Friends escrita por LC_Pena


Capítulo 4
Capítulo 3. Depois dela


Notas iniciais do capítulo

Agora, a conclusão épica do meu conto. Tive que refazer o capítulo dois e fiquei quase um mês inteiro trabalhando nisso! Descobrirá que o capítulo um e o três seguem um curso mais ou menos sem Dora, a escolhida depois de implorar a Ly Anne um ship aceitável, mas o dois é todo sobre ela.

Claro que eu me redobrei para encaixá-la na fic toda, ia ficar parecendo um Frankstein seu não fizesse isso, mas o dois foi um parto porque eu tive que construí-la do zero, enquanto Gui já existia, lindo, ruivo e soberano. Enfim...

Se você tiver gostado de ler um décimo do que eu gostei de escrever, esse conto aqui teve o seu próprio final feliz, Brenda.

Bjuxxx

(Ainda nos vemos no epílogo!)



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Depois dela

Call it magic, call it true

I call it magic when I’m with you

And I just got broken, broken into two

Still I call it magic, when I’m next to you

Aparatou do lado de fora dos terrenos da família Weasley. A grama mais alta do que era aconselhável em um terreno familiar, as árvores frondosas, agora completamente cobertas de neve e até mesmo o pequeno lago congelado ao norte lembravam infância. Uma muito feliz e perfeita infância.

Gui se aproximou da casa, pelos fundos. Já conseguia sentir o cheiro delicioso da comida de sua mãe, antes mesmo de poder vislumbrá-la através da porta da cozinha, sempre aberta para todos que tivessem um coração bom e humilde.

Não quis entrar pela frente. Não queria ter que falar com todos os seus irmãos, explicar porque não viria passar o Natal com eles de novo. Sabia que, independente da forma como sua mãe colocasse depois, provavelmente com uma leve desaprovação no tom, ninguém contrargumentaria.

Agradeceu mentalmente que a senhora grisalha, uma vez ruiva, estava sozinha no recinto. Tirou um minuto para observar sua amada mãe. A guerra tinha lhe cobrado um preço muito alto e Gui ainda se pegava surpreso ao perceber o quanto a matriarca Weasley havia envelhecido em tão pouco tempo.

– Oh, Guilherme, que susto! – Molly Weasley colocou a mão no peito, como se assim pudesse fazer seu coração parar de bater tão rápido. – Meu menino!

Sua mãe não precisou nem de um quarto de minuto para largar a infinidade de atividades que estava fazendo ao mesmo tempo e abraçar seu primogênito, como se esse fosse o melhor presente de Natal que pudesse ter recebido.

– Entre, entre! Por que não entrou pela frente? Seu pai e George estão... Querido, onde está Fleur? – Sua mãe falou de um fôlego só, com a senhora Weasley tudo era sobre praticidade e eficiência.

– Fleur não está se sentindo muito bem, mãe, ela tem ficado um pouco inquieta em aglomerações...

– Bobagem, ela está com vergonha porque a barriguinha está começando a aparecer, não é?

Sua mãe sempre sabia de tudo. Gui passou a mão pela cabeça, levemente exasperado. As roupas antigas de Fleur estavam começando a ficar apertadas e de uma hora para outra a sua amada esposa havia colocado na cabeça que nada lhe servia mais.

– Ela está me deixando louco, mãe! – Gui soltou um riso meio histérico. Se tinha alguém que saberia como lidar com humores da gravidez, essa criatura era sua mãe.

– Tenha paciência, querido, as coisas são assim mesmo. Fleur é vaidosa, mas tem o coração no lugar certo, logo, logo ela vai começar a ter orgulho do barrigão dela.

– Tomara, mãe. Não tenho dúvidas de que ela está feliz com nosso menino, mas...

– É uma menina, Guilherme. – O ruivo riu da certeza de sua mãe. Fleur e Molly pareciam muito certas de que o primeiro Weasley da nova geração seria uma garotinha.

Ela também sempre dizia que ele tinha cara de pai de meninas...

– Não somos uma família de meninas, mãe. – Gui falou, sem perceber, em um tom condescendente, tom esse que estava deixando Fleur louca ultimamente.

– Não seja cabeça dura, menino! Eu sei o que estou dizendo, será uma menina. – A senhora Weasley falou em um tom conclusivo, não iria ficar dando lenha para a teimosia de seu filho mais velho. Resolveu partir para um assunto mais importante. – Guilherme, durante a lua cheia, se sentir que está ficando...

– Eu sei, mãe. As coisas têm estado sobre controle, estranhamente ter um bebê a caminho acalma o lobo... – O rapaz falou levemente desconfortável, não gostava de discutir essas coisas com sua mãe, mas não tinha lhe restado muitas opções depois que o casal Lupin havia falecido na guerra.

Essa era uma daquelas coisas que Gui fazia questão de jogar no fundo da mente para acessar apenas quando estivesse sozinho. Pensar na senhora Lupin doía demais e não queria que mais ninguém visse essa dor. Tratou de sorrir para tranquilizar sua mãe, antes que ela resolvesse continuar nesse assunto.

– Bom, bom. – A bruxa soltou um suspiro pesado, segurando o rosto de seu eterno bebê. Lembrava quando Guilherme havia chegado ao mundo, não sabia nem o segurar direito e agora ele seria pai. Como o tempo podia ter passado tão rápido? – Fique com sua esposa, ela preci...

Molly não conseguiu completar a frase. Gui trouxe sua mãe para um abraço desajeitado, não sabendo lidar muito bem com o tom embargado que manchou a voz de sua sempre forte mãe.

– Queria que estivéssemos... Que estivéssemos todos juntos, mas nunca mais...

A bruxa apertou o seu filho mais velho, querendo não mais ter que soltá-lo. A ideia de que nunca mais haveria um Natal onde todos os seus meninos estariam perto era cruel demais, deixou que as lagrimas rolassem no sobretudo de viagem de seu primogênito.

Por Merlin, a dor da perda de um filho parecia que não diminuía nunca!

Todas e cada uma de suas crianças lembravam-lhe que um dos ponteiros do relógio Weasley nunca mais voltaria a se mexer. O Natal parecia ser o momento mais difícil do ano naquela casa...

– Mãe, posso pedir a Fleur para...

– Não! – Molly soltou seu filho abruptamente, enxugando o rosto cansado. – Fique com sua esposa, família vem em primeiro lugar, Guilherme.

– Você é minha família também. – Molly apenas acariciou o rosto de seu filho amado, bem onde a cicatriz, que sempre a lembrava do quão perto esteve de perdê-lo também, estava.

– Haverá outros Natais, Guilherme. Só preciso me acostumar com a ideia de que não posso retê-los para sempre. – Gui tocou a mão que acariciava seu rosto, mão essa que tinha cuidado dele tão bem toda a vida. – Você será pai, meu filho! Não posso mais querer que fique aqui debaixo das minhas asas...

– Vamos visitá-la em alguns dias, ok? Quando a casa estiver mais tranquila.

– Claro, querido. – Molly falou dando leve tapinhas no rosto de seu filho, já se virando para continuar seus afazeres. – Fica pelo menos para comer alguma coisa?

O ruivo não poderia dizer não à comida de sua mãe, assim como não podia dar as costas e simplesmente deixá-la fragilizada desse jeito. Sentou e começou a comer algumas das mais maravilhosas iguarias do mundo, com gosto de infância, apenas porque podia.

Por quanto tempo havia se privado daquele pequeno prazer?

Molly não queria parar de fazer o jantar, estava esperando muita gente, seus filhos, conjugues e amigos, mas não pôde evitar ficar admirando Guilherme comer, como costumava fazer a alguns anos atrás.

Quase podia ver toda a sua trupe de ruivinhos bagunceiros, barulhentos e cheios de energia transformando qualquer refeição em um grande evento.

Percy tentando ser ouvido pelo pai, Charlie desafiando o seu irmão mais velho, Gui, para uma batalha épica de waffles voadores, Rony alheio a tudo, comendo como se não houvesse amanhã, enquanto a pequena Gina olhava encantada para as travessuras dos gêmeos.

Ainda podia ver a marca da tentativa falha de Fred de construir um vulcão havaiano na mesa, usando uma das poções de tirar limo que ela deixava muito bem guardada no sótão, enquanto George usava os pergaminhos com as anotações de Percy para fazer os pequenos aldeões sendo queimados...

Que saudades de sua família completa, que saudade de seu menino travesso!

Gui comia como se não tivesse comido uma comida tão boa em anos, o que bem poderia ser verdade, mas sua mente estava concentrada em outra coisa, no último Natal que tivera com a sua família completa...

Não era tempo de paz, mas ele estava completo.

Ok, Gui tinha sentido saudade de tudo isso, só não havia lembrado antes.

Era estranho como sua mente lhe pregava peças, quando estava nas escaldantes areias do Saara, mal podia esperar para experimentar a neve fria sob seus pés de novo e agora que a tinha, tentava entender por que diabos ele queria essa coisa gelada manchando suas botas?

Desviou de uma família com duas garotinhas gêmeas que pareciam prontas para se engalfinhar a qualquer minuto por causa de um saquinho de alcaçuz trouxa. Gui piscou para uma delas quando ela o encarou sem querer e a garotinha acabou vermelha como um tomate.

O rapaz protegeu melhor o pescoço do vento gélido que soprava no Beco Diagonal aquele dia, mesmo sabendo que em mais alguns passos estaria na recém-aberta loja de seus irmãos mais novos.

Parou um pouco na frente, atrapalhando alguns transeuntes apressados, para apreciar o bom trabalho dos gêmeos. Agora, quase véspera de seu primeiro Natal de retorno ao lar, a Gemialidades Weasley estava abarrotada de gente, especialmente crianças, doidas para garantir as últimas novidades em travessuras e pegadinhas.

Gui se esgueirou entre os clientes afoitos dos irmãos, tentando avistar àqueles dois cabeças de fósforo, conseguindo apenas porque contava com seus quase 1,90m de altura. Fred fazia uma demonstração de um novo produto e George tentava distribuir magicamente as notas dos pedidos.

– Hey, vai uma ajuda aí, garotos? – Os gêmeos chamaram seu nome, mas acabaram distraídos pelos seus afazeres de empreendedores. Meu Merlin, como o tempo havia passado! Os gêmeos agora eram homens de negócio.

O ruivo mais velho apontou para um pequeno espaço ao lado de uma estante quase vazia, os produtos dos rapazes estavam acabando muito rápido. Os dois entenderam que ele os esperaria ali. Provavelmente não poderiam almoçar juntos, mas ao menos eles poderiam conversar um pouco, assim que a loja estivesse mais tranquila.

Um barulho de explosão chamou a atenção de todos e fez Gui pegar sua varinha automaticamente, mas era apenas Fred transformando metade das crianças que assistiam sua apresentação em criaturinhas roxas. As crianças vibraram com o truque.

Bem, talvez os seus irmãos não estivessem tão crescidos assim...

Voltou para o Natal atual, com os barulhos de panelas fervendo e o leve assobiar de sua mãe cozinhando. Um dos gêmeos havia crescido cruelmente rápido e o outro... Bem, o outro teve sua chance de crescer roubada para sempre.

Antes que pudesse perceber, a comida havia acabado, assim como sua desculpa para permanecer naquela casa, a casa que chamou de lar por tantos anos. Não podia ficar nem mais um minuto ali.

Gui seguiu seu caminho mais cedo do que sua mãe gostaria. Pensou em voltar para a nova casa, sua verdadeira casa, lembrou-se tardiamente. Pensou em voltar para sua esposa grávida de seu primeiro filho, mas ainda não estava pronto para retornar para o Chalé das Conchas. Havia mais um lugar que Gui precisava ir e seus pés acabaram por levá-lo sem que percebesse.

A beira do lago congelado, na exata divisa entre os bosques que cercavam o terreno Weasley e as árvores que já pertenciam aos Tonks. Ele se sentou na pedra que era deles, dele e de sua eterna amiga, e respirou fundo.

O ar invernal invadiu seus pulmões, fazendo com que todo seu corpo parecesse um pouco mais purificado do que antes. O seu olfato, agora muito mais sensível, não deixava passar nenhum daqueles aromas que eram tão familiares, mas ao mesmo tempo tão desconhecidos.

Gui finalmente tirou de seu bolso, enrolado em um lenço de linho sem importância alguma, um dos seus maiores tesouros. Não havia sido achado em escavações, muito menos comprado por uma fortuna.

Não era nada disso, era apenas um pequeno pingente de prata que havia ganhado tantos anos antes, quando era só um menino. A duas semanas atrás, Fleur havia encontrado a pequena pulseira de couro, que chamou sua atenção logo que se conheceram, no meio das suas tralhas antigas do Egito e nela o pequeno símbolo de uma amizade antiga repousava.

No momento em que sua esposa percebeu que o pingente se tratava de prata pura, ameaçou jogar fora, pelo bem de seu lobo, mas Gui não permitiu. Era um presente, um símbolo de algo que não só era um marco, como também um lembrete: nunca mais estaria completo novamente.

Tocou no objeto pela primeira vez desde que o havia tirado no episódio da batalha em que Greyback transformou-lhe em algo mais, algo diferente. Daquela noite em diante, mesmo seu coração querendo mantê-lo por perto, a pulseira com seu pendente de prata era um verdadeiro incômodo para o seu lado lobo.

Na época pedira desculpas a TK, e ela deu risada, explicando que havia recuperado seu próprio pingente com seu pai, mas que este estava muito bem guardado para não machucar o seu marido. Que coincidência infeliz que era feito de prata, ela disse divertida. Uma coincidência ou um aviso? Gui se perguntara no momento em que soube da sua morte.

Era quase como se o universo soprasse para eles, que estavam condenados a se separarem, mesmo contra seus melhores esforços.

O pingente começou a incomodar em sua mão, ao ponto de tirá-lo de suas divagações. Gui olhou para as pequenas folhas interligadas, sabia que sozinhas não significavam nada, nunca significariam e como nunca mais aquela pulseira veria sua gêmea, o melhor era se desfazer dela também.

Estava mais do que decidido a atirar tudo no lago, pulseira, pingente e se possível o luto que ele não achava que tinha o direito de sentir. Havia perdido um irmão, merda! Tinha perdido tantos amigos na guerra, tinha perdido uma parte de sua humanidade em batalha, mas porque a perda de Tonks ainda o deixava completamente sem direção desse jeito?

Call it magic, cut me into two

And with all your magic, I disappear from view

And I can’t get over, can’t get over you

Still, I call it magic, such a precious jewel

O bruxo apoiou as duas mãos no joelho, a pulseira de couro frouxa em uma delas, estava sem ar, estava sem rumo. Tonks tinha um filho, ela tinha toda uma vida pela frente, era uma pessoa melhor do que ele em tantos sentidos, como diabos ele havia sobrevivido e ela não?

Não caía uma lágrima, havia chorado por todos, havia chorado como um bebê por causa do seu irmãozinho, tinha vontade de chorar toda vez que via George sem sua outra metade, mas para ela... Nada.

Olhou novamente para o que deveria ser um nó celta¹, o símbolo da eterna evolução, da eterna transformação. Segundo Tonks, a eternidade era ele e a transformação era ela, não fazia sentido algum, mas ele gostava de deixá-la pensar que sim.

Estava sozinho, num lugar que sempre fora deles por excelência, então precisava ser sincero consigo mesmo.

Tonks estava morta.

Tonks não estava mais com ele, nem mesmo em forma de fantasma, o que só poderia significar uma coisa: ela não tinha deixado nada inacabado no plano terrestre. Mas Guilherme se sentia inacabado, sentia como se agora nada no mundo pudesse fazê-lo ser completo novamente, como aquela simples pulseira de couro, nunca mais ele estaria completo de novo.

Onde estava sua outra metade agora? Talvez Tonks estivesse entre as estrelas Black, talvez a pulseira estivesse debaixo de sete palmos de terra... Ou talvez ambas estivessem num lugar diferente, em um lugar melhor.

Ele respirou fundo, o ar gélido trazendo de novo uma paz inadequada para o momento, era quase como se o lago quisesse consolá-lo. Deixou se cair para trás, recostando totalmente na pedra, deixou vir também uma lembrança, uma memória da época que nem ele, muito menos ela, poderiam ser chamados de responsáveis.

O vento gelado cortava sua pele enquanto corria o mais rápido que suas pernas de menino de seis anos conseguiam. Não precisava olhar para saber o que tinha acontecido: Charles já devia ter desistido e voltado para casa como o bebê chorão que era, mas ela não.

Não, Dora era uma garotinha persistente, muito legal para uma menina, Gui tinha que admitir. Ele parou, subindo na pedra que, em sua cabeça juvenil, era na verdade o topo de seus domínios, apenas aguardando a pequena chegar.

A garotinha de chiquinhas negras parou, tentando recuperar o fôlego, correr na neve era um pesadelo, não importava se estava usando suas confortáveis botas rosas dos Aristogatas². Mas no fim das contas valia a pena, porque tinham deixado Charlie para trás e agora eram só ela e ele.

Gui lhe deu um sorriso travesso de cima de sua pedra, estendendo a mão para ajudá-la a subir. Ignorava que ela nem sequer tinha quatro anos completos, ele não se importava, Dora era muito mais esperta do que Charlie jamais seria.

– Por que saiu colendo dessa vez, Gui? – Dora ajeitou sua saia ao redor das pernas, ainda bem que havia tirado um pouco da neve antes que ela se sentasse, tia Andie ficaria brava se ele devolvesse a menina suja com limo e neve.

– Não aguento mais Charlie e essa brincadeira boba de Rei Arthur! – O garoto continuou em pé, se equilibrando na ponta do pequeno rochedo. Dora não entendeu, não havia nada de bobo na lenda do Rei Arthur de Camelot!

– Mas se você é o rei! – Ele parou com a sua brincadeira para encarar a pequena, que havia soado surpresa. Ela o olhou de baixo, esfregando de leve o nariz que sempre ficava muito sensível no frio.

– E Charlie é o dragão mordedor. – Ele completou, fazendo Dora rir, porque era verdade. Charlie não gostava de usar o soprador de bolhas enfeitiçado pelo senhor Weasley como bafo de dragão. As bolhinhas saiam vermelhas mesmo, como fogo, mas seu amiguinho preferia morder o rei Arthur, o que fazia Gui ficar realmente bravo.

– Você pode pedir para ele palar! – A menina estava começando a ficar muito confusa com toda a situação, o cabelo clareando um pouco nas raízes. Gui desceu da pedra, ficando em frente a garota, gostava sempre de observar de perto quando ela tinha essas mudanças esquisitas.

– Charlie ia arranjar alguma outra coisa mordedora para ser, mamãe diz que é por causa do bebê... – Dora fez uma cara de quem não tinha entendido, agora uma das chiquinhas completamente amarelo ovo. Gui sorriu, seu sorriso com os dois dentes da frente faltando, ele também não entendia, mas ela não precisava saber disso.

Gui iria começar a contar a Dora a última que o bebê Percy tinha aprontado, fazendo xixi espirrar para todo o lado quando papai estava trocando a fralda suja dele. Ele tinha tido uma ideia muito boa de roubar a fralda do seu irmãozinho caçula para colocar debaixo do travesseiro de Charlie, mas a mamãe descobriria tudo, que chato, mas o plano podia ser feito com uma distração, quando a sua amiga resolveu pular da pedra em que estava.

– Gui, tenho um plesente pra você! – Ela disse, corando nas bochechas e cabelo, com Dora tudo era possível, ela era toda um tomate agora!

– Não pode me dar hoje, o Natal é só amanhã! – Ele disse com um tom repreensivo, que não intimidou em nada a menina. Dora não era fácil de chatear como Charlie.

– Não ia te dar mesmo... Só se você fosse naquela pedra e voltasse. – A menina apontou espertamente para uma das pedras no meio do lago. Finalmente Gui admitiria que não podia fazer uma coisa e ela seria a nova “Rei Arthur” e ele teria que ser a boba Guinevere!

Gui cruzou os braços, nem um pouco impressionado com a sagacidade da amiga. Dora era mesmo tão boba quanto Charlie se achava que podia enganá-lo desse jeito.

– Não vou nadar até aquela pedra, isso é bobagem! – Ela começaria a imitar um franguinho, exatamente do jeitinho que seu papai havia ensinado, mas Gui foi mais rápido. – Você é muito boba mesmo.

A boca da menina fez um “o” perfeito, surpresa com o que ele tinha dito. Ninguém poderia dizer que ela era boba, ninguém, nem mesmo Gui, seu melhor amigo no mundo todo.

– E você... Você... VOCÊ É UM CABEÇUDO! – Dora não iria chorar, ela não era do tipo que chorava, mas cruzou os braços igualzinho a ele e colocou um bico enorme no rosto.

Ok, ele estava encrencado agora.

Gui sabia que quando o cabelo de Dora ficava vermelho como o seu e principalmente, quando o bico dela aparecia daquele jeito... Era hora de parar. Ele suspirou, estafado, como sua amizade com meninas era difícil!

– Ok, Dora, desculpa, mas eu não vou nadar até aquela pedra. – Ela olhou desconfiada para aquele pedido de desculpas, desculpas nunca vinham fácil com Gui. – Posso ter meu presente agora?

Ela olhou para a mão estendida, com uma luva listrada em uma cor esquisita que a menina não conhecia. Parecia cor de meleca.

– Vai me deixar ser o rei Arthur? – Ela perguntou, no seu melhor tom neutro. Ele revirou os olhos com aquela boboquice.

– Mas você é uma menina! – Ela dessa vez nem ficou chateada, Gui poderia ser tão besta às vezes...

– E desde quando Charlie é um dlagão? – Gui ficou abrindo e fechando a boca como um peixinho ruivo. Caramba, como aquela menininha podia ser tão esperta? Ela o olhou sabendo muito bem que o tinha pego daquela vez.

– Tá bom... Pode ser o rei, mas só UMA vez! – Ele disse, mas Dora já estava nas nuvens! Gui não só aceitara brincar daquilo de novo, como também iria deixá-la ser o rei! Agora sim podia lhe dar seu presente.

– Tá bom, tá bom! Olha só! – Dora tirou do bolso do seu casaco de inverno um pequeno embrulho, que logo revelou dois cordões de couro com pingentes de prata. – Papai comprou lá na cidade, é para amigos para todo, todo o semple!

Gui colocou as duas peças na mão e Dora mostrou-lhe o segredo mais secreto de todos, colocou um pingente em cima do outro e as duas peças de prata formaram um símbolo, que a pequena não sabia então, mas chamava-se nó celta.

Ambos descobririam depois que aquele símbolo significava a união infinita, eterna e a constante evolução das partes para ascensão do todo. A pulseira de Gui possuía três folhas interligadas, já a de Dora era um círculo com um intricado conjunto de linhas curvas dentro, ambos sobrepostos formavam o nó.

Gui começou a amarrar a tira fina de couro no pulso magro da amiga, precisou dar três voltas para que ficasse certo e finalizou com um simples nó duplo. Dora teve um pouco mais de dificuldade para retribuir o gesto, tanto pela limitada habilidade motora de uma menina de três anos, quase quatro, quanto pelo frio que deixava seus dedinhos sem luvas dormentes.

– Plonto! Agora somos amigos para semple! – Ela levantou o olhar para encontrar um ruivinho a encarando com um sorriso ladino, que viria a se tornar sua marca registrada futuramente.

– Pra sempre? – Ele perguntou divertido, tirando as mãos das delas. – Pra sempre é muito tempo, sabia?

A pequena fez que sim com a cabeça, balançando suas chiquinhas que haviam voltado a ser negras. Dora ainda tinha dificuldade para manter as transformações, até mesmo as involuntárias.

– Para semple, Gui. Vamos ser amigos para semple!

Gui tocou seu rosto e lá estavam elas, as lágrimas por Tonks. Ele riu entre lágrimas, por todos os deuses egípcios, como ele sentia falta daquela garota! Apertou uma parte do símbolo do infinito celta, uma parte do seu próprio infinito, ignorando o incômodo da prata em sua pele.

Chegara naquela pedra sem saber o que estava fazendo, mas agora sabia o porquê de estar ali. Aquela pulseira não era só sua para se desfazer dela assim, bem como Tonks não fora só sua para protegê-la como sempre quis fazer.

Depois de tudo, a verdade era que, mesmo que Tonks não estivesse mais com ele, a amizade deles ainda seguia o curso normal: um não era o que o outro queria e sim o que precisava. O ruivo guardou de volta a peça, decidido. Tinha planos para ela.

No entanto, Guilherme se permitiu chorar naquela pedra solitária por sua mãe e pai com um filho a menos, por seu irmão George sem metade da sua alma, chorou pelo pequeno Ted Lupin sem os seus maravilhosos pais, mas principalmente chorou por si mesmo.

Finalmente, ele chorou por si mesmo.

Pela primeira vez em quase um ano ele chorou por eles, o teimoso Gui e a adorável Dora, chorou por tudo que viveram e por tudo que não viveriam nunca mais.

Pela primeira, vez chorou por ela.

Wanna fall, fall so far

I wanna fall, fall so hard

And I call it magic

And I call it true

I call it magic

Gui aparatou no Chalé das Conchas, que logo, logo não seria mais a morada dos Delacour-Weasley. A pequena casa para sempre seria o refúgio de sua família, queria que suas crianças crescessem perto da água, mas principalmente perto das areias branquinhas, tão parecidas com outras que lhe marcaram tanto, mas a Cornualha era apenas muito distante.

Tudo estava muito claro agora. Não iria se isolar mais, não achava que poderia ficar longe da sua família, de seus amigos, do seu verdadeiro lar, como havia feito antes. Seus anos no Egito foram de aprendizado em tantas formas diferentes, mas aquela vida não lhe pertencia mais. Havia perdido tanto em tão pouco tempo, que seria loucura se ainda pertencesse, se ainda tentasse ser aquele Guilherme de seis, sete anos atrás.

Entrou na casa de paredes desgastadas cobertas de conchas, para encontrar sua linda esposa deitada no sofá em frente a lareira, adormecida com um livro pendente nas mãos. Céus, ela era exatamente a criatura por quem tinha se apaixonado naquele cubículo esquecido por Merlin em Gringotes.

Linda e delicada, forte e sábia.

Os cabelos loiros e macios formavam uma adorável cortina que passava pela pele alva do pescoço e quase tocavam no chão. Tirou o sobretudo, colocando no gancho atrás da porta e se ajoelhou para fitá-la mais de perto.

– Guilherrrme? – Parecia que a simples presença do marido era suficiente para fazer todo o seu corpo despertar. Fleur ficou feliz em constatar que seu amado já havia retornado. – Estava esperrando você, mas acabei...

Gui roubou-lhe um beijo, que logo se transformou em um sorriso no rosto da meia veela. Ela o amava por sua constância, estava sempre ali para ela, mas o amava ainda mais pela sua imprevisibilidade.

– Me esperou para começar os trabalhos? – A loira levantou animada de seu assento. Isso significava dizer que eles passariam o Natal somente eles? Somente sua pequenina e jovem família?

Fleur não queria que ninguém pensasse o contrário, amava sua nova família por casamento, assim como Gui se dava bem com seus pais, mas nesse ano pós-guerra sentia falta de ter Gui só para si nessas datas simbólicas, era como se sempre houvesse mais alguém, era quase sufocante...

Como se seu marido não lhe pertencesse completamente.

– O que quer começarr primeirro? Os biscoites ou a gemade? O perru já está no forne! – A jovem bruxa falou empolgada. Estava muito feliz simplesmente por estar ali com seu marido.

Gui a puxou para um abraço doce, sentindo o cheiro de seus cabelos. O lobo gostava disso, mas o homem gostava ainda mais. Fleur ainda mantinha o cheiro de jasmim que o encantou desde aquela primeira vez que sentiu, lá nos gelados corredores de Gringotes.

Não eram biscoitos recém-saídos do forno, mas era doce também, à sua maneira.

– Minha flor... – A francesa passou os braços ao redor do pescoço de seu ruivo, nunca cansaria de olhá-lo. – Não acredito que estamos aqui, ainda não parece real...

Gui não se referia ao local e sim a todo o momento. Depois dos horrores e luto da guerra, de toda a difícil e lenta reconstrução do mundo bruxo, que ainda estava acontecendo, ter um momento da mais singela paz era como um presente dos deuses. Guilherme se sentia abençoado.

Hoje finalmente havia decidido começar a viver plenamente.

– Oui, mon amour, nous sommes vraiment heureux maintenant! – Gui já não tinha mais problema em entender sua pequena fada. Tudo que vinha dela era familiar e querido para ele, as palavras em francês soando como música em seus ouvidos.

– Toujours, ma fleur!

Quase podia ver o sorriso satisfeito de sua ninfa do bosque olhando para aquela cena de onde quer que estivesse.

Para sempre.


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Notas finais do capítulo

Música do capítulo: Magic, Coldplay

¹Nó celta – A própria fic traz o significado da peça, que foi escolhido por ser um símbolo que representa o infinito. Suponho que esse seja o cerne dessa amizade bonita, um amor sem fim.

²Aristogatas – Um clássico da Disney, protagonizados por gatos aristocráticos e de rua, sucesso na época que Gui e Dora eram crianças.



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