – seus olhos esverdeados brilharam. – Esqueceu o motivo da mudança?

— Ah é, o kendô... – me perdi em lembranças da antiga cidade, de nossa casa, da outra escola e de tudo que ficou por lá. A tristeza tomou meu rosto e acho que Sugu percebeu.

— Kirito – disse Su com delicadeza – Vai ser divertido por aqui, confie em mim – sorriu, enquanto acariciava meu rosto suavemente.

Dei um sorriso em sua direção e concordei com a cabeça. Suguha é a melhor irmã que eu poderia ter. Nós até que somos parecidos. Nossa pele é clara e os cabelos escuros, mas seus olhos claros da cor das folhas são infinitamente mais bonitos que os meus, que não passam de duas bolas pretas. Mas como eu adoro preto, não vejo problema nenhum. Além da aparência é claro, temos gostos muitos parecidos, amamos o bom e velho rock: desde Pink Floyd até Guns e Bon Jovi. Não curtimos muito séries, mas alguns desenhos na TV até que são interessantes... Tirando o fato de que eu sempre estou de preto e ela prefere estar colorida, e quando eu digo colorida é colorida mesmo, somos quase idênticos. Mas acho Sugu bem mais linda que eu, com certeza puxou a mamãe. Tomara que não tentem mexer com a minha irmãzinha na escola nova. Não sou nenhum valentão ou algo desse tipo, mas pra um garoto de 15 anos eu tô bem em forma e não ia pensar duas vezes antes de dar umas porradas na cara de algum moleque safado que ficar de gracinha com ela.

Quebrando meu raciocínio, Suguha deu um berro que meu coração quase parou.

— Ei! Olha lá Kirito! Nossa nova casa! – apontou Sugu, que estava quase sem ar.

Quase não acreditei. Eu vou mesmo morar aí?

Era simplesmente fantástica. Os dois andares em madeira escura, construída no estilo americano, com as telhas azuladas e uma varanda lá em cima. Isso sem contar o enorme jardim com uma fonte de pedra e garagem pra dois carros. Infelizmente eu não tenho nenhum automóvel pra decorá-la.

Quando o motorista parou, peguei as nossas malas, as minhas e as da Su, não eram tão pesadas e levantei todas de uma vez. Corremos pra dentro rindo como duas criancinhas. O interior era ainda mais bonito. Admito que fiquei de queixo caído. Um grande hall de entrada com piso de madeira clara, mas bem talhado e lustroso. O sofá era enorme, fazia uma curva no canto da sala de tão imenso e era todo aveludado. Uma lareira aconchegante de ardósia com uma chaminé que subia até o teto e uma TV gigante sobre o console da lareira. Tudo era muito lindo, aquele pesadelo estava virando um sonho.

— É enorme né Su? – falei boquiaberto.

—Aham... Queria que a mamãe estivesse aqui. – respondeu olhando para o piso lustroso.

Num gesto incomum, a abracei com força. Geralmente sou tímido e pouco sentimental, mas sei como é difícil ficar longe da mamãe. E agora que ela está na capital pra trabalhar, eu e a Suguha só temos um ao outro.

— Eu vou cuidar de você maninha – sem soltá-la continuei –Amanhã tem aula, que tal a gente ir dormir? Falando em dormir... – empurrei ela pro sofá com força, mas cuidado e ela caiu de costas nele – O quarto maior é meu! Muahahahaha – corri lá pra cima, onde ficam os quartos, subindo a escada de madeira que por sinal era enorme.

— Isso é trapaça Kazuto! Volta aqui agora! – gritou enquanto riamos e eu fugia dela

Amanhã vai ser um dia cheio...