Lá E De Volta Outra Vez escrita por Pacheca


Capítulo 58
O Mundo Não Para


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas, voltei. Era pra eu ter estudado, mas eu sou dessas mesma que não estuda e depois sofre (mentira, eu ainda tenho amanhã para acabar a lista rs) Enfim, espero que gostem ♥



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   Eu cheguei em casa quando meus pais estavam na cozinha, preparando a janta. Eu subi o mais silenciosamente possível pro meu quarto, ainda lidando com a cara inchada. Eles nem sabiam que eu tinha ido ao hospital.

   Dentro do banheiro, tranquei a porta e lavei a cara, descalçando os sapatos e pegando meu celular. Chamei e deixei no viva voz. A voz rouca de quem estava dormindo. Ri, chamando-o pelo nome.

   – Bom dia, Castiel.

   – Oh, Anna. Oi. Que foi?

   – Eu fui ao hospital.

   – Como ele tá?

   – É, já o vi melhor. Os machucados melhoraram. A memória também, eu acho. 

   – O bloco deu efeito? Dragon, solta. Sai.

   – Não muito, mas ainda assim...Ele estava mais aberto comigo.

   – Ele falava muito de você. Deve ser por isso que eu não aguento mais ouvir seu nome.   

   – O Dragon soltou seu chinelo? – Perguntei, ignorando o comentário idiota. Ele riu.

   – O que te faz pensar que é meu chinelo?

   – Palpite. Enfim, achei que você gostaria de saber do que aconteceu com meu plano.

   – Ainda acho que eu podia esperar, mas obrigado. – Eu até arrepiava quando ele me agradecia. – A propósito, era a minha camisa. Eu ando descalço em casa.

   – Coincidência, eu também.

   – Boa noite. – E desligou. Sorri, pegando o celular de novo e mandando um boletim para a Rosalya. Minha mãe bateu na porta e eu acabei de me trocar, disfarçando os olhos ainda meio pesados.

   – Olá, amorzinha. Como foi seu dia?

   – Oi, mãe. Cansadinha, mas passei bem. E com fome.

   – Venha, seu pai decidiu fazer lasanha. – Sorri, seguindo-a escada abaixo.

   Aquele jantar me fez bem. Apesar de toda minha alegria com a esperança de ter Lysandre de volta, eu ainda reconhecia que eu estava deixando minha família de lado. No fundo eu estava isolando-os de tudo na minha vida, então passar algum tempo com eles me trouxe para aquela bolha de novo.

   Foi uma conversa bem tranquila. Até ciúmes no meu pai eu fiz. Nathaniel ficaria mais marcado ainda com ele, mas eu não resisti ao comentar que ele agora morava sozinho. Só paramos quando ninguém mais conseguia respirar de tanto rir.

   Dormi muito bem, só que tarde. No dia seguinte eu entrei numa roupa bonitinha para refletir meu bom humor e fui para a aula. Querendo ou não, a vida seguia. Se tinha alguém que entendia que o mundo não parava por nada, esse alguém era eu. Peguei minha mochila e fui com meu pai até a metade do caminho, para depois seguir sozinha.

   Eu estava passando pela lanchonete, esperando o sinal abrir, quando escutei a vozinha enjoativa já familiar. Bia, olhei por cima do ombro, vendo-a com um menino pouco maior que ela, com um topete loiro, óculos imensos e calças com suspensórios. Algo que meu avô vestiria. Mesmo assim, ele parecia simpático.

   Provavelmente pelo sorriso bobo que ele lançava na direção da menina. E que ela, pasme, retribuía.

   – Sammy, você sabe que eu tenho aula agora. A gente vai se ver mais tarde.

   – Eu sofro cada minuto longe de você, anjo.

   Aquilo sim foi a cereja do bolo. Eu não sabia se abria a boca, se ria de tamanho discurso ou se fingia que não tinha presenciado aquela cena. O sinal abriu e eu simplesmente atravessei, ainda meio apavorada com toda aquela melação.

   E logo na entrada da escola eu já tive um péssimo encontro. Ambre e suas duas cobras criadas, falando justamente da garota na lanchonete.

   – Ele sequer ganha um cinco, ela deve estar louca.

   – Li, um cinco é muito para ele. Eu classifico como três. Totalmente fora da nossa liga. – Charlotte completou. Ambre viu meu olhar repleto de nojo e cruzou os braços com o ar de deboche.

   – Você está olhando o que?

   – Um espetáculo em pessoa. Infelizmente, não me valeu o ingresso.

   – Deve ter custado todas as suas economias dos últimos anos, sou uma obra prima.

   – Tadinha. Eu iria a um médico, delírio pode ser sintoma de algo sério.

   – Deixa ela, Ambre, estamos numa discussão séria. Bia não pode mais ser do nosso grupo.

   – Que grupo? – Me meti, fazendo as três me olharem com desdém. – O grupo onde ela é desesperada por atenção e vocês se aproveitam disso, mas no fundo não ligam para ela? Não acho que vai ser tão ruim para ela.

   – Somos o grupo das três garotas mais populares da escola, e você é quem?

   – Alguém de quem não riem e fazem piadas pelas costas. Diferente de você, meu status aqui não é baseado em uma fantasia infantil e mal executada. Ninguém gosta de você. De vocês, na verdade. Por que alguém gostaria? Vocês são três mimadas patéticas que não sabem reconhecer que o problema está em vocês e uniram forças para descontar sua pateticidade nos outros. Bia tem o direito de gostar de quem ela quiser, e vocês...Deveriam arrumar alguém antes de sair dando pitaco na vida alheia.

   As três estavam fervendo, o rosto até meio vermelho de raiva. Passei por elas e fui para o corredor, pegar minhas coisas no corredor. Vi Priya agradecendo Patrick, enquanto o último me desejava bom dia e nos deixava a sós. Ou quase, mas os outros alunos não estavam interessados.

   – Bom dia, Priya.

   – Oh, Anna. Bom dia. Como vai você?

   – Bem, você? Conversando com o professor logo de manhã.

   – Ah, é só sobre a aula de artes. Eu estou desesperada, sou um desastre.

   – Não pode ser tão ruim.

   – Eu dou graças a todos os deuses de que não preciso desenhar hennas.

   – Priya, eu sou péssima em desenho. Você deve ser razoável.

   – Me pede um desenho. – Ela falou enquanto pegava seu caderno na mochila. Dei de ombros.

   – Eu sei lá, desenha um gato.

   – Pede direito, garota, isso não prova minha incompetência.

   – Um gato num barco tocando clarineta? – Ela sorriu, pegando seus lápis e entrando na sala, usando sua mesa para se apoiar. Eu aproveitei a chance e tomei o lugar ao seu lado, esperando a minha encomenda.

   Ela acabou em dez minutos e escondeu a folha, olhando para mim com um sorriso. Sorri de volta, esperando ela virar o desenho.

   – Pronta?

   – Não, mas manda a ver.

   Segurei o riso por uns dois segundos. Continuava sendo melhor que o que eu desenharia, mas ainda era algo tão bobo que eu caí na gargalhada. Ela também, posando perto da sua obra de arte.  

   – Eu avisei.

   – Para, é...fofo. Bonitinho. Obrigada pelo presente.

   – Eu travo em qualquer coisa além disso. É terrível.

   – Olha, eu só uso lápis pra escrever, o resto eu nem tento. A Violette poderia te ajudar.

   – É, talvez. Ela faz com tanta naturalidade. Obrigada pelo apoio.

   Fui para meu lugar com Melody na aula de Delanay, assim que a professora chegou, guardando meu desenho. Eu reparei que algo daria errado no momento em que Bia entrou e todo mundo olhou para ela.

   – Garotos, prestem atenção! – A professora tentou controlar os ânimos, e funcionou por uns cinco minutos, mas logo o assuntou voltou e Bia começou a ficar cada vez menor no seu lugar. – Senhorita...

   Dava para ouvir os soluços afogados dela, mas ninguém calou a boca. Ergui a mão, ainda vigiando a porta como se fosse conseguir descobrir pra onde ela estava indo. A professora acenou com a cabeça para eu poder falar.

   – Se importa se eu for atrás dela, senhora? – Peggy ergueu a mão esperando se juntar a mim. Ela liberou nós duas e voltou a copiar o quadro. Melody me disse que me emprestaria as anotações.

   – Bia. Bia. – Chamei pelo corredor, tentando não atrapalhar as aulas vizinhas, mas sem resposta. Peggy foi checando alguns cantos mais escondidos, mas no fim já estávamos no pátio e nada da garota. – Onde ela se meteu?

   – Estou chocada com todo esse fuzuê. É só um namorado, ele não pode ser tão estranho.

   – Não faz meu tipo, mas até ai...Ele só se veste engraçadinho.

   – Aquele trio de aberrações acha que se veste tão bem assim?

   – Vem aqui, Peggy. – Falei depois de concordar com ela. Entramos no ginásio, abrindo a porta do vestiário na maior lentidão. – Bia?

   O soluço cessou na hora, mas ela não aguentou segurar por muito tempo. Abri um dos chuveiros, achando-a sentada no chão. Peggy se abaixou, falando num tom baixo.

   – Bia, viemos te ajudar.

   – Me deixem em paz. Elas já me odeiam demais.

   – Bia, elas não valem isso tudo. Vem aqui, por favor. – Pedi, esticando a mão. Ela aceitou, e Peggy logo a ajudou a secar um pouco o rosto, sem muito sucesso. As lágrimas logo voltavam. Levei-as para o jardim, aproveitando a brisa para acalmá-la.

   – Elas nunca mais querem me ver a não ser que eu termine com o Sammy.

   – Sammy?

   – Samuel, eu acho. – Ela concordou com minha fala. Consolar a Bia definitivamente não estava nos meus planos, mas eu realmente tinha um coração muito bom. – E acha que ele merece ser trocado pelas três?

   – Elas são minhas amigas...

   – Bia, elas são más com você. Olhe agora, elas estão fazendo você se sentir mal por gostar de alguém. – Peggy falou, fazendo-a respirar fundo. – Você tem outras pessoas, melhores. Melody é sua amiga.

   – A gente conversa, às vezes.

   – Ela provavelmente gostaria do Sam...my. – Concordei, segurando o braço de Bia.

   – Bia, você não gostou de mim pela Ambre. E agora quem está aqui preocupada com você? Quando você decide o que quer fazer, a recompensa é bem maior...

   – Eu não sei, ela...

   – Ela não ajudou o próprio irmão. – Peggy soltou. Reprovei-a com o olhar. Odiando Ambre ou não, a menina não era exatamente culpada pela situação familiar. – Enfim, você vai ficar bem sem ela.   

   Ainda assim, a menina chorou horrores e disse que não sabia o que pensar. Então demos a ela algum espaço. Peggy decidiu voltar a aula e eu estiquei a pulseira para Bia. Ela me olhou, preocupada.

   – Onde achou?

   – Caída no corredor. Presente dele? – Ela concordou com a cabeça. – Ele deve ser um cara legal.

   – Obrigada. – Fiquei de pé de novo e deixei-a lá, chorando sozinha. Voltei para a aula já na metade e reassumi meu lugar, fingindo que nada tinha acontecido. Ambre só não falou nada porque sua nova dupla não lhe deu atenção.

   No fim da aula, eu aproveitei meu fim de castigo e encurralei Rosa e Alexy num canto. Marcamos uma festa do pijama na casa de Alexy, onde ele prometeu que expulsaria Armin do quarto quando estivéssemos trocando de roupa. Ri.

   – Anna deve dormir mais vestida que ele. – Rosa resmungou, mal humorada com meus pijamas. Cruzei os braços.

   – Pois saiba você que eu ganhei, atualmente, da minha tia, um baby-doll. Acho que não vou levar então.

   – Vai sim. – Alexy me agarrou pelo braço, sério. Concordei, dizendo que o encontraria lá.

   Passei em casa, avisei minha mãe do meu passeio, peguei minhas coisas e peguei o ônibus. Os pais dos gêmeos me receberam na maior alegria, e Rosa já tinha chegado. Fui para o quarto, encontrando Armin esparramado no tapete e Rosalya e Alexy rindo dele de cima da cama.

   – Qual jogo?

   – Hum. Oi, amor. Mortal Kombat.

   – E você joga de Kabal?

   – Não gosta dele? É incrível.

   – Gosto, mas ninguém nunca gosta.

   – Ei nerd, sua festa é aqui em cima. – Alexy me chamou, jogando a caixinha vazia de suco em mim. Fiquei de pé e pulei na cama perto deles. – Armin, sai fora que as madames vão se trocar.

   – Nem vem, eu vou acabar essa luta antes. – Ele resmungou, tentando executar algum combo.

   – Nós vamos ao banheiro. Vem, Rosa.

   Ela deu um berro com minha camisola, e Alexy abriu a porta assustado. Até Armin tinha finalmente pausado o jogo. Sai com minhas roupas enroladas na mão, calçando as pantufinhas vermelhas. Ele também deu um berro.

   – Menina, que arraso.

   Armin me deu um assovio e mandou um beijo antes de desligar o vídeo game e pegar seu portátil e deixar o quarto.

   Nossa noite baseou-se em falar mal dos outros e fofocas. Um dia normal entre nós três. Rosa tinha passado pelo corredor uma vez e disse que Armin estava fazendo um barulho muito estranho no quarto de hóspedes, mas o Alexy simplesmente disse que a culpa era da minha roupa.

   – Como é?

   – Amiga, não finge que você não viu o estado que ele saiu do quarto. Enfim, não quero falar da ação do meu irmão.

   Rimos mais um pouco e fomos dormir. No dia seguinte, o Armin deu graças a Deus por eu ter descido já de shorts, blusa e casaco. A mãe dele se assustou, mas não questionou. Em compensação, ele estava sem camisa.

   – Bom dia.

   – Oi, princesa. – Ele estava um pouco sem graça, mas logo ele acabou de comer e foi se arrumar. Fomos para a escola e ele fugiu para o porão para jogar. Fiquei esperando do lado de fora do colégio, só tomando um ar e tentando esquecer que meu amigo pensava em mim de um jeito meio estranho, ao que parecia.

   Tinham sido poucos dias desde meu último encontro com Lysandre, mas eu acabei pensando em como ele devia estar. Aquele vazio voltou, me fazendo coçar o olho para checar se eu não estava chorando. Ainda não.

   – Anna. – Ergui o rosto, enxergando o casaco preto familiar. Engasguei, olhando para o alto. Pisquei, mas ele sorriu, tristonho. – Eu sinto tanto.

   – Lys, como...?Quando?

   – Eu cheguei ontem à noite. Fui obrigado a voltar para te pedir desculpas.

   – Lys, eu não entendi ainda...

   – Me perdoa. – Eu tomei um susto quando ele acabou com nossa distância e colou a testa na minha, segurando meu rosto com as duas mãos. Pela primeira vez na vida, vi os olhos heterocromáticos enchendo de lágrimas. – Eu fiquei confuso quando te vi chorando, mas o que eu te fiz...

   – Não é culpa sua. – Sorri, segurando-o pelo casaco e deixando o choro comer solto. – Você está bem?

   – Eu senti sua falta. Desde o início, eu só não sabia quem era o alvo da minha saudade. E te ver aquela noite no hospital. Como eu pude te esquecer?

   – Sendo atropelado? – Ele riu e eu emendei a risada. Era um alívio tão grande vê-lo ali, bem e forte, que eu simplesmente puxei-o ainda mais para perto e o abracei, ignorando qualquer um que pudesse nos ver.


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Notas finais do capítulo

Até mais vê-los queridos ^~^